Nas últimas três décadas ocorreram grandes avanços no que diz respeito aos direitos das mulheres, especialmente relacionados ao combate á violência contra elas. A maior parte das mudanças foram no campo de vista normativo, ou seja, a legislação vem atendendo antigas reivindicações dos movimentos de mulheres e feministas. Embora venham de forma gradativa e lenta, em sua maioria, tais mudanças são bastante benéficas às mulheres.
A história de luta das mulheres pela igualdade de direitos entre homens e mulheres é longa e seu começo é difícil ser apontado. Um dos momentos importantes que marcou essa história, entretanto, se deu através das articulações dos movimentos de mulheres e feministas realizadas internacionalmente a partir de meados da década de 1970, mais especificamente no ano de 1975. Este ano a ONU declarou como o Ano Internacional da Mulher, abrindo a “Década da Mulher” (1975 a 1985), o que trouxe grande visibilidade para as questões concernentes às mulheres. Esse período deu início ao processo de construção histórica dos direitos das mulheres e colocou na pauta das discussões da sociedade as questões que afetavam as mulheres. A temática da violência contra as mulheres, principalmente, a violência doméstica e familiar, passou a ser uma das prioridades, chegando a ser definida como “carro chefe” das reivindicações feministas da década de 1980 (COSTA, 2005).
No Brasil, até o início dos anos 70, a violência contra as mulheres era visto com um problema particular, só interessando aos familiares o que ocorria dentro de casa. Foi por meio dos movimentos de mulheres e feministas no combate à violência doméstica contra as mulheres que se começou a mostrar que este tipo de violência é um problema não apenas doméstico, mas também social e político.
O forte movimento de combate da violência contra a mulher se fortaleceu em meados dos anos 70, época em que muitas mulheres foram assassinadas por seus parceiros íntimos.
Nessa época ocorreu um dos mais aterrorizantes assassinatos da história do Brasil. Ângela Diniz foi brutalmente assassinada por Doca Street, de quem ela queria se separar.Quatro tiros no rosto, à queima-roupa, deixaram Ângela Diniz desfigurada, aos 32 anos, em 30 de dezembro de 1976. Em 1979, o advogado de Doca Street conseguiu que ele fosse condenado a apenas dois anos, alegando legítima defesa da honra, em seu primeiro julgamento.A pressão popular e os movimentos feministas fizeram com que o julgamento fosse anulado. Assim, no seu segundo julgamento, foi condenado a 15 anos, em 1981, dos quais cumpriu de fato pouco mais de dois anos em regime fechado, e mais dois no semi-aberto, e ficou 10 anos na condicional. (VALE, 2006)
Devido à grande movimentação das mulheres que clamavam pelo slogan: “quem ama não mata”, o problema de violência contra as mulheres ganhou grande repercussão midiática, mas os agressores/assassinos continuavam impunes, amparados por argumentos como a “legítima defesa da honra”, vestígio da lei penal colonial portuguesa que admitia o homem matar sua esposa se esta o traísse.
A LUTA DAS MULHERES PELA PUNIÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL
Segundo Diniz (2006, p.17) a primeira estratégia do movimento feminista foi a “ação direta” e a reivindicação de políticas públicas: “O movimento feminista brasileiro tem como uma marca própria a sua articulação com a reivindicação dos direitos sociais, mais do que com a noção de liberdade ou libertação das mulheres.” Em movimentos feministas internacionais, a exigência dos direitos das mulheres era muito mais em face dos direitos individuais, tendo como apoio e referência a tradição liberal, de escolha e de liberdade amorosa, sexual e doméstica, que precisavam se desdobrar na plenitude da liberdade e autonomia nas relações pessoais, de trabalho político. Aqui no Brasil as feministas, desde os seus primórdios, ainda nos anos setenta, enfatizaram os direitos sociais e a luta pelo estado democrático.
Inicialmente, grupos ativistas como “Nós Mulheres”, “Brasil Mulher” e “Grupo Feminista 8 de Março”, se organizaram em São Paulo, formando o “SOS Mulher”, e resolveram ajudar as mulheres atingidas por qualquer tipo de violência. Esse primeiro acolhimento às mulheres violentadas foi realizado por mulheres voluntárias, pois esses grupos muitas vezes não confiavam no Estado, devido ao contexto em que viviam: o fim da Ditadura Militar, marcado por grande violência e desrespeito aos Direitos Humanos (DNIZ, 2006, p.18).
Já na década de 80, algumas feministas se filiaram ao PMDB, partido que ganhou as eleições estaduais em São Paulo, no ano de 1982, e reivindicaram a formação de um Conselho Estadual da Condição Feminina (CECF). Este Conselho foi criado em 1983, e apresentou quatro prioridades: creche, saúde, trabalho e combate a violência (DINIZ, 2006, p. 19). As propostas do CECF, de São Paulo, no que se refere à violência, conforme apresenta SANTOS (2008, p.7), foram as seguintes:
[...] o CECF defendia uma abordagem não apenas criminal; apresentava propostas de “serviços integrados” e medidas como: “1) maior politização da violência contra mulheres, coordenação de campanhas educacionais e conscientização das mulheres sobre o problema; 2) criação de casas abrigo e de novas instituições para fornecer atendimento jurídico e psicológico às vítimas da violência doméstica e sexual; 3) mudanças nas instituições jurídicas e policiais, como a capacitação dos policiais numa perspectiva anti-machista, bem como a contratação de assistentes sociais em cada delegacia de policia; 4) reformulação da legislação machista; 5) fomento de pesquisas sobre violência contra as mulheres; e 6) incorporação das preocupações dos movimentos de mulheres na agenda das políticas públicas.[1]
Com o incentivo do grupo feminista, o CECF sugeriu a criação de um Centro de Orientação Jurídica e Encaminhamento à Mulher (COJE), que foi aceito e inaugurado em 1984. O COJE prestava serviços voluntários, proporcionando atendimento e orientação psicológica e jurídica às mulheres vítimas da violência doméstica, mas devido à falta de apoio institucional o órgão perdeu sua eficácia sendo desativado em 1987.[2]
Em 1985, o então Presidente da República, Sarney, fundou o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), que teve fundamental relevância no crescimento da política para as mulheres. Merece destaque, também, o movimento conhecido como “lobby do batom”, que através de sua atuação fez com que 80% das demandas feministas fossem incluídas na nova Constituição de 1988.
Outro avanço significativo para o combate à violência contra a mulher foia criação da primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), em São Paulo, no Governo Franco Montoro, em 1985. A abertura da DDM teve uma grande cobertura da mídia, dando maior visibilidade ao problema da violência doméstica e destacando a violência contra as mulheres como um crime, essa nova estrutura foi a primeira política pública de combate a violência doméstica contra a mulher. Dada a sua relevância, a criação da primeira Delegacia de Defesa da Mulher demanda a criação de tópico próprio para abordagem mais aprofundada.
A criação da primeira DDM se deu, no Governo de Montoro em São Paulo, através do Decreto 23.769, de 6 de agosto de 1985, no qual estabelecia como sua atribuição investigar os “delitos contra a pessoa do sexo feminino”, previstos no Código Penal (PASINATO e SANTOS, 2008, p.11).
Entretanto o Estado, entendendo ser suficiente a focalização na criminalização da violência contra mulher, não investiu nas necessidades básicas da DDM, como: capacitação dos funcionários, acompanhamento psicológico, assistência social, assistência à saúde, orientação jurídica, casas de abrigo e principalmente medidas protetivas. Não foi dada a devida importância às atividades educativas naquele momento, mas estas não deixaram de ser o foco das organizações não-governamentais feministas.
O anteprojeto do decreto relatava que só poderia investigar crimes sexuais, como estupro e atentado violento ao pudor, a lesão corporal não foi incluída. Assim como também não foi incluído o crime de homicídio, tendo como base o fato de já existir uma delegacia de polícia específica na averiguação nessa espécie de delito. As feministas lutaram pela inserção dos dois crimes: de lesão corporal e homicídio, nas atribuições da DDM. Nesse momento, a mídia enfocava bem esta discussão e afirmava que a violência doméstica e conjugal era a principal espécie de violência contra a mulher na sociedade. Mas as demandas das feministas não foram atendidas. (PASINATO e SANTOS, 2008. p.11)
Assim que a DDM foi implantada, quase todas as denúncias faziam referência ao espancamento, e quase nunca ao estupro, o que sustentou ainda mais os argumentos feministas.
Com a pressão feminista, em 1989, o Governador do Estado de São Paulo, ampliou a competência das delegacias da mulher através do Decreto Nº 29.981/89, com a inserção das atribuições para apuração de delitos contra a honra, tais como calúnia, injúria e difamação, e do crime de abandono material. Porém a modificação mais profunda ocorreu em 1996, com o Decreto Nº 40.693/96, que permitia a essas delegacias apurar mais crimes contra a mulher, como por exemplo, o homicídio ocorrido no âmbito doméstico e de autoria conhecida.
Reconhecida a necessidade da Delegacia da Mulher, houve um expressivo crescimento no número de Delegacias da Mulher, desde 1985 em todo o país, tornando-se uma das mais importantes políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulheres no país. Hoje, existem delegacias da mulher em todos os26 Estados da federação e no Distrito Federal.
Conforme dado da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), existem 436 delegacias da mulher no país, sendo que esse número é mal distribuído em nosso território nacional, onde somente 6,82% dos municípios brasileiros tem delegacias da mulher. No Sudeste, há cerca de 195 delegacias, e o Estado de São Paulo possui 129, detendo a maior parte destas[3]. O número de casas de abrigos, Centros de Referência para atendimento jurídico, psicológico e social, e Defensoria Pública não acompanharam o número crescente de delegacias, existindo apenas 68 casas de abrigos em funcionamento, 131 Centros de Referência registrados e 16 Defensoria Pública em funcionamento em um total de 9 capitais ( SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICA PARA AS MULHERES, 2009).
Meados dos anos 90 temas como as políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica contra as mulheres e a eficácia das DDM foram retomadas por conta do surgimento dos Juizados Especiais Criminais (JECRIM). Portanto, importante tema a ser estudado.
Juizados Especiais Criminais (JECRIM)
Os JECRIM’s foram criados em 26 de setembro de 1995, através da Lei Federal nº 9.099/95, representando um novo modelo de justiça criminal, de natureza antes de tudo consensual, tendo como alvo principal aumentar o acesso à justiça e torná-la mais célere e eficiente, propondo medidas de despenalização. Cabendo a esses Juizados “processar e julgar crimes de ‘menor potencial ofensivo’” (PASINATO, 2004, p. 6).
Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo os crimes e contravenções com pena privativa de liberdade não superior a um ano, posteriormente ampliada para dois anos. Nesses casos, o Inquérito Policial conduzido pelas delegacias de polícia foi substituído por um “Termo Circunstanciado”, um tipo de inquérito simplificado com um resumo da ocorrência, acompanhado do laudo pericial, quando indispensável, que deveria ser remetido ao JECRIM para realização de audiência de conciliação e julgamento. (SANTOS, 2008, p.17).
Apesar da Lei 9.099/95 não ser uma legislação específica para a violência contra a mulher, seu conceito englobou quase que totalmente as ocorrências que eram registradas nas DDMs, o que deu origem a diversos debates a respeito do tratamento judicial aos casos de violência de gênero. Assim, o movimento de mulheres passou a pensar a respeito da violência denunciada, dos anseios das mulheres diante da queixa e das respostas judiciais que vem sendo oferecidas. (PASINATO, 2004, p.8)
Os JECRIM’s foram criados para aliviar a justiça brasileira e impedir a estigmatização do sistema penal, mas não foram pensados a partir das relações de gênero. Em pesquisa[4] feita por Carmen Hein de Campos, apurou-se que 70% dos casos julgados nos JECRIM’s em Porto Alegre referiam-se à violência doméstica cometida pelo homem contra a mulher, e esses delitos, ameaças e lesões corporais, não eram eventuais, mas, em regra, habitualmente cometidos.
Para Herman (2004, p.114) a questão é muito mais complexa:
[...] a mensuração da lesividade potencial de um delito pelo quantum da pena fixada resultou num tratamento penal indiferenciado, que aqui pretende-se qualificar de linear, de conflitos de uma diversidade significativa, resultando daí a trivialização no tratamento de situações que muitas vezes exigem uma abordagem específica – e especial.
O que ocorre é que o legislador, em geral, concentra-se na celeridade e na economia processual, deixando para segundo plano a eficácia da solução aplicada ao caso concreto, o que é de fundamental importância no caso de violência doméstica. A busca deve voltar-se não só a uma solução formal, mas acima de tudo conduzir à pacificação do conflito, presumidamente pela vítima e pela sociedade.
A trivialização mencionada por Herman (2004, p.114) seria decorrente do tratamento discriminatório dado às mulheres no acesso a justiça, pois a partir da Lei nº 9.099/95 a violência contra a mulher passou a ser tratada como delito de “menor potencial ofensivo”. Por ser uma relação conjugal, a presença da afetividade entre a mulher e o agressor potencializa a gravidade no plano emotivo, não sendo possível uma solução por nenhuma estratégia meramente técnica.
Outro aspecto da trivialização seria em relação à pena que vem a ser aplicada. Conforme a lei, as penas mais comuns são o pagamento de multa ou de cestas básicas (alimentos), que são enviadas a instituições de caridade. A pena não se reverter em favor da vítima, seja por meio material, seja por meio de segurança. Essa forma de penalização só demonstra a banalização da violência contra a mulher, uma vez que a vítima tem suas expectativas ignoradas e é excluída da decisão judicial.
Pasinato (2004, p.10) afirma que além de medidas sócio-educativas, que tem como alvo a conscientização a respeito dos direitos das mulheres, são necessárias as leis penais e processuais e o esforço de seus intérpretes, para proteger o gênero feminino de uma violência estrutural que está inserida na sociedade atual.
O que as feministas freqüentemente denunciavam era a posição da vítima no desenrolar do processo. As vítimas lutam por ajuda e proteção eficaz, mas se deparavam com um sistema penal precário e ineficiente no sentido de lhe prestar a assistência de que necessitavam. A Lei nº 9.099/95 determina que em casos de lesões corporais, a vítima demonstre seu desejo de representar criminalmente contra o autor, conduzindo o caso a um desfecho judicial ou seu arquivamento. Como afirma Pasinato (2004, p. 12):
Para alguns segmentos o poder de representação que foi dado a vítima transformou-se numa armadilha. Primeiro, porque as mulheres estão mal informadas sobre os procedimentos da lei e não conhecem os desdobramentos possíveis, por exemplo, que o marido não será condenado e preso. Segundo, porque uma vez que possuem o poder de encerrar o processo antes de qualquer desdobramento, estas mulheres teriam se transformado em vítimas potenciais para novas agressões, ameaças e pressões exercidas pelo agressor para que retirem a queixa. Mal orientadas e desprotegidas acabam sendo novamente classificadas como vítimas e seu comportamento se transforma num poderoso instrumento no processo de descriminalização da violência (...) o problema não estáno poder da vítima em se manifestar, mas na ausência de mecanismos que permitam que elas estejam informadas a respeito de seus direitos e sobre os desdobramentos do registro policial.
Como percebemos, a vítima ocupa uma posição de desvantagem, pois os seus interesses são completamente relegados no processo penal. A mulher era posta em situação vexatória, pois é ela normalmente quem levava a intimação/notificação ao acusado, era obrigada a descrever os fatos por diversas vezes (na polícia e em juízo, no mínimo); era constrangida, nas audiências de instrução e julgamento, pois ficava frente a frente com o agressor. Daí surge à frustração da mulher, uma vez que não recebeu o apoio e o acompanhamento devidos, ficando totalmente desamparada e sem proteção adequada, o que por conseqüência gerava um grande número de arquivamento de processos/inquéritos por falta ou retirada da representação feita.
O JECRIM, no que se refere à violência doméstica, começou a se mostrar incapacitado para cumprir qualquer função preventiva ou reparatório nos litígios conjugais, visto que a violência doméstica passa a ser banalizada e a justiça se torna questionável, dando ensejo à impunidade (Santos, 2008, p.18). Se houvesse conciliação entre as parte, haveria a “limpeza” na ficha do acusado, sendo considerado réu primário, além de haver a possibilidade de transação penal, trazendo a opção de pagamento de multa ou de cestas básicas.
A inadequação das respostas da justiça significou um retrocesso no enfrentamento à violência contra a mulher. Segundo Pasinato (2004, p.9): “A classificação da violência como crime de menor potencial ofensivo, o pequeno número de ocorrências que chegam a uma decisão judicial e o tipo de decisão que tem sido ofertada são os principais eixos em que as críticas se articulam”. Neste sentido, movimentos feministas passam a discutir e produzir conhecimento em relação aos efeitos da Lei 9.099/95.
Passada uma década de protestos contra os JECRIMs, “um consórcio de organizações não-governamentais e especialistas na temática da violência contra as mulheres” (SANTOS, 2008, p. 21), é formado para elaborar uma proposta de lei que surgiria para retirar a competência dos JECRIMs nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher (GOMES, et al, 2009).
A ONU (Organização das Nações Unidas) define a “violência contra a mulher apenas porque ela é mulher” ou que atinja a mulher “desproporcionalmente”, o que pode compreender agressão ou sofrimento físico, mental ou sexual, ameaças, coerção e outros atos que prive as mulheres de liberdade. (PASINATO, SANTOS, 2008)
Existem dois instrumentos jurídicos que têm sido de extrema importância para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil: a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Convenção da Mulher ou CEDAW), adotada pela Organização das Nações Unidas em 1979, só ratificada sem reservas pelo governo brasileiro em 1994 e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará) adotada pela Organização dos Estados Americanos em 1994, ratificada pelo Brasil em 1995.
A Convenção da Mulher reconheceu a violência contra as mulheres como uma forma de discriminação e violação aos Direitos Humanos. Sua adoção pela Assembléia Geral das Nações Unidas deu-se em 1979 e sua confirmação pelo Brasil, em 1984. No ano de 2001, o Brasil assinou o Protocolo Facultativo à Convenção, assumindo assim a responsabilidade pelo seu cumprimento. (CORTÊS, 2004)
A Convenção da Mulher é um documento internacional de suma importância, pois garante à mulher igualdade com o homem para o gozo de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais.Esta Convenção é monitorada pelo Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Contra a Mulher (CEDAW), que tem, dentre outras, a competência para receber denúncias e petições de mulheres ou grupo de mulheres e, diante delas, solicitar ao Estado que adote as medidas cabíveis para por fim à discriminação denunciada.
O Comitê não possui poderes para punir o Estado infrator, entretanto sua força política e moral é bastante abrangente e suas recomendações têm um forte significado perante as Nações Unidas. Regularmente todo Estado-parte é obrigado a apresentar relatórios sobre a real situação das mulheres e estes relatórios são estudados pelo Comitê, recebendo as críticas e recomendações necessárias para a eliminação da discriminação existente. (CORTÊS, 2004)
Por sua vez, a Convenção de Belém do Pará foi reconhecida em junho de 1994 pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) e ratificada pelo Brasil em novembro de 1995.
Como diz Cortês (2004), este documento é um importante instrumento para a proteção legal das mulheres, pois esclarece de forma clara e explícita os tipos de violência cometida rotineiramente contra elas, pois:
[...] a violência contra a mulher como uma violação dos direitos humanos e das liberdades fundamentais; reconhece que a discriminação pode ser baseada na perspectiva de gênero; dá visibilidade à violência sexual e psicológica, reconhecendo que um ato de violência contra a mulher pode ser perpetrado tanto nos espaços privados quanto nos públicos.
A Convenção de Belém do Pará também submete os países subscritores a um monitoramento, mas há uma grande diferença entre este e o monitoramento da Convenção da Mulher. O Comitê da Mulher, originado da Convenção da Mulher, é integrante do sistema global da ONU, portanto não tem competência jurisdicional, enquanto a Convenção de Belém do Pará, que integra o sistema interamericano, dispõe de órgão jurisdicional - a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Esta Corte possui força jurídica vinculante e obrigatória.
A Convenção de Belém do Pará foi de extrema importância para o Brasil, uma ferramenta jurídica influente no enfrentamento da violência contra as mulheres, sendo aproveitada com êxito. Nesse sentido, esta Convenção foi aplicada pela primeira vez em 2001, no caso Maria da Penha, no qual responsabilizou o Estado brasileiro por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres, estabelecendo recomendações não só a título individual, de reparação em relação à violência sofrida por Maria da Penha, mas também a título coletivo. Surgiu, assim, a proposta de uma Lei específica para combater e prevenir à violência doméstica e familiar contra as mulheres, que posteriormente transformou-se na Lei Nº 11.340, sancionada em 7 de agosto de 2006, oficial e popularmente conhecida como Lei Maria da Penha.
COSTA, Ana Alice Alcântara. O Movimento Feminista no Brasil: Dinâmicas de uma Intervenção Política. Revista do Núcleo Transdisciplinar de Estudos de Gênero. n. 5, 2005.
VALE, Ana Lúcia do. Literatura: Um crime sem perdão. Disponível em: <http://odia.terra.com.br/portal/>. Acessado em: 04 abril de 2009.
DINIZ, C. S. G. Violência contra a mulher: estratégias e respostas do movimento feminista no Brasil (1980-2005). In: DINIZ, Simone; MIRIM, Liz; SILVEIRA, Lenira. (Orgs.).Vinte e cinco anos de respostas brasileiras em violência contra a mulher. São Paulo: Ed. Coletivo Feminista, 2006. p15 – 44. v.1.
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[1] Sobre as propostas formuladas pelo CECF na área de violência, ver Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo (1984, 1985a).
[2] Para mais informações sobre o Centro de Orientação Jurídica e Orientação à Mulher (COJE), ver Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo (1984 e 1985ª).
[3] Consultar página eletrônica da Secretaria Especial de Políticas Públicas para a Mulher.
[4]Pesquisa sobre a lei 9.099/95 e a violência doméstica, durante o VIII Concurso de pesquisa sobre Gênero, promovido pela Fundação Carlos Chagas/Fundação Ford
Mestre em Direito das Relações Internacionais pelo Uniceub. Procurador Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, Milton Carvalho. Avanços e retrocessos no combate à violência contra a mulher: O contexto de surgimento da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2012, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/32882/avancos-e-retrocessos-no-combate-a-violencia-contra-a-mulher-o-contexto-de-surgimento-da-lei-maria-da-penha-lei-n-11-340-2006. Acesso em: 23 dez 2024.
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