INTRÓITO
Mesmo sendo uma questão antiga e até mesmo corriqueira em nossa sociedade, os juristas não tratam especificamente do dano moral gerado por uma lesão corporal.
Encontram-se estudos que trazem em seu bojo matéria que pode servir como norte para a busca no direito de pleitear indenização por este tipo de dano, mas não se acha farta matéria que trate unicamente da correlação entre as duas situações propensas a serem estudadas agora. A legislação tutela a inviolabilidade da intimidade e com isso pretende que este direito seja respeitado não podendo ser um bem jurídico violado sem que com essa nasça a obrigação de indenizar o dano causado, surgindo assim a responsabilidade.
É indubitável que se podem gerar mais de um tipo de responsabilidade por apenas uma ação, mas isto não significa que uma absorve a outra e que apenas uma deverá ser cobrada do agressor. A lesão corporal gera uma responsabilidade penal sim, contudo, esta responsabilidade não exime o agressor a responder civilmente já que as duas são independentes e autônomas. A responsabilização do acusado, tanto civil quanto penal, deve ser imposta para que o mesmo possa readaptar-se ao convívio social.
Como esta matéria é singular no sentido de se intercambiar matéria penal e civil constantemente, não pode este ensejo ter a pretensão de esgotar o assunto pertinente.
Para que fique claro o que queremos propor colocaremos em breves linhas o que se entende como mais importante nas matérias civis e penais para que possa se concluir o raciocínio da forma mais clara e coesa possível.
A RESPONSABILIDADE
A interdisciplinaridade constatada nesta matéria traz a necessidade de se discutir os tipos de responsabilidades encontradas em nosso ordenamento jurídico atual.
A responsabilidade consiste no dever de indenizar contraído pela violação do direito alheio para que possa ser restituído o status quo ante do ofendido, amenizando assim o seu pesar.
Quanto à natureza da norma violada a responsabilidade pode ser basicamente moral, civil ou penal.
A responsabilidade moral encontra-se na seara individual, onde apenas o próprio indivíduo poderia julgar o dano que causou. Não pode ser determinada pela sociedade, a sanção depende tão somente da consciência do agressor ou, como propaga Maria Helena Diniz, “pela própria consciência ou temor a Deus”.
A responsabilidade penal é concebida quando se infringe uma norma de caráter social, aquela que regule a vida em sociedade e que todos a elas estão submetidos. Aqui a pena é imposta como forma de restituir o dano causado à sociedade e de forma a garantir que não será mais lesada pelo mesmo indivíduo.
Quando se quebra uma norma que gere prejuízo individual ou a um terceiro, seja ele particular ou o Estado, se tem a Responsabilidade Civil, que será restituída através de indenização que tem dupla função punitiva-satisfativa, visando punir o agente e expurgar o sofrimento da vítima.
O DANO MORAL
O dano moral é algo muito subjetivo já que só quem sabe o que foi obrigado a suportar foi a própria vítima do dano.
No dano moral há uma lesão nos sentimentos, existe uma alteração no bem estar geral, causando perturbações no viver do lesado. É a alteração psicofísica que determina menoscabo espiritual. É a perda da incolumidade espiritual.
Dissecando-se a expressão temos o DANO como uma violação a um direito, ou expectativa desse, inerente a um indivíduo; a MORAL é uma sentimento subjetivo que envolve o foro íntimo e pessoal de cada ser humano e que tangencia o que lhe é de mais íntimo e sagrado; O DANO MORAL é aquele que causa uma dilaceração à moral, é o detrimento das afeições legítimas advindas da moral da vítima, seja o dano causado pela forma que for. O conceito de dano está intimamente ligado ao psique do indivíduo, de sorte que é algo personalíssimo e intransferível.
Por ser mandamento Constitucional a incolumidade à moral deve ser respeitada e buscada pelo integrante da sociedade que a vir violada. Difícil arbitrar um quantum que sirva como alento ao prejudicado, mas se deve sempre tentar amenizar o dano sofrido de modo que satisfaça um pólo e puna o outro.
A LESÃO CORPORAL
O art. 129 do Código Penal define lesão corporal como “ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”. Segundo a hermenêutica este artigo abrange o dano causado à normalidade corporal do ser humano, quer do ponto de vista anatômico, fisiológico ou psíquico.
Desta feita temos que lesão corporal é um sinônimo veemente de agressões físicas no vocábulo corriqueiro. Contudo, do ponto de vista jurídico, as lesões corporais são espécies, mesmo que sendo a grande maioria do gênero agressões físicas.
Aqui nos cabe cingir de forma breve esta lesão corporal, conceituando e delimitando a atuação e interpretação deste tipo penal. O dispositivo tutela a integridade física, moral e psíquica do indivíduo. Por serem bens sociais e individuais são de competência do poder público os apurar e solucionar, mesmo com o seu caráter misto já que são bens sociais e individuais simultaneamente. É unânime a opinião de que a lesão corporal pode causar danos ao psique da vítima e em se gerando este tipo de dano dar-se-á ensejo à reparação indenizatória pelos danos morais sofridos.
O DANO MORAL NAS LESÕES CORPORAIS
Já se foi dito que o dano moral é oriundo de uma situação que afeta o bem estar do agredido em seus mais profundos sentimentos, “afeta a alma de cada um naquilo que existe de mais puro e secreto. Só quem sofre é capaz de estabelecer a sua dimensão” (Antônio Lindbergh C. Montenegro).
A Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), em seu art. 186, traz em sua redação a caracterização do ato ilícito, que gera responsabilidade por ação, omissão, imperícia ou imprudência, haja vista ser inerente à prática do ato ilícito a conseqüente existência de um dano. Para que o ressarcimento que visa compensar o referido dano seja devido, são necessários que sejam atendidos alguns requisitos: a) fato lesivo voluntário; b) ocorrência do dano moral; e c) nexo causal entre o dano e o comportamento do agente. (Interpretado de Maria Helena Diniz).
A base constitucional para o ressarcimento dos danos morais encontra-se esculpida principalmente nos arts. 5º., X da CF e 186 do CC.
À primeira vista, uma interpretação precipitada do texto constitucional pode levar ao convencimento de que o dano moral não é passível de indenização afora os casos de vulneração à vida privada, honra e imagem.
A letra fria diz que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano moral ou material decorrente de sua violação.
Tendo em vista todo o contexto constitucional e o estado Democrático de Direito o qual estamos submetidos não se pode assegurar que o dano moral está esmiuçadamente tipificado no art. 5º. da CF. A Constituição vela pelo outros direitos e garantias fora os elencados no dispositivo em comento, de sorte que traz o amparo legal para o pleito da indenização pelo dano moral sofrido, mas não o restringe ao exposto no inciso X do art. 5º.
O parágrafo segundo do próprio art. 5º. desfaz esta interpretação ao proteger os direitos personalíssimos humanos, mostrando que o grande rol apresentados em todos os incisos do art. 5 não encerram os direitos ali protegidos e tampouco restringem ou anulam direitos outros que porventura apareçam no cotidiano jurídico.
A lesão corporal, quando tipificada e comprovada, atende os requisitos para a composição do dano moral, senão vejamos: Alguém que desfere contra outrem uma lesão corporal está praticando um ato lesivo voluntário (ponto a); se no conceito de lesão corporal está descrita como uma causa de detrimento físico, MORAL ou psicológico à outrem, vislumbramos a ocorrência do dano moral (ponto b), que tem esse mesmo conceito; por fim urge salientar que se o mal estar sofrido pela vítima é conseqüência da lesão corporal contra ela desferida está configurado o nexo causal entre a lesão e o dano moral (ponto c).
A lesão corporal é um ato ilícito, já que foi “propagado de encontro à ordem jurídica, violando direito subjetivo individual” (Maria Helena Diniz). A conseqüência que nasce da prática desse ato ilícito, civilmente falando, é o dever de indenizar.
Ao início destes estudos fez-se menção aos tipos de responsabilidade. Aqui, nas lesões corporais, nascem as duas concomitantemente. A penal se exaure com a prolatação da sentença e conseqüente cumprimento da pena estabelecida. A civil finda com o pagamento de um quantum indenizatório que deverá ter duplo caráter, tendo escopo de minimizar, se não for possível esgotar, o sofrimento da vítima e precipuamente coibir que o agente repita a sua conduta fazendo pagar pelo erro que cometeu. O caráter punitivo-satisfativo dado à indenização por danos morais tem caráter sui generis em nosso direito pátrio.
Não se pode titubear em conceder-se danos morais nas lesões corporais. Muitos magistrados entender que a responsabilização penal do acusado já é o suficiente para que a conduta reprovável seja coibida. Todavia, esquece que a vítima deve ser ressarcida pelos danos sofridos pela atitude irresponsável de um terceiro agressor, não podendo arcar com o ônus provocado por este tipo de atitude. Deve-se criar uma nova visão no que concerne a este tipo de situação fático-jurídica. Mesmo em lesões corporais de potencial ofensivo menor o dano moral é devido, tendo em vista que o abalo espiritual é o mesmo.
Casos de deformações, mutilações, cicatrizes advindas de lesões corporais devem ser encaradas como danos estéticos que necessariamente devem vir cumulados com os danos morais e materiais, dependendo do caso.
O sofrimento, a dor, a decepção, a vergonha, a ira, o desconforto emocional sofrido pelo agredido de forma mais leve é tão aparente quanto os que sofrem lesões mais graves. O que diferencia uma da outra é o grau de satisfação que a indenização trará à sua alma. Sabemos que algumas seqüelas advindas de lesões corporais graves e gravíssimas são irreversíveis e que não há dinheiro que pague o dano permanente causado à vítima. O agressor, em alguns tipos de lesões corporais, assume o risco de produzir uma lesão mais grave do que a esperada, caracterizando o dolo eventual, e é em cima deste risco assumido que as indenizações devem ser pensadas. O risco maior não ocorreu por fato alheio a sua vontade.
CONCLUSÃO
Se o dano moral é cabível quando gera um mal estar psicológico que é refletido no espírito da vítima, não resta dúvida que estará presente nas práticas das lesões corporais.
Insistentes, relutantes e minoritárias opiniões propagam não entender que caiba ressarcimento de danos nesse tipo de crime. Como a visão jurídica brasileira está se modernizando, acreditamos que esta visão obsoleta de dentro em breve esteja extinta. Está sendo esquecida aquela visão materialista e patrimonial constatada no direito nacional de outrora para dar lugar a um direito que respeito o subjetivismo e o foro íntimo do subordinado e acima de tudo uma legislação que proteja esta parte humana que é tão importante para o amadurecimento individual e social do cidadão.
Não se encontram na doutrina pátria temas que tragam pesquisas ou entendimentos consolidados a respeito do dano moral na lesão corporal. Foi aí onde se encontrou a necessidade da confecção das presentes linhas.
Não se tem a pretensão de se esgotar o assunto, mas sim trazer à baila o tema para que possa servir de provocação aos estudiosos, de forma a acrescentar uma forma moderna e dinâmica de se encarar o assunto fazendo com que a Justiça possa ser operada de forma mais correta e calara possível.
Procurador Federal. Procurador Regional da PF/ANTAQ.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FáBIO GUSTAVO ALVES DE Sá, . Responsabilidade civil: da necessidade de ressarcimento do dano moral sofrido nos casos de lesão corporal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jul 2013, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35892/responsabilidade-civil-da-necessidade-de-ressarcimento-do-dano-moral-sofrido-nos-casos-de-lesao-corporal. Acesso em: 23 dez 2024.
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