RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo precípuo analisar as mudanças trazidas pela Lei 12.403 de 04 de maio de 2011 que alterou o Código de Processo Penal com especial destaque as medidas cautelares inclusas no ordenamento jurídico brasileiro, mudando o sistema vigente relativo à liberdade provisória e a prisão cautelar, e os efeitos dessa mudança perante a sociedade do nosso país.
Palavras-chave: Lei 12.403. Medidas Cautelares. Presunção de inocência. Sensação de impunidade.
ABSTRACT: This work has as main objective to analyze the changes introduced by Law 12403 of May 4, 2011 which amended the Code of Criminal Procedure with particular precautionary measures included in the Brazilian legal system, changing the current system on parole and prison precautionary and the effects of this change in the society of our country.
Keywords: Law 12,403. Precautionary Measures. Presumption of innocence. Sense of Impunity.
1 INTRODUÇÃO
A desvalorização dos pilares da sociedade ocidental como a família a religião e um forte processo de capitalização potencializado pela globalização vem contribuindo com o aumento da violência no nosso país, exigindo uma resposta reativa do Estado através da Policia na repressão dos delitos e dos Poderes Legislativo na formulação de leis mais rigorosas e do Judiciário na aplicação dessas leis.
É necessário salientar que para a sociedade, especialmente uma grande parcela composta por leigos, a melhor maneira de combate à violência e de punição aos criminosos é o encarceramento durante longo tempo dos criminosos, e até mesmo há quem defenda penas vedadas na nossa Carta Magna como a pena de prisão perpetua e a pena de morte com o pensamento que a dureza de tais penas inibiria a pratica de novos crimes.
2 TIPOS DE PUNIÇÃO NO NOSSO ORDENAMENTO E O CERCEAMENTO DA LIBERDADE
As penas previstas no ordenamento criminal pátrio são as elencadas nos artigos 43 e 53 do Código Penal. No artigo 43 estão expostas as penas restritivas de direito que são: “I-prestação pecuniária; II- perda de bens e valores; III-vetado; IV-prestação de serviço à comunidade; V-interdição temporária de direitos; VI- limitação de fim de semana”.
Importante à ressalva que as penas restritivas de direito não se confundem com o as medidas cautelares utilizadas a partir da lei 12.403/11, pois estas são enquanto não ocorreu ainda à condenação criminal e aquelas são aplicáveis após o trânsito em julgado se enquadrando nos casos do artigo 44 do mesmo dispositivo legal quando o réu tiver pena inferior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, o crime for culposo punido por qualquer pena; e o réu não tiver condenação em crime doloso e os antecedentes e conduta social permitirem a substituição segundo o magistrado.
2.1 Da Pena de Prisão e sua simbologia
A prisão é considerada o principal meio punitivo do Estado e surgiu no final do absolutismo com o nascimento do capitalismo e seguiu ao longo dos anos conforme preleciona Chiaverini, (2009, p.11) “como uma contenção do homem no tempo e no espaço, delimitados mediante uma vontade pública” (grifo nosso).
Já o marco penal para Mirabete (2003, p.36) foi o talião que na prática limitou a retribuição penal ao olho por olho e dente por dente “Adotado no Código de Hamurabi (Babilônia), no êxodo (povo hebraico) e na Lei das XII Tábuas (Roma), foi ele um grande avanço na história do Direito Penal por reduzir a abrangência da ação punitiva”.
Mas ao longo dos tempos a prisão e seu caráter retributivo ganharam espaço diante dos castigos corporais, utilizados em larga escala na idade média pelos governos absolutistas.
Mas o próprio cárcere passou a ser questionado ao longo dos séculos por seu caráter desproporcional em que muitas vezes se assemelhava com o sistema de domesticação, senão vejamos o trecho da obra de Crosseli apud Focault, (2009, p.89):
Dá-nos uma clara visão dos processos de adestramentos desenvolvidos no cárcere, semelhantes em seminários, quartéis, escolas, locais em que a supressão do tempo é um forte aliado neste processo de sujeição. Identifica a aprendizagem corporativa como forma de desenvolvimento de programas bem definidos para atendimento deste estado de coisas, pautado pela dominação do sistema e pela sujeição dos seres humanos
O conceito que melhor define a simbologia que pena de prisão tenha na nossa sociedade talvez seja o de Beccaria (1764, p.14):
O clamor público (grifo nosso), a fuga, as confissões particulares, o depoimento de um cumplice do crime, as ameaças que o acusado pode fazer seu ódio inveterado do inimigo, um corpo de delito existente e outras presunções semelhantes bastam para permitir a prisão de um cidadão.
A prisão a partir da obra de Beccaria, e das mudanças mundiais após o fim do Estado Monárquico, até os dias atuais passou a ser considerada o meio mais justo de punição pelo cometimento de crimes, pois em tal época os castigos corporais eram permitidos, mas a privação da liberdade, dado o valor que tal direito significa para as pessoas passou a ser uma punição aceitável diante do cometimento de crimes.
É necessário salientar que a pena de prisão, assim como as outras penas na idade média eram aplicadas de maneira praticamente discricionária, com o aviltamento de qualquer julgamento revestido de ampla defesa ou contraditório para os condenados e as penas muitas vezes eram injustas ou desproporcionais aos acusados.
Atualmente nos Estados Democráticos de direito, ou em países que adotaram esse sistema princípios como a dignidade da pessoa humana, ampla defesa e contraditório, devido processo legal, norteiam o direito penal em busca da verdade real para que não aconteçam mais, pelo menos no plano teórico, punições injustas aos acusados.
2.2 Da proporcionalidade das penas e das medidas cautelares impostas pela Lei 12.403/2011
Para respeitar as peculiaridades de cada caso foi criado no âmbito do direito material o Decreto Lei nº2848 de 07 de setembro de 1940 conhecido como Código Penal que tipifica não só os tipos penais como disciplina em sua parte geral os tipos de penas, os regimes e dosimetria das penas.
Em relação ao direito processual, temos o Decreto Lei nº3.689 de 03 de outubro de 1941 Código de Processo Penal que versa sobre a matéria procedimental.
O Código de Processo Penal passou a ser de grande importância nos dias atuais em virtude do aumento populacional e da violência em número proporcionalmente desigual de servidores do poder judiciário e das próprias policias encarregadas de elaborar os inquéritos necessários ao auxilio da instrução criminal.
As espécies de prisão cautelar previstas no código são a prisão em flagrante, prisão temporária e prisão provisória, utilizadas enquanto o processo transita em julgado, sendo aplicadas quando atendidos os requisitos do próprio código
Com a morosidade no andamento dos inquéritos e dos processos a prisão que deveria ter caráter cautelar começou a se transformar numa verdadeira antecipação de pena, muitas vezes ultrapassando a quantidade de pena imposta aos condenados, violando o principio constitucional da Presunção de Inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII da Constituição Cidadã de 1988 que preceitua que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.
Visando corrigir essa distorção deu entrada na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4.208 de 2001 que posteriormente viria a se transformar na Lei 12.403/11 que alteraria o Código de Processo Penal.
A alteração consiste na inclusão de novas medidas cautelares faculta ao magistrado uma maior margem de discricionariedade a de três medidas e faculta a aplicação das medidas conforme a situação de cada acusado, senão vejamos a justificativa do Projeto de Lei 4.208/01 (2001, p.02):
Assegura o novo sistema significativo avanço da justiça criminal, ao proporcionar ao juiz alternativas de aplicação das medidas cautelares, estabelecida ordem de graduação segundo a intensidade das obrigações impostas ao acusado e sempre de acordo com a solução mais adequada ao caso concreto (grifo nosso). As soluções do projeto para a liberdade provisória não só uniformizam como acentuam a lógica do sistema adotado. Ao contrário do que dispõe o atual art. 310 do Código, o projeto atribui ao juiz que recebe o auto de prisão em flagrante três alternativas: relaxar o flagrante, se ilegal; converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, se presentes as condições do art. 312; e conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
A Mensagem com a justificativa de tal projeto ainda se refere sobre o respeito da presunção de inocência quando se refere ao cumprimento antecipado de pena conforme o trecho final daquela fundamentação:
Finalmente é necessário acentuar que a revogação, estabelecida no projeto, dos arts. 393, 594, 595 e dos parágrafos do artigo 408, todos do Código de Processo Penal, tem como propósito definir que toda prisão, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, terá sempre caráter cautelar. A denominada execução antecipada não se concilia com os princípios do Estado constitucional e democrático de direito (grifo nosso).
Segundo os requisitos do artigo 282 do Código de Processo Penal os requisitos utilizados para a aplicação das novas medidas cautelares são a necessidade da medida para o andamento da investigação ou instrução criminal, procurando evitar a pratica de novos crimes e avaliada sobre o aspecto das circunstancias do fato ou condições pessoais do acusado ou do indiciado, com a opção de serem aplicadas isolada ou cumulativamente, com a possibilidade de aplicação de outra dessas medidas, isolada, cumulativamente ou substituição pela prisão preventiva através de medida solicitada do representante do Ministério Público, de seu assistente ou querelante, conforme parágrafo 4º do mesmo dispositivo legal, com a presunção de que os órgãos cabíveis como a policia, o Ministério Público e os estabelecimentos prisionais devem fiscalizar o correto cumprimento das novas medidas cautelares.
O parágrafo 6º do diploma acima escrito confere o caráter residual à prisão preventiva quando não for possível nenhuma das medidas cautelares do artigo 319 do Código de Processo Penal dispostas abaixo:
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII - fiança, nas infrações que a admitem para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX - monitoração eletrônica.
(...)
§ 4o A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.” (NR).
Outra medida imposta ao novo ordenamento foi à prisão domiciliar que aparece no artigo 317 do Código de Processo Penal e se aplica nos casos em que o acusado tiver mais de 80 (oitenta) anos, sofrer de doença grave, e for imprescindível aos cuidados especiais a pessoa menor de 6(seis) anos ou com deficiência.
Após a entrada em vigor da Lei muitos presos provisórios através de flagrante delito passaram a se beneficiar dessas medidas cautelares, causando a impressão na grande mídia e em segmentos da sociedade de um aumento da violência devido ao questionamento sobre a eficácia ou não dessas medidas que deixam em liberdade acusados quando somados a lentidão processual trazem segundo Rocha (2008, p.01) ”uma sensação de impunidade que deve ser permanentemente combatida”.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que a Lei 12.403 veio trazer uma justa aplicação das prisões cautelares em respeito ao principio da presunção de inocência, em virtude do cumprimento, praticamente antecipado, de penas pelo excesso de tempo dos acusados na prisão, quando não injusta a medida pela absolvição destes.
Ao mesmo tempo a demora na tramitação judicial dos processos existentes trouxe o aumento da sensação de impunidade, pois os acusados submetidos às medidas cautelares passam uma imagem de fragilização do Estado que não divulgou e debateu a Lei de maneira devida com a sociedade, causando uma confusão que as medidas cautelares seriam um sinônimo de impunidade em virtude do pouco tempo de existência da Lei, do desconhecimento, já relatado, por parte da sociedade e principalmente pela incapacidade do próprio Estado, seja através do Poder Judiciário, seja através da Policia, ambos por falta de recursos, como material humano e equipamentos, em fiscalizar o cumprimento ou não das medidas cautelares positivadas no Código de Processo Penal através da Lei 12.403.
REFERENCIAS
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CHIAVERINI, Tatiana. Origem da Pena de Prisão. Dissertação para obtenção do titulo de Mestre em Direito. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: 2009 Disponível em:
<http://www.observatoriodeseguranca.org/files/Origem%20da%20pena%20de%20pris%C3%A3o.pdf>. Acesso em 10 de março de 2013
CROSSELI, Luís Eduardo. Revista Liberdades. nº 02. São Paulo:. Vozes. 2001. Disponível em:
<https://www.ibccrim.org.br/site/revistaLiberdades/_pdf/02/resenha.pdf> Acesso 13 de março de 2013
MORES, Castigat Ridendo. Dos Delitos e das Penas. OAB Federal. ed. eletrônica. Distrito Federal. 2001.Disponivel em:
<http://www.oab.org.br/editora/revista/revista_08/e-books/dos_delitos_e_das_penas.pdf> Acesso em 13 de março de 2013
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei 4.208/2001 Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=E2A3A55DF190378C2F6549735A2
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ROCHA, Asfor César. Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/component/content/article/96-noticias/4698-stj-comemora-san-de-leis-que-modernizam-o-co-de-processo-penal->
BRASIL. Governo Federal. Código Penal Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm> Acesso em 10 de março de 2013
BRASIL. Governo Federal. Constituição Federal de 1988 Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em 13 de março de 2013
Bacharel em Direito e Pós Graduando em Direito Público pela Faculdade Paraiso do Ceará- FAP. Funcionário Público desde 2001, fui membro da Corregedoria e chefe da divisão de Ronda Escolar da Guarda Municipal de Juazeiro do Norte-CE de 2009 a 2012.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Marcelo Alves Batista dos. Aspectos da Lei 12.403/11. entre a presunção de inocência e a sensação de impunidade da sociedade? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 out 2013, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36805/aspectos-da-lei-12-403-11-entre-a-presuncao-de-inocencia-e-a-sensacao-de-impunidade-da-sociedade. Acesso em: 23 dez 2024.
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