SUMÁRIO: CONSIDERAÇÕES INICIAIS. 1 DESAFORAMENTO. 2 EXTINÇÃO DO PROTESTO POR NOVO JÚRI. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
A Lei nº 11.689/2008 trouxe um novo rito ao Tribunal, reformulando-o totalmente. Os objetivos principais da lei seriam prestar celeridade, rapidez e maior eficiência ao procedimento, adequando-o, inclusive, à nova ordem constitucional e aos anseios populares.
Várias foram as alterações ocasionadas pela norma assinalada, sendo tratados, especificamente neste artigo, o desaforamento e a aclamada extinção do protesto por novo júri.
É necessário, diante da nova lei, averiguar as alterações advindas, observando se atenderam o objetivo para o qual vieram e entender como cada uma delas afeta o procedimento do Júri, suas causas e conseqüências para a sistemática que será adotada a partir de agora.
Segundo o art. 424 do CPP, antes das alterações, o julgamento poderia ser desaforado para comarca ou termo próximo nas seguintes hipóteses: a) se o interesse da ordem pública assim o reclamasse; b) houvesse dúvida sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança pessoal do réu; c) se o julgamento não se realizasse no período de um ano, contado do recebimento do libelo, desde que para a demora não haja concorrido o réu ou a defesa. O dispositivo antigo era o seguinte:
Art. 424. Se o interesse da ordem pública o reclamar, ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança pessoal do réu, o Tribunal de Apelação, a requerimento de qualquer das partes ou mediante representação do juiz, e ouvido sempre o procurador-geral, poderá desaforar o julgamento para comarca ou termo próximo, onde não subsistam aqueles motivos, após informação do juiz, se a medida não tiver sido solicitada, de ofício, por ele próprio.
Segundo o novel art. 427, alterado pela Lei nº 11.689/08, mantém-se as causas acima apontadas, incluindo-se no art. 428 a situação de comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, e alterando-se apenas o prazo para o caso de o julgamento não puder ser realizado em 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia.
Caso haja relevância nos motivos alegados, poderá ser determinada a suspensão do julgamento pelo Júri por decisão fundamentada do relator (art. 427, §2º, do CPP).
A nova redação ficou da seguinte forma:
Art. 427. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 1o O pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 2o Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 3o Será ouvido o juiz presidente, quando a medida não tiver sido por ele solicitada. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 4o Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo, nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
Art. 428. O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 1o Para a contagem do prazo referido neste artigo, não se computará o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
§ 2o Não havendo excesso de serviço ou existência de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
No mais, o que se percebe mais sensivelmente nas mudanças proporcionadas no desaforamento diz respeito ao achatamento do prazo, no caso de excesso de serviço, para 6 (seis) meses desde a decisão de pronúncia.
Segundo Badaró, “a redução de prazo se justifica pelo objetivo de dar maior celeridade ao procedimento, destacando que a mudança do seu marco inicial decorre da supressão do libelo, que não mais é previsto no Projeto”[1].
Para Tourinho Filho[2], com base no §1º do art. 428, não há desaforamento, na situação aqui discutida, quando a demora for ocasionada pela própria Defesa, por decorrência de adiamentos e diligências por esta requeridos.
Segundo Pacelli[3], tal vedação é curiosa, dado que a realização de diligências e a ocorrência de incidentes proporcionados pela defesa são medidas regulares no curso do processo, que causam, na verdade, excesso de serviço no foro.
Além disso, deve-se ressaltar a novidade trazida pelo art. 428, §2º, que prevê, segundo Badaró[4], uma espécie de “aceleração” do julgamento, ainda que não seja caso de excesso de serviço ou de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri. Na hipótese, o réu poderá pedir a imediata realização do julgamento nas reuniões periódicas ocorridas no foro.
Por fim, salienta-se que a reforma trouxe uma novidade muito aclamada pelos críticos ao Tribunal do Júri, qual seja, a extinção do protesto por novo júri, recurso outrora previsto no art. 607 do CPP, antes cabível quando o juiz condenava o acusado a pena igual ou superior a 20 anos:
Art. 607. O protesto por novo júri é privativo da defesa, e somente se admitirá quando a sentença condenatória for de reclusão por tempo igual ou superior a vinte anos, não podendo em caso algum ser feito mais de uma vez.
§ 1o Não se admitirá protesto por novo júri, quando a pena for imposta em grau de apelação (art. 606).
§ 2o O protesto invalidará qualquer outro recurso interposto e será feito na forma e nos prazos estabelecidos para interposição da apelação.
§ 3o No novo julgamento não servirão jurados que tenham tomado parte no primeiro.
Art. 608. O protesto por novo júri não impedirá a interposição da apelação, quando, pela mesma sentença, o réu tiver sido condenado por outro crime, em que não caiba aquele protesto. A apelação, entretanto, ficará suspensa, até a nova decisão provocada pelo protesto.
Conforme indica Badaró[5], o recurso era bastante arcaico, tendo origem no Código de Processo Criminal do Império de 1832, a sua disciplina pelo Código de Processo Penal de 1941 acabava levando, muitas vezes, a situações de injustiça.
A fim de evitar a anulação do julgamento, os juízes, muitas vezes, fixavam penas de 19 anos e 6 meses, ou seja, dificultando a aplicação da sanção correta e adequada ao caso concreto quando deveria ser superior a 20 anos.
Segundo Nucci[6], era inviável manter o protesto por novo júri no sistema recursal brasileiro, pois o motivo de sua origem (condenação em pena capital ou de caráter perpétuo) não existe atualmente na legislação do país.
Por esse motivo, uma segunda chance para repetição do julgamento apenas para o Tribunal do Júri, por ocasião de penas mais elevadas, estava descontextualizada. Para Mougenot e Parra Neto[7], o recurso referido era uma excrescência jurídica, que deveria há mais tempo ter sido extirpada do sistema processual brasileiro.
Ademais, o único pressuposto do recurso era o quantum da condenação, sem levar em consideração a existência de erro no julgamento ou outro motivo plausível.
Nucci[8] critica o recurso, pois a pena em si não deveria ser a única causa para um novo julgamento, até porque, justifica o doutrinador, o crime de latrocínio está sujeito a pena mínima de 20 anos e, nem por isso, era passível do protesto.
A Lei nº 11.689/2008 suprimiu o recurso indicado, trazendo, além de justiça à aplicação das penas quando os crimes justificam sanções acima de 20 anos, celeridade ao processo, sem a possibilidade de mais uma via recursal que delongaria mais ainda o curso processual, quando já garantido por outras vias o devido processo legal (apelação, recurso em sentido estrito, ação revisional etc.).
Tourinho Filho[9], por outro lado, entende que o protesto por novo júri estava estritamente relacionado à ampla defesa, nos termos do princípio inserto no art. 5º, XXXVIII, da CF/88.
Critica, portanto, a abolição do recurso pela lei indicada, por compreender que a defesa no julgamento pelo Tribunal do Júri abrange os recursos a ela inerentes, sendo que sua extinção teria violado garantia constitucionalmente protegida.
Nas palavras do doutrinador, verbis:
Que prejuízo havia para a Acusação na adoção do protesto? Feito o protesto, se o julgamento não atendeu à expectativa jurídica do órgão acusatório, nada o impede de apelar e conseguir do Tribunal um novo julgamento, nos termos do art. 593, III, do CPP. Eliminá-lo, simplesmente, porque houve um caso em que o réu foi condenado e, mercê do protesto, absolvido, não faz sentido. Que prejuízo sofreu a sociedade se o Ministério Público podia e pode apelar? Quando se interpunha o protesto, o julgamento anterior ficava invalidado e, depois do segundo julgamento motivado pelo protesto, as partes podiam apelar. A nosso juízo, quando a Constituição, que é a Lei Maior, concede ao Júri “plenitude de defesa”, não se limita a conferir-lhe o simples contraditório, a paridade de armas, a exigência de defesa efetiva. Isso é ampla defesa.
[...]
A nosso juízo, a exclusão do protesto lesionou flagrantemente dogma constitucional: a plenitude de defesa. Esta já não será tão plena como era. Castrou-se-lhe um dos princípios constitucionais da instituição do Júri.[10]
Discute-se, ainda, se os réus julgados pelo Tribunal do Júri anteriores à promulgação da referida lei ainda teriam direito ao protesto por novo júri. Caso se entenda que a norma é meramente processual, não teria qualquer retroação, nos termos do art. 2º do CPP – “a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”.
Se a extinção do recurso especificado for compreendida como norma de direito material, por influenciar diretamente no status libertatis do condenado, a interpretação será de que a lei penal nova não retroage, salvo para beneficiar o réu (arts. 5º, XL, da Constituição Federal, e 2º, parágrafo único, do Código Penal).
Na opinião de Rômulo Andrade Moreira[11], qualquer norma que estabeleça um meio recursal em benefício do réu deve ser entendida como garantia assegurada relacionada ao duplo grau de jurisdição, de caráter materialmente constitucional.
Conclui o autor, assim, que a lei que proporcionou a extinção do protesto por novo júri, apesar de sua natureza processual, inclui-se no âmbito do direito material, inserindo-se no rol, portanto, das normas processuais penais materiais. Assim, pela sua essência mista, não pode retroagir, prejudicando o condenado anterior à sua vigência. Por esse motivo, os dispositivos revogados deverão se aplicar àqueles agentes que praticaram infrações penais anteriores à entrada em vigor da nova lei.
Tourinho Filho se filia à solução supra, entendendo que as disposições sobre o protesto são processuais materiais e “serão aplicáveis a todos os crimes da competência do Júri que estejam em andamento e aos fatos ocorridos antes da vigência da nova lei, dês que não tenham sido atingidos pela coisa julgada”[12].
Contrariamente, Nucci[13] entende que a extinção do protesto por novo júri tem aplicação imediata, por se tratar de norma processual. Para o autor, o recurso não pode ser considerado norma mista apenas porque sua interposição condicionava-se a um determinado patamar de pena, porque tal situação não transformaria uma norma processual pura em processual material.
Para apoiar seu entendimento, afirma que a antiga previsão do protesto por novo júri não consistiria em norma material, pois não permitia a soltura do acusado e nem extinguia a sua punibilidade.
Ou seja, na interpretação de Nucci, caso o recurso fosse provido ou não, não haveria conseqüência no campo da pena. Dessa forma, “a sua utilização não afetava o direito de punir do Estado”, sendo que, na verdade, “cabia ao Tribunal do Júri, por intermédio de outro Conselho de Sentença, julgar novamente o caso”[14].
Portanto, para o doutrinador supracitado, a extinção do protesto por novo júri foi positiva, pois trouxe modernidade ao sistema recursal no processo penal brasileiro. Quanto à questão intertemporal, a norma em questão é puramente processual, tendo aplicação imediata, atinge todos os processos em andamento, pouco importando quando o crime foi cometido.
A jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça filiou-se à corrente de que a nova regra, que aboliu o protesto por novo júri, aplica-se quando o julgamento pelo Conselho de Sentença tenha ocorrido após a sua entrada em vigor, independentemente de o crime ter sido cometido antes da extinção do recurso.
O entendimento do STJ está espelhado em diversos precedentes, coletando-se os seguintes:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PROTESTO POR NOVO JÚRI. RÉU JULGADO PELO CONSELHO DE SENTENÇA APÓS A ENTRADA EM VIGOR DA LEI N.º 11.689/2008. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. A recorribilidade se submete à legislação vigente na data em que a decisão foi publicada, consoante o art. 2.º do Código de Processo Penal. Incidência do princípio tempus regit actum.
2. O art. 4.ª da Lei n.º 11.689/2008, que revogou expressamente o Capítulo IV do Título II do Livro III, do Código de Processo Penal, afasta o direito ao protesto por novo júri quando o julgamento pelo Conselho de Sentença ocorrer após a sua entrada em vigor, ainda que o crime tenha sido cometido antes da extinção do recurso.
3. Recurso provido para, cassado o acórdão atacado, restabelecer a decisão de primeiro grau que indeferiu o pedido de realização do novo júri, mantendo incólume a decisão dos jurados que condenou o Recorrido à pena de 24 anos de reclusão diante da prática do delito previsto no art. 121, § 2.º, incisos II, III e IV, c.c. o art. 121, § 4.º (última parte), do Código Penal.
(REsp 1183341/RR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 13/12/2012)
RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE HOMICÍDIO CONSUMADO E HOMICÍDIO NA FORMA TENTADA. PLEITO DE RECONHECIMENTO DE CONTINUIDADE DELITIVA. REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS.
INEXISTÊNCIA DE UNIDADE DE DESÍGNIOS. PROTESTO POR NOVO JÚRI.
JULGAMENTO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.689/2008. CONCURSO DE CRIMES. CONDENAÇÕES INFERIORES A VINTE ANOS. DESCABIMENTO DO RECURSO. PROGRESSÃO DE REGIME. TESE ABORDADA SEM A PARTICULARIZAÇÃO DA NORMA VIOLADA. SÚMULA N.º 284 DO STF. FIXAÇÃO DE REGIME PRISIONAL INTEGRALMENTE FECHADO. ILEGALIDADE FLAGRANTE. APRECIAÇÃO DE OFÍCIO.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO.
1. Segundo a consolidada orientação desta Corte, para o reconhecimento da continuidade delitiva entre delitos é necessário o cumprimento de requisitos de ordem objetiva - mais de uma ação ou omissão, crimes da mesma espécie e mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução - e subjetiva - unidade de desígnios.
2. Na hipótese dos autos, a Recorrente tentou ceifar a vida dos pais para obter os bens de ambos, em proveito à condição de filha única.
Assim, a investida contra a vida dos pais era motivada, em sua essência, por um propósito individual, autônomo, de alcançar a parte dos bens que, isoladamente, vinculava cada um deles. Nesse contexto, sendo notória a inexistência de unidade de desígnios, mostra-se incabível o reconhecimento da continuidade delitiva.
3. O fato de a lei nova ter suprimido o recurso de protesto por novo júri não afasta o direito à recorribilidade subsistente pela lei anterior, quando o julgamento ocorreu antes da entrada em vigor da Lei n.º 11.689/2008 que, em seu art. 4.º, revogou expressamente o Capítulo IV do Título II do Livro III, do Código de Processo Penal, extinguindo o protesto por novo júri. Incidência do princípio tempus regit actum.
4. Ainda que, na espécie, o julgamento tenha ocorrido antes da vigência da Lei n.º 11.689/2008, as penas relacionadas aos crimes cometidos, isoladas, são inferiores a 20 anos, razão pela qual a Sentenciada não faz jus ao protesto pelo novo júri.
5. O pedido relacionado à possibilidade de progressão de regime prisional não ultrapassa o juízo de admissibilidade, pois não foi indicado o dispositivo de lei federal eventualmente malferido ou cuja vigência tenha sido negada, o que atrai, por analogia, a incidência da Súmula n.º 284 do Supremo Tribunal Federal.
6. Contudo, é flagrante o constrangimento ilegal pelo qual passa a Recorrente, pois mantida pela Corte de origem a fixação do regime prisional integralmente fechado firmado na sentença condenatória.
7. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do § 1.º do art. 2.º da Lei n.º 8.072/90 e, posteriormente, com a edição da Lei n.º 11.464/2007, foi afastado em definitivo do ordenamento jurídico o regime integralmente fechado, antes imposto aos condenados por crimes hediondos, assegurando-lhes a progressividade do regime prisional.
8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. Habeas corpus concedido de ofício, para afastar a imposição do regime integralmente fechado à Recorrente.
(REsp 1046429/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 17/10/2012)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PROTESTO POR NOVO JÚRI. APLICABILIDADE DA LEI N. 11.689/2008. DECISUM POSTERIOR À NOVA LEI. PRETENSÃO CARENTE DE SUBSTRATO LEGAL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. STF.
1. Dispõe o art. 2º do Código de Processo Penal que se aplicará a lei processual penal desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.
2. A Lei n. 11.689, que entrou em vigor em 8/8/2008, revogou os arts. 607 e 608 do Código de Processo Penal e excluiu do ordenamento jurídico o protesto por novo júri, recurso privativo da defesa. Só terão direito a esse recurso aqueles cujas sentenças foram proferidas antes da entrada em vigor da nova lei.
3. No caso, conquanto a prática dos delitos tenha ocorrido em 25/2/2000, o julgamento pelo Júri foi em 22/9/2009, quando já vigia a Lei n. 11.689/2008. Em consequência, não há falar em cabimento de protesto por novo júri.
4. A violação do art. 5º, XL, da Constituição Federal revela-se quaestio afeta à competência do Supremo Tribunal Federal, provocado pela via do extraordinário, motivo pelo qual não se pode conhecer do recurso especial nesse aspecto, em função do disposto no art. 105, III, da Constituição Federal.
5. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.
6. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1289868/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2012, DJe 20/08/2012)
Nesses termos, apesar da divergência da doutrina, a questão já está solidificada na jurisprudência, entendendo-se pela extinção do recurso do protesto por novo júri a partir dos julgamentos pelo Conselho de Sentença ocorridos após a nova lei.
O Tribunal do Júri, apesar de muito criticado, é instituto consagrado na Carta Magna de 1988 e repleto de garantias constitucionais. Assim, é enorme a sua relevância para o sistema processual penal brasileiro, razão pela qual mereceu ampla reforma de seu procedimento pela Lei nº 11.689/08, a fim de adequá-lo aos novos influxos constitucionais e à necessidade atual e constante de celeridade, rapidez, simplificação e eficiência da prestação jurisdicional.
Uma das principais alterações do rito, enfocada neste artigo, trata-se do desaforamento, especificamente na redução do prazo, no caso de excesso de serviço, para 6 (seis) meses desde a decisão de pronúncia. Também foi incluída uma espécie de “aceleração” do julgamento, ainda que não seja caso de excesso de serviço ou de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri. Ambas as situações traduzem a intenção do legislador de trazer maior celeridade ao rito.
Outra modificação considerada de grande relevância diz respeito à extinção do protesto por novo júri, recurso extremamente censurado pela doutrina, taxado de anacrônico e causador de injustiças, pela dificuldade dos juízes na fixação de penas superiores a 20 anos, com o fim de evitar o ensejo à esta forma de impugnação.
Sua supressão traria, além de justiça à aplicação das penas quando os crimes justificam reprimendas mais rigorosas, celeridade ao processo, sem a possibilidade de mais uma via recursal que delongaria mais ainda o curso processual, quando já garantido por outras vias o devido processo legal. Restam, porém, críticas à extinção do protesto por novo júri, visto que muitos doutrinadores o entendiam como expressão da garantia constitucional do duplo grau de jurisdição, com reflexos na ampla defesa.
Em suma, diante do exposto neste artigo, conclui-se que a reforma do rito do Tribunal do Júri, trazida pela Lei nº 11.689/2008, parece ter, em grande parte, atendido seus objetivos de alcançar a celeridade, clareza e simplificação ao procedimento, atendendo ao princípio da razoável duração do processo previsto na Constituição Federal no art. 5º, LXXVIII.
Não está, porém, passível de críticas, pois, no afã de acelerar o andamento dos processos, deixou algumas lacunas e questionamentos, principalmente no que tange à preservação do devido processo legal e da ampla defesa e ao respeito à competência constitucional do Júri.
Por fim, analisando os benefícios proporcionados e as críticas formuladas, é possível concluir que a reforma ocasionou mais vantagens do que malefícios à sistemática do júri, sendo possível, ao longo de sua aplicação, a correção de qualquer prejuízo causado às garantias constitucionais do júri e aos direitos fundamentais.
BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró. Projeto nº 4.203/2001 (Tribunal do Júri). Material da 3ª aula da disciplina Processo Penal: Grandes Transformações, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Processual: Grandes Transformações – UNISUL/REDE LFG.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Direito Processual Penal. REsp 1183341/RR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 13/12/2012. Disponível em < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=protesto+por+novo+j%FAri&b=ACOR>. Acesso em 27/03/2013.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Direito Processual Penal. REsp 1046429/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 17/10/2012. Disponível em < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=protesto+por+novo+j%FAri&b=ACOR>. Acesso em 27/03/2013.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Direito Processual Penal. AgRg no REsp 1289868/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2012, DJe 20/08/2012. Disponível em < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=protesto+por+novo+j%FAri&b=ACOR>. Acesso em 27/03/2013.
BONFIM, Edilson Mougenot e PARRA NETO, Domingos. O novo procedimento do Júri: comentários à lei nº 11.689/2008. São Paulo: Saraiva, 2009.
BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm>. Acesso em 04/04/2009.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em 04/04/2009.
MOREIRA, Rômulo de Andrade. O fim do protesto por novo júri e a questão do direito intertemporal. Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080618092617625&query=rômulo%20de%20andrade%20moreira. Material da 6ª aula da disciplina Processo Penal: Grandes Transformações, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Processual: Grandes Transformações – UNISUL/REDE LFG.
NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 10ª edição. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2008.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11ª edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009.
[1] BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró. Projeto nº 4.203/2001 (Tribunal do Júri). Material da 3ª aula da disciplina Processo Penal: Grandes Transformações, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Processual: Grandes Transformações – UNISUL/REDE LFG. P. 20.
[2] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11ª edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009. P. 716.
[3] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 10ª edição. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2008. P. 580.
[4] BADARÓ, op. cit., p. 20.
[5] BADARÓ, op. cit., p. 32.
[6] NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. P. 407/408.
[7] BONFIM, Edilson Mougenot e PARRA NETO, Domingos. O novo procedimento do Júri: comentários à lei nº 11.689/2008. São Paulo: Saraiva, 2009. P. 150.
[8] Ibidem, p. 408.
[9] TOURINHO FILHO, op. cit., p. 837.
[10] Ibidem, p. 837/838.
[11] MOREIRA, Rômulo de Andrade. O fim do protesto por novo júri e a questão do direito intertemporal. Disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story= 20080618092617625&query=rômulo%20de%20andrade%20moreira. Material da 6ª aula da disciplina Processo Penal: Grandes Transformações, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Processual: Grandes Transformações – UNISUL/REDE LFG. P. 6.
[12] TOURINHO FILHO, op. cit., p. 839.
[13] NUCCI, op. cit., p. 408/410.
[14] Ibidem, p. 410.
Advogada da União da Advocacia Geral da União, atuante desde março/2007. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília - UnB. Especialista em Direito Público (Pós-graduação lato sensu - Universidade Anhanguera - Uniderp). Especialista em Direito Constitucional (Pós-graduação lato sensu - Universidade Anhanguera - Uniderp). Especialista em Direito Processual - Grandes Transformações (Pós-graduação lato sensu - Universidade do Sul de Santa Catarina - Unisul).<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NUNES, Regina Lopes Dias. Alterações no desaforamento e extinção do protesto por novo júri Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 abr 2013, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/34457/alteracoes-no-desaforamento-e-extincao-do-protesto-por-novo-juri. Acesso em: 23 dez 2024.
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