A Lei nº 11.340/2006 foi “batizada” com esse nome em homenagem à mulher que lutou 20 anos para que o seu agressor não ficasse impune, o que a tornou símbolo da luta contra a violência doméstica no nosso país.Maria da Penha, em 1983, sofreu duas tentativas de homicídio por parte de seu marido. Na primeira vez, 1983, ele simulou um assalto fazendo uso de arma de fogo, que em razão do tiro que a atingiu ficou paraplégica. Logo após alguns dias, quando retornou para casa sofreu uma nova tentativa de homicídio, ele tentou eletrocutá-la por meio de uma descarga elétrica enquanto ela tomava banho (DIAS, 2008, p. 13).
O processo criminal contra o agressor, até 1988, ainda não tinha sido encerrado no âmbito nacional, razão pelo qual o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) encaminharam o caso a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O Estado brasileiro não se manifestou em relação ao caso diante da Comissão e acabou sendo responsabilizado por violações à Convenção Americana de Direitos Humanos e à Convenção de Belém do Pará. Somente em virtude desta decisão é que foi possível lograr o encerramento do processo no âmbito nacional, bem como a prisão do agressor.
A criação de uma lei para erradicar a violência contra a mulher, sempre teve como foco fundamental caracterizar a violência doméstica e familiar como violação dos direitos humanos das mulheres, e elaborar uma norma que assegure proteção e procedimentos policiais e judiciais humanizados para as vítimas. Além de punir, a Lei Maria da Penha traz aspectos educativos que a qualificam com uma legislação avançada e inovadora. Segue um Direito moderno, com capacidade de compreender a complexidade das questões sociais e o grave problema da violência doméstica e familiar.
A Lei surge para promover uma real mudança nos valores sociais, que naturalizam a violência que acontece nas relações domésticas e familiares, em que os padrões de superioridade masculina e subordinação feminina, durante séculos, foram aceitos por toda a sociedade.
Neste panorama é que a Lei apresenta, de maneira minuciosa, os conceitos e as diferentes modalidades de violência contra a mulher, pretendendo ser um instrumento de mudança política, jurídica e cultural (CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIAS, 2007, p.15).
Compreende a Lei Maria da Penha como violência doméstica e familiar “toda e qualquer espécie de agressão (omissão ou ação) dirigida contra mulher, que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonialcausado no ambiente familiar” (art. 5º).
Conselho da Europa[1] citado por Cunha e Pinto (2008, p. 39) define bem a Violência Contra as Mulheres como:
Qualquer ato, omissão ou conduta que serve para infligir sofrimentos físicos, sexuais ou mentais, direta ou indiretamente, por meio de enganos, ameaças, coação ou qualquer outro meio, a qualquer mulher, e tendo por objetivo e como efeito intimidá-la, puni-la ou humilhá-la, ou mantê-la nos papéis estereotipados ligados ao seu sexo, ou recusar-lhe a dignidade humana, a autonomia sexual, a integridade física, mental e moral, ou abalar a sua segurança pessoal, o seu amor próprio ou a sua personalidade, ou diminuir as suas capacidades físicas ou intelectuais.
As mulheres, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, gozam dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Além disso, elas tem garantidas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social (art. 2º).
A Lei Maria da Penha deve ser analisada de acordo com o fato social do tempo em que for aplicada, e o art. 4º estabelece, in verbis: “Na interpretação desta lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar”. Portanto, os operadores do Direito, ao aplicarem a LMP, devem sempre interpretá-la de forma a atender à sua finalidade, que é assegurar à mulher em situação de violência condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, segurança, saúde, alimentação, educação, cultura, moradia, acesso à justiça, esporte, lazer, trabalho, cidadania, liberdade, à dignidade, respeito e convivência familiar e comunitária.
A Lei define de maneira precisa as formas de violência doméstica e familiar contra as mulheres, de uma maneira pedagógica, visto a diversidade de termos que vinha sendo usados de modo intercambiáveis, tanto no discurso acadêmico quanto na prática jurídica, nem sempre tratava o termo da violência contra a mulher na sua abrangência e significações, dando margem a uma diversidade de interpretações, com sérias implicações políticas e legais.
Surge assim, pela primeira vez em nossa legislação, o conceito moderno de família. Entende que família é “a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa” (art. 5º, inciso II). Antes se utilizava um conceito restrito de família, considerando-a como à instituição jurídica estabelecida por meio do casamento ou da união estável entre um homem e uma mulher.
Como salienta Rabelo e Saraiva (2006):
Aceitar novos modelos familiares não significa dizer que a família será destruída. Conceber apenas a família nuclear composta pelo casal heterossexual e filhos como o único modelo de família aceitável, é incompatível com a natureza afetiva da família. A noção de família como núcleo de afetividade e base da sociedade deve ser encarada, como de fato é, como um fator cultural. E, dessa maneira, a legislação deve acompanhar a evolução da sociedade e, conseqüentemente, dos arranjos familiares.
Importante inovação é que a partir do momento em que a lei abriga a mulher, sem a distinção de sua orientação sexual, o alcance da norma abrange tanto heterossexuais quanto lésbicas, travestis, transexuais e transgêneros que mantêm relação íntima de afeto, em ambiente familiar ou de convívio. Em todos esses relacionamentos, as situações de violência contra o gênero feminino justificam especial proteção. Na lição de Dias (2008, p. 41):
No que diz com o sujeito passivo, há a exigência de uma qualidade especial: ser mulher. Nesse conceito encontram-se as lésbicas, os transgêneros, as transexuais e as travestis, que tenha identidade com o sexo feminino. A agressão contra elas no âmbito familiar também constitui violência doméstica.
Com isso, surge um grande debate sobre a constitucionalidade da lei, pois se estaria excluindo o homem de tal proteção, sob o argumento de que o homem se tornaria um cidadão de segunda categoria em relação ao sistema de proteção contra a violência doméstica, estabelecendo, contudo um tratamento desigual entre as partes. Mas, por outro lado, parte da doutrina apóia a aplicação de uma norma de proteção às mulheres que se encontram em posição de inferioridade em relação aos homens, sendo na maior parte das vezes as principais vítimas no âmbito da violência doméstica. Esses e outros argumentos serão discutidos no próximo capítulo.
A Lei descreve com detalhe todas as formas de manifestação da violência doméstica e familiar contra a mulher, esgotam todas as práticas que devem ser coibidas pelo Estado. Menciona de forma clara a violência sexual, psicológica, moral e patrimonial, exemplifica os males causados à saúde psíquica, emocional, à honra, à imagem, que podem ser causados à mulher violentada, posto isto, fica claro que a violência doméstica vai além da violência física, deixando marcas que não aparecem no seu corpo.
A principal Política Pública estabelecida pela Lei Maria da Penha tem por objetivo coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, e deve ser formulada e colocada em prática por meio de um conjunto articulado e integrado de ações do poder público, articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios (art. 8º).
A "assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar” (art. 9º) será prestada por meio de medidas de proteção, que deverão ser efetivadas de forma articulada entre as autoridades e agentes públicos.
A Lei Maria da Penha impõe a inserção das mulheres em situação de violência a medidas assistenciais e, sendo determinado pelo Juiz, o Estado deve proporcionar condições eficazes para o seu cumprimento. Muitas dessas mulheres dependem financeiramente do seu agressor, sendo assim, é de extrema importância que sejam inseridas em programas sociais para que superem a fase de violência em que estão envolvidas. (ALVES, 2006).
No âmbito policial a assistência deve ser preventiva ou repressiva. A Lei Maria da Penha enfatiza bem o atendimento que deve ser prestado à mulher vítima de violência. A autoridade policial deverá garantir proteção à mulher; encaminhá-la ao hospital ou posto de saúde; fornecer transporte, para ela e/ou seus dependentes, a um abrigo ou a um local seguro; deve acompanhar a mulher violentada até ao domicílio para retirada dos pertences do local da ocorrência; e com destaque, a Lei Maria da Penha, resgata a instauração do inquérito policial, que foi afastado na época em que a violência doméstica era tratada nos JECRIMs.
No que concerne ao âmbito judicial, cremos que a medida mais importante diz respeito à criação de um novo órgão judicial: o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher (JVDFM). Esses Juizados especializados terão competência cível e criminal, “que poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher” (art. 14). Assim, essa nova lei estabelece a necessidade de criar um sistema judicial próprio para aplicação das normas, para, atender especificamente os casos decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Enquanto não estruturados os JVDFM, as medidas protetivas serão encaminhadas ao juízo criminal. A este compete apreciar medidas protetivas até mesmo de natureza cível: decretar à separação de corpos, fixar alimentos e etc. A execução de mediadas urgentes que obrigam o agressor é providencia a ser estabelecida pelo juiz que as deferiu (vara criminal). Mas as medidas de trato sucessivo, como alimentos e regulamentação de visitas, depois de intimado o agressor e decorrido o prazo recursal, o procedimento é encaminhado ao juízo cível ou de família. (DIAS, 2008, p.67)
A LMP esclarece a dúvida de muitas mulheres sobre a renúncia à representação: “Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público” (art. 16). O referido artigo aborda as ações penais “condicionadas à representação da ofendida”, ou seja, a vítima tem que querer que o crime seja investigado pela autoridade competente (autoridade policial e Ministério Público), para que o agressor seja denunciado e seja instaurado o processo criminal. Neste tipo de ação, a vítima pode desistir da queixa, sempre obedecendo os requisitos do dispositivo citado.
A renúncia é muito comum, visto que a mulher que sofreu violência doméstica muitas vezes é tratada com descaso na área policial e judicial, mas, a desistência ocorre, sobretudo, quando a vítima depende economicamente e emocionalmente do agressor, ou teme uma retaliação bem maior. O fato é que muitas mulheres que sofrem a violência e procuraram a Justiça não desejam, na verdade, separar-se do marido ou companheiro ou vê-los presos, mas ela deseja apenas cessar com as agressões (CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIAS, 2007, p.27).
No entanto, a situação hoje pode ser um pouco diferente, já que a renúncia à representação por parte da vítima só será aceita perante o juiz, em audiência especialmente designada para tal fim, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. Assim, a mulher terá mais tempo para pensar e, com as medidas protetivas de urgência asseguradas, poderá seguir com a denúncia até o final. (CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIAS, 2007, p.28).
Importante salientar que a lei proíbe a aplicação de penas de prestação pecuniária, especialmente a de cesta básica ou a de substituição de pena "que implique o pagamento isolado de multa" (art. 17). E o art. 41 é, ainda, mais contundente, pois impedem a incidência de toda a Lei 9.099/1995 em crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher.
A intenção do legislador é fazer o agressor cumprir pena de caráter pessoal, ou seja, privativa de liberdade ou restritiva de direitos (prestação de serviço à comunidade, limitação de fim de semana ou interdição temporária de direitos), sempre adequando o tipo de crime em análise.
Essas e outras mudanças enfrentaram severas críticas dos aplicadores do Direito. Sendo que o principal argumento que rodeia essa questão é sobre a constitucionalidade, visto que alegam que a lei estaria ferindo a competência da Constituição Federal. Como pontua Maria Berenice Dias ([20--]):
“Como tudo que é inovador e tenta induzir mudanças, também a nova lei está sendo alvo das mais ácidas críticas. Há uma tendência geral de desqualificá-la. São suscitadas dúvidas, apontados erros, identificadas imprecisões e proclamadas até inconstitucionalidades. Tudo serve de motivo para tentar impedir sua efetividade. Mas todos esses ataques nada mais revelam do que injustificável resistência à sua entrada em vigor”
Com tudo isso, a Lei Maria da Penha enfrenta todos os desafios e permanece para assegurar à mulher o direito à sua integridade física, psíquica, sexual e moral. A Lei 11.340/06 trouxe para a sociedade o reconhecimento dos direitos humanos para as mulheres.
As medidas protetivas de urgência são ações necessárias para oferecer à mulher proteção contra agressões futuras e suas conseqüências. É importante ressaltar que a LMP não busca exclusivamente o encarceramento do agressor, como solução do problema da violência contra a mulher e sim que haja uma resposta do Estado visando coibir tal violência, por meio de processo e de outros instrumentos.
Para tanto, proporciona à mulher condições de avançar com a ação judicial, de permanecer em seu lar, de exercer o direito de ir e vir, de continuar trabalhando, de proteger seus filhos e sua integridade física, psicológica, patrimonial e moral. Estas medidas podem ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da própria mulher ofendida, diretamente na Delegacia. O juiz, ao receber o pedido de medidas protetivas de urgência encaminhado pelo delegado, vai examiná-lo e decidi sobre o caso no prazo de 48 horas, determinando, se for o caso, o encaminhamento da ofendida à assistência judiciária e comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis. Pode também conceder as medidas imediatamente, sem precisar ouvir as partes em audiência pública ou esperar a manifestação do Ministério Público.
Existem várias medidas protetivas de urgência que não são estabelecidas na LMP e nem têm um prazo certo. O juiz, percebendo a necessidade, pode aplicar quantas medidas protetivas achar necessárias, analisando cada caso; pode mudá-las, suspendê-las ou acrescer outras que não estão elencadas nesta Lei. Mas para que isso ocorra, é essencial que a mulher ofendida ou o Ministério Público solicite ao juiz. (CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIAS, 2007, p.30).
A Lei Maria da Penha ainda traz a possibilidade da prisão preventiva do agressor. Esta deverá ser decretada de ofício ou mediante representação do MP ou da autoridade policial. O juiz a qualquer momento poderá revogar a prisão preventiva se verificar a falta de requisitos para tal ação ou mesmo pode decretá-la novamente se verificar que o agressor está atrapalhando o andamento do processo, ou se perceber que o agressor poderá agredir novamente a vítima. Vale destacar que a LMP sempre visa à proteção da mulher, devendo a vítima ser notificada de todos os atos processuais relativos ao agressor, em especial quanto a entrada e a saída do acusado da prisão.
A Lei apresenta um rol (não taxativo) de medidas protetivas de urgência, previstas nos artigos 22 a 24, que limitam a ação do agressor, obrigando-o a se afastar do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; poderá suspender a posse ou restringir o porte de armas, devendo assim comunicar ao órgão competente[2]; poderá ainda proibir determinadas condutas como aproximação da ofendida; freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida, dentre outras medidas de prevenção, a fim de salvaguardar a vítima.
Existem também medidas protetivas de urgência à ofendida, elencadas Lei Maria da Penha. Poderá o juiz ou autoridade policial determinar; o encaminhamento da ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento; determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; determinar a separação de corpos.
Ainda para proteger a mulher de mais um ato estúpido de violência, a Lei Maria da Penha proíbe que a vítima entregue a intimação ou notificação ao agresso. Cabe ao oficial de Justiça ou ao policial fazer este serviço. Esse dispositivo surge especialmente para as delegacias de polícia, pois verificando ser comum a vítima, após registro da ocorrência, ser encarregada de entregar ao agressor a notificação para comparecimento perante a autoridade policial, o que provocava novas agressões à mulher. (ALVES, 2006). Uma das exigências da Lei é que a vítima seja acompanhada do advogado em todos os atos processuais em que participe, garantindo o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita.
Para assegurar a aplicação da Lei Maria da Penha foi necessário alterar o Código Penal, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal para aperfeiçoá-los e estabelecer medidas punitivas compatíveis com as violações à integridade física, psicológica, sexual, moral e patrimonial das mulheres. Assim, para atender aos seus propósitos, os artigos 42 ao 45 estão elencando as alterações.
Como retrata Dias (2008, p. 99), essas modificações levada a efeito na legislação infraconstitucional foram de pequena monta. Tratando do Código Penal, o legislador acrescentou mais uma circunstância agravante, pelo artigo 43 da Lei Maria da Penha[3], incluiu a violência contra a mulher como mais uma forma de agravamento da pena, ficando a seguinte redação para este artigo no inciso II, alínea f: “com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica”. No entanto, houve mais uma forma de agravamento da pena, se o delito for praticado com violência doméstica. Em relação à lesão corporal, houve somente alteração no limite máximo e mínimo de duração da pena, passando de seis meses a um ano, para três meses a três anos. Assim, fica vedada a possibilidade de transação, composição de danos e suspensão condicional do processo, pois estas regalias só são cabíveis para infrações penais com pena máxima não superior a dois anos (DIAS, 2008, p. 100).
Com o advento do art. 44 da Lei Maria da Penha, alterou o art. 129 do Código Penal[4] majorando a pena para quem praticasse lesões corporais na modalidade de violência doméstica contra vítima portadora de deficiência. Nessa hipótese a pena é aumentada de um terço.
A LPM também alterou art. 313 do Código de Processo Penal, que trata da prisão preventiva que está prevista no art. 42 da LMP[5]. O dispositivo insere um novo inciso no CPP, determinando que a prisão preventiva também possa ser decretada se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
Segundo Cunha e Pinto (2008, p.82): “Há quem sustente inclusive a inconstitucionalidade da nova hipótese de decreto de prisão preventiva como forma de garantir a execução de medida protetiva de índole civil.” Mas esse aprisionamento ocorre exclusivamente da violência doméstica, assim o Juiz pode decretar a prisão provisória do agressor para garantir o cumprimento das medidas protetivas de urgência, portanto, não se limita ao âmbito criminal.
Mas, como bem explana o nobre doutrinador Rodrigo da Silva Perez Araujo (apud Dias, 2008, p. 104):
[...] a prisão cautelar do agressor é, sem dúvida, garantia do direito fundamental da mulher vitimada em sua integridade- implícita ao direito fundamental à vida. E não há reprovação que se possa fazer por se estar a cumprir o direito a liberdade do agente. A opção do legislador é voz legítima do interesse público e do povo, de que emana o Poder, e, portanto, deve preponderar.
A respeito da alteração feita na Lei de Execução Penal, a Lei Maria da Penha acrescentou em seu art. 42 um parágrafo único ao art. 152 da Lei de Execução Penal[6], admitindo que sejam ministrados ao condenado cursos e palestras, ou atribuídas atividades educativas durante o tempo que permanecer na instituição – indicada pelo juiz para cumprir a pena restritiva de direito de limitação de fim de semana. Este tipo de pena consiste na obrigação do agressor de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado (art. 48, CP). Este seria o modo para o agressor cumprir sua pena e ainda refletir sobre o seu comportamento e conhecerem outras formas de construção da masculinidade, para além daquela baseada no uso da força, do domínio e da violência sobre a mulher (CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIAS, 2007, p. 36).
A Lei Maria da Penha proíbe de forma enfática a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direito de prestação pecuniária, esta está expressa em seu art.17 da lei citada. O legislador deixa clara a proibição da substituição da pena carcerária por pena restritiva de direito que tenha conteúdo econômico, e assim mostra o quão importante é a integridade da mulher, que jamais poderá ser trocado por qualquer valor econômico.
Esta Lei enfrenta duras críticas e muitos tentam desqualificá-la, considerando a Lei Maria da Penha inconstitucional, sofrendo alegações que a lei fere o Principio constitucional da igualdade e trata homem e mulher de forma diferenciada. Entretanto, outros autores, a exemplo de Dias ([20--]), entendem que a “Lei trata da consagração da máxima aristotélica de que o princípio da igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam”.
ALVES, Fabrício de Mota. Lei Maria da Penha: das discussões à aprovação de uma proposta concreta de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher,2006 Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8764&p=2>. Acesso em: 15 set 2009
CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ACESSÓRIA (CFEMEA). Lei Maria da Penha: do papel para a vida.Comentários à lei11340/2006. CECIP. 2007.
CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista. Volência doméstica: Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06). Comentada artigo por artigo. São Paulo: RT, 2007.
DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
______. Falando em Violência Doméstica. Disponível em:<http://www.mariaberenicedias.com.br/site/content.php?cont_id=154&isPopUp=true>. Acessado em 30 ago 2009
RABELO, Iglesias Fernanda de Azevedo; SARAIVA, Rodrigo Viana. A Lei Maria da Penha e o reconhecimento legal da evolução do conceito de família. Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8911>. Acessado em: 9 de out. 2009.
[1] O Conselho da Europa é uma organização internacional fundada a 5 de Maio de 1949, a mais antiga instituição européia em funcionamento. Os seus propósitos são a defesa dos direitos humanos, o desenvolvimento democrático e a estabilidade político-social na Europa. Tem personalidade jurídica reconhecida pelo direito internacional e serve cerca de 800 milhões de pessoas em 47 Estados, incluindo os 27 que formam a União Européia.
[2]Lei 10.826/2003.
[3]O art. 43 acrescentou na alínea f do II do art. 61 do CP: São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: (...) II- ter o agente cometido crime: f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hostilidade, ou de violência contra a mulher na forma da lei específica.
[4]Código Penal, art. 129,§11: na hipótese do,§9º deste artigo, apena será aumentada de um terço se o crime dor cometido contra pessoa portadora de deficiência.
[5]CPP, art. 313 Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos: IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
[6]A LEP,art. 152: Poderão ser ministrados ao condenado, durante o tempo de permanência, cursos e palestras, ou atribuídas atividades educativas. Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.
Mestre em Direito das Relações Internacionais pelo Uniceub. Procurador Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, Milton Carvalho. A Lei Maria da Penha e as perspectivas de redução da violência doméstica contra a mulher Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 dez 2012, 10:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/32874/a-lei-maria-da-penha-e-as-perspectivas-de-reducao-da-violencia-domestica-contra-a-mulher. Acesso em: 23 dez 2024.
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