INTRODUÇÃO
O presente artigo busca investigar o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, fundamento do pedido de suspensão (também conhecido como “suspensão de segurança”).
Primeiramente se abordará o conceito de interesse público, posteriormente o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, abordando o curioso caso de conflito de interesses públicos, e, por fim, se analisará como o magistrado deve verificar a presença (ou não) do interesse público na lide.
1. INTERESSE PÚBLICO
É de suma importância a compreensão jurídica do que se denomina interesse público, pois as hipóteses de cabimento do pedido de suspensão estão intrinsecamente relacionadas à sua tutela. Ademais, conforme ressalta RODRIGUES (2010), o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado constitui a razão de ser dos pedidos de suspensão.
Ao explicar-se o conceito de interesse público, não raras vezes o operador do Direito apenas o contrapõe ao interesse particular, privado, ou seja, pessoal de cada um. Todavia, a melhor compreensão deste conceito jurídico indeterminado supera tal explicação simplista e que dámargem ao arbítrio.
É bem verdade que se trata do interesse do todo, do corpo social, da coletividade. Exatamente por isso, não se pode dizer que seja um interesse completamente desvinculado, autônomo, em relação às partes que compõem o todo, sendo certo que o interesse público não é algo que existe em si mesmo.
Embora possa haver um interesse público incompatível com um determinado interesse individual, é inconcebível que haja um interesse público discordante dos interesses de cada um dos membros da sociedade. Afinal, seria um contra-senso que o bem de todos fosse o mal de cada um, ou seja, que o interesse da coletividade fosse um anti-interesse de cada um dos membros que compõem o todo. Percebe-se, destarte, uma relação indissociávelentre o interesse público e os interesses individuais (MELLO, 2004)[1].
Na verdade, como bem ensina o publicistaCelso Antônio Bandeira de Mello (2004), o interesse público (ou interesse coletivo) nada mais é do que a dimensão pública dos interesses individuais, isto é, dos interesses de cada um dos membros da sociedade enquanto partícipes desta[2].
Vê-se, assim, que ao lado do interesse pessoal particular dos indivíduos, inerente a conveniência de cada um, existe um interesse também pessoal desses mesmos indivíduos, que se manifesta enquanto partícipes de uma coletividade maior no qual estão inseridos. Trata-se da faceta coletiva dos interesses individuais, um interesse de vários membros do corpo social e não de um todo abstrato. Este é o legítimo interesse público, oriundo das pessoas que compõem o todo. (MELLO, 2004). [3]
Nesse diapasão, podemos chegar a algumas conclusões: (i) os interesses públicos e individuais (particulares) não são completamente desvinculados (ii) nem todo interesse do Estado qualifica-se como interesse público, sendo este apenas depositário de um interesse que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da sociedade (iii) é errado dizer que apenas o Poder Público pode atuar na defesa do interesse público, pois, como já dito, os particulares não são estranhos a tal interesse. (MELLO, 2004).
Embora o Estado subjetive a dimensão pública dos interesses individuais (interesses públicos),ele, como os demais particulares, convive no universo jurídico com outros sujeitos e também pode ter interesses particulares, concebidos em sua mera individualidade. Estes interesses não se qualificam como públicos, mas meramente individuais do Estado (chamado por alguns de “interesse público secundário”), similares aos interesses de qualquer outro sujeito.
Celso Antônio Bandeira de Melo (2004) entende que, diferentemente dos particulares, o Estado só pode defender seus interesses individuais quando estes não se chocarem com os interesses públicos, pois que as pessoas governamentais foram concebidas para assegurar o interesse público primário.[4]
Com efeito, o uso do pedido de suspensão pelo Poder Público só é legítimo na defesa do interesse público (o qual tem o dever legal de zelar), que se manifesta através da ocorrência de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, e nunca na defesa do mero interesse estatal (interesse público secundário)[5].
Apesar do princípio não estar previsto expressamente na Constituição, trata-se de pressuposto lógico do convívio social e encerra princípio geral do Direito (MEIRELLES, 2000)[6].
A preocupação com a prevalência do interesse público se deu no final do século XIX, quando iniciaram-seas reações contra o individualismo, em razão de inúmeras transformações de ordem econômica, sociais e políticas. Nessa ordem de ideias, o próprio Direito teve seu papel revisto, na medida em que deixou de ser instrumento de garantia dos direitos do indivíduo, para ser visto como instrumento para a consecução da justiça social, do bem comum, do bem-estar coletivo (DI PIETRO, 2002). O Poder Público passou a atender às necessidades coletivas, crescendo a preocupação com os interesses difusos, com o meio ambiente e o patrimônio histórico e artístico nacional.
A supremacia do interesse públicoé princípio de observância obrigatória pela Administração Pública e corresponde ao “atendimento a fins de interesse geral, vedada renúncia total ou parcial de poderes ou competência, salvo autorização em lei” (art. 2º, parágrafo único, II, da Lei 9.784/199). Justifica-se na exata medida em que o interesse geral (coletivo, difuso, público) deve prevalecer sobre o interesse meramente individual.
Como vimos em linhas anteriores, parafraseando o administrativista Celso Antônio Bandeira de Melo, o interesse público é o interesse de todo o corpo social, ou seja, o interesse da coletividade (daí o publicista dizer com maestria que trata da dimensão pública dos interesses individuais), sendo correto afirmar que o interesse em comento se confunde com os interesses difusos.
Tal afirmação é extremamente útil à explicação da finalidade do instituto suspensivo, que é justamente a prevalência do interesse público, mediante a tutela da saúde, segurança, ordem e economia públicascontra grave lesão.
Tendo o Estado o complexo e difícil dever de zelar pelo bem comum (interesse público)[7], diferentemente das pessoas jurídicas de direito privado, o ordenamento jurídico lhe confere algumas prerrogativas processuais[8] como a remessa necessária, o benefício de prazo e o pedido de suspensão: legítima medida de contracautela que visa salvaguardar interesses públicos relevantíssimos para o bem comum.
Conforme adverte Rodrigues (2010), a medida não visa, apesar de ser comum a expressão, “sacrificar” o interesse individual em prol do interesse público, o objetivo é “evitar que o interesse coletivo possa ser prejudicado ou lesionado enquanto não se tem a certeza da afirmação de direito daquele em favor de quem foi concedida a decisão cuja eficácia pretende ser temporariamente suspensa.” (RODRIGUES,2010).[9]
Assim, não obstante a decisão possa ser juridicamente irretocável, e nessa análise meritória não cabe ao Presidente do Tribunal adentrar, caso ela seja capaz de causar grave lesão, empiricamente comprovada, à saúde pública, por exemplo, é prudente que se aguarde o trânsito em julgado do processo. Ao final, após esgotadas todas as instâncias, caso se verifique que a pretensão do autor estava de acordo com o ordenamento jurídico, seu direito não poderá ser “sacrificado” em prol do interesse público, até porque sobre ele há a certeza da coisa julgada, que não pode ser afrontada sob pena de violação ao próprio Estado Democrático de Direito.
Questão que pode suscitar dúvidas é a situação em que é proferida sentença de procedência em ação civil pública para a tutela de interesses difusos. A ação destina-se a proteção de direitos difusos e o pedido de suspensão também. Como resolver tal confusão jurídica?
Primeiramente, cumpre-nos saber se o interesse público é único. Segundo Marçal Justen Filho, a resposta é negativa, pois situações concretas indicam a existência de diversos interesses públicos, podendo, inclusive, estarem em conflito entre si, conforme o exemplo do respeitado autor:
Imagine-se que o aumento do tráfego torne necessária a duplicação de uma rodovia. O congestionamento rodoviário provoca atrasos, acidentes e poluição. É inegável a existência de interesse público em promover a duplicação.
Suponha-se, no entanto, que a duplicação acarrete a necessidade de desmatamento de uma área florestal de preservação permanente, de grande valor ecológico. Ou que existam sítios arqueológicos de valor inestimável que serão destruídos em virtude da duplicação da rodovia. Ou que a duplicação exija o deslocamento de grande quantidade de moradores de baixa renda, remetendo-os ao constrangimento de total afastamento do núcleo urbano. Seria inquestionável a existência de interesses públicos potencialmente lesados em virtude da duplicação da rodovia. (JUSTEN FILHO, 2005, p. 42).
De fato, é evidente a existência de diversos interesses públicos que podem entrar em conflito. Nestes casos, caberá ao Presidente do Tribunal, se provocado, sopesá-los e procurar harmonizá-los, mesmo que haja a necessidade de relativização de um. Assim, faz-se necessária a ponderação do peso relativo a cada um dos bens em jogo, utilizando-se do princípio da proporcionalidade[10].
Conclui-se, portanto, que o princípio da supremacia do interesse público é o fundamento dos pedidos de suspensão, tendo em vista que este visa tutelar de forma efetiva tal interesse, sempre que se demonstre, empiricamente, a viabilidade de que possa vir a ser gravemente comprometido pela manutenção da eficácia do provimento judicial.
Quando o Presidente do Tribunal se depara com o pedido de suspensão de decisão que o Poder Público alega potencialmente lesiva ao interesse público, a questão não deve ser enfrentada pelo magistrado mediante soluções simplistas, de aplicação automática do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, sobretudo se o provimento jurisdicional que se pretende suspender estiver tratando direitos fundamentais do particular.
Tendo em vista que o interesse público constitui um conceito jurídico vago e indeterminado, a análise de sua presença deve ser feita no caso concreto, mediante a aplicação do princípio da proporcionalidade. Constatada efetivamente, no caso dos pedidos de suspensão, empiricamente, mediante provas inequívocas, a grave lesão (e não apenas mera lesão), daqueles bens jurídicos superiormente protegidos pela norma (ordem, economia, saúde e segurança públicas), o interesse coletivo deve prevalecer.
Com efeito, a supremacia do interesse público não pode ser utilizada como cláusula geral de restrição de direitos fundamentais. [11]Abusos neste sentido verificados com o manejo da medida suspensiva devem ser coibidos pelo Presidente do Tribunal. O princípio em tela não comporta presunção, e a sua presença deve ser aferida em cada caso concreto, mediante, repita-se, a aplicação do princípio da proporcionalidade[12]. Não é, frise-se, pelo simples fato de o Poder Público estar em juízo que, necessariamente, há a presença de interesse público.
De fato, e isso é importante para o manejo legítimo do instrumento suspensivo, o princípio da supremacia do interesse público não se presume e nem tem aplicação automática. Faz-se necessária a investigação da natureza, dos valores e das necessidades em jogo, transformando a discussão em questão ética, intimamente relacionadas à realização dos princípios e valores fundamentais, notadamente a dignidade da pessoa humana. (ROSSATO, 2009).
Nesse sentido, um interesse, embora possa parecer privado, assume a natureza de público quando não pode ser objeto de transigência, quando é indisponível, de realização obrigatória. É perfeitamente possível, repita-se, que um interesse, embora pareça particular, adquira natureza de público, tal como ocorre com o direito à vida de um indivíduo. E também é possível a ocorrência de choque entre esse direito e os interesses gerais da coletividade, quando então caberá ao Presidente do Tribunal a análise jurídica tendente a harmonização dos interesses colidentes.
Pelo que expusemos,depreende-se que a aplicação do princípio em comento (e do pedido de suspensão que nele encontraseu fundamento) deve ser analisado com cautela pelo magistrado, diante de cada caso concreto, de modo que o princípio da supremacia ( e o pedido de suspensão) seja aplicado como garantia do cidadão e nunca como forma de preservação da autoridade estatal.
Expomos que o interesse público, fundamento de existência e pressuposto para concessão do pedido de suspensão, trata da dimensão (ou faceta) coletiva dos interesses individuais, ou seja, um interesse de vários membros do corpo social e não de um todo abstrato.
Embora o estado subjetive esse interesse público, ele também pode ter interesses particulares, concebidos em sua mera individualidade, os quais são denominados “interesses públicos secundários” ou “meros interesses estatais”.
Com efeito, o uso do pedido de suspensão pelo Estado só se legitima na defesa do verdadeiro interesse público (“primário”), o qual tem o dever legal de zelar, mediante a tutela da ordem, saúde, economia e segurança públicas contra grave lesão.
ARRUDA ALVIM, José Manoel de. Mandado de segurança contra decisão que nega ou concede liminar em outro mandado de segurança. RePro80, out.- dez. 1995.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da.A Fazenda Pública em juízo. 8 ed. São Paulo: Dialética, 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas.
FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. 2. Ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. Atual. Arnold Wald. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
______. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2000.
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2010.
ROSSATO, Luciano Alves. A suspensão de liminar e de sentença. RePro167/433, 2009.
VENTURI, Elton. Suspensão de liminares e sentenças contrárias ao Poder Público.2.ed. São Paulo: Ed. RT, 2010.
[1]Muito embora a douta doutrina alerte que o interesse público “não se confunde com a somatória dos interesses individuais, peculiares de cada qual.” (MELLO, 2004)
[2]Para elucidar o que foi dito,vejamos as palavras do renomado autor, explicando e exemplificando o que seria a “dimensão pública dos interesses individuais”: “Veja-se: um indivíduo pode ter, e provavelmente terá, pessoal – e máximo – interesse em não ser desapropriado, mas não pode, individualmente, ter interesse em que não haja o instituto da desapropriação, conquanto este, eventualmente, venha a ser utilizado em seu desfavor. É óbvio que cada indivíduo terá pessoal interesse em que exista dito instituto, já que, enquanto membro do corpo social, necessitará que sejam liberadas áreas para abertura de ruas, estradas, ou espaços onde se instalarão aeródromos, escolas, hospitais, hidroelétricas, canalizações necessárias aos serviços públicos etc., cuja disponibilidade não poderia ficar a mercê da vontade dos proprietários em comercializá-los. Equivalentes observações, como é claro a todas as luzes, obviamente, podem ser também feitas em relação à existência de multas e outras sanções por violação de regras que, também elas, visam a oferecer condições de vida organizadas e satisfatórias ao bem estar de cada um, conquanto ninguém se considerasse individualmente interessado em sofrer tais limitações quando o tolhessem, ou sanções, quando nelas incurso.” (MELO, 2004, p. 54).
[3] Nesse sentido, passo a palavra ao douto Celso Antônio Bandeira de Mello (2004): “Pois bem, é este último interesse o que nomeamos de interesse do todo ou interesse público. Não é, portanto, de forma alguma, um interesse constituído autonomamente, dissociado do interesse das partes e, pois, passível de ser tomado como categoria jurídica que possa ser erigida irrelatamente aos interesses individuais, pois, em fim de contas, ele nada mais é que uma faceta dos interesses dos indivíduos: aquela que se manifesta enquanto estes – inevitavelmente membros de um corpo social – comparecem em tal qualidade. Então, dito interesse, o público – e esta já é uma primeira conclusão - , só se justifica na medida em que se constitui em veiculo de realização dos interesses das partes que o integram no presente e das que o integrarão no futuro. Logo, é destes que, em última instância, promanam os interesses chamados públicos.” (MELLO, 2004, p. 54)
[4]“(...) Poderíamos acrescentar que seria concebível um interesse da pessoa Estado em recusar administrativamente – e até questionar em juízo, se convocado aos pretórios – responsabilidade patrimonial por atos lesivos a terceiros, mesmo que os houvesse causado. Teria interesse em pagar valor ínfimo nas desapropriações, isto é, abaixo do justo, inobstante o preceito constitucional. Com todos estes expedientes, muitos dos quais infelizmente (e injustamente) adota, resguardaria ao máximo seu patrimônio, defendendo interesses à moda de qualquer outro sujeito, mas agrediria a ordem normativa. Ocorre que em todas estas hipóteses estará agindo contra o Direito, divorciado do interesse público, do interesse primário que lhe assiste cumprir. Este proceder, nada obstante seja comum, é fruto de uma falsa compreensão do dever administrativo ou resultado de ignorância jurídica. Os interesses a que se aludiu são todos interesses secundários e que a pessoa governamental tem apenas segundo os termos em que o teria qualquer pessoa. Não são interesses públicos. Não respondem à razão última de existir própria das pessoas governamentais em geral.’’ (MELLO, 2004, p.55)
[5] Concordamos com Marçal Justen Filho no sentido de que o chamado interesse público secundário sequer pode ser considerado público, caracterizando-se como “meras conveniências circunstanciais, alheias ao direito”. (JUSTEN FILHO, 2005, p.39). Por isso, o leitor observará que poucas vezes utilizamos a nomenclatura interesse público primário, pois quando nós aludimos ao interesse público estamos nos referindo a este último, qual seja, o interesse da coletividade.
[6] Embora não haja previsão expressa, há diversos dispositivos na Constituição que evidenciam a sua presença: “O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele, como, por exemplo, os princípios da função social da propriedade, da defesa do consumidor ou do meio ambiente (art. 170, III, V e VI), ou tantos outros. Afinal, o princípio em causa é pressuposto lógico do convívio social. Para o Direito Administrativo interessam apenas os aspectos de sua expressão na esfera administrativa. Para não deixar sem referência constitucional algumas aplicações concretas especificamente dispostas na Lei Maior e pertinentes ao Direito Administrativo, basta referir os institutos da desapropriação e da requisição (art. 5º, XXIV e XXV), nos quais é evidente a supremacia do interesse público sobre o privado.” (MELLO, 2004, p.87)
[7]Conforme leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro: “Administração Pública não é titular do interesse público, mas apenas a sua guardiã; ela tem que zelar pela sua proteção. Daí a indisponibilidade do interesse público.” (DI PIETRO, 1991, p. 160). No mesmo sentido arremata Leonardo José Carneiro da Cunha: “Pode-se dizer, valendo-se das palavras de João Caupers, que o verdadeiro fio condutor da atividade administrativa é a prossecução do interesse público. O Estado não detém exclusividade na prossecução dos interesses públicos, muito embora a definição destes constitua monopólio da lei. Sem embargo de o Estado não ser o único a buscar e alcançar o interesse público, sua atuação é marcada por tal busca, não devendo afastar-se desse objetivo.” (CUNHA, 2010, p. 34).
[8]Explicando as prerrogativas processuais conferidas ao Poder Público: “Quando a Fazenda Pública está em juízo, ela está defendendo o erário. Na realidade, aquele conjunto de receitas públicas que pode fazer face às despesas não é de responsabilidade, na sua formação, do governante do momento. É toda sociedade que contribui para isso. (...) Ora, no momento em que a Fazenda Pública é condenada, sofre um revés, contesta uma ação ou recorre de uma decisão, o que se está protegendo, em última análise, é o erário. É exatamente essa massa de recurso que foi arrecadada e que evidentemente supera, aí sim, o interesse particular. Na realidade, a autoridade pública, é mera administradora.” (MORAES, 2000, p. 69).
[9] Nesse sentido leciona Arruda Alvim a respeito do pedido de suspensão no mandado de segurança: “(...) mesmo diante de direito líquido e certo, poder-se-á, ainda assim, fazer cessar a eficácia protetiva de tal direito, desde que, em despacho fundamentado e à luz das provas, se constate a iminência de possível lesão ao interesse público, tal como descrito. (...) Não se estará, na realidade, fazendo sucumbir o direito do particular, mas, apenas, e tão somente, não se estará, naquele caso concreto e específico, outorgando ao mesmo um tipo de proteção, que tão graves os danos à ordem pública provoca”. (ALVIM, 1978, p. 173).
[10] Veja-se a aplicação do princípio da proporcionalidade no STF: “O princípio da proporcionalidade representa um método geral para a solução de conflitos entre princípios, isto é, um conflito entre normas que, ao contrário do conflito de regras, é resolvido não pela revogação ou redução teleológica de uma das normas conflitantes nem pela explicitação de distinto campo de aplicação entre as normas, mas antes e tão somente pela ponderação do peso relativo de cada uma das normas em tese aplicáveis e aptas a fundamentar decisões em sentido opostos. Nessa última hipótese, aplica-se o principio da proporcionalidade para estabelecer ponderações entre distintos bens constitucionais.Em síntese, a aplicação do princípio da proporcionalidade se dá quando verificada restrição a determinado direito fundamental ou um conflito entre diversos princípios constitucionais de modo a exigir que se estabeleça o peso relativo de cada um dos direitos por meio da aplicação das máximas que integram o mencionado princípio da proporcionalidade. São três as máximas parciais do princípio da proporcionalidade: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Tal como já sustentei em estudo sobre a proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (...), há de perquerir-se, na aplicação do princípio da proporcionalidade, se em face do conflito entre dois bens constitucionais contrapostos, o ato impugnado afigura-se adequado (isto é, apto para produzir o resultado desejado), necessário (insto é, insubstituível por outro meio menos gravoso e igualmente eficaz) e proporcional em sentido estrito (ou seja, se estabelece uma relação ponderal entre o grau de restrição de um princípio e o grau de realização do princípio contraposto).” (STF. Intervenção Federal 2257-6/SP, Rel. Gilmar Mendes).
[11]Pertinente é a crítica de Paulo Ricardo Shier: “A conclusão (...) dá-se no sentido de que a assunção prática da supremacia do interesse público sobre o privado como cláusula geral de restrição de direitos fundamentais tem possibilitado a emergência de uma política autoritária de realização constitucional, onde os direitos, liberdades e garantias fundamentais devem, sempre e sempre, ceder aos reclames do Estado que, qual Midas, transforma em interesse público tudo aquilo que toca.(...) O que se questiona, logo, não é o conteúdo, mas sim, a forma: a entronização do interesse público num pretenso patamar hierárquico superior àquele ocupado pelos direitos e liberdades individuais.”(SHIER, 2008, p. 1-2).
[12] Conforme leciona Daniel Sarmento: “O emprego do princípio da proporcionalidade busca otimizar a proteção aos bens jurídicos em confronto, evitando o sacrifício desnecessário ou exagerado de um deles em proveito da tutela do outro. Neste sentido, ele é de especial importância no campo dos direitos fundamentais, como fórmula de limitação de medidas que restrinjam estes direitos. Um dos seus objetivos, como o nome já revela, é a busca de uma justa e adequada "proporção" entre os interesses em pugna. Por isso, a aplicação do princípio da proporcionalidade exige a realização de ponderações minuciosas e devidamente motivadas, nas quais se torna fundamental a atenção sobre as particularidades da situação concreta sob análise.” (SARMENTO, 2007, p. 100).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CUNHA, Victor Rizzo Carneiro da. O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado como conteúdo teleológico do pedido de suspensão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 fev 2013, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33754/o-principio-da-supremacia-do-interesse-publico-sobre-o-interesse-privado-como-conteudo-teleologico-do-pedido-de-suspensao. Acesso em: 23 dez 2024.
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