RESUMO: A reclamação constitucional vem prevista no artigo 102, I, da Constituição Federal, para preservar a competência e garantir a autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal. A outra reclamação prevista na Constituição Federal é a feita perante o Superior Tribunal de Justiça, prevista no artigo 150, I, f. A discussão que se trava é se há possibilidade de sua utilização perante outros Tribunais.
PALAVRAS-CHAVE: Reclamação constitucional. STF. Tribunais.
1. Da Função Jurisdicional
A atividade jurisdicional define-se como sendo a atividade estatal de resolução das lides impostas pelas partes, particulares ou poder público.
Como bem explicitado pelo professor Jorge Amaury Maia Nunes, em seu texto “Teoria Geral do Processo”[1]:
A explicação para esta função vem do direito romano e após uma evolução história, tornou-se a função atualmente disseminada em nosso direito, qual seja, a atividade de julgar as lides pelos magistrados. Na Roma antiga essa função primeiramente foi exercida pelos monarcas, que acumulavam as funções de rei e julgador, mas foi na Idade Moderna, com o Estado Constitucional, que tal função passou aos magistrados, como conhecemos atualmente.
Mais do que isso, segundo o autor, a atividade ou função jurisdicional coaduna-se por ser “a criação do direito pelo magistrado supõe uma sentença, norma jurídica individual (desdotada de abstração e generalidade), reguladora da relação jurídica submetida a seu exame, não espraiando seus efeitos diretos para além das pessoas que tenham participado do processo judicial e conclui por ser tal função uma atividade de aplicação do direito”.
Importante para definirmos tal atividade seria distingui-la das atividades legislativa e administrativa, afetas aos Poderes Legislativo e Executivo.
Assim, enquanto na atividade jurisdicional, como já citado, o magistrado julga e cria o direito apenas entre as partes (via de regra), na legislativa as leis tem efeito genérico, abstrato, atingindo uma coletividade.
Já na segunda distinção, enquanto que na função jurisdicional, segundo Chiovenda[2], citado no referido texto, “o juiz age atuando a lei, enquanto a administração age em conformidade com a Lei”.
Além disso, para estar completo o entendimento sobre a definição da função jurisdicional, importante elencar seus elementos e seus princípios informadores.
Os elementos, então seriam, “notio, que seria a aptidão do magistrado em conhecer das causas, a vocatio, que seria o poder de vir a juízo qualquer cidadão que pudesse auxiliar no julgamento da causa, coertio, que seria o poder o magistrado em se fazer respeitar, como membro de um poder público e a iudicium, que seria o poder de julgar”.
Ainda segundo o autor, os princípios informadores seriam, apenas para citá-los, da investidura, da aderência ao território, da indelegabilidade, da inevitabilidade, da inafastabilidade, do juiz natural, da inércia e da jurisdição voluntária.
2. Da Reclamação, sua natureza e a possibilidade de sua utilização por outros Tribunais.
O direito de petição está consignado no artigo 5º, XXXIV, a, da Constituição Federal que assegura a todos o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra a ilegalidade ou abuso de poder.
Segundo José Afonso da Silva, em sua obra Curso de Direito Constitucional Positivo, “sua origem é remota. Nasceu na Inglaterra na Idade Média e decorre o right of petititon que resultou das Revoluções Inglesas de 1628, consolidando-se com a Revolução de 1689, com a declaração dos direitos, Bill of Rights”.
Segundo ele, “o direito de petição define-se como o direito que pertence a uma pessoa de invocar a atenção dos poderes públicos sobre uma questão ou uma situação”.
Creio que seja importante frisar, como o fez o conceituado autor na obra já citada, que o direito de petição cabe a todas as pessoas, físicas ou jurídicas, e não pode ser destituído de eficácia, ou seja, a autoridade a quem a dirigida a petição não pode se escusar de responder, seja para acolha-la ou não.
Segundo o Ministro Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco, em sua obra Curso de Direito Constitucional, prevista no artigo 103-A, § 3º, da Constituição Federal a reclamação perante o Supremo Tribunal Federal é cabível “do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”.
A reclamação constitucional vem prevista no artigo 102, I, da Constituição Federal, para preservar a competência e garantir a autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).
O procedimento para sua utilização está prevista no regimento interno do STF (RISTF) e assemelha-se àquele previsto para o mandado de segurança.
A reclamação pode ser proposta por qualquer interessado devendo apenas estar instruída com a prova documental prevista no artigo 156 do RISTF e parágrafo único.
A autoridade reclamada deverá prestar esclarecimentos em cinco dias (art.157) e o pedido do reclamante poderá ser impugnado por qualquer interessado (art. 159).
Das decisões prolatas pelo relator caberá agravo regimental.
Segundo Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco, “a ampla legitimação e o rito simples e célere, como características da reclamação, podem consagrá-la, portanto, como mecanismo processual de eficaz proteção da ordem constitucional, tal como interpretada pelo Supremo Tribunal Federal”.
A outra reclamação prevista na Constituição Federal é a feita perante o Superior Tribunal de Justiça, no artigo 150, I, f, que consigna a “reclamação para preservação de sua competência e garantia a autoridade de suas decisões”.
Atualmente, a posição dominante é que a reclamação é uma espécie de ação, visto que por meio dela há uma provocação da jurisdicional e a formulação de pedido de tutela jurisdicional. Busca-se com a reclamação preservar a competência do Tribunal ou garantir a autoridade de suas decisões.
A discussão que se trava é se a reclamação é apenas cabível perante o STF e STJ ou se é possível sua utilização perante outros tribunais.
Assim, apesar de não haver previsão constitucional da reclamação para os demais Tribunais, há uma diferença entre a reclamação proposta perante o Supremo Tribunal Federal e os demais Tribunais e ela está prevista no artigo 103-A da CF.
Enquanto a reclamação perante os demais Tribunais é proposta apenas para garantia de suas decisões, a reclamação perante o STF, além dessa, possui a função de anular o ato administrativo ou cassar uma decisão judicial contrária a uma súmula vinculante, prática, aliás, que já era utilizada largamente, mas que somente agora foi regulamentada.
Em importante decisão concedida pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 2212 que versa sobre a possibilidade da previsão na Constituição do Estado do Ceará e do Regimento Interno do Tribunal de Justiça daquele Estado sobre a possibilidade da utilização do procedimento da reclamação pelo Tribunal de Justiça do Ceará, houve o entendimento de que isso seria possível.
Na referida decisão, os argumentos favoráveis a esta utilização foram dos então ministros Ellen Gracie, Nelson Jobim, Carlos Ayres Brito e Sepúlveda Pertence e dos atuais Carlos Velloso e Marco Aurélio Mello.
O então Advogado-Geral da União e atual ministro do STF, Gilmar Ferreira Mendes, “para o fim de admitir, em caráter exclusivo, a reclamação para preservar a eficácia das decisões proferidas no controle abstrato de normas perante as cortes estaduais” e prossegue, “o instituto da reclamação constitui inexorável decorrência da eficácia geral e do efeito vinculante do controle abstrato de normas deferido pela Constituição Federal aos Tribunais de Justiça” e “a existência no âmbito estadual de mecanismos de defesa da Constituição local constitui pressuposto básico para a existência de uma jurisdição constitucional estadual”.
3. Conclusão
Analisando-se tal decisão, creio que os melhores argumentos para sustentar a tese vencedora estão no relatório e no voto da Ministra Relatora.
Em seu voto, a então ministra relatora Ellen Gracie, entendeu que a reclamação nada mais é “um instrumento a dar efetividade a decisões prolatadas em última instância pelas Cortes de Jurisdição nacional: o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição da República, o Superior Tribunal de Justiça, guardião da legislação federal, bem como de um instrumento destinado a preservar a competência de ambos contra usurpação cometida por outro Tribunal ou órgão do Poder Judiciário”.
Além disso, bem elucidado pela ex-ministra Ellen Gracie, o “art.125, caput, dispõe que ‘Os Estados organizarão sua justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição’. O § 1º preceitua que ‘A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado , sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça”.
Desta feita, creio que a Constituição Estadual do Ceará, bem como o regimento interno do Tribunal de Justiça daquele Estado, nada mais fizerem que seguir os preceitos da Constituição Federal ao criaram a possibilidade do procedimento da Reclamação para garantia de suas decisões.
4. Referências
1- SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.
2- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Editora jurídica Atlas.
3- MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional.
4- CHIOVENDA. Instituições. Campinas: Bookseller, 1998. v. 2, p. 16-17
5- NUNES, Jorge Amaury Maia. Teoria Geral do Processo.
[1] Texto Teoria Geral do Processo. Professor Jorge Amaury Maia Nunes.
[2] CHIOVENDA. Instituições. Campinas: Bookseller, 1998. v. 2, p. 16-17
Procurador Federal. Coordenador-Geral de Cobrança e Recuperação de Créditos da Procuradoria-Geral Federal. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC Campinas e Especialista em Direito Público pela Universidade Federal de Brasília.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MUNHOZ, Fabio. A reclamação perante o Supremo Tribunal Federal e sua utilização em outros Tribunais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 dez 2012, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33230/a-reclamacao-perante-o-supremo-tribunal-federal-e-sua-utilizacao-em-outros-tribunais. Acesso em: 23 dez 2024.
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