RESUMO: Este trabalho procura de forma detalhada, explanar um entendimento de suma importância, que são as alterações introduzidas pela constituição federal de 1988 no sistema tributário brasileiro, procurando identificar, na concepção estatal, os motivos que deram base à atual Constituição e as razões que tornaram tão necessária a função dos princípios constitucionais na organização dos demais direitos infraconstitucional. A constitucionalização retrata a preocupação em implementar dispositivos de caráter fundamental em toda legislação, e em especial a sua funcionalidade dentro da sociedade e a razão que limita a legitimação do Estado, tendo como principal motivação a satisfação das garantias constitucionais a favor da coletividade, como sua razão de ser, basilares nos princípios da igualdade, legitimidade, solidariedade e legalidade.
PALAVRAS-CHAVE: Constituição; direitos; objetivos; princípios; sociedade.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho é expandir informações e opiniões, conceituando de forma ampla a importância das mudanças na legislação tributária após a promulgação da Constituição Federal de 1988, delineando, segundo o texto constitucional, as regulamentações por normas e princípios, definindo a organização administrativa financeira e política do Estado concomitantemente com os direitos e deveres do cidadão. Ela tem entre as suas características a generalidade, ou seja, ela é aplicada genericamente a sociedade e a todos os cidadãos e a ninguém é dado o direito de desconhecê-la como também de desobedecê-la, para que não sofra sanções, pelo descumprimento das obrigações. Estes descumprimentos fazem parte da premissa da execução fiscal, com ressalvas da ampla defesa ao contribuinte. A limitação ao poder impositivo do Estado representa um dos direitos fundamentais mais importantes outorgados pela Carta da República de 1988 ao universo dos cidadãos. Não podemos desconhecer que os direitos fundamentais na perspectiva do direito tributário representam uma importante conquista política jurídica dos contribuintes seja administrativamente ou judicial, invocando o acesso à justiça e a ampla defesa.
O poder imperial do Estado, distribuído entre as pessoas jurídicas de direito público como a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, mas submetidos às regras constitucionais, onde compete o poder para cobrar e exigir tributos, tendo como contrapartida as pessoas físicas e jurídicas, com o dever de pagar, de forma que não contrarie os direitos e garantias individuais, que tem aplicação imediata e se sobrepõem sobre os demais direitos. O Estado exige dos indivíduos o pagamento de forma inconteste do que lhe é devido, apesar de não ter o retorno em forma de melhoria da qualidade de vida equivalente ao tributo pago. A cobrança do tributo tem como objetivo a consecução de obras, prestação de serviços que proporcione o bem estar social da coletividade, pois sem ele o Estado não tem como a execução de tais objetivos. Contudo os custos para alcançar estes objetivos advém das rendas de tributos de forma imposta aos contribuintes e empresários (pessoas físicas e jurídicas) sejam eles de atividades diversas, conforme passamos a analisar uma demonstração da iniciação da atividade empresarial , exemplificando de um chinês vindo da China em 1926 para trabalhar como garçom e mais tarde se torna empresário, contribuinte e empregador, narrado por Boris Fausto que:
[...] Ho-Fung e Maria passaram do conhecimento ao namoro, e se casaram em 1933. Nesse ano ocorreu a morte da mãe de Maria, que deixou uma pequena herança – uma casa em Araquara, vendida pelos nove filhos herdeiros. Foi com o dinheiro dessa herança que o casal instalou seu restaurante na rua Wenceslau Braz número 13, aproveitando uma boa oportunidade; o local ficara vago, pois o primo de Ho-Fung, Antonio Akui, jogador inveterado, levara o antigo restaurante à falência. A família de Maria Akiu fazia um continuado esforço de integração no país. Seus membros se converteram ao catolicismo e optaram pela utilização primeiros nomes usuais no Brasil, formando combinações curiosas, como a do nome patriarca – Joaquim Akiau Ching. O fato de o “mercado matrimonial” intraetécnico ser muito reduzido para os chineses também concorreu para que os filhos e filhas do casal imigrante Joaquim e Maria tendessem a casar com brasileiros, italianos, espanhóis. O casamento da filha Maria Akiau com Ho-Fung, assim, uma exceção. (FAUSTO, 2009, p. 25).
É triste e notório que a carga tributária imposta no Brasil é considerada uma das mais elevadas mundialmente, para as pessoas físicas e jurídicas, inibindo o poder de investimento, tanto de um como de outro. Em razão isso, as empresas deixam de investir na qualificação e ampliação da mão de obra; melhoramento de equipamentos, o que ocasionaria uma elevação e qualificação da produção, havendo uma maior demanda de produtos, aumentando o consumo pela pessoa física, que menos onerada principalmente nos denominados impostos indiretos, aqueles embutidos nos produtos e bens de consumo passaria a consumir satisfatoriamente o necessário.
As pessoas buscam no dia a dia, uma melhor condição de vida, mas não há reciprocidade do Estado, na efetiva prestação de serviços condignos com o que é instituído ao cidadão e as empresas. As pessoas em geral (físicas e jurídicas), não se opõem ao pagamento de tributos, porém num patamar condigno com seu modo e estilo de vida, onde a contraprestação do Estado deveria ser condigna com que é pago. Contudo estas atribuições impostas ao ser humano, apesar de constitucional é desumano, isto é, contrário à dignidade da pessoa humana, tudo aquilo que puder reduzir a pessoa à condição de objeto, instituindo a pessoa humana como um mecanismo de arrecadação de tributo. Para melhor entendermos tal mecanismo e sabermos os direitos do contribuinte, veremos o pensamento de Geovana Oliveira de Assis que:
A constituição enquanto sistema aberto implica em sua aptidão para o desenvolvimento e aceitação da existência de normas implícitas cuja positividade e eficácia são admitidas como parte do sistema. Todas as considerações tecidas nesse ítem (Sistema Tributário na Constituição Federal) observam como é peculiar o nosso Sistema Tributário; peculiares são também as características que apresenta. Fixou-se o entendimento de um sistema cuja abertura permite um relacionamento com outras imposições do Sistema Constitucional como um todo. Previlegiou-se na análise a interação mantida com os direitos e garantias fundamentais do cidadão que trabalham no sentido de conferir, às vezes de maneira negativa. (ASSIS, 2011, p.123).
Diversos mecanismos foram criados ao longo dos anos, para cada vez mais instituir impostos ao cidadão, sem a reciprocidade almejada por todos. Exemplificadamente temos o aumento da alíquota do imposto de renda das pessoas físicas, buscando um equilíbrio financeiro nas contas públicas, com isso impondo maior ônus aqueles que ganham mais, porém a realidade é outra, aqueles que ganham mais são os que menos pagam.
A maioria dos brasileiros, paga alta carga tributária nos impostos embutidos nos produtos, até nos produtos da denominada cesta básica. A função social do tributo diante destas realidades vividas cotidianamente pelo cidadão, só atingirá o seu ápice tão almejado, quando população tiver uma consciência fiscal, participando ativamente das decisões que envolvem conhecimento do valor arrecadado pelo Estado e os seus gastos públicos.
O Estado, para prover o bem comum por meio da tutela das necessidades públicas, necessita da obtenção de recursos. Além disso, deve gerir e aplicar tais recursos de acordo com um planejamento adequado e dentro das respectivas decisões políticas, sempre com o objetivo de atender aos interesses básicos e fundamentais definidos na Constituição Federal. Como atividade estatal, não só a cobrança fiscal em si, mas todos os procedimentos e etapas para se chegar a essa cobrança, devem estar de acordo com a Constituição Federal e com as autorizações expressas do ordenamento jurídico pátrio. Trata-se essencialmente do respeito ao princípio da legalidade, evitando assim o arbítrio dos governantes. Com estas atribuições que são conferidas ao Estado que Norberto Bobbio diz:
[...] Para resumir brevemente tais resultados, digamos que não foi possível dar uma definição do Direito do ponto de vista da norma jurídica, considerada isoladamente, mas tivemos de alargar nosso horizonte para a consideração do modo pelo qual uma determinada norma se torna eficaz a partir de uma complexa organização que determina a natureza e a entidade das sanções, as pessoas que devam exercê-las e a sua execução. Essa organização complexa é o produto de um ordenamento jurídico. Significa, portanto, que uma definição satisfatória do Direito só é possível se nos colocarmos do ponto de vista do ordenamento jurídico. Repensemos por um momento as várias tentativas feitas para definir o Direito através deste ou daquele elemento da norma jurídica. Todas elas resultaram em sérias dificuldades. Os critérios adotados, a cada vez, para encontrar uma definição de Direito tomando como base a norma jurídica ou foram tais que deles não foi possível obter um elemento característico dessa norma com respeito a outras categorias de norma (como as normas morais ou sociais), conduzindo, portanto, a um círculo vicioso, ou então reconduziam àquele fenômeno mais complexo da organização de um sistema de regras de conduta, no qual consiste justamente o ordenamento jurídico, abrindo, assim, para uma estrada que tinha saída o reconhecimento da relevância do ordenamento para a compreensão do fenômeno jurídico. No conjunto de tentativas realizadas para caracterizar o Direito através de algum elemento da norma jurídica, consideraríamos, sobretudo quatro critérios: 1. critério formal; 2. critério material; 3. critério do sujeito que põe a norma; 4. critério do sujeito ao qual a norma se destina (BOBBIO, p. 22-23).
O princípio da legalidade possui uma densa carga valorativa, no que diz respeito à cobrança de tributos. Pelos ideais de segurança jurídica e justiça são vetores que não podem ser solapados da seara tributária. Outro vetor essencial à tributação é a proteção à dignidade da pessoa humana. Tal preceito, além de ser um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, apresenta-se na norma jurídica tributária como um limite de ingerência da atuação estatal, com relação direta à proteção da liberdade e da propriedade do cidadão.
Os princípios básicos estabelecidos na Constituição Federal de 1988 devem ser observados e buscados em todas as disposições do Código de Processo Civil, seja explícita ou implicitamente, sendo necessária a observância do princípio do contraditório, da igualdade entre as partes, do devido processo legal, dentre outros, em destaque o contribuinte na condição de parte mais frágil na relação, estes fundamentos encontram-se amparados no desenvolvimento do direito processual como um fenômeno social que deve se adequar às exigências que são emanadas na carta maior de 1988.
O envolvimento do cidadão no acompanhamento da qualidade e na adequação das receitas e dos gastos públicos, instala-se uma pressão social sobre o desempenho dos administradores públicos e sobre os resultados sociais alcançados. Esse dualismo do cidadão com o Estado dá transparência ao orçamento público e harmoniza a relação cidadão-contribuinte x Estado-arrecadador. O aprimoramento da relação entre o Estado e o cidadão, a tomada de consciência sobre a função social do tributo e a certeza de que os gastos e investimentos públicos são apropriados e de que estão sendo bem administrados os recursos tomados da sociedade, são elementos que formam o cidadão esclarecido, participativo e dotado de boa vontade contributiva, o que certamente leva à redução da evasão e ao aumento da arrecadação tributária.
A partir de então poderemos ter a certeza de estarmos diante da tão justiça social almejada e resgatando os verdadeiros valores da cidadania. A política tributária ideal é aquela que arrecada o necessário para suprir os custos e investimentos públicos exigidos pela sociedade, mediante a contribuição de todos os cidadãos, seguindo sua capacidade contributiva.
Assim, o financiamento dos gastos públicos se dar através da arrecadação de tributos, mas de forma equilibrada, com respeito à capacidade contributiva dos cidadãos e quando possível, sem a criação de novos tributos em razão de sermos atualmente um dos maiores pagantes de impostos do mundo.
Cumpre ressaltar que o princípio da dignidade da pessoa humana precede a todos os demais princípios, por ser substância básica de todo e qualquer direito fundamental, e, portanto, está inserido nas diferentes manifestações dos direitos inerentes à pessoa humana. A dignidade humana é um valor espiritual e moral atinente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida, e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar.
Vislumbra-se, portanto, a indissociável disposição de direitos fundamentais, como a garantia do direito à vida, à liberdade, à igualdade, etc., tendo como objetivo maior, a finalidade de preservar a dignidade do ser humano em seu sentido amplo. Em que pese o direito à vida, este é o mais fundamental de todos os direitos, pois sua proteção é imperativa, tendo em vista constituir pré-requisito de existência e exercício de todos os demais direitos. Neste raciocínio, deu-se uma forma de resumir em um conceito único às diversas nomenclaturas utilizadas para designar direitos humanos, conforme esclarece José Afonso da Silva:
A Constituição resolveu, em parte, esse problema porque adotou a expressão direitos fundamentais, como rubrica do Título II, e direitos fundamentais da pessoa humana, no art. 17, o que equivale dizer direitos fundamentais do homem, ou direitos humanos fundamentais, ou direitos fundamentais humanos. Foi além, porque empregou a expressão no sentido abrangente de direitos individuais, sociais, de nacionalidade e políticos. Aí temos uma base para a classificação desses direitos (JOSÉ AFONSO DA SILVA, 1992, p. 24).
Contudo, cabe observar que o direito a vida só se satisfaz com a presença de uma qualificadora que é a vida com dignidade. Para se alcançar tal dignidade é que surge o Estado como assegurador do bem-estar social, empenhado em articular com ações que dêem efetividade aos direitos sociais constitucionalmente assegurados, como o direito à moradia, ao trabalho, ao lazer, à saúde, o acesso à justiça, dentre outros.
Apesar da Carta Magna de 1988, dispor sobre as limitações constitucionais do Estado ao poder de tributar, arrolando princípios de direitos dos cidadãos, justamente para coibir a avidez ilimitada do ente tributante na captação de recursos. Entretanto, estes princípios são desrespeitados por quem deveriam aplicá-los. Desse modo, a existência de garantias de nada vale. Outro obstáculo na efetivação das garantias existe por parte daqueles que são incumbidos de criar, executar e aplicar as leis, pois, conforme aludimos, não bastam apenas à oferta de meios, políticas ou instrumentos, é instruir os tributados de como utilizá-los. O que nos leva a crê que, neste preceito, o nosso Estado é precário.
Partindo desta premissa, conclui-se que ordenamento jurídico brasileiro tem que ser interpretado e aplicado de forma sistêmica, onde as leis infraconstitucionais deverão ser aplicadas em consonância com a Constituição Federal, tratando-se inclusive a tributação, para haver uma perfeita harmonia da legislação tributária com os princípios e garantias constitucionais, anseio da sociedade.
CONCLUSÃO
Após uma análise geral, há que considerar, que a influência dos tributos na vida social da população; a importância das leis tributárias e a execução fiscal dependem da existência de uma sociedade tributária livre, justa e solidária, onde o detentor do poder de arrecadação tributária respeite e entenda as prerrogativas básicas do contribuinte tributário, elencadas no texto constitucional. O Estado necessita de recursos para executar suas políticas públicas, tendo em vista que a sua execução é dependente da tributação. É visível a ocorrência de violação dos direitos dos contribuintes. Muitos dos direitos previstos na lei de execuções fiscais são afastados pelas jurisprudências e estabelecidos pelos legisladores. A máquina estatal não é mais ditatorial, sua atuação é inibida e está pautada em não violar os direitos fundamentais do cidadão; por certo que deve defender os direitos públicos, atendendo aos interesses da coletividade. Muito doutrinadores são coesos em afirmar que a todo tributo, sua cobrança e majoração deve ser pautada e prevista em lei, caso contrário está estabelecida uma violação ao principio da legalidade, em que a administração pública só pode fazer o que a lei permite. Este princípio, junto com o controle da administração pública pelo poder judiciário, surgiu com o Estado de direito, uma das principais garantias de respeito aos direitos individuais, isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também os limites da atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais direitos. Esse princípio tem raízes na história da humanidade, encontrando sua expressão máxima na soberania popular, na medida em que limitou o poder real, impedindo-o de instituir tributo de forma arbitrária.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Tradução: Maria Celeste C. J. Santos. 10. ed. Brasília: UNB, 1997.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2011.
DE ASSIS, Geovana Oliveira. Direito tributário na perspectiva dos direitos fundamentais. Curitiba: Juruá, 2011.
FAUSTO, Boris. O crime do restaurante chinês – carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
SILVA, José Afonso da. Direito constitucional positivo. 9ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1992.
Acadêmico do Curso de Direito da Faculdade AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Antonio Luiz Ferreira. O Direito Tributário em consonância com os direitos fundamentais e seus beneficios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2012, 03:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/32880/o-direito-tributario-em-consonancia-com-os-direitos-fundamentais-e-seus-beneficios. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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