INTRODUÇÃO
O presente artigo visa demonstrar a evolução da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho - TST em matéria de responsabilidade subsidiária do ente público em contratos de terceirização de serviços.
Será abordado o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho antes do julgamento da ADC nº 16/DF pelo Supremo Tribunal Federal - STF, bem como a atual jurisprudência de suas Colendas Turmas.
DESENVOLVIMENTO
Como é de conhecimento notório, até o julgamento da ADC nº 16/DF, o Tribunal Superior do Trabalho tinha entendimento pacífico no sentido de que os entes públicos eram responsáveis subsidiários pelo simples fato de serem tomadores dos serviços prestados, in verbis:
SÚMULA Nº 331
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE
(...)
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).
Com o julgamento da Ação Declaratório nº 16/DF (24/11/2010), o Plenário do Egrégio STF declarou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, ao tempo em que consignou que o ente público somente poderá ser condenado em responsabilidade subsidiária quando comprovada sua culpa in vigilando.
Em razão do decidido no bojo da ADC nº 16, a C. 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho passou a dar provimento aos recursos dos entes públicos para absolvê-los da responsabilidade subsidiária, quando o acórdão regional aplicava culpa presumida, responsabilidade objetiva ou aplicação pura e simples da Súmula nº 331, inciso IV, do TST, vejamos[1]:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. Diante da ofensa ao art. 71, § 1.º, da Lei n.º 8.666/93, determina-se o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. Para que seja autorizada a responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte da empresa contratada conforme o disposto na Lei n.º 8.666/93, deve ser demonstrada a sua conduta omissiva no que se refere à fiscalização do cumprimento das obrigações relativas aos encargos trabalhistas. Esse, aliás, foi o entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Federal que em recente decisão (ADC 16 - 24/11/2010), ao declarar a constitucionalidade do art. 71, § 1.º, da Lei n.º 8.666/93, asseverou que constatada a culpa in vigilando, gera a responsabilidade subsidiária da União. Não restando comprovada a omissão culposa do ente em relação à fiscalização quanto ao cumprimento das obrigações trabalhistas, não há de se falar em responsabilidade subsidiária. Recurso de Revista conhecido e provido.
(RR - 4562-05.2010.5.10.0000 , Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, Data de Julgamento: 04/05/2011, 4ª Turma, Data de Publicação: 13/05/2011)
AGRAVO. DECISÃO DO PRESIDENTE DO TST QUE DENEGOU SEGUIMENTO A AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. A decisão agravada mostra-se em desacordo com o novo balizamento da Súmula n.º 331, IV, concedido pelo STF no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 16. Agravo provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO. Diante da ofensa ao art. 71, § 1.º, da Lei n.º 8.666/93, determina-se o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. CULPA IN VIGILANDO NÃO CONFIGURADA. PROVIMENTO. Para que seja configurada a responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte da empresa contratada, conforme o disposto na Lei n.º 8.666/93, deve ser demonstrada a sua conduta omissiva no que se refere à fiscalização do cumprimento das obrigações relativas aos encargos trabalhistas. Esse, aliás, foi o entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Federal que, em recente decisão (ADC 16 - 24/11/2010), ao declarar a constitucionalidade do art. 71, § 1.º, da Lei n.º 8.666/93, asseverou que a constatação da culpa in vigilando, isto é, a omissão culposa da Administração Pública em relação à fiscalização quanto ao cumprimento dos encargos sociais, gera a responsabilidade do ente contratante. Assim, não restando comprovada a omissão culposa do Ente Público no cumprimento das obrigações trabalhistas, mostra-se incabível a responsabilidade subsidiária pronunciada no acórdão regional. Recurso de Revista conhecido e provido.
(RR - 13040-24.2006.5.02.0013 , Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, Data de Julgamento: 06/04/2011, 4ª Turma, Data de Publicação: 19/04/2011)
Posteriormente, o Tribunal Superior do Trabalho reformulou sua Súmula nº 331 para estabelecer a necessidade de demonstração da culpa in vigilando do ente público, como medida necessária para ensejar a sua condenação em responsabilidade subsidiária, in verbis:
SUM-331 CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Com a reformulação da súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, quase todos os ministros do TST passaram a absolver a União da responsabilidade subsidiária, quando o acórdão regional aplicava culpa presumida, responsabilidade objetiva ou aplicação pura e simples da Súmula nº 331, inciso IV, do TST. Vejamos[2]:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. Provável ofensa ao artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93 - tendo em vista a discussão sobre a responsabilidade subsidiária da Administração Pública - autoriza o provimento do agravo de instrumento. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. O item V da Súmula-TST-331 assenta o entendimento de que a responsabilidade supletiva, em casos de terceirização de serviços, só pode ser atribuída à Administração Pública quando evidenciada a culpa in vigilando. No caso, não é possível verificar a conduta culposa da União, uma vez que o e. Tribunal Regional confirmou a condenação subsidiária com fundamento tão somente no inadimplemento das obrigações trabalhistas. Nesse contexto, impõe-se a exclusão da União da lide. Recurso de revista conhecido e provido.
(RR - 283-64.2010.5.10.0003, Relator Ministro: Horácio Raymundo de Senna Pires, Data de Julgamento: 23/11/2011, 3ª Turma, Data de Publicação: 25/11/2011)
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SÚMULA N.º 331, V, DO TST. Demonstrada a afronta ao artigo 71, § 1º, da Lei n.º 8.666/93, dá-se provimento ao agravo de instrumento a fim de determinar o processamento do recurso de revista. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SÚMULA N.º 331, V, DO TST. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 16, ajuizada pelo Governador do Distrito Federal, decidiu ‘que a mera inadimplência do contratado não poderia transferir à Administração Pública a responsabilidade pelo pagamento dos encargos’. Reconheceu, todavia, a Corte suprema, -que isso não significaria que eventual omissão da Administração Pública, na obrigação de fiscalizar as obrigações do contratado, não viesse a gerar essa responsabilidade- (informativo n.º 610 do Supremo Tribunal Federal). 2. Nesse sentido, orienta-se a jurisprudência desta Corte superior consagrada no item V da Súmula n.º 331, com a redação que lhe emprestou o Tribunal Pleno, mediante a Resolução n.º 174, de 24/05/2011, segundo a qual ‘os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada’. 3. Nesse contexto, merece reforma a decisão proferida pela Corte de origem, porquanto não se constata do substrato fático probatório dos autos a omissão da administração pública quanto ao dever de fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviços. 4. Recurso de revista de que se conhece e se dá provimento.
(RR - 126200-18.2007.5.15.0017, Relator Juiz Convocado: Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 07/12/2011, 1ª Turma, Data de Publicação: 16/12/2011)
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. CULPA IN VIGILANDO NÃO CONFIGURADA. SÚMULA 331, V, DO TST. Constatada possível violação do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, merece provimento o Agravo de Instrumento para determinar o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento conhecido e provido. II - RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO.PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR INOBSERVÂNCIA DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CF/88 E SÚMULA VINCULANTE 10 DO STF. Com fundamento no art. 249, § 2º, do CPC, deixo de apreciar a alegação em face da possibilidade de julgamento em favor da parte a quem aproveitaria a declaração de nulidade. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. CULPA IN VIGILANDO NÃO CONFIGURADA. SÚMULA 331, V, DO TST. Em se considerando que o Regional manteve a responsabilidade subsidiária do ente da Administração Pública tão somente sob o fundamento de que fora beneficiário da prestação de serviços, sem ter sido demonstrada culpa decorrente de conduta omissiva na fiscalização do cumprimento do contrato firmado com a empresa prestadora dos serviços, impõe-se a aplicação do disposto na Súmula 331, V, do TST, para afastar a responsabilidade subsidiária que lhe foi atribuída. Recurso de Revista conhecido e provido.
(RR - 516700-09.2009.5.12.0005, Relator Ministro: Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 16/11/2011, 8ª Turma, Data de Publicação: 18/11/2011)
Entretanto, alguns Ministros do TST (por exemplo, Ministro Freire Pimenta, Ministro Renato Paiva e Ministro Caputo Bastos) insistem em manter a condenação subsidiária da União, mesmo nos casos citados acima, ao fundamento de que seria ônus da União comprovar que fiscalizou o contrato de trabalho (inversão do ônus da prova), in verbis[3]:
TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 71, § 1º, DA LEI Nº 8.666/93 E RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ENTE PÚBLICO PELAS OBRIGAÇÕES TRABALHISTAS DO EMPREGADOR CONTRATADO. POSSIBILIDADE, EM CASO DE CULPA IN VIGILANDO DO ENTE OU ÓRGÃO PÚBLICO CONTRATANTE, NOS TERMOS DA DECISÃO DO STF PROFERIDA NA ADC Nº 16-DF E POR INCIDÊNCIA DOS ARTS. 58, INCISO III, E 67, CAPUT E § 1º, DA MESMA LEI DE LICITAÇÕES E DOS ARTS. 186 E 927, CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL E PLENA OBSERVÂNCIA DA SÚMULA VINCULANTE Nº 10 E DA DECISÃO PROFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ADC Nº 16-DF. SÚMULA Nº 331, ITENS IV E V, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Conforme ficou decidido pelo Supremo Tribunal Federal, com eficácia contra todos e efeito vinculante (art. 102, § 2º, da Constituição Federal), ao julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16-DF, é constitucional o art. 71, § 1º, da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93), na redação que lhe deu o art. 4º da Lei nº 9.032/95, com a consequência de que o mero inadimplemento de obrigações trabalhistas causado pelo empregador de trabalhadores terceirizados, contratados pela Administração Pública, após regular licitação, para lhe prestar serviços de natureza contínua, não acarreta a esta última, de forma automática e em qualquer hipótese, sua responsabilidade principal e contratual pela satisfação daqueles direitos. No entanto, segundo também expressamente decidido naquela mesma sessão de julgamento pelo STF, isso não significa que, em determinado caso concreto, com base nos elementos fático-probatórios delineados nos autos e em decorrência da interpretação sistemática daquele preceito legal em combinação com outras normas infraconstitucionais igualmente aplicáveis à controvérsia (especialmente os arts. 54, § 1º, 55, inciso XIII, 58, inciso III, 66, 67, caput e seu § 1º, 77 e 78 da mesma Lei nº 8.666/93 e os arts. 186 e 927 do Código Civil, todos subsidiariamente aplicáveis no âmbito trabalhista por força do parágrafo único do art. 8º da CLT), não se possa identificar a presença de culpa in vigilando na conduta omissiva do ente público contratante, ao não se desincumbir satisfatoriamente de seu ônus de comprovar ter fiscalizado o cabal cumprimento, pelo empregador, daquelas obrigações trabalhistas, como estabelecem aquelas normas da Lei de Licitações e também, no âmbito da Administração Pública federal, a Instrução Normativa nº 2/2008 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), alterada por sua Instrução Normativa nº 03/2009. Nesses casos, sem nenhum desrespeito aos efeitos vinculantes da decisão proferida na ADC nº 16-DF e da própria Súmula Vinculante nº 10 do STF, continua perfeitamente possível, à luz das circunstâncias fáticas da causa e do conjunto das normas infraconstitucionais que regem a matéria, que se reconheça a responsabilidade extracontratual, patrimonial ou aquiliana do ente público contratante autorizadora de sua condenação, ainda que de forma subsidiária, a responder pelo adimplemento dos direitos trabalhistas de natureza alimentar dos trabalhadores terceirizados que colocaram sua força de trabalho em seu benefício. Tudo isso acabou de ser consagrado pelo Pleno deste Tribunal Superior do Trabalho, ao revisar sua Súmula nº 331, em sua sessão extraordinária realizada em 24/05/2011 (decisão publicada no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho de 27/05/2011, fls. 14 e 15), atribuindo nova redação ao seu item IV e inserindo-lhe o novo item V, nos seguintes e expressivos termos: -SÚMULA Nº 331. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE. (...)IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada-. Na hipótese dos autos, além de não constar, do acórdão regional, nenhuma referência ao fato de que o ente público demandado praticou os atos de fiscalização do cumprimento, pelo empregador contratado, das obrigações trabalhistas referentes aos trabalhadores terceirizados (o que é suficiente, por si só, para configurar a presença, no quadro fático delineado nos autos, da conduta omissiva da Administração configuradora de sua culpa in vigilando), verifica-se que o Tribunal de origem, com base no conjunto probatório, consignou ter havido culpa do ente público, o que igualmente seria suficiente para a manutenção da decisão em que se o condenou a responder, de forma subsidiária, pela satisfação das verbas e demais direitos objeto da condenação. Agravo de instrumento desprovido.
(AIRR - 34000-13.2009.5.04.0733, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 19/10/2011, 2ª Turma, Data de Publicação: 28/10/2011)
De outra feita, outros Ministros do Tribunal Superior do Trabalho (por exemplo, Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro) passaram a dar provimento aos recursos da União para absolvê-la da responsabilidade subsidiária, na hipótese do acórdão regional trazer apenas menções de responsabilidade subsidiária por culpas “in eligendo” e “in vigilando”, vejamos[4]:
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. CULPA IN VIGILANDO NÃO CONFIGURADA. SÚMULA 331, V, DO TST. Constatada possível violação do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, merece provimento o Agravo de Instrumento para determinar o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento conhecido e provido. II - RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO.PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR INOBSERVÂNCIA DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CF/88 E SÚMULA VINCULANTE 10 DO STF. Com fundamento no art. 249, § 2º, do CPC, deixo de apreciar a alegação em face da possibilidade de julgamento em favor da parte a quem aproveitaria a declaração de nulidade. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. CULPA IN VIGILANDO NÃO CONFIGURADA. SÚMULA 331, V, DO TST. Em se considerando que o Regional manteve a responsabilidade subsidiária do ente da Administração Pública tão somente sob o fundamento de que fora beneficiário da prestação de serviços, sem ter sido demonstrada culpa decorrente de conduta omissiva na fiscalização do cumprimento do contrato firmado com a empresa prestadora dos serviços, impõe-se a aplicação do disposto na Súmula 331, V, do TST, para afastar a responsabilidade subsidiária que lhe foi atribuída. Recurso de Revista conhecido e provido.
(RR - 516700-09.2009.5.12.0005, Relator Ministro: Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 16/11/2011, 8ª Turma, Data de Publicação: 18/11/2011)
Todavia, em data recente, a C. 6ª Turma[5] do Tribunal Superior do Trabalho passou a deliberar no sentido de determinar o retorno dos autos a origem, quando não houvesse a demonstração de culpa do ente público, para que fosse reanalisado o quadro fático probatório:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA - ENTIDADES ESTATAIS - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DECISÃO RECORRIDA NA QUAL A MATÉRIA FOI EXAMINADA EM TESE, SEM O REGISTRO DAS PREMISSAS FÁTICO-PROBATÓRIAS CONCERNENTES ÀS CULPAS IN ELIGENDO E IN VIGILANDO. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, ante a constatação de possível violação do art. 71 da Lei nº 8.666/93. Agravo de instrumento a que se dá provimento nos termos dos arts. 228 e 229 do RITST. TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA - ENTIDADES ESTATAIS - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DECISÃO RECORRIDA NA QUAL A MATÉRIA FOI EXAMINADA EM TESE, SEM O REGISTRO DAS PREMISSAS FÁTICO-PROBATÓRIAS CONCERNENTES ÀS CULPAS IN ELIGENDO E IN VIGILANDO. 1 - O Pleno do STF, ao declarar a constitucionalidade do art. 71 da Lei nº 8.666/93, somente vedou a transferência consequente e automática, fundada no mero inadimplemento, da responsabilidade da empresa prestadora de serviços para o ente público tomador de serviços, ressalvando que -isso não impedirá que a Justiça do Trabalho recorra a outros princípios constitucionais e, invocando fatos da causa, reconheça a responsabilidade da Administração, não pela mera inadimplência, mas por outros fatos-. 2 - Em consonância com a jurisprudência do STF, o Pleno do TST deu nova redação à Súmula nº 331 do TST: -IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada-. 3 - Na hipótese dos autos, o Regional manteve a condenação subsidiária, por entender que -O só fato de o empregador não pagar o crédito trabalhista ao empregado justifica a responsabilidade subsidiária da tomadora de serviços, em face da configuração da culpa in eligendo. O art. 455 da CLT pode e deve ser interpretado extensivamente-. Contudo, não havendo no acórdão regional elementos fáticos suficientes para se perquirir sobre a existência ou não de conduta culposa do reclamado, ente público, torna-se necessário, considerando os limites de cognição em instância extraordinária, o retorno dos autos ao TRT de origem a fim de que analise o caso concreto sob a ótica do decidido pelo STF na ADC 16 e da Súmula 331/TST, em sua nova redação (Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011), explicitando as premissas fáticas específicas que remetam à efetiva ausência de fiscalização da entidade pública na terceirização. Precedentes da 6ª Turma. Nesse contexto, ressalvando entendimento pessoal, dou provimento parcial para determinar o retorno dos autos à Corte de origem para que prossiga no exame da matéria à luz do conjunto fático-probatório relativo à culpa in eligendo e/ou à culpa in vigilando, analisando o caso concreto sob a ótica do decidido pelo STF na ADC 16 e da Súmula 331/TST, em sua nova redação (Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011), explicitando as premissas fáticas específicas que remetam à efetiva ausência de fiscalização da entidade pública na terceirização.
(RR - 29600-60.2004.5.01.0006, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 06/03/2013, 6ª Turma, Data de Publicação: 08/03/2013)
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA UNIÃO. ENTE PÚBLICO. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA EM FACE DA CULPA IN VIGILANDO. É certo que a terceirização tem sido amplamente adotada com o fim de proporcionar maior economia e eficiência na prestação de serviços especializados. Conforme determina a Lei de Licitações, os contratos devem ser fiscalizados, como também já determinado pela administração pública, por meio da Instrução Normativa nº 2/2008. O c. TST entende que a ausência de fiscalização pelo ente público determina a sua responsabilidade subsidiária pelas verbas inadimplidas no contrato de trabalho. Ocorre que o e. STF não vem admitindo a mera responsabilização do ente público sem que haja efetiva demonstração de culpa in vigilando. Desse modo, torna-se necessário, para fazer incidir a Súmula 331, V, do c. TST, que os tribunais regionais assentem tal premissa com o fim de, em cada caso concreto, o TST identificar se houve inércia do administrador público, em ofensa aos princípios contidos no art. 37 da Carta Magna. Após a decisão do Pretório Excelso no julgamento da ADC 16, não mais se vislumbra a possibilidade de declaração de responsabilidade subsidiária do tomador de serviços por mero inadimplemento pelo prestador. No caso em exame, não há como se manter a decisão que entende pela manutenção da responsabilidade subsidiária do ente público, mas também não é possível, diante da restrita cognição em instância extraordinária, identificar se o ente público fiscalizou o contrato de trabalho, sem que a Corte a quo trate das premissas específicas que remetam à efetiva ausência de fiscalização. O provimento do recurso deve se dar para determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional de origem com o fim de examinar a responsabilidade por culpa in vigilando, nos termos definidos pela ADC 16. Recurso de Revista conhecido e parcialmente provido.
(RR - 287300-16.2007.5.02.0058, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 06/03/2013, 6ª Turma, Data de Publicação: 08/03/2013)
Atualmente, conforme demonstrado acima, as C. Turmas do Tribunal Superior do Trabalho divergem quanto à forma de comprovação da culpa do ente público para eventual condenação em responsabilidade subsidiária.
E, na medida em que a C. SBDI-1[6] suspendeu o julgamento dos processos em responsabilidade subsidiária até decisão final do Supremo Tribunal Federal no RE nº 603.397[7], não há no horizonte perspectivas para a pacificação da matéria posta em discussão.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, antes do julgamento da ADC nº 16/DF, era pacífico no sentido de que o mero inadimplemento dos direitos trabalhistas, por parte da empresa contratada, seria suficiente para condenar o ente público em responsabilidade subsidiária (antiga redação da Súmula nº 331 do TST).
Com o julgamento da ADC nº 16/DF, o Tribunal Superior do Trabalho reformulou sua Súmula nº 331, para estabelecer que o ente público somente poderia ser condenado em responsabilidade subsidiária caso evidenciada sua conduta culposa no cumprimento dos ditames da Lei nº 8.666/93.
Entretanto, as decisões das Colendas Turmas do Tribunal Superior do Trabalho encontram-se divergentes quanto à forma de comprovação da existência de culpa in vigilando, sendo que atualmente a matéria encontra-se pendente de análise pela C. SBDI-1 (órgão responsável pela pacificação da jurisprudência).
REFERÊNCIAS
Sítio do Tribunal Superior do Trabalho: www.tst.jus.br
Sítio do Supremo Tribunal Federal: www.stf.jus.br
[1] No mesmo sentido, são os acórdãos proferidos nos seguintes processos: 15840-14-2006-5-01-0058; 2548-48-2010-5-10-0000; 105400-35-2008-5-04-0018; 1627-41-2010-5-01-0000; 4017-32-2010-5-10-0000; 3522-85-2010-5-10-0000; 4365-50-2010-5-10-0000; 3544-46-2010-5-10-000; 2875-90-2010-5-10-0000; 4598-47-2010-5-10-0000; 2189-98-2010-5-10-0000; 3619-85-2010-5-10-0000; 181500-02-2006-5-04-0018; 327500-37-2006-5-09-0242; 94500-94-2009-5-10-0016; 3383-04-2010-5-04-0000; 2953-73-2010-5-14-0000; 1777-70-2010-5-10-0000; 1095-40-2010-5-02-0000; 945-37-2010-5-10-0000; 13940-29-2005-5-15-0093; 270-74-2010-5-10-0000; 2282-50-2010-5-14-0000; 3495-05.2010.5.10.0000.
[2] No mesmo sentido, são os acórdãos proferidos nos seguintes processos: 87140-46.2008.5.15.0003; 2953-09.2010.5.02.0000; 80200-54.2007.5.06.0002; 41900-17.2009.5.10.0010; 155340-37.2008.5.21.0004; 84440-60.2007.5.10.0007; 937-12.2010.5.01.0000; 52600-18-2009-5-09-0095; 96340-71-2006-5-10-0008; 755700-73-2008-5-12-0035; 104000-84-2009-5-10-0017; 647300-93-2007-5-12-0036; 87600-68-2009-504-0661; 120-78-2010-5-10-0005; 14340-44-2008-5-14-0101; 536200-26-2008-5-12-0028; 4554-28-2010-5-10-0000; 207.28.2010.5.10.0007; 48400.34.2008.5.01.0027; 851-93-2010-5-24-0002; 151-72-2010-5-03-0012.
[3] No mesmo sentido, os acórdãos proferidos nos seguintes processos: 183200-42-2008-5-04-0018; 121700-98-2009-5-03-0104; 38500-47-2009-5-04-0661.
[4] No mesmo sentido os acórdãos proferidos nos seguintes processos: 516700-09-2009-5-12-0005; 529700-76-2009-5-12-0005; 824-09-2010-5-10-000; 345-54-2010-5-03-0018; 3856-22-2010-5-10-0000.
[5] No mesmo sentido os acórdãos proferidos nos seguintes processos: RR-172000-73-2005-02-0026; RR-48800-56-2006-5-15-0018; RR - 407-69-2012-5-03-0036.
[6] Notícia extraída do sítio do Tribunal Superior do Trabalho: http://www.tst.jus.br/home/-/asset_publisher/nD3Q/content/sdi-1-suspende-julgamento-de-processos-sobre-responsabilidade-subsidiaria-de-ente-publico?redirect=http%3A%2F%2Fwww.tst.jus.br%2Fhome%3Fp_p_id%3D101_INSTANCE_nD3Q%26p
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_p_col_id%3Dcolumn-3%26p_p_col_count%3D4 Acesso em: 08/03/2013.
[7] ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA POR ENCARGOS TRABALHISTAS EM FACE DO INADIMPLEMENTO DE EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇO. EXAME DA CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 71, § 1º, DA LEI 8.666/1993. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
(RE 603397 RG, Relator(a): Min. MIN. ELLEN GRACIE, julgado em 04/02/2010, DJe-067 DIVULG 15-04-2010 PUBLIC 16-04-2010 EMENT VOL-02397-05 PP-01366 RDECTRAB v. 17, n. 196, 2010, p. 260-264)
Advogada da União, com pós-graduação em Direito Processual.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AMARAL, Anna Maria Felipe Borges. Da evolução da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho em responsabilidade subsidiária do ente público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 mar 2013, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/34187/da-evolucao-da-jurisprudencia-do-tribunal-superior-do-trabalho-em-responsabilidade-subsidiaria-do-ente-publico. Acesso em: 23 dez 2024.
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