INTRODUÇÃO
O ato administrativo, nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho (FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo, São Paulo, Atlas, 25. ed., 2012, pág. 99), é “a exteriorização da vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público”. Mas como distingue-se tal ato administrativo dos atos privados? Quais atributos lhe são peculiares para essa distinção? No conteúdo a seguir serão abordados os mais específicos e aceitos pela maioria doutrinária. São eles: Presunção de Legitimidade/Veracidade, Imperatividade, Autoexecutoriedade e Tipicidade.
1. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE/VERACIDADE
Esse atributo presume que o ato administrativo origina-se em conformidade com a lei, ou seja, com observância às regras estabelecidas nas normas legais, que vão determinar sua emissão.
“É a qualidade, que reveste tais atos, de se presumirem verdadeiros e conformes ao Direito, até prova em contrário. Isto é: milita em favor deles uma presunção “juris tantum” de legitimidade; salvo expressa disposição legal, dita presunção só existe até serem questionados em juízo. Esta, sim, é uma característica comum aos atos administrativos em geral; as subsequentes referidas não se aplicam aos atos ampliativos”. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, São Paulo, Malheiros, 15. ed., 2003, pág. 382)
Já José dos Santos Carvalho Filho (FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo, São Paulo, Atlas, 25. ed., 2012, pág. 120), simplifica, “essa característica não depende de lei expressa, mas deflui da própria natureza do ato administrativo, como ato emanado de agente integrante da Estrutura do Estado”.
Dentro ainda do conceito desse atributo, há autores que o igualam ao atributo de PRESUNÇÃO DA VERACIDADE. Maria Sylvia Zanella di Pietro, em suas palavras, os diferencia, pela abrangência de diferentes situações: “a presunção de legitimidade diz respeito à conformidade do ato com a lei; em decorrência desse atributo, presume-se, até prova em contrário, que os atos administrativos foram emitidos com observância na lei. A presunção de veracidade diz respeito aos fatos; em decorrência desse atributo, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pela Administração. Assim ocorre com relação às certidões, atestados, declarações, informações por ela fornecidos, todos dotados de fé pública” (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo, São Paulo, Atlas, 24. ed., 2011, págs. 199 e 200).
Esse atributo justifica-se em alguns fundamentos:
- Visa atender à supremacia do interesse público, que sempre se sobrepõe à necessidade individual, particular, justificando ser necessário garantir celeridade para que os atos sejam cumpridos;
- Tende à finalidade em conservar a legalidade, controlando o ato, quer seja pela Administração em si, quer pelos outros Poderes do Estado;
- Por tutelar o princípio da legalidade, presume-se que a própria Administração, em obediência ao referido princípio, pratique seus atos de acordo com a lei.
2. IMPERATIVIDADE
É a possibilidade de a Administração impor obrigações unilaterais a terceiros. Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, São Paulo, Malheiros, 15. ed., 2003, pág. 383), “é a qualidade pela qual os atos administrativos se impõem a terceiros, independentemente de sua concordância”. Isto quer dizer que, mesmo contrariando interesses privados, a Administração impõe o cumprimento de uma obrigação visando atender ao princípio da supremacia do interesse público.
“A imperatividade é uma das características que distingue o ato administrativo do ato de direito privado, este último não cria qualquer obrigação para terceiros sem a sua concordância”, define Maria Sylvia Zanella di Pietro (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo, São Paulo, Atlas, 24. ed., 2011, pág. 202)
A imperatividade só existe nos casos que imponham obrigações. Há atos onde a imperatividade inexiste. Essa exceção ocorre nos atos solicitados à Administração, ou seja, direitos solicitados pelos administrados, como licenças, permissões, autorizações; e nos atos enunciativos, como pareceres, certidões, atestados.
3. AUTOEXECUTORIEDADE
Característica peculiar onde a Administração após a prática do ato, executa e atinge seu objetivo, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário.
Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho (FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo, São Paulo, Atlas, 25. ed., 2012, pág. 121), “a autoexecutoriedade tem como fundamento jurídico a necessidade de salvaguardar com rapidez e eficiência o interesse público, o que não ocorreria se a cada momento tivesse que submeter suas decisões ao crivo do Judiciário. Além do mais, nada justificaria tal submissão, uma vez que assim como o Judiciário tem a seu cargo uma das funções estatais – a função jurisdicional - , a Administração também tem a incumbência de exercer função estatal – a função administrativa”.
No direito privado, há casos raros em que se permite a autoexecutoriedade:
- No desforço imediato, ou seja, defesa da posse, como configura o artigo 1.210, §1º do Código Civil de 2002, transcrito: “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além fo indispensável à manutenção ou restituição da posse”;
- Na legítima defesa, conforme o artigo 23, II do Código Penal: “Não há crime quando o agente pratica o fato: em legítima defesa”. Para melhor compreensão sobre legítima defesa, esclarece o artigo 25 dessa mesma codificação: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
Ainda na autoexecutoriedade dos atos administrativos, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo, São Paulo, Atlas, 24. ed., 2011, pág. 203), situa que a “a Administração pode autoexecutar as suas decisões, com meios coercitivos próprios”. Meios esses diferenciados, como a exigibilidade, onde são utilizados meios indiretos de coerção, definidos em lei, como as sanções punitivas, tipo multas, em caso de descumprimento à obrigação decorrente do ato; e como a executoriedade, onde há o emprego de meios diretos de coerção, podendo se valer até do uso da força física, se houver a necessidade de prevalência do interesse coletivo diante de situação emergente, onde há o risco à saúde e à segurança, por exemplo.
Ainda nesse tema, Celso Antônio Bandeira de Mello (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, São Paulo, Malheiros, 15. ed., 2003, pág. 383) enfatiza: “a executoriedade não se confunde com a exigibilidade”. Há fatos que possuem exigibilidade e não tem executoriedade. Baseado em exemplo citado pelo doutrinador, a Administração pode intimar o administrado a realizar um determinado ato, no caso específico, tratava-se de uma construção de calçada em frente à casa do administrado. A obrigação é exigível, mas não executável, porque o entendimento deste seria do uso direto da coerção, da força inclusive, para o cumprimento do ato. Na situação da construção, se não cumprida, pode resultar em uma penalidade, como multa, ao administrado, sem a necessidade do reconhecimento do Judiciário ao direito da Administração penalizar tal descumprimento. A execução, nessa questão, seria a própria Administração construir a calçada e cobrar os custos da obra ao administrado.
Agora, se a autoexecutoriedade resultar em lesão a algum direito do administrado, ou até mesmo que, antes da produção deste resultado, já haja ameaça de lesão a esse direito, pode o vitimado buscar na própria Administração ou no Judiciário, a interrupção da execução do ato administrativo ou que este nem mesmo se inicie, já que os danos do ato podem ser irreversíveis.
Acrescentamos, para um melhor entendimento sobre os atributos abordados até aqui, jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça-STJ tendo esses atributos abordados na questão:
“ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – FECHAMENTO DE PRÉDIO IRREGULAR – AUTO-EXECUTORIEDADE DO ATO ADMINISTRATIVO – DESNECESSIDADE DE INVOCAR A TUTELA JUDICIAL.
1. A Administração Pública, pela qualidade do ato administrativo que a permite compelir materialmente o administrado ao seu cumprimento, carece de interesse de procurar as vias judiciais para fazer valer sua vontade, pois pode por seus próprios meios providenciar o fechamento de estabelecimento irregular.
2. Recurso especial improvido.
(REsp 696.993/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ 19/12/2005, p. 349)”
4. TIPICIDADE
“É o atributo pelo qual o ato administrativo deve corresponder a figuras definidas previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados. Para cada finalidade que a Administração pretende alcançar existe um ato definido em lei”. Conceitua Maria Sylvia Zanella Di Pietro (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo, São Paulo, Atlas, 24. ed., 2011, pág. 203).
Esse atributo assegura aos administrados que a Administração não praticará atos inonimados, todos os seus atos atendem ao princípio da legalidade, ou seja, estão definidos em lei. Aos particulares, os atos inonimados são possíveis, por estarem resguardados pelo princípio da autonomia da vontade.
Sem previsão legal, a Administração não pode nem vincular unilateralmente o particular e nem praticar ato totalmente discricionário sem limitações calculadas em norma.
Esse atributo possui destaque na doutrina de Maria Sylvia Zanella Di Pietro.
Observa-se em todas essas características apresentadas, a presença da lei, seja garantindo-lhe a presunção de legitimidade, onde se presume que o ato baseou-se nela para existir; seja na presunção de veracidade, onde seus atos formalizam fatos existentes através de documentos dotados de fé pública; seja na imperatividade, onde a Administração obriga o cumprimento de determinada obrigação, mesmo sem a anuência do administrado; seja também na autoexecutoridade, onde a lei dá à Administração uma espécie de autonomia, para que, de modo direito ou indireto, faça-se cumprir seu ato sem a intervenção do Judiciário; e por fim, seja na tipicidade, situação em que a lei determina os tipos e procedimentos dos atos administrativos, para que não haja atos inonimados por parte da Administração, gerando insegurança àqueles atingidos pelos atos e seus resultados.
CONCLUSÃO
Em suma, tais atributos são de grande importância para uma melhor compreensão sobre o ato administrativo, pois, além de diferenciá-los dos atos privados, revestem a Administração com o poder necessário para fazer valer, em seus atos, a supremacia do interesse público em detrimento do interesse privado.
BIBLIOGRAFIA:
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, São Paulo, Malheiros, 15. ed., 2003.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo, São Paulo, Atlas, 24. ed., 2011.
FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo, São Paulo, Atlas, 25. ed., 2012.
BRASIL. VADE MECUM. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial REsp 696993. Relator: Ministra Eliana Calmon. Brasília, DF, 2004. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=imperatividade+ato+administrativo&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=14>. Acesso em: 05 out. 2012.
Estudante do Curso de Direito da Faculdade Guararapes-PE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DALCIN, Cristiane Nery de Oliveira. Atributos do Ato Administrativo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 out 2012, 07:34. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/31838/atributos-do-ato-administrativo. Acesso em: 23 dez 2024.
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