Resumo: O regime de previdência complementar é responsável por grande parcela dos recursos financeiros aplicados no sistema financeiro nacional e mercado de capitais. Não é despiciendo o título de investidor institucional atribuído às entidades fechadas de previdência complementar - EFPC. Em razão do relevo de tais investimentos, entendeu por bem o legislador outorgar a outro órgão regulador, no caso o Conselho Monetário Nacional, a competência para expedir normas reguladoras que disciplinam as relações das EFPC com o mercado financeiro. Assim o presente estudo se propõe a expor, em brevidade, os principais aspectos da regulação de investimentos no âmbito das entidades fechadas de previdência complementar.
Palavras-chave: Previdência Complementar Fechada. Competência da Previc. Investimentos.
Sumário: 1. INTRODUÇÃO; 2. DAS CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR; 3. DAS FUNÇÕES DA PREVIC COMO ÓRGÃO FISCALIZADOR 4. DA REGULAÇÃO DOS INVESTIMENTOS DAS EFPC PELO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL 5. CONCLUSÃO.
1. INTRODUÇÃO
O regime de previdência complementar é responsável por considerável parcela dos recursos financeiros a cargo do sistema financeiro nacional e mercado de capitais.
Nesta linha será objeto de estudo do presente artigo a aplicação dos recursos garantidores dos planos de benefícios no mercado financeiro, cuja disciplina é regulada por outro órgão regulador, o Conselho Monetário Nacional – CMN, conforme determina a Lei Complementar nº 109/2001. Destarte, a regulação do tema caracteriza-se pela intricada e específica temática da resolução do CMN, cujos efeitos são de extrema importância para manutenção do equilíbrio financeiro e solvência do próprio regime de previdência complementar.
A par do tema central, imprescindível constarmos uma breve introdução trazendo feições gerais do regime de previdência complementar, bem como uma concisa narrativa expositiva sobre as competências legais da autarquia responsável pela fiscalização das entidades fechadas de previdência complementar, e em especial por zelar pelo fiel cumprimento da resolução já citada.
2. DAS CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR
Como dito acima, faz-se necessário efetuar uma breve digressão sobre as características básicas do regime de previdência complementar.
O Regime de Previdência Complementar encontra sua base de sustentação no art. 202 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998, e assim reza:
Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)
§ 2° As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a remuneração dos participantes, nos termos da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (destaque nosso)
A multicitada LC nº 109/2001, “Lex Mater” do Sistema Previdenciário Complementar, ao colmatar o comando constitucional, prevê que:
Art. 1o O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal, observado o disposto nesta Lei Complementar. (destaque nosso)
Da leitura do dispositivo constitucional e da norma legal complementar acima transcritos, podemos extrair que a finalidade precípua da previdência privada é operar planos de previdência complementar, mediante a constituição de reservas que garantam o benefício contratado, o que se dá mediante uma relação jurídico-previdenciária de natureza complementar, de caráter privatístico, caracterizada pela autonomia e facultatividade.
Isso significa dizer que as EFPC são criadas sob a forma de pessoas jurídicas de direito privado (independentemente da natureza jurídica de seu patrocinador), destinadas à instituição, administração e execução dos planos de benefícios autônomos e complementares em relação aos ofertados pelo regime geral de previdência social, de adesão facultativa por participantes e assistidos.
O mestre Caio Tácito[1] assim prescrevia com relação ao tema:
“As entidades fechadas de previdência privada e os participantes que a elas se associam firmam uma relação contratual, constituído mediante a adesão desses últimos aos planos de benefício oferecidos por aquelas, nos termos de seus estatutos e regulamentos internos”. (destaque nosso)
Ao contrário da previdência pública oficial (operada pelo INSS), que possui vinculo obrigatório e natureza pública, a previdência privada possui seus contornos e premissas abalizadas em um regime de direito privado, baseado em uma relação contratual, muito embora esteja submetida à regulação e à fiscalização do poder público. Daí decorrem fundamentos e princípios próprios como a facultatividade, a transparência, liquidez e o equilíbrio econômico-financeiro e atuarial, etc.
Neste sentido, confira-se a lição de Wagner Balera[2]:
Integram o quadro componentes do Sistema de Seguridade Social brasileiro os entes de previdência privada. Servem os entes supletivos, como estruturas de expansão do arcabouço de proteção, formando, como já se costuma dizer em França, rede de seguridade social, em estreita colaboração com o Poder Público, no interior do aparato do bem – estar. Mas não perdem os traços característicos que são peculiares às pessoas privadas.
Cabe destacar, ainda, que os fundos de pensão diferenciam-se dos fundos abertos por não visarem ao lucro (art. 31, § 1º da LC nº 109/2001) e por operarem planos de benefícios acessíveis a integrantes de grupos fechados, como por exemplo, empregados de uma mesma empresa ou grupo de empresas e os membros de uma mesma classe ou profissão. A própria origem dos fundos de pensão remonta a uma atividade originária das relações empregatícias que a caracterizam, tendo em vista ser uma política de atração e manutenção de mão-de-obra qualificada no âmbito do setor empresarial. A doutrina[3] especializada traz a conhecimento:
A verdade é que o Brasil nunca pensou globalmente em criar um sistema de previdência complementar para o trabalhador do setor privado. O que existe hoje é o resultado de iniciativas particulares que foram se aglutinando ao longo do tempo, sem obediência a qualquer projeto estruturado e, finalmente, consagradas em lei. Assim são as entidades fechadas, versão atual das caixas assistenciais de funcionários, como assim são. Também, as entidades abertas, evoluídas dos antigos montepios.
Destarte, não restam dúvidas acerca da natureza privada das EFPC, bem como do caráter contratual da relação jurídico-previdenciária havida entre os atores envolvidos nesse sistema (patrocinadores, instituidores, participantes e assistidos), a qual, repita-se, reveste-se de caráter autônomo e facultativo.
3. DAS FUNÇÕES DA PREVIC COMO ÓRGÃO FISCALIZADOR
De saída, cumpre trazer a lume as balizas legais que envolvem a atividade desenvolvida pelo órgão supervisor e fiscalizador. Nos termos do disposto no art. 3º da Lei Complementar nº 109, de 2001, no regime de previdência complementar fechada a ação estatal visa os seguintes objetivos:
a) formular a política de previdência complementar;
b) disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades reguladas por esta Lei Complementar, compatibilizando-as com as políticas previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro;
c) determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades;
d) assegurar aos participantes e assistidos o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de benefícios;
e) fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar penalidades; e
f) proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.
A fim de operacionalizar a ação estatal na busca destes objetivos, o art. 5º da LC nº 109/2001 estabeleceu que a normatização, a coordenação, a supervisão, a fiscalização e o controle das atividades das entidades de previdência complementar seriam realizados por órgão regulador e fiscalizador, nos termos do art. 74 da referida Lei Complementar.
Referida regra restou sacramentada pelo artigo 2º da Lei nº 12.154 que assim dispõe:
Art. 2° Compete à Previc:
I - proceder à fiscalização das atividades das entidades fechadas de previdência complementar e de suas operações;
II - apurar e julgar infrações e aplicar as penalidades cabíveis;
III - expedir instruções e estabelecer procedimentos para a aplicação das normas relativas à sua área de competência, de acordo com as diretrizes do Conselho Nacional de Previdência Complementar, a que se refere o inciso XVIII do art. 29 da Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003;
IV - autorizar:
a) a constituição e o funcionamento das entidades fechadas de previdência complementar, bem como a aplicação dos respectivos estatutos e regulamentos de planos de benefícios;
b) as operações de fusão, de cisão, de incorporação ou de qualquer outra forma de reorganização societária, relativas às entidades fechadas de previdência complementar;
c) a celebração de convênios e termos de adesão por patrocinadores e instituidores, bem como as retiradas de patrocinadores e instituidores; e
d) as transferências de patrocínio, grupos de participantes e assistidos, planos de benefícios e reservas entre entidades fechadas de previdência complementar;
V - harmonizar as atividades das entidades fechadas de previdência complementar com as normas e políticas estabelecidas para o segmento;
VI - decretar intervenção e liquidação extrajudicial das entidades fechadas de previdência complementar, bem como nomear interventor ou liquidante, nos termos da lei;
VII - nomear administrador especial de plano de benefícios específico, podendo atribuir-lhe poderes de intervenção e liquidação extrajudicial, na forma da lei;
VIII - promover a mediação e a conciliação entre entidades fechadas de previdência complementar e entre estas e seus participantes, assistidos, patrocinadores ou instituidores, bem como dirimir os litígios que lhe forem submetidos na forma da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996;
IX - enviar relatório anual de suas atividades ao Ministério da Previdência Social e, por seu intermédio, ao Presidente da República e ao Congresso Nacional; e
X - adotar as demais providências necessárias ao cumprimento de seus objetivos.
(...)
Mediante a leitura atenta ao rol dos objetivos da atuação estatal no sistema de previdência complementar, verifica-se que o legislador conferiu tarefas de alto relevo à Previc, entre elas destacando-se a proteção dos interesses dos participantes e assistidos, conferindo-lhe, para tanto poder de polícia e poder sancionador. Neste sentido é imperioso destacar uma das mais relevantes atribuições da Previc é a de fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar penalidades.
Contudo, a fiscalização e aplicação de penalidades não é o único e inevitável objetivo. A supervisão, o controle e o monitoramento exercidos pela Previc visam, sobretudo, o contínuo aprimoramento da complexa atividade gerencial que é a administração dos benefícios pelos fundos de pensão. Tal meta se justifica por si só, pois a excelência na gestão das EFPC é a garantia de que os participantes e assistidos irão receber o benefício previdenciário contratado, conforme estatui o art. 202 da Constituição.
Com efeito, a atuação da Previc perpassa uma vasta gama de atividades. Esses procedimentos vão desde a expedição de atos normativos na sua área de competência e de autorizações de constituição e funcionamento dos fundos de pensão, passando por ações de educação previdenciária e pelo monitoramento da aplicação dos recursos garantidores dos planos, até a apuração e julgamento de infrações à legislação de previdência complementar.
Tendo em vista o foco da propositura em tela – o controle das EFPC - , cumpre destacar a relevância do papel de supervisão e fiscalização, a partir do qual, uma vez presentes indícios da prática de uma conduta vedada pela legislação de previdência complementar fechada, cabe à Previc, mediante processo administrativo no qual sejam observados os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, constatar a efetiva ocorrência da irregularidade e aplicar a penalidade eventualmente cabível, conforme estatuído no art. 65 da LC nº 109/2001.
No âmbito da previdência complementar privada, enquanto atividade econômica no que se refere a investimentos no mercado financeiro, o Estado tem como supedâneo constitucional para a intervenção neste setor, o disposto no art. 174 da Constituição Federal que assim determina:
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Conforme ensina a doutrina especializada[4], “no campo em que se permite o desempenho, por particulares, de empreendimentos privados no setor de seguridade social, a participação do Estado se dará enquanto agente normativo e regulador de atividades econômicas desempenhadas por sujeitos privados (art. 174, caput, da Constituição) – não, portanto, como titular de atividade econômica...”
Da análise das competências da Previc, podemos notar que o Estado intervém mediante inserções ou medidas que não só tangenciam o regime, mas também estabelecem limites, demonstrando claramente como este deve portar-se, visando assegurar sua regularidade e transparência na aplicação dos recursos de terceiros. Trata-se do Estado exercendo uma das funções intervencionistas como agente regulador de sistemas econômicos.
Na linha de atuação estatal como órgão regulador do sistema, a doutrina[5] igualmente ministra:
“a intervenção indireta do Estado limita-se a condicionar, a partir de fora, a atividade econômica privada, sem que o Estado assuma a posição de sujeito econômico ativo. É o caso da criação de infraestruturas, da polícia econômica e do fomento.”
Desse modo, tendo em vista que as atividades das EFPC são desenvolvidas sob a ótica contratual, de caráter privado, e considerando o papel de órgão fiscalizador e supervisor desempenhado pela Previc, inclusive quanto ao desempenho de atividades econômicas pelas EFPC, o que importa dizer é que as funções envolvem atos típicos de agência reguladora, de supervisão e fiscalização, nos moldes acima explanados, abrangendo, fundamentalmente, competências ligadas ao exercício do poder de polícia.
Por derradeiro, cabe destacar que, em hipóteses excepcionais, expressamente prevista em lei, tais como a administração especial, a intervenção ou a liquidação extrajudicial dos planos de uma dessas entidades (art. 42 e seguintes da LC nº 109/2001) é que a Previc passa a interferir diretamente na gestão, em face do mandamento legal de proteção dos interesses dos participantes e assistidos, mediante o poder de polícia conferido pela lei.
4. DA REGULAÇÃO DOS INVESTIMENTOS DAS EFPC PELO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL
Ao lado da atividade fim das EFPC (administrar e executar planos de previdência complementar) devidamente supervisionada e fiscalizada pela Previc, merece destaque a aplicação dos recursos garantidores como principal atividade meio dessas entidades, possuindo disciplina peculiar no bojo da LC nº 109/2001.
Segundo ensina Wagner Balera[6], o termo aplicação, utilizado pela lei corresponde à “aplicação financeira desses recursos, isto é, da realização de investimentos nos mercados financeiros e de capitais, segundo os critérios fixados pelo órgão regulador destes mercados, o CMN.”
Diante disso, não obstante a atividade das EFPC não vise ao lucro, em decorrência da aplicação de seus recursos envolver a realização de investimentos no mercado financeiro e mobiliário, a LC nº 109/2001 entendeu determinar que outro órgão que não o ente regulador das entidades fechadas de previdência complementar estabeleça as diretrizes a serem observadas quando dos investimentos dos recursos garantidores dos planos de benefícios operados pelas EFPC’s. Neste sentido, assim dispôs o § 1º do seu art. 9º, verbis:
Art. 9o As entidades de previdência complementar constituirão reservas técnicas, provisões e fundos, de conformidade com os critérios e normas fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.
§ 1o A aplicação dos recursos correspondentes às reservas, às provisões e aos fundos de que trata o caput será feita conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.
§ 2o É vedado o estabelecimento de aplicações compulsórias ou limites mínimos de aplicação. (grifo nosso)
Pertence, pois, ao Conselho Monetário Nacional a competência legal para estabelecer diretrizes para a aplicação dos recursos dos planos de benefícios operados pelos fundos de pensão. Nesse particular, é importante que fique claro que a Resolução leva em consideração um detalhe especial: o de que a aplicação é em relação aos planos de benefícios, já que estes é que são os detentores são detentores dos recursos de direito.
Na qualidade de órgão regulador e deliberativo máximo do Sistema Financeiro Nacional, ao CMN compete, entre outras atividades: a) estabelecer as diretrizes gerais das políticas monetária, cambial e creditícia; b) regular as condições de constituição, funcionamento e fiscalização das instituições financeiras; c) disciplinar os instrumentos de política monetária e cambial, etc.
As diretrizes gerais impostas pelo CMN traduzem-se por atos administrativos infralegais, denominados resoluções. Neste ponto, cabe trazer as lições sempre presentes do mestre Hely Lopes Meirelles[7], que assim definem o âmbito de atuação desses atos:
"O objetivo imediato de tais atos é explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados. Esses atos expressam em minúcia o mandamento abstrato da lei, e o fazem com a mesma normatividade da regra legislativa, embora sejam manifestações tipicamente administrativas. A essa categoria pertencem os decretos regulamentares e os regimentos, bem como as resoluções, deliberações e portarias de conteúdo geral."
Segue Hely Lopes[8] definindo o ato administrativo denominado resolução:
"Resoluções são atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do Executivo (mas que não pelo Chefe do Executivo, que só deve expedir decretos) ou pelos presidentes de tribunais, órgãos legislativos e colegiados administrativos, para disciplina de matéria de sua competência específica. Por exceção admitem-se resoluções individuais."
Assim é que, por meio da devida delegação legislativa operada pelo citado § 1º do art. 9º da LC nº 109/2001, dá-se a disciplina legal da aplicação dos recursos dos planos de benefícios operados pelas EFPC, mediante as resoluções do CMN, as quais explicitam parâmetros técnicos mínimos sobre o tema e possuem caráter normativo cogente. Tais regras devem ser uniformemente seguidas pelas entidades fechadas, sob pena de afronta ao regime de previdência complementar, passível de aplicação da sanção administrativa cabível.
No exercício de sua competência, o Conselho Monetário Nacional editou diversas resoluções, as quais se sucederam na ordem cronológica, regulando os níveis de investimentos alocados pelas EFPC no âmbito da previdência complementar fechada. Desta forma, a Resolução CMN nº 3.792/2009, vigente atualmente, estatui que:
Art. 1º - As entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) devem, na aplicação dos recursos correspondentes às reservas técnicas, provisões e fundos dos planos que administram, observar o disposto nesta Resolução.
(...)
Art. 3º - O disposto nesta Resolução se aplica aos recursos dos planos administrados pela EFPC, formados pelos ativos disponíveis e de investimentos, deduzidos de suas correspondentes exigibilidades, não computados os valores referentes a dívidas contratadas com os patrocinadores.
A referida Resolução tece as diretrizes prudenciais que buscam nortear o sistema de investimentos das entidades de fundos de pensão, a fim de garantir, entre outros aspectos, a solvência e higidez do sistema (art. 4º), monitorar constantemente os riscos existentes (art. 9º), avaliar a capacidade técnica e potenciais conflitos de interesses dos seus prestadores de serviços (art. 10) e estabelecer limites mínimos de alocação de recursos (enquadramento/risco) conforme o segmento de aplicação ou o volume próprio de recursos (arts. 35 a 40), etc.
Bem assim, a Resolução permite que os recursos geridos por EFPC possam ser aplicados nos segmentos de renda fixa, renda variável, investimentos estruturados e no exterior, imóveis e operações com participantes (art. 17), sendo considerados os ativos correspondentes às aplicações financeiras como “ativos garantidores” de tais recursos.
Por fim, vale dizer que a importância da aplicação de recursos dos fundos de pensão possui dupla dimensão. A primeira vincula-se diretamente à gestão eficiente dos recursos e reservas para garantia de pagamento dos benefícios previdenciários a longo prazo. A segunda caracteriza-se por serem estes investimentos mecanismos de alavancagem do setor produtivo interno. Neste sentido, com maior clareza demonstrou Francisco R. Baima[9]:
Os fundos de pensão exercem, na atualidade, um papel duplamente importante: tanto no aspecto social, por proporcionarem benefícios aos participantes em situações de perda de capacidade laborativa, quanto no aspecto econômico, por representarem o mais relevante mecanismo de poupança de longo prazo, aplicada no mercado financeiro, de forma a suprir as carências dos agentes econômicos deficitários, cujas necessidades de investimento superam a capacidade de gerar poupança.
Em suma, o objetivo do legislador, ao remeter a condução das diretrizes de investimentos dos fundos de pensão ao CMN, possui cerne no contexto macroeconômico que tais fundos possuem no cenário financeiro nacional. A poupança gerada por tais fundos alcança cifras vultosas, destacando-os com grandes investidores institucionais do sistema. Nessa esteira, a doutrina[10] especializada ministra acerca das reservas de tais fundos de pensão:
Por um lado, constituem o resultado acumulado de contribuições sobre salários e benefícios, e sua finalidade declarada é garantir a esses assalariados, quando se aposentarem, uma pensão regular e estável. São, portanto, formas institucionais de centralização de poupança, muitas vezes nascidas de regimes empresariais privados, obrigatórios, tendo como fonte inicial rendimentos salariais (em sentido amplo). Por outro lado, a partir do momento em que a poupança acumulada ultrapassa certo limite, os fundos passam a figurar entre as instituições financeiras não-bancárias, tendo a função de fazer frutificar um montante elevado de capital monetário, preservando a liquidez e a máxima rentabilidade deste. Com isso, muda a natureza econômica dos fundos, e já não se pode escamotear o alcance e as conseqüências dessa mudança. Os fundos deixam de ser a expressão de uma poupança modesta [...], e passam a ser instituições centrais do capital financeiro [...] (CHESNAIS, 1998, p.28-29).
Assim sendo, em matéria de aplicação de recursos dos planos de benefícios operados pelas EFPC, observa-se que essas entidades, ao mesmo tempo em que têm o dever de constituir e acumular reservas de longo prazo, para garantir o pagamento dos benefícios contratados, seguindo as diretrizes técnicas do CMN por meio de aplicações financeiras transparentes, com segurança, rentabilidade, solvência e liquidez, também têm forte propensão para exercer papel relevante na economia, ante o volume consolidado dos recursos geridos.
Por tais razões é que, repita-se, entendeu o legislador pela remessa do tema à regulação específica – atinente a parâmetros eminentemente técnicos, atribuindo-a ao principal órgão regulador do Sistema Financeiro Nacional, o Conselho Monetário Nacional - CMN.
5. CONCLUSÃO
O presente artigo teve como objetivo básico tecermos algumas considerações e reflexões acerca do complexo sistema de regulação e fiscalização dos investimentos financeiros pelas entidades fechadas de previdência complementar.
Ao longo da breve exposição, verificou-se que a opção legislativa de determinar que outro órgão regulador, no caso o Conselho Monetário Nacional, detivesse a competência de determinar as diretrizes técnicas para correta aplicação destes recursos, seja pelo viés social que este regime previdenciário possui, seja pelo destaque no aspecto de investidor institucional e o volume de recursos em tais aplicações no mercado financeiro e mobiliário.
[1] TÁCITO, Caio. Previdência privada e direito adquirido. Revista de direito administrativo. N 186. out./dez. 1991. p.101.
[2] BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. São Paulo. LTr,, 2000, p.61
[3] MARENSI, Voltaire. Regime da previdência privada no Brasil e as distorções do sistema. Síntese Trabalhista,
Porto Alegre, Síntese v.130, abr. 2000. p. 33.
[4] PULINO, Daniel. Previdência Complementar – natureza jurídico-constitucional e seu desenvolvimento pelas Entidades Fechadas, 1ª Ed. São Paulo, 2010, p. 80.
[5] MONCADA, Luís Cabral de. Direito Económico. Coimbra: Coimbra Editora, 2000., pp. 38-39.
[6] BALERA, Wagner. Comentários à Lei de Previdência Privada. Quartier Latin, 1ª Ed., outono de 2005, p. 81.
[7] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Malheiros, 20ª Ed., São Paulo, p. 161.
[8] Op. Cit. P. 162.
[9] BAIMA, Francisco de Resende. Análise e Desempenho dos Investimentos dos Fundos de Pensão no Brasil. 2004. 198 p. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção e Sistemas). Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC.
[10] BRENO, Lobo; FILGUEIRAS, Luiz. Artigo Científico: FUNDOS DE PENSÃO E FINANCIAMENTO DA ECONOMIA BRASILEIRA. X Encontro Nacional de Economia Política. Disponível em: <http://www.sep.org.br>. Acesso em: 01 set. 2010.
Procurador Federal, Coordenador-Geral de Estudos e Normas da Procuradoria Federal junto à PREVIC, Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL, Membro da Câmara de Recursos da Previdência Complementar - CRPC.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: HENRIQUE, Adriano Cardoso. Breves comentários acerca dos aspectos jurídicos dos investimentos financeiros das entidades fechadas de previdência complementar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 jul 2013, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35952/breves-comentarios-acerca-dos-aspectos-juridicos-dos-investimentos-financeiros-das-entidades-fechadas-de-previdencia-complementar. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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