SUMÁRIO. 1. Introdução. 2. Da responsabilidade do construtor e o prazo de garantia das construções. 3. Considerações Finais. 4. Referências bibliográficas.
RESUMO
Analisa a natureza jurídica do prazo previsto no artigo 618 do Código Civil, que trata da responsabilidade do construtor pelos imóveis por ele construídos.
1. INTRODUÇÃO
Hodiernamente, temos nos deparado com uma infinidade de ofertas de imóveis à venda, muitos ainda em fase de construção. Como é sabido, não raro são os defeitos encontrados nos imóveis após a entrega, tais como problemas estruturais, rachaduras no piso, infiltração nas paredes, goteiras, etc.
Dessa forma, torna-se importante saber o que nosso ordenamento jurídico dispõe sobre a responsabilidade dos construtores e, principalmente, o prazo em que é possível reclamar dos vícios eventualmente encontrados.
2. DA RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR E O PRAZO DE GARANTIA DAS CONSTRUÇÕES
De acordo com o art. 618 do Código Civil, o construtor responde pela solidez e segurança da obra pelo prazo de cinco anos:
Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.
Deve-se ressaltar que esse prazo de cinco anos refere-se ao prazo de garantia da construção e não a prazo de decadência ou de prescrição. Nesse sentido, posiciona-se a doutrina e a jurisprudência majoritárias, conforme se infere dos julgados abaixo:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR. DEFEITOS DA CONSTRUÇÃO. PRAZOS DE GARANTIA E DE PRESCRIÇÃO. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. IMPROVIMENTO.
I. Cabe a responsabilização do empreiteiro quando a obra se revelar imprópria para os fins a que se destina, sendo considerados graves os defeitos que afetem a salubridade da moradia, como infiltrações e vazamentos, e não apenas aqueles que apresentam o risco de ruína do imóvel.
II.- Na linha da jurisprudência sumulada desta Corte (Enunciado 194), 'prescreve em vinte anos a ação para obter, do construtor, indenização por defeitos na obra'. Com a redução do prazo prescricional realizada pelo novo Código Civil, referido prazo passou a ser de 10 (dez) anos. Assim, ocorrendo o evento danoso no prazo previsto no art. 618 do Código Civil, o construtor poderá ser acionado no prazo prescricional acima referido. Precedentes.
III. Agravo Regimental improvido.
(STJ, AgRg no Ag 1208663/DF, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/11/2010, DJe 30/11/2010)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR. DEFEITOS DA OBRA. CAPACIDADE PROCESSUAL. PERSONALIDADE JURÍDICA. SÚMULA N. 7/STJ. PRAZOS DE GARANTIA E DE PRESCRIÇÃO. 618/CC. SÚMULA N. 194/STJ. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. IMPROVIMENTO.
I. Na linha da jurisprudência sumulada desta Corte (Enunciado 194), 'prescreve em vinte anos a ação para obter, do construtor, indenização por defeitos na obra'.
II. O prazo estabelecido no art. 618 do Código Civil vigente é de garantia, e, não, prescricional ou decadencial.
III. O evento danoso, para caracterizar a responsabilidade da construtora, deve ocorrer dentro dos 5 (cinco) anos previstos no art. 618 do Código Civil. Uma vez caracterizada tal hipótese, o construtor poderá ser acionado no prazo prescricional de vinte (20) anos. Precedentes.
IV. Agravo regimental improvido.
(STJ, AgRg no Ag 991883/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 12/06/2008, DJe 04/08/2008).
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 1245 DO CÓDIGO CIVIL DE 1.916 (ART. 618, CC/2002). PRAZOS DE GARANTIA E DE PRESCRIÇÃO. PRECEDENTE. ENUNCIADO SUMULAR N.194/STJ. CONDOMÍNIO. DEFEITOS DE CONSTRUÇÃO. ÁREA COMUM. LEGITIMIDADE ATIVA.INTERESSES DOS CONDÔMINOS. DESISTÊNCIA. EXCLUSÃO. ARTS. 2º E 267, VIII, CPC. CONDENAÇÃO MANTIDA. CASO CONCRETO. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.
I - Na linha da jurisprudência sumulada (enunciado n. 194) deste Tribunal, fundada no Código Civil de 1916, “prescreve em vinte anos a ação para obter, do construtor, indenização por defeitos na obra”.
II - O prazo de cinco (5) anos do art. 1245 do Código Civil, relativo à responsabilidade do construtor pela solidez e segurança da obra efetuada, é de garantia e não de prescrição ou decadência. Apresentados aqueles defeitos no referido período, o construtor poderá ser acionado no prazo prescricional de vinte (20) anos".
III - O condomínio tem legitimidade ativa para pleitear reparação de danos por defeitos de construção ocorridos na área comum do edifício. Havendo, no entanto, pedido seu de ser excluído do feito, é de rigor seu acolhimento, ainda que fundado em premissa equivocada.
IV - Em se tratando de direitos disponíveis, a parte pode livremente optar em desistir da ação, mesmo que sua pretensão possivelmente viesse a ser acolhida. Nos termos do art. 2º, CPC, "nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer".
V - A exclusão do condomínio, no caso, não tem o condão de alterar a condenação da ré, uma vez presente o interesses dos condôminos também na reparação dos danos existentes às áreas comuns. (STJ, REsp 215.832/PR, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 06/03/2003, DJ 07/04/2003, p. 289).
Isto quer dizer que os defeitos surgidos no imóvel durante o prazo de cinco anos devem ser reparados pelos construtores, que devem ser acionados no prazo prescricional legal, havendo controvérsias se esse prazo é de 10 (dez) ou 3 (três) anos.
Como se trata de exigência de uma prestação, tal prazo é prescricional e não decadencial.
Atualmente, a doutrina tem diferenciado a prescrição e a decadência com base na classificação de direitos subjetivos: direitos potestativos e direitos a uma prestação. Assim, enquanto a decadência seria a perda do exercício de um direito potestativo, a prescrição seria a extinção da pretensão a uma prestação. Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho (2007, p. 465) sintetizam o conceito de um e outro:
Direitos a uma prestação: Nesta categoria de direitos, encontram-se aqueles que têm por finalidade um bem da vida a conseguir mediante uma atividade (prestação) – positiva ou negativa – a que está submetida um sujeito passivo. (…) Entre eles, arrolem os direitos de crédito, como uma prestação positiva a exigir-se (…).
Direitos potestativos: Nesta segunda categoria, enquadram-se os direitos mediante os quais determinadas pessoas podem influir, como uma declaração de vontade, sobre situações jurídicas das outras. Trata-se de direitos insuscetíveis de violação, pois a eles não corresponde qualquer prestação (…).
Dúvidas surgem com relação ao prazo de 180 (cento e oitenta) dias previsto no parágrafo único do art. 618 do Código Civil:
Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito.
A uma primeira leitura do dispositivo, parece que tal prazo é de prescrição, ou seja, que o comprador do imóvel tem apenas 180 (cento e oitenta) dias para propor a ação de reparação caso verificados vícios no imóvel. Contudo, preferimos a posição de Luiz Antonio Scavone Junior (2012), segundo o qual o prazo previsto no paragrafo único do art. 618 do Código Civil é de decadência, sendo aplicável somente às ações desconstitutivas:
O prazo decadencial de 180 dias, portanto, somente poderá ser aplicado a uma ação desconstitutiva, ou seja, de resolução do contrato, jamais nas ações que visam a indenização (condenação) pelos danos decorrentes do inadimplemento contratual do construtor quanto à segurança e solidez da obra, que respeitam o prazo prescricional de três anos do art. 206, § 3º, V, do Código Civil.
Ressalte-se que tendo surgido os defeitos dentro do prazo de garantia, a culpa do construtor é presumida por lei. Neste sentido, cito as explanações do douto Silvio Venosa (2005, p. 258):
A lei estabeleceu presunção de culpa do construtor, profissional técnico e prestador de serviço, reconhecendo a vulnerabilidade do dono da obra nesse aspecto contratual. Acrescente-se a aplicabilidade da lei do consumidor a apontar para a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviço. Parte do pressuposto de que o dono da obra não tem como avaliar de plano, ou em menor prazo, a excelência e perfeição da obra.
Não se pode olvidar que nos casos em que o comprador efetua a compra do imóvel diretamente do construtor e na qualidade de destinatário final, está-se diante de uma relação de consumo, sendo o construtor considerado fornecedor, conforme se verifica da leitura dos artigos 2º e 3º da Lei n.º 8.078/90:
Código de Defesa do Consumidor:
Art. 2°. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3°. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Nesses casos, é aplicável o Código de Defesa do Consumidor, o qual dispõe que a responsabilidade do construtor pela reparação dos danos causados aos consumidores e objetiva, ou seja, independe de culpa, conforme art. 12:
SEÇÃO II - Da Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, o construtor responde pela solidez e segurança da obra pelo prazo de cinco anos, nos termos do art. 618 do Código Civil. Tal prazo é de garantia, o que significa dizer que os defeitos que vierem a surgir no imóvel durante esse o prazo de cinco anos devem ser reparados pelos construtores, que devem ser acionados dentro do prazo prescricional legal.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no Ag 1208663/DF, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/11/2010, DJe 30/11/2010 Disponível em: < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&processo=1208663&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO#DOC1 >. Acesso em: 02 jun. 2013.
_______. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no Ag 991883/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 12/06/2008, DJe 04/08/2008. Disponível em: < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&processo=991883&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO>. Acesso em: 02 jun. 2013.
_______. Superior Tribunal de Justiça. REsp 215.832/PR, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 06/03/2003, DJ 07/04/2003, p. 289. Disponível em: < http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&processo=215832&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO>. Acesso em: 02 jun. 2013.
GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. O prazo do art. 618 do Código Civil – vícios nos imóveis – é de prescrição ou de garantia, de 180 dias ou de 3 anos? Disponível em < http://www.scavone.adv.br/index.php?o-prazo-do-art-618-do-codigo-civil-vicios-nos-imoveis-e-de-prescricao-ou-de-garantia-de-180-dias-ou-de-3-anos>. Acesso em 02 jun. 2013.
VENOSA, Silvio. Direito Civil: contratos em espécie. 5 ed. v. 3. São Paulo: Editora Atlas, 2005, p. 258.
Procuradora da Fazenda Nacional na PFN/PA. Bacharela em Direito pela UFMA. Especialista em Direito Processual pela UNAMA. Especialista em Direito Tributário pela UNIDERP. Exerceu o cargo de Analista Judiciário no TJMA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PASSOS, Danielle de Paula Maciel dos. Da responsabilidade do construtor e o prazo de garantia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jun 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35661/da-responsabilidade-do-construtor-e-o-prazo-de-garantia. Acesso em: 23 dez 2024.
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