Os contratos administrativos, diferentemente dos contratos privados, são necessariamente formais e escritos. Utilizando-se da classificação civilista o contrato administrativo classifica-se como “consensual [bilateral], em regra, formal, oneroso, comutativo e realizado intuito personae. [...]; é formal porque se expressa por escrito e com requisitos especiais; [...]” (Meirelles, 2009: 214).
Note-se, portanto, que enquanto nos contratos privados vige a liberdade de forma, nos cotratos administrativos, ao contrário, a forma é inerente ao instrumento, sem cujo atendimento incide a pecha de nulidade. Mauro Sérgio dos Santos bem distingue a seara privada da pública em matéria de contratos:
Os contratos administrativos exigem maiores solenidades do que os contratos que envolvem apenas pessoas privadas. Isso ocorre para possibilitar maior publicidade e segurança jurídica aos contratos dessa natureza. Os contratos privados, em sua maioria, sequer se revestem sob a forma escrita, apresentando-se na maioria das vezes como contratos verbais; os contratos administrativos exigem uma série de formalidades, entre elas a adoção da forma escrita (2012: 605-606)
No mesmo sentido, destaca Maria Sylvia Zanella di Pietro, para quem, sob o aspecto formal, “exige-se, para todos os contratos da Administração, pelo menos a forma escrita”, dando ênfase à importância dessa exteriorização física do contrato administrativo (2006: 262).
A exigência de forma escrita pode ser inserida no estudo geral dos atos administrativos, considerando-se aqui o contrato administrativo como uma espécie de ato administrativo bilateral. Como espécie de ato administrativo, o contrato submete-se, em linhas gerais, aos requisitos do ato administrativo (objeto, motivo, finalidade, forma e competência). Sendo um dos requisitos do contrato a forma, e esta sendo um dos elementos vinculados do ato administrativo, sobre o qual o administrador não tem opção, algum vício na forma pode provocar a nulidade do ato (Meirelles, 2009: 223 e Carvalho Filho, 2010: 219).
Tanto é assim que o parágrafo único do art. 60 da LLC, logo em seu início, destaca a nulidade do denominado contrato verbal, isto é, aquele que não se reveste, pelo menos, da forma escrita. A correta interpretação do dispositivo exige seja aqui transcrito:
Parágrafo único. É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a 5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea "a" desta Lei, feitas em regime de adiantamento.
Uma primeira característica que convém destacar é a natureza de exceção do dispositivo, ou seja, mesmo para a hipótese veiculada no dispositivo acima a regra é que o contrato seja escrito, porém a Lei admite validade jurídica ao contrato não-escrito que atenda aos requisitos mencionados, quais sejam: a) tratar-se de compra; b) sejam de pronto pagamento, isto é, não excedam o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais); c) trate-se de regime de adiantamento.
Convém analisar cada um dos requistos de forma autônoma.
a) Compra
Ao falar em compra, o dispositivo quis afastar a utilização de contrato verbal para serviços. A distinção entre compras e serviços é veiculada na própria LLC, em enunciado destinado às definições (art. 6º); as compras estão definidas no inciso II e os serviços no inciso III.
b) De pronto pagamento (valor inferior a R$ 4.000,00)
O próprio dispositivo define o que entende por “pronto pagamento”. Cabe aqui, no entanto, distinguir o “pronto pagamento” da “pronta entrega” ou “entrega imediata”, conceitos que não podem ser confundidos. A definição de compra de “pronta entrega” ou “entrega imediata” está no §4º do art. 40 da LLC; trata-se daquelas compras cujo prazo de entrega ocorra em até 30 (trinta) dias. O art. 32, §1º, da LLC utiliza a expressão “pronta entrega” com mesmo sentido de “entrega imediata”, motivo por que aqui são consideradas equivalentes.
Podem ser feitas duas distinções básicas entre os conceitos de “pronto pagamento” e “pronta entrega” ou “entrega imediata”: primeiro, a classificação como “pronto pagamento” diz com o valor (menos R$ 4.000,00), enquanto a “entrega imediata” relaciona-se com o prazo de entrega (menos de 30 dias); segundo, os casos de “pronto pagamento” autorizam a utilização de contrato verbal (não-escrito), já nos casos de “entrega imediata” não há tanta informalidade, pois o que se dispensa é o “termo de contrato” e algumas outras formalidades, como a flexibilização nas exigências de habilitação (art. 32, §1º, da LLC) e no procedimento de entrega (art. 40, §4º, da LLC).
Portanto, ao tratar de exceção à forma escrita, há de se feita a correta e restritiva interpretação da expressão “pronto pagamento”, não a confundindo com a locução “pronta entrega” ou “entrega imediata”.
Por fim, na consideração do valor, deve-se ter em mente que se trata de uma única compra, e não de fracionamento de compra maior, que ultrapassa o limite de valor para o qual a Lei admite o contrato verbal como válido.
c) Regime de adiantamento (pagamento antecipado)
Por regime de adiantamento a Lei quer se referir ao conhecido pagamento antecipado. Essa antecipação é em regra vedada pelo art. 65, II, c, da LLC, bem como pela sistemática de pagamento disciplinada na Lei 4.320/64. O dispositivo da LLC veda expressamente; já a vedação da Lei 4.320 não está expressa, mas se presume do rito de processamento da despesa pública.
A referida Lei, que regula as finanças públicas, exige que as fases de “empenho” e “liquidação” ocorram antes do efetivo pagamento. Assim, não poderia a Administração empenhar e logo em seguida pagar, sendo necessária uma fase intermediária de liquidação, cujo procedimento exige a comprovação da execução, o que se dá pela apresentação de alguns documentos (art. 63, Lei 4.320/64). Assim, o pagamento antecipado seria procedimento sem respaldo legal.
No entanto, considerando a natureza de certos contratos, a doutrina e alguns julgados dos órgãos de controle têm afiançado o pagamento antecipado, desde que obedecidos alguns procedimentos cautelares prévios. Para um entendimento compilado e atualizado segundo entendimento do controle externo no âmbito federal, remete-se à Orientação Normativa nº 37, de 13 de dezembro de 2011, da Advocacia-Geral da União.
Voltando a esse requisito legal necessário para a utilização do contrato verbal, entende-se que a LLC admite o contrato verbal em razão da necessidade de pagamento imediato da despesa, inclusive em regime de adiantamento (antes da execução). Na prática, solicita-se um produto e se efetua o pagamento “em regime de adiantamento”, sem que se faça necessário um instrumento escrito. Resta admitida, assim, não só a contratação verbal, mas também a antecipação de pagamento.
A Lei parece vincular o conceito de “regime de adiantamento” ao requisito anteriormente analisado, qual seja a compra “de pronto pagamento”. Pela redação legal, nas compras “de pronto pagamento”, o pagamento é feito, como regra, em “regime de adiantamento”.
Assim, nota-se que o “regime de adiantamento” (i.e., pagamento antecipado) não é necessariamente um requisito do contrato verbal, senão uma faculdade, dada a natureza simples e peculiar dessa espécie de compra, cujo pagamento pode ser feito antes da entrega do produto. Fica aqui arrolado como requisito para um melhor entendimento prático.
CONCLUSÃO
Conclui-se, portanto, que o contrato administrativo deve ser, em regra, escrito. O contrato verbal, por conseguinte, é nulo. Admite-se, contudo, a existência de contrato verbal, desde que se reúnam os seguintes requisitos: a) seja uma compra, não um serviço; b) seja de pronto pagamento, isto é, de valor não superior a R$ 4.000,00 (quatro mil reais); c) seja possível o pagamento antecipado, não sendo este, propriamente um requisito, mas uma faculdade, sendo recomendável, portanto, o pagamento somente depois de recebido o produto.
Por fim, sendo o contrato verbal nulo, não se pode descuidar das hipóteses de convalidação, conforme previsto no art. 55 da Lei 9.784/99, mas isto deve ser objeto de estudo específico acerca da convalidação em sede administrativa.
REFERÊNCIAS
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2006.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 35 ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
SANTOS, Mauro Sérgio dos. Curso de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2012.
Procurador Federal. Pós-Graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DINIZ, Braulio Gomes Mendes. O contrato administrativo verbal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 maio 2013, 06:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35110/o-contrato-administrativo-verbal. Acesso em: 23 dez 2024.
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