1 INTRODUÇÃO
O art. 114, VIII da Constituição Federal estabelece a competência material da Justiça do Trabalho para a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a , e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.
A cobrança de juros sobre as contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho tem sido objeto de diversas controvérsias, ensejadoras de insegurança jurídica.
O presente trabalho objetiva examinar os pontos objeto de cizânia jurisprudencial.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Fato gerador
Quando o crédito trabalhista decorrente de sentença proferida pela Justiça do Trabalho é referente a serviços prestados até 3/12/2008, há entendimento de que a obrigação previdenciária é devida a partir do segundo dia do mês seguinte à liquidação da sentença, em razão do disposto no caput do art. 276 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/1999, in verbis:
Art. 276. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o recolhimento das importâncias devidas à seguridade social será feito no dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença.
Todavia, deveriam ter sido adotadas as competências dos meses em que foram prestados os serviços pelos quais a remuneração é devida, na medida em que, conforme dispõe o art 51 da Instrução Normativa RFB nº 971/2009, constitui fato gerador da obrigação previdenciária principal: (i) em relação ao segurado empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e contribuinte individual, o exercício de atividade remunerada; (ii) em relação ao empregador doméstico, a prestação de serviços pelo segurado empregado doméstico, a título oneroso; (iii) em relação à empresa ou equiparado à empresa, a prestação de serviços remunerados pelos segurados empregado, trabalhador avulso, contribuinte individual e cooperado intermediado por cooperativa de trabalho.
Com o escopo de conferir segurança jurídica na fixação do momento em que se considera ocorrido o fato gerador, a Medida Provisória nº 449/2008 (DOU de 4.12.2008), convertida na Lei nº 11.941/2009, incluiu os §§ 2º e 3º ao art. 43 da Lei nª 8.212/91, estabelecendo como fato gerador das contribuições previdenciárias a data da prestação dos serviços e determinando a incidência dos acréscimos moratórios desde a época da prestação dos serviços.
Diante disso, a 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, no julgamento do RR 142100-18.2009.5.12.0029[1], firmou entendimento no sentido de que: (i) "para os serviços prestados antes de 4/12/2008, os juros e a multa moratória sobre as contribuições previdenciárias são aplicáveis somente a partir do segundo dia do mês seguinte à liquidação da sentença, nos termos do art. 276 do Decreto nº 3.048/99"; (ii) "quando a prestação dos serviços ocorrer após 4/12/2008, os encargos moratórios das contribuições sociais devem incidir desde a data da efetiva prestação dos serviços, conforme preceitua o art. 43, § 2º e § 3º, da Lei nº 8.212/90, em sua atual redação".
2.2 Taxa dos juros de mora
Dispõe o art. 879, § 4º da CLT que a atualização do crédito devido à Previdência Social observará os critérios estabelecidos na legislação previdenciária.
KERTZMAN ensina:
A sistemática de cálculo dos juros moratórios referentes às contribuições previdenciárias foi alvo de profunda alteração, com a publicação da Medida Provisória 449, de 03.12.2008. A partir desta MP, que revogou o art. 34 da Lei n. 8.212/91, os juros passaram a ser regulamentados pelo § 3º, do art. 61, da Lei n. 9.430/96, unificando a sistemática para todos os tributos arrecadados pel RFB - Receita Federal do Brasil.
Não obstante, o Tribunal Superior do Trabalho tem entendido que os juros de mora relativos às contribuições previdenciárias devidas em decorrência de decisão judicial trabalhista devem ser calculados conforme a regulamentação específica prevista no art. 883 da CLT c/c o § 1º do art. 39 da Lei nº 8.177/91, e não a taxa SELIC, que engloba juros e correção, conforme julgado a seguir ementado:
RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA E MULTA. TERMO INICIAL. TAXA SELIC. NÃO APLICAÇÃO. A Constituição da República determina que -as contribuições sociais para custeio da seguridade social incidam sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício- (art. 195, I, -a-, CF). Pela CF, a incidência se faz a partir do momento em que tais rendimentos sejam pagos ou creditados, o que afasta a incidência de juros de mora e de multa antes da apuração judicial do crédito, nos casos em que se tratar de valores resultantes de condenação ou acordo judicial. Desse modo, com respeito a processos em que se apuram contribuições previdenciárias decorrentes de decisão judicial (sentença ou acordo), só haverá incidência de juros de mora e de multa se a parte executada não efetuar o recolhimento da parcela devida ao INSS no prazo que lhe faculta a ordem jurídica, qual seja, até o dia dois do mês subsequente ao pagamento realizado ao obreiro, nos termos do artigo 276 do Regulamento da Previdência Social (Decreto n. 3.048/99). Essa regra se aplica tanto aos valores pagos em virtude da liquidação da sentença ou do cumprimento do acordo, quanto às contribuições devidas referentes aos salários pagos durante o pacto laboral só reconhecido em juízo (parágrafo único do art. 876 da CLT), ainda que abrangendo vários anos atrás. Considera-se que esse critério se coaduna com o espírito da Lei que, ao prever a possibilidade de execução das contribuições previdenciárias por esta Justiça do Trabalho, inclusive incidentes sobre os salários pagos no curso da relação de emprego reconhecida judicialmente, com certeza não pretendeu onerar excessivamente os contribuintes, com a criação de possíveis situações inusitadas como, por exemplo, a do crédito previdenciário ultrapassar o valor do crédito principal devido ao trabalhador. Registre-se, ainda, que alteração legal ocorrida em lei (nova redação do art. 43 da Lei n. 8.212/91, conferida pela MP n. 449, de 3.12.2008, convertida na Lei n. 11.941/09), se interpretada com as normas constitucionais e legais que regem a matéria, não autoriza o entendimento de ter sido alterada a forma de cálculo das contribuições previdenciárias devidas em decorrência de decisão judicial. Ao crédito trabalhista se aplicam juros de mora conforme a regulamentação específica prevista no art. 883 da CLT c/c § 1º do art. 39 da Lei 8.177/91, e não a taxa SELIC, que engloba juros e correção monetária. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido no aspecto. 2. FÉRIAS. SÚMULA 126/TST. Dada a soberania das Cortes Regionais no exame da matéria fática, mostra-se inviável o processamento de recurso de revista contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional que consigna que a autora não ficou afastada por mais de seis meses no período aquisitivo. Incidência da Súmula 126/TST. Recurso de revista não conhecido no aspecto. ( RR - 692900-02.2009.5.12.0026 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 12/12/2012, 3ª Turma, Data de Publicação: 14/12/2012)
Tal orientação pretoriana, data maxima venia, merece críticas.
A uma, porque o art. 883 da CLT[2] teve a sua redação dada pela Lei nº 2.244/54, sendo transparente que tal dispositivo nada tem a ver com execução de contribuições previdenciárias na Justiça do Trabalho, que surgiu com a inclusão do § 3º do art. 114 da Constituição, incluído pela Emenda Constitucional nº 20/98.
A duas, porquanto a Lei nº 8.177/91 estabelece regras para desindexação da economia, não tendo o seu art. 39[3] qualquer pertinência com a cobrança contribuições previdenciárias.
A três, porque tal posicionamento nega vigência ao disposto no art. 879, § 4º da CLT.
Com efeito, o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal[4], ao tratar dos juros de mora sobre contribuições previdenciárias, estabelece serem eles, a partir de fev/92, de 1%, sendo que, para fatos geradores ocorridos: a) Até 31.12.94: taxa Selic, a partir de abr/97 até o mês anterior ao pagamento; 1% no mês do pagamento; b) A partir de jan/95: I) De jan/95 a mar/95: TMMCTN (Taxa Média Mensal de Capacitação do Tesouro Nacional); II) A partir de abr/95: taxa Selic até o mês anterior ao pagamento; 1% no mês do pagamento.
Tem-se, portanto, que as contribuições incidentes sobre remunerações pagas durante o período trabalhado, com ou sem vínculo empregatício, quando, por qualquer motivo, não houver sido executada a cobrança pela Justiça do Trabalho, estão sujeitas a juros de mora calculados nos termos do referido Manual, enquanto as contribuições decorrentes das sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho podem sofrer a incidência de juros moratórios calculados de forma diversa, malgrado seja o mesmo o critério de cálculo estabelecido na legislação previdenciária.
3 CONCLUSÃO
Do quanto se expôs, conclui-se que o fato gerador das contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho deve ser considerado como ocorrido nas competências dos meses em que foram prestados os serviços pelos quais a remuneração é devida, e que os juros de mora devem ser calculados de acordo com a SELIC.
REFERÊNCIAS
AMADO, Frederico Augusto Di Trindade. Direito Previdenciário Sistematizado. Salvador: Juspodivm, 2010.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 17. ed. Niterói: Impetus, 2012.
KERTZMAN, Ivan. As Contribuições Previdenciárias na Justiça do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2012.
[1] BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. 7ª Turma. RR nº 142100-18.2009.5.12.0029. Relator: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho. Publicado no DJU de 24 de maio de 2013.
[2] Art. 883 - Não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial. (Redação dada pela Lei nº 2.244, de 23.6.1954)
[3] Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva, sentença normativa ou cláusula contratual sofrerão juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento. § 1° Aos débitos trabalhistas constantes de condenação pela Justiça do Trabalho ou decorrentes dos acordos feitos em reclamatória trabalhista, quando não cumpridos nas condições homologadas ou constantes do termo de conciliação, serão acrescidos, nos juros de mora previstos no caput juros de um por cento ao mês, contados do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação. § 2° Na hipótese de a data de vencimento das obrigações de que trata este artigo ser anterior a 1° de fevereiro de 1991, os juros de mora serão calculados pela composição entre a variação acumulada do BTN Fiscal no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e 31 de janeiro de 1991, e a TRD acumulada entre 1° de fevereiro de 1991 e seu efetivo pagamento.
[4] Disponível em: < https://www2.jf.jus.br/phpdoc/sicom/arquivos/pdf/manual_de_calculo_JF_2011.pdf>. Acesso em: 30 maio 2013.
Procurador Federal, pós-graduado em Direito Constitucional do Trabalho e pós-graduando em Direito Tributário pela Universidade Federal da Bahia.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Iuri Cardoso de. Notas sobre a incidência de juros na execução de contribuições previdenciárias na Justiça do Trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jun 2013, 06:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35370/notas-sobre-a-incidencia-de-juros-na-execucao-de-contribuicoes-previdenciarias-na-justica-do-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
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