RESUMO: muitas normas coletivas, senão todas, instituem contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Conforme será visto no presente artigo, tais cláusulas são nulas de pleno direito.
PALAVRAS CHAVES: Acordo Coletivo de Trabalho – Convenção Coletiva de Trabalho – Norma Coletiva – Cláusula – Contribuição Sindical – Não Sindicalizados – Ilegalidade.
O presente artigo tem por objetivo a análise da legalidade de cláusulas contidas em acordos ou convenções coletivas de trabalho que instituem contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados.
A maioria das normas coletivas nos dias atuais, senão todas, dispõe que a empregadora deverá descontar na folha de pagamento as contribuições em favor da entidade sindical, independente de sua filiação sindical. Assim, os dispositivos convencionais são claros ao permitirem que os empregadores retirem da folha de pagamento do empregado os descontos relativos as contribuições em favor da entidade sindical, não importando se o mesmo é filiado ou não ao sindicato.
Mesmo que a norma coletiva vede o desconto do empregado que manifeste “essa intenção ao sindicato, em documento escrito e assinado”, tal ato configura verdadeira ilegalidade.
É o reconhecimento formal de que o desconto é ilegal, mas que mesmo assim será efetuado, a não ser que o próprio empregado demonstre sua vontade por escrito, dentro de um prazo unilateralmente fixado.
A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe em seu art. 5º, onde estão ilustrados os Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, inc. XX, sobre a liberdade de associação: “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”.
A abrangência das referidas cláusulas podem ferir, sem dúvida, o princípio insculpido na Carta Magna de 1988 eis que a previsão é de que a associação à entidade de classe somente aconteça por manifestação expressa de vontade.
Assim, o desconto obrigatório de não sindicalizados retira a liberdade do cidadão de assim decidir.
Veja que se assim o fosse, estar-se-ia diante de uma indevida equiparação entre associado e não associado: ambos teriam descontado o valor, só que o associado poderia usufruir de todos os benefícios decorrentes, enquanto o não associado continuaria na mesma situação, apenas contribuindo com seu esforço.
Tal fato faz o que a relação sinalagmática entre sindicato e membro se transmude, indevidamente, em ato gracioso por parte do funcionário não sindicalizado, em contra a sua vontade.
Há clara violação da isonomia entre os empregados, pois se verifica tratamento igualitário entre aqueles que se encontram em situação diferenciada.
A garantia de livre associação profissional ou sindical encontra guarida no art. 8º, V da Carta Magna, desta vez inserta no capítulo referentes aos Direitos Sociais.
É fato que o art. 462 da Consolidação das Leis Trabalhistas permite o desconto no salário do empregado se decorrente de acordo coletivo. No entanto, esse mandamento deve ser contido dentro de balizas constitucionais e infralegais, caso contrário, haveria o ferimento do princípio constitucional da intangibilidade salarial, além de outros já expostos, atingindo o conteúdo normativo do art. 114, § 2º da Constituição Federal.
Nesse sentido, a Orientação Jurisprudencial nº. 119/SDC do egrégio Tribunal Superior do Trabalho afirma expressamente:
“A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados. (Destacamos).”
Referida orientação é clara ao afirmar que é inconstitucional o desconto efetuado na folha de salário a empregado não sindicalizado, tornando-se nula de pleno direito qualquer disposição que assim proceda, mesmo que prevista em acordo coletivo.
E mais, qualquer valor que efetivamente tenha sido descontado deve ser restituído, pois caracteriza enriquecimento sem causa, ilícito, vedado pela legislação pátria.
A Convenção nº. 87 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que dispõe sobre a Liberdade Sindical e o Direito Sindical, sobreleva o direito à associação como cláusula de pacificação mundial e de melhora nas condições do trabalho, senão vejamos:
“CONVENÇÃO (87) - SOBRE A LIBERDADE SINDICAL E A PROTEÇÃO DO DIREITO SINDICAL' A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho: Convocada em São Francisco pelo Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho e reunida em 17 de junho de 1948, em sua trigésima primeira reunião; Tendo decidido adotar, na forma de convenção, proposições relativas à liberdade sindical e à proteção do direito sindical, tema que constitui a sétima questão da ordem do dia da reunião; Considerando que o Preâmbulo à Constituição da Organização Internacional do Trabalho declara que "o reconhecimento do princípio da liberdade sindical constitui um meio de melhorar as condições de trabalho e de promover a paz";
Considerando que a Declaração de Filadélfia reafirma que "a liberdade de expressão e de associação é condição essencial para a continuidade do progresso";
Considerando que a Conferência Internacional do Trabalho, em sua trigésima reunião, adotou, por unanimidade, os princípios em que deve fundamentar-se a regulamentação internacional;
Considerando que a Assembléia Geral das Nações Unidas, em sua segunda reunião, endossou esses princípios e solicitou à Organização Internacional do Trabalho que desse continuidade a seus esforços para tornar possível a adoção de uma ou várias convenções internacionais, adota, no nono dia de julho de mil novecentos e quarenta e oito, a seguinte Convenção que pode ser citada como a Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Proteção do Direito Sindical, de 1948. (Destacamos).”
É inquestionável que um acordo coletivo que ofende a ordem constitucional e internacional não pode prevalecer em detrimento das liberdades conquistadas pelos trabalhadores, ao longo da história.
Tratam-se de direitos que são buscados desde os tempos mais remotos e passaram a ser garantidos e escritos somente após o fim do antigo Estado Absolutista.
A aceitação da obrigatoriedade de associação e de contribuição é um retorno aos primórdios da espécie humana.
Ainda, a Convenção 87 da OIT preconiza em seu teor o direito à liberdade de se associar, com o seu conseqüente corolário de arcar com os custos necessários para tanto:
“PARTE 1. LIBERDADE SINDICAL
Artigo 1° - Todo País-membro da Organização Internacional do Trabalho, no qual vigore a presente Convenção, compromete-se a tomar efetivas as disposições seguintes.
Artigo 2° - Trabalhadores e empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão o direito de constituir, sem prévia autorização, organizações de sua própria escolha e, sob a única condição de observar seus estatutos, a elas se filiarem (Destacamos).”
Espancando quaisquer dúvidas, evidenciando a impossibilidade de manutenção do desconto assistencial de não associado, são suficientes os acórdãos do TST abaixo transcritos, que denotam a mansa e vasta jurisprudência sobre a situação exposta:
“RECURSO DE REVISTA - COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA E ASSISTENCIAL - EMPREGADOS NÃO FILIADOS AO SINDICATO - ILEGALIDADE. A teor do § 4º do art. 896 da CLT e da Súmula 333, resta inviabilizado o apelo revisional que pretende investir-se contra jurisprudência sedimentada pelo Tribunal Superior do Trabalho, como, no caso, a Orientação nº 119 da E. SDC, que reputa nulo qualquer desconto de contribuição em favor de entidade sindical, que esteja em conflito com a liberdade de associação e de sindicalização, mesmo que fruto de norma coletiva. Eventual descompasso com manifestações do E. STF desafiam recurso próprio.
Recurso não conhecido.
(RR 693755/2000, 2ª Turma, rel. Juiz Convocado JOSÉ PEDRO DE CAMARGO, DJ 28/6/2002. Destacamos).
HOMOLOGAÇÃO DA RESCISÃO CONTRATUAL.
Não há ilegalidade alguma em cláusula de Convenção Coletiva de Trabalho em que o Sindicato patronal celebra Convenção Coletiva com o Sindicato profissional no sentido de que as empresas pagarão uma taxa por homologação de rescisão contratual, já que o que é vedado pela lei é cobrar qualquer valor do empregado para esse fim o que não ocorre "in casu".
TAXA ASSOCIATIVA.
A cobrança de taxa assistencial de todos os integrantes da categoria, sindicalizados ou não, fere o princípio da liberdade de associação, consagrado no inciso V do art. 8º constitucional, cujo corolário é a liberdade de contribuir para a entidade sindical correspondente, bem como o disposto no art. 5º, inciso XX, da Constituição Federal.
Recurso ordinário parcialmente provido.
(ROAD 677281/2000, Dissídios Coletivos, rel. Min. VANTUIL ABDALA, DJ 1/12/2000. Destacamos).
REDUÇÃO DO INTERVALO PARA DESCANSO E REFEIÇÃO.
A redução do intervalo de refeição e descanso, no presente caso, não resultou no aumento da carga laboral diária do trabalhador, pelo que não se constitui em uma ilegalidade. Ademais, a Constituição Federal autoriza expressamente a livre estipulação sobre o horário de trabalho pela via negocial e também assegura e incentiva a composição autônoma dos conflitos coletivos no seu art. 7º, incisos XXII e XXIII.
DESCONTO ASSISTENCIAL.
A cobrança do desconto assistencial de todos os integrantes da categoria, sindicalizados ou não, fere o princípio da liberdade de associação consagrado no inciso V do art. 8º constitucional, princípio que constitui cânone do Direito Internacional do Trabalho - (Convenção nº 87 da OIT, art. 2º), cujo corolário é a liberdade de contribuir para a entidade sindical correspondente, bem como o disposto no art. 5º, inciso XX, da Constituição Federal.
Recurso ordinário parcialmente provido.
(ROAA 626094/2000, Dissídios Coletivos, rel. Min. VANTUIL ABDALA, DJ 30/6/2000. Destacamos).”
Assim sendo, não há dúvida de que estamos diante de patente ilegalidade, quando nos deparamos diante de cláusulas em acordos ou convenções coletivas de trabalho que dispõe que tanto sindicalizados quanto não sindicalizados devem contribuir com todas as contribuições estabelecidas nos instrumentos normativos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 22ª edição. Ed. Saraiva, 2001.
CARRION, Valentim. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 34ª edição. Ed. Saraiva 2009.
CUNHA, Maria Inês M. S. Alves. Direito do Trabalho. 5ª edição. Ed. Saraiva, 2009.
MARANHÃO, Délio. Instituições de Direito do Trabalho. 20ª edição. Ed. LTr, 2002.
OLIVEIRA, Francisco Antônio. Comentários a Consolidação das Leis do Trabalho. 3ª edição. Ed. Revista dos Tribunais, 2005.
OIT, Organização Internacional do Trabalho
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª Edição. Ed. Malheiros, 2009.
Advogada e Procuradora do Município de Diadema/SP. Bacharel em Direito pelas Faculdades Metropolitanas Unidas.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBIERI, Fabiana Amendola. Da ilegalidade das cláusulas constantes de normas coletivas que impõe o pagamento de contribuição sindical a empregados não sindicalizados Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jun 2013, 07:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35586/da-ilegalidade-das-clausulas-constantes-de-normas-coletivas-que-impoe-o-pagamento-de-contribuicao-sindical-a-empregados-nao-sindicalizados. Acesso em: 23 dez 2024.
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