No início dos anos 90, observou-se, no Brasil, que a terceirização perdeu forças devido à recessão econômica e a abertura comercial, o que gerou, também, aumento nos índices de desemprego.
Contudo, com o Plano Real redefinindo a estrutura de preços e reacendendo a competição no setor produtivo e a Súmula 331 do TST, definindo setores onde se admitiu a terceirização, houve uma inédita elevação nos índices de contratação de terceirizados.
No tocante à Administração Pública, a terceirização pode significar problemas para o Estado, acarretando sua responsabilização civil e política, sendo necessário impor-se limites a essa descentralização.
O Decreto-Lei nº 200/67 que dispõe sobre a organização da Administração Federal e estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa, trouxe uma efetiva descentralização da Administração Federal, desobrigando-a da realização material de tarefas executivas. Essa descentralização está condicionada aos ditames do interesse público e às conveniências da segurança nacional (§8º do art 10. do referido Decreto-Lei).
A faculdade de se terceirizar encontra limitações de ordem constitucional, de modo que as atividades que correspondam a atribuições inerentes a cargos legalmente criados para o desempenho dessas, deverão ser exercidos somente por servidores admitidos mediante concurso público, nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988. Vejamos:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;
Tal limitação encontra-se disciplinada, ainda, no Decreto n° 2.271/97, que dispõe sobre a contratação de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. In verbis:
Art. 1º. No âmbito da Administração pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.
§ 1º. As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferencia, objeto de execução indireta.
§ 2º. Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangias pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal.
Por sua vez, a Lei de Licitações (Lei nº 8666/93) estabelece inúmeras cautelas para a proteção da Administração com relação aos seus contratos.
O objeto do presente estudo visa demonstrar a possibilidade de contratação da prestação dos serviços de secretariado executivo e mensageria no âmbito das Agências Reguladoras, sem ferir o art. 37, II da Constituição Federal.
Nesse sentido, a IN nº 02/2008/SLTI/MPOG, que dispõe sobre regras e diretrizes para a contratação de serviços continuados ou não, nos seus arts. 6º, 8º e 9º assim dispõem:
Art. 6º Os serviços continuados que podem ser contratados de terceiros pela Administração são aqueles que apoiam a realização das atividades essenciais ao cumprimento da missão institucional do órgão ou entidade, conforme dispõe o Decreto nº 2.271/97.
(...)
§ 2º O objeto da contratação será definido de forma expressa no edital de licitação e no contrato, exclusivamente como prestação de serviços, sendo vedada a utilização da contratação de serviços para a contratação de mão de obra, conforme dispõe o art. 37, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil. (incluído pela Instrução Normativa MP n° 03, de 15/11/2009)
§ 3º A contratação deverá ser precedida de e instruída com plano de trabalho, aprovado pela autoridade máxima do órgão ou entidade, ou a quem esta delegar competência, e conterá, no mínimo: (incluído pela Instrução Normativa MP n° 03, de 15/11/2009);
I – justificativa da necessidade dos serviços; (incluído pela Instrução Normativa MP n° 03, de 15/11/2009);
II – relação entre a demanda prevista e a quantidade de serviço a ser contratada; (incluído pela Instrução Normativa MP n° 03, de 15/11/2009);
III – demonstrativo de resultados a serem alcançados em termos de economicidade e de melhor aproveitamento dos recursos humanos, materiais ou financeiros disponíveis. (incluído pela Instrução Normativa MP n° 03, de 15/11/2009);
Art. 8º Poderá ser admitida a alocação da função de apoio administrativo, desde que todas as tarefas a serem executadas estejam previamente descritas no contrato de prestação de serviços para f unção especifica, admitindo-se pela administração, em relação à pessoa encarregada da função, a notificação direta para execução das tarefas previamente definidas.
Art. 9º É vedada a contratação de atividades que:
I – sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, assim definidas no seu plano de cargos e salários, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal;
II – constituam a missão institucional do órgão ou entidade; e
III – impliquem limitação do exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público, exercício do poder de policia, ou manifestação da vontade do Estado pela emanação de atos administrativos, tais como:
a) aplicação de multas ou outras sanções administrativas;
b) a concessão de autorizações, licenças, certidões ou declarações;
c) atos de inscrição, registro ou certificação; e
d) atos de decisão ou homologação em processos administrativos.
Dessa forma, infere-se dos supracitados artigos que estando as atividades de apoio administrativo para exercer as funções de mensageria e secretariado, pormenorizadamente descritas no contrato e desde que estas não sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos das Agências Reguladoras, é viável a contratação do referido serviço terceirizado de apoio administrativo (secretariado e mensageria). Contudo, o objeto da contratação será definido de forma expressa no Edital de Licitação e no Contrato, nos termos do §2º do art. 6º da IN n° 02/2008/SLTI/MPOG.
Por outro lado, a Lei nº 10871/2004, que dispõe sobre a criação de carreiras e organização de cargos efetivos das autarquias especiais denominadas Agências Reguladoras elenca os cargos para exercício exclusivo nas referidas Agências.
Assim, as atividades a serem desempenhadas no âmbito dos contratos de secretariado e mensageria não deve se confundir com as atribuições compreendidas na supramencionada Lei nº 10871/2004.
Ademais, a Lei que regulamenta o exercício da profissão de Secretariado Executivo, nº 7377/85, no seu artigo 4º, assim determina:
Art. 4º - São atribuições do Secretário Executivo:
I - planejamento, organização e direção de serviços de secretaria;
II - assistência e assessoramento direto a executivos;
III - coleta de informações para a consecução de objetivos e metas de empresas;
IV - redação de textos profissionais especializados, inclusive em idioma estrangeiro;
V - interpretação e sintetização de textos e documentos;
VI - taquigrafia de ditados, discursos, conferências, palestras de explanações, inclusive em idioma estangeiro;
VII - versão e tradução em idioma estrangeiro, para atender às necessidades de comunicação da empresa;
VIII - registro e distribuição de expedientes e outras tarefas correlatas;
IX - orientação da avaliação e seleção da correspondência para fins de encaminhamento à chefia;
X - conhecimentos protocolares.
No que se refere às atividades da profissão de Secretariado Executivo, infere-se do supracitado artigo que tais atividades elencadas na Lei nº 7377/85 não se confundem com as atribuições do art. 1º da Lei nº 10871/2004.
De outro turno, é de bom alvitre submeter o procedimento licitatório que visa tais contratações ao exame dos Recursos Humanos das Agências Reguladoras com o fito de verificar se as atividades a serem desenvolvidas pelo secretário executivo/mensageiro, são inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, assim definidas no seu plano de cargos e salários, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal; constituam a missão institucional do órgão ou entidade; ou impliquem limitação do exercício dos direitos individuais em beneficio do interesse publico, exercício do poder de polícia, ou manifestação da vontade do Estado pela emanação de atos administrativos.
Nesse sentido é a jurisprudência do TCU. Vejamos:
Licitação de serviços advocatícios: 3 - A contratação de tarefas inerentes a categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos de entidade ou órgão da Administração Pública afronta o disposto no art. 1º, § 2º, do Decreto 2.271/1997 e a regra do concurso público, somente podendo ser admitida temporariamente para fazer frente a comprovada necessidade do contratante
Ainda nos autos do citado agravo em que a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) requereu a revogação de medida cautelar que suspendeu a Concorrência 2/2011 Galic-AC/CBTU, cuidou o relator de examinar a licitude do objeto desse certame, visto que há previsão, no plano de cargos da CBTU, do cargo de advogado. Anotou, de início, o aparente conflito entre esse procedimento licitatório e o disposto no art. 1º, § 2º, do Decreto 2.271/1997, aplicável, por analogia às empresas estatais, conforme decidido pelo Tribunal no Acórdão 2132/2010-TCU-Plenário. Estabelece o referido comando normativo que: “§ 2º Não poderão ser objeto de execução indireta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal”. A CBTU informou, porém, que o número atual de advogados da empresa é de aproximadamente vinte, lotados na administração central e em suas superintendências regionais. Registrou, ainda, ter sofrido com evasão dos advogados contratados e suspensão de concursos públicos pelo governo. Sensível a essas contingências, o relator sugeriu instar a CBTU a adequar a defesa judicial das ações em que figure como parte ou interessada aos ditames da Constituição e da lei. A despeito disso, ressalvou a viabilidade de deflagração imediata de novo procedimento licitatório para a contratação de serviços técnicos de advocacia, desde que sanadas as demais irregularidades identificadas no referido certame. O Tribunal, então, quanto a esse aspecto, determinou à CBTU que: a) “avalie se o seu quadro de advogados é compatível com a projeção da quantidade de ações judiciais em que devam atuar”; b) elabore relatório circunstanciado que, entre outras informações, revele: b.1) as projeções, ano a ano, da quantidade de advogados do seu quadro próprio e da quantidade de ações judiciais a serem conduzidas; b.2) a conclusão da Diretoria quanto à compatibilidade e suficiência de seu quadro próprio de advogados para defesa judicial da Companhia e as providência para compatibilizar a condução dessas ações com o disposto no Decreto 2.271/1997 e o princípio do concurso público. Acórdão n.º 525/2012-Plenário, TC 032.341/2011-3, rel. Min. Weder de Oliveira, 7.3.2012.
TERCEIRIZAÇÃO. DOU de 19.03.2012, S. 1, p.100.Ementa: alerta ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão no sentido de que oriente os gestores públicos de que não será considerada de boa-fé pelo TCU a terceirização de serviços que envolvam a contratação de profissionais existentes no Plano de Cargos e Salários do órgão/entidade por contrariar o art. 37, II, da Constituição Federal e, ainda, poder implicar futuros prejuízos ao Erário, decorrentes do possível acolhimento pela Justiça do Trabalho de pleitos dos terceirizados, garantindo-lhes o direito ao recebimento das mesmas verbas trabalhistas legais e normativas asseguradas àqueles contratados pelo tomador dos serviços, na esteira da Orientação Jurisprudencial n° 383 SDI-1 do TST (item 9.3, TC-032.732/2011-2, Acórdão nº 576/2012-Plenário).
TERCEIRIZAÇÃO e TRABALHISTA. DOU de 07.03.2012, S. 1, p. 120. Ementa: alerta à Companhia de Eletricidade do Acre (ELETROACRE), às Centrais Elétricas de Rondônia S/A (CERON), à Companhia Energética do Piauí (CEPISA), à Boa Vista Energia S/A (BVENERGIA), à Companhia Energética de Alagoas (CEAL) e à Amazonas Distribuidora de Energia S/A (AME) no sentido de que a terceirização de serviços que envolvam a contratação de profissionais existentes no Plano de Cargos e Salários da respectiva entidade contraria o art. 37, II, da Constituição Federal e, ainda, pode implicar futuros prejuízos ao Erário, decorrentes de possível acolhimento pela Justiça do Trabalho de pleitos dos terceirizados com base na Orientação Jurisprudencial/TST n° 383 SDI-1, que garante a esses empregados o direito ao recebimento das mesmas verbas trabalhistas legais e normativas asseguradas aos empregados da empresa tomadora dos serviços, desde que presente a igualdade de funções (item 9.4, TC-019.784/2011-2, Acórdão nº 418/2012-Plenário).”
Ante o exposto, tais atividades de mensageria e secretariado executivo devem estar descritas no Edital de Licitação e Contrato e não abrangidas pelo plano de cargos das Agências Reguladoras, criadas pela Lei nº 10871/2004. Destarte, as supracitadas atividades não devem se confundir com as atribuições compreendidas nesta Lei. Nesses moldes, tais contratações possibilitam a efetivação do princípio da eficiência, pois facilitam o bom desempenho das atividades das Autarquias Especiais denominadas Agências Reguladoras.
Procuradora Federal, lotada na Procuradoria Federal do Estado de Goiás, em exercício na Agência Nacional de Telecomunicações desde agosto de 2008 até a presente data. Atuou por 06 (seis) anos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JULIANA DE ASSIS AIRES GONçALVES, . Da possibilidade de contratação da prestação de serviços tercerizados de secretariado executivo e mensageria no âmbito das Agências Reguladoras Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 nov 2012, 08:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/32338/da-possibilidade-de-contratacao-da-prestacao-de-servicos-tercerizados-de-secretariado-executivo-e-mensageria-no-ambito-das-agencias-reguladoras. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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