DESCARTES, René. Regras para a Direção do Espírito. Lisboa. Editorial Estampa. 1977.
O filósofo René Descartes nasceu 1596 em Haia, na França, e faleceu em 1650 em Estocolmo. Estudou Matemática, Física e Filosofia. O autor é considerado um dos fundadores da filosofia moderna, com destaque à criação do sistema baseado no sujeito do conhecimento da ciência para fundamentar o mundo representado. Para o autor, a ideia de verdade está intrinsecamente relacionada ao método.
Dentre as diversas obras que elaborou está a “Regras para a Direção do Espírito”. Neste texto, o autor revela a capacidade prática da filosofia, no sentido de que a busca pela verdade representa uma tentativa de garantia do conhecimento com vistas à boa condução da vida. Estas ideias demonstram a diferença frente à ciência medieval vigente na época, a qual se apoiava nos dogmas teológicos como fontes de revelação, os quais Descartes sugeriu que deveriam ser colocados à prova pelo fato de não primar pela fundamentação racional.
Logo em sua primeira regra, o autor demonstra o caminho para que o espírito consiga elaborar juízos firmes e verdadeiros sobre as coisas que se apresentam. Dessa forma, Descartes se preocupou em ofertar ao conhecimento bases sólidas nas quais pudesse ser utilizados de forma irrestrita em diferentes situações. Este conhecimento contemplaria uma estrutura que permitiria sempre inferências irrefutáveis, posto que, para o autor, a ciência é um conhecimento certo e evidente.
Partindo da matemática para dar fundamento à sua teoria, Descartes enxerga neste modelo o rigor disciplinar e a capacidade de propiciar a ordem e a medida. Estes elementos são fundamentais para a construção do seu método. Contudo, o autor não visa copiar os preceitos da matemática universal, mas apenas utilizá-los como fundamentos ordenadores de um método para atingir um saber seguro.
O autor sugere esse novo modelo com o intuito de criar uma nova modalidade do saber, a qual desvencilha o conhecimento da concepção escolástica de revelação como primeira fonte de verdade. Assim, o autor diz que, nestes termos, o conhecimento passa a caminhar de forma autônoma, o que revela, o saber coloca sua própria essência como fundamento de si mesmo.
O método adequado é necessário à procura da verdade. Dessa forma, o autor afirma, em sua regra II, que é preciso trabalhar somente com os objetos cujo conhecimento é certo e indubitável. Ou seja, um saber correto advém da investigação que obtemos em uma intuição clara e evidente, ou que se possa deduzir com certeza.
A partir da terceira regra, Descartes aduz que o correto é que seja investigado tudo aquilo que intuímos, em detrimento das coisas que suspeitamos. Em verdade, tudo o que intuímos de forma clara e evidente pode vir a ser deduzida com certeza, caso contrário, de outra forma, não se adquire a ciência.
Neste sentido, a intuição seria o conceito que a inteligência pura e atenta forma com tanta facilidade e clareza que não fica absolutamente nenhuma dúvida sobre o que compreendemos. Essa intuição não pode ser confundida com a confiança instável dada pelos sentidos ou o juízo enganador de uma imaginação. Logo, intuição intelectual seria a forma como o espírito enxerga.
As regras de Descartes demonstram o método que ele sugere e, a intuição e a dedução são as únicas formas de se alcançar o conhecimento para o autor. Dessa forma, sugere que devemos treinar nosso espírito para saber intuir cada coisa particular e deduzir umas das outras, utilizando todos os recursos do entendimento, da imaginação, dos sentidos e da memória. O autor diz que se deve estudar o que intuímos claramente para chegarmos à certeza, e não aquilo que suspeitamos, sob pena de não se adquirir a ciência.
A intuição intelectual representa o modo com o qual o espírito vê e não a intuição mística ou religiosa. Por outro lado, a dedução corresponde à conclusão necessária tirada de outras coisas conhecidas com certeza. Todavia, mesmo que a verdade não se mostre totalmente evidente, esta pode ser deduzida por princípios verdadeiros já apreendidos pela intuição, por meio de um movimento contínuo e ininterrupto de pensamento. Assim, se desconhecemos etapas de um saber, é possível, através da dedução, que esse se torne evidente por meio da sequência das outras verdades que estão ligadas a esse.
O autor ressalta veementemente a distinção entre estas duas estruturas do conhecimento. Logo, a intuição intelectual se diferencia da dedução necessária à medida que, nesta, se realiza o movimento de sucessão das evidências. Por outro lado, a intuição significa a apreensão da certeza em uma enunciação sobre o dado intuído. Ambos são métodos fidedignos, sendo indispensáveis ao acesso à ciência para que sejam eliminadas as chances de erros.
O método proposto por Descartes se apoia em duas premissas fundamentais, quais sejam, a de que não se poder tomar o falso pelo verdadeiro e nem aplicar as regras como princípios simples com o único fim de atingir a ciência. Esses preceitos revelam o caminho para o conhecimento seguro e devem ser estritamente obedecidos para não incorrer em erros
Considerando as premissas supracitadas, percebe-se o valor fundamental do método, posto que este permite uma explicação coerente da utilização do intelecto e da forma de se encontrar deduções para todas as coisas. A contrário sensu, descumprir essas regras significa possivelmente incorrer em erro.
A ordenação deve sempre se iniciar das proposições mais simples para as mais complexas. Desse modo, são consideradas asserções simples tudo aquilo que contempla e conserva a natureza das coisas. Para diferenciá-las das complexas e prosseguir ordenadamente, mister que se deduza uma verdade da outra.
Descartes classifica as coisas em absoluta e relativa. Absoluta seria as que “contém em si a natureza pura e simples sobre a qual versa uma questão”, já as relativas são as que “tem a mesma natureza ou pelo menos um de seus elementos em participação, em virtude do que se pode reportá-lo ao absoluto e dele deduzi-lo, construindo uma série; mas ele encerra, ademais, em seu conceito outras coisas que chamo relações”. Assim, é possível concluir que poucas são as coisas simples na natureza e que se podem acessar pela intuição imediata. Logo, a dedução deve ser utilizada para evoluir progressivamente das coisas simples às complexas.
Essa forma de se buscar o conhecimento de forma contínua e sem interrupção leva o autor a ventilar a ideia de que se deve atrelar o pensamento das coisas relacionadas ao o nosso propósito e reuni-las em uma enumeração suficiente e ordenada. Essa acepção de enumeração tem caráter indutivo e significa a “investigação diligente e cuidadosa” das questões e que dela podemos concluir com certeza e evidência.
Ademais, entende que a enumeração suficiente ou indução corresponde somente àquelas que nos oferta a verdade em sua conclusão com mais certeza do que qualquer outro gênero de prova, exceto a simples intuição. A enumeração ou indução corresponde a um meio satisfatório de assegurar o conhecimento, pois com ela se obtém facilmente, partindo-se de uma ordem bem estabelecida, um conjunto de tarefas que pareciam tortuosas a priori.
Para ilustrar seu raciocínio, o autor faz alusão à geometria, no sentido de que, quando se calcula o perímetro de um único círculo, tal resultado pode ser aplicado aos outros círculos iguais, sem que seja necessário se repetir o procedimento novamente.
O método para Descartes significa a ordem e disposição das coisas, para as quais é necessário dirigir toda agudeza do espírito para se chegar à verdade. Isso ocorreria sempre que, do espírito, diminuirmos progressivamente os problemas complicados e obscuros a outros mais simples, e, partindo destes, tentar elevar o grau de conhecimento de todas as outras coisas. Assim, deduzindo umas verdades de outras, seria possível distinguir as coisas simples das mais complexas e prosseguir ordenadamente na investigação. O autor ainda aponta que se existem algumas coisas que nossa cognição não consegue intuir de forma adequada, são nestas que devemos concentrar nossos esforços, no sentido de que se estude até enxergá-las de forma clara.
Na busca do conhecimento científico verdadeiro, o autor adverte que é necessário diligenciar toda a força do espírito para se obter clareza quanto ao modo verdadeiro das coisas intuídas. Assim, é preciso vincular-se nelas tempo necessário até enxergar a verdade por intuição, de tal maneira clara e distinta. Logo, a intuição intelectual e a dedução necessária são fundamentais para a consecução deste objetivo.
Advogado, Mestrando em Direito na Universidade Federal da Bahia (UFBA), Especialista em Direito Constitucional e Direito Processual Civil pela AVM Faculdade Integrada, Formado em Direito na Universidade Estadual de Santa Cruz, BA, (UESC).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIêGO EDINGTON ARGôLO, . Regras para a Direção do Espírito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jun 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35617/regras-para-a-direcao-do-espirito. Acesso em: 23 dez 2024.
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