Inicialmente, faz-se necessária uma exposição acerca do surgimento do Direito Econômico, bem como de seu conceito. Entretanto, por não ser o estudo dessa matéria o objetivo deste trabalho, será realizada apenas uma breve análise, apoiada em doutrina pátria e estrangeira, sem maiores preocupações acerca das controvérsias apresentadas pelos estudiosos.
Em meados do século XIX, o mundo capitalista iniciou uma grande transformação. O denominado capitalismo atomista perdeu força, dando origem ao capitalismo de grupo.
Dessa forma, as empresas iniciaram um processo de concentração objetivando o fortalecimento de suas instituições com a conseqüente maximização dos lucros. Assim, livraram-se das incertezas do mercado, acarretando o surgimento do poder econômico privado, ou seja, a capacidade que as empresas têm de aumentar os seus lucros mesmo reduzindo as suas produções, cobrando mais que o preço competitivo pelos seus produtos.
Este fenômeno, decorrente de fato econômico, alterou profundamente o contexto social, levando, conforme as lições do Professor JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA, a “uma nova juridicização, a uma nova manifestação reguladora do Direito direcionada a um fato novo. O fato econômico se apresenta de forma diferente, e o Direito se curva sobre ele para moldá-lo às novas intuições ideológicas”[1].
G. FARJAT, acerca do tema, leciona:
“A concentração capitalista é o fenômeno decisivo do Direito Econômico. É ela que está na origem de todas as grandes mutações das sociedades industriais: a intervenção do Estado, (...)”.[2]
Entretanto, é a partir das duas Grandes Guerras Mundiais que o mundo assiste ao recrudescimento da descrença, por parte dos Estados, em relação ao liberalismo econômico. A crise econômica gerada após as Grandes Guerras (desemprego, aumento das pessoas carentes e inaptas ao trabalho, dívidas públicas, etc...) fez com que os Estados assumissem uma função de estabilizadores do sistema e de promotores do bem comum.
Ressalta-se também que, durante o lapso temporal compreendido entre o início da Primeira e o final da Segunda Grande Guerra, outros acontecimentos mundiais deram uma importante contribuição para esta mudança de paradigma. Entre estes acontecimentos, apenas para exemplificar, podemos citar a Revolução Bolchevista (1917), Constituição do México (1917), Constituição de Weimar (1919) e a quebra da Bolsa de Nova Iorque (1929).
Assim, desde o século passado, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, observa-se, em maior ou menor intensidade, intervenção estatal no âmbito social e, principalmente, no econômico. Nesse sentido, o Professor MANUEL AFONSO VAZ preleciona:
“Efectivamente, o retorno a uma absoluta não intervenção do Estado no social e, especificamente, no econômico (´regresso a Adam Smith´), hoje com alguma voga inspirada nas teses neo-liberais dos economistas de Chicago, como o conhecido Milton Friedman, não corresponde em parte alguma a uma realidade”.[3]
Com este novo paradigma, recrudesce a cada dia a importância do domínio e estudo do Direito Econômico – ramo da Ciência Jurídica – especialmente voltado para a intervenção estatal, notadamente na ordem econômica.
O Ex-Professor Catedrático de Direito Econômico da Faculdade de Direito da UFMG, WASHINGTON PELUSO ALBINO DE SOUZA, assim conceitua este ramo do Direito:
“Direito Econômico é o ramo do Direito que tem por objeto a regulamentação da política econômica e por sujeito o agente que dela participe. Como tal, é um conjunto de normas de conteúdo que assegura a defesa e harmonia dos interesses individuais e coletivos, de acordo com a ideologia adotada na ordem jurídica. Para tanto, utiliza-se do ‘princípio da economicidade’”.[4]
Após esta superficial explanação acerca do surgimento e do conceito do Direito Econômico,realizada apenas com o intuito de melhor caracterizar o objeto deste trabalho, ou seja, a soberania nacional econômica, passar-se-á a análise das relações entre o Direito Econômico e o Direito Constitucional.
Relações entre o Direito Econômico e o Direito Constitucional
O Direito Constitucional compreende, sinteticamente, as ordens jurídica e política de um país, que devem servir de norte obrigatório para os governantes (no exercício de qualquer um dos três poderes, a saber, Legislativo, Executivo e Judiciário).
As referidas ordens compreendidas pelo Direito Constitucional, através dos princípios e normas por elas esculpidas, contém os princípios básicos da atividade econômica considerada em termos de deveres e direitos, restando, assim, juridicamente definida a ordem econômica.
Assim, a ordem econômica não pode ser analisada como um texto diverso do da Constituição. Nesse sentido estão os ensinamentos do ilustre Professor Emérito de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, RAUL MACHADO HORTA:
“A Ordem Econômica e Financeira não é ilha normativa apartada da Constituição. É fragmento da Constituição, uma parte do todo constitucional e nele se integra. A interpretação, a aplicação e a execução dos preceitos que compõem reclamam o ajustamento permamente das regras da Ordem Econômica e Financeira às disposições do texto constitucional que se espraiam nas outras partes da Constituição”[5].
Entretanto, o aspecto mais importante da relação entre o Direito Econômico e o Direito Constitucional se consubstancia no fato de que as normas de Direito Econômico são criadas em consonância com a ideologia constitucionalmente posta para a nação. Neste sentido, as lições do Professor WASHINGTON PELUSO ALBINO DE SOUZA:
“Ora, em nosso conceito de Direito Econômico afirmamos que o seu entendimento parte da ‘ideologia adotada constitucionalmente’. A partir das normas fundamentais definidas pela Constituição, que trataremos pela ótica do Direito Constitucional, identificamos os princípios ideológicos nela inseridos, daí partindo para a elaboração das normas de Direito Econômico, especialmente na sua aplicação como Direito Positivo”.[6]
Dessa forma, assim como os demais ramos do Direito, a relação entre o Direito Constitucional e o Direito Econômico se baseia fundamentalmente na constitucionalidade das leis desse último, acabando o primeiro por assegurar a definição da ordem jurídica.
Por fim, o Direito Econômico, principalmente o Título VII da Constituição da República, a saber, “Da Ordem Econômica e Financeira”, como já explanado anteriormente, contém normas essenciais para a consecução dos objetivos fundamentais do nosso país. Assim, o Direito Econômico torna-se instrumento ímpar para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, além de garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza, a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
[1]FONSECA, João Bosco Leopoldino. Direito Econômico. 2ª Edição, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1997.
[2] G. FARJAT. DroitÉconomique, 1982 apud FONSECA, João Bosco Leopoldino. Direito Econômico. 2ª Edição, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1997.
[3]VAZ, Manuel Afonso. Direito Econômico – A Ordem Econômica Portuguesa. 2ª Edição, Coimbra: Coimbra Editora, 1990.
[4]SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras Linhas de Direito Econômico. 4ª Edição, São Paulo: Editora LTR, 1999.
[5]HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 2ª Edição, Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1999.
[6]SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras Linhas de Direito Econômico. 4ª Edição, São Paulo: Editora LTR, 1999.
Mestre em Direito Econômico pela Faculdade de Direito da UFMG. Ex-Subprocurador-Geral Federal Substituto. Ex-Chefe de Gabinete da Procuradoria-Geral Federal. Ex-Membro do Conselho Consultivo da Escola da AGU. Ex-Coordenador-Geral de Administração das Procuradorias da PFE/INSS. Ex-Chefe da Divisão de Planejamento e Gestão da Procuradoria-Geral Federal. Ex-Chefe do Serviço de Matéria Administrativa da Procuradoria-Regional do INSS da 1ª Região.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AGUIAR, Bernardo Augusto Teixeira de. Relações entre o Direito Econômico e o Direito Constitucional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 dez 2012, 07:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33072/relacoes-entre-o-direito-economico-e-o-direito-constitucional. Acesso em: 23 dez 2024.
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