Resumo: O tema “Ação de Improbidade Administrativa: o ingresso da pessoa jurídica de direito público no pólo passivo na proteção do interesse público” trata de um estudo que tem como escopo a visão sobre as possibilidades de ingresso da pessoa jurídica de direito público na ação por improbidade administrativa e a abrangência de sua atuação, em especial o ingresso no pólo passivo tendo em vista a defesa do ato administrativo legítimo. Para tanto, utilizando procedimento bibliográfico de pesquisa, este trabalho versará sobre as modalidades de ingresso da pessoa jurídica, no pólo ativo, passivo ou ausência de manifestação na lide (omissão). Será defendida a idéia de que justificativa de ingresso de pessoa jurídica lesada encontra-se diretamente associada à legitimidade do ato administrativo praticado e a proteção ao interesse público.
Palavras-chave: Ação civil pública de improbidade administrativa; Formas de Ingresso; Legitimidade do ato administrativo praticado; Ingresso no pólo passivo; Defesa do interesse público tutelado.
Summary: The theme "Administrative Action Impropriety: the entrance of the legal entity of public law at the defendant in protecting the public interest" is a study that is scoped to the vision of the possibilities of joining the legal entity of public law in action by administrative misconduct and scope of its activities, in particular the entry into defendant in view of the administrative act of legitimate defense. To do so, using procedures bibliographic research, this paper will focus on the modalities of admission of the legal entity, the plaintiff, liability or absence of expression in the deal (default). Will defended the idea that justification inflow of legal injured person is directly linked to the legitimacy of the administrative act practiced and protecting the public interest.
Keywords: Civil public action of administrative misconduct; Join ways; Legitimacy of the administrative act practiced; Join the defendant; The public interest protected.
Em 02 de junho de 1992 foi publicada a Lei n. 8.429/92, conhecida como Lei de Improbidade Administrativa porque disciplina as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional.
A citada lei de improbidade é um marco no combate aos atos considerados ímprobos, como forma de proteção para a sociedade dos atos considerados como violadores dos princípios administrativos praticados por agentes públicos, resultando ou não em prejuízo ao erário público.
A lei de improbidade traz um rol extenso, mas não exaustivos, de atos considerados ímprobos, organizando-os em (três) categorias: i) atos que importam em enriquecimento ilícito (art. 9º), ii) atos que causam dano ao erário (art. 10) e iii) atos violadores dos princípios e deveres da administração pública (art. 11).
Segundo os ditames de mencionada lei, o ato ímprobo não consiste em meras irregularidades administrativas ou transgressões disciplinares mais simples.
Como o objetivo da lei de improbidade é resguardar os princípios da administração pública sob o prisma do combate à corrupção, à imoralidade qualificada e à grave desonestidade funcional, considera-se improbidade, o ato irregular qualificado pela má-fé do administrador. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1322353/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2012, DJe 27/08/2012; AgRg no REsp 1245622/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 24/06/2011).
Tendo em vista a possível violação do interesse público na prática do ato administrativo questionado, a lei de improbidade traz a determinação legal de intimação da pessoa jurídica de direito público lesado, quando a ação judicial for proposta pelo Ministério Público (art. 17 c/c § 3odo art. 6o da Lei no 4.717/65).
Assim, sempre visando à preservação do interesse público a ser protegido, o ingresso da Administração Pública pode ser dar três formas: no pólo ativo, como assistente litisconsorcial; no pólo passivo, como assistente simples ou pode-se omitir, postergando a sua atuação para momento posterior, caso constatada a necessidade de sua intervenção.
Nesse aspecto, verifica-se interessante a análise do ingresso da pessoa jurídica de direito público lesado na lide no pólo passivo da ação, na qual figurará ao lado do réu na defesa do ato administrativo impugnado.
Dessa forma, a pessoa jurídica quando ingressa no polo passivo da ação, ela defende a legitimidade do ato administrativo praticado pelo agente público com o fim de preservar o interesse público tutelado. Essa necessidade do ingresso ao lado do ora réu se faz essencial na defesa do ato legítimo, considerada a presença de todos os seus atributos.
Nesse aspecto, fundamentado em pesquisa bibliográfica de diversos autores sobre o tema, o presente estudo abordará a legitimidade do ato administrativo, as formas de ingresso da pessoa jurídica na ação civil pública de improbidade administrativa, buscando demonstrar que o ingresso da pessoa jurídica no pólo passivo da ação está fundamentado na proteção do interesse público.
Reproduzindo o conceito legal, considera-se “improbidade administrativa a prática de ato por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território que importe em enriquecimento de ilícito, dano ao erário e/ou violação aos princípios e deveres da administração pública” (art. 1º da Lei n. 8.429/92).
De acordo com sua definição léxica, a improbidade está relacionada à ausência de caráter íntegro, honesto na conduta do agente público relacionadas nas disposições dos artigos 9º, 10 e 11 da Lei no. 8.429/92.
Na definição do dicionário Aurélio (p. 277 e 410) ímprobo significa “sem probidade, desonesto”, enquanto que probo significa de “caráter íntegro; honrado”.
O vocábulo latino improbitate tem o significado de falta de honradez, de caráter, maldade, falta de retidão do indivíduo e desonestidade (WASHINGTON DOS SANTOS, p. 119).
Em função dessa relação entre probidade e honestidade, diversos autores consideram que a probidade trata-se de mera especificação do princípio da moralidade administrativa. Nesse sentido ensina José Afonso da Silva (2004, página 650):
“A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímbropo com a suspensão de direitos políticos (Art. 37, § 4º). A probidade administrativa consiste no dever de o ‘funcionário Server a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer’. O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem.”
Apesar de o conceito de improbidade ser umbilicalmente ligado ao da imoralidade ou desonestidade, esta não pode ser considerada como seu único elemento integrante. A análise da improbidade deve ser analisada sob a ótica de violação de todos os princípios que regem a atuação administrativa, expressos ou explícitos no ordenamento jurídico e que gerem ou não prejuízo ao erário público.
Sobre a ligação tênue entre moralidade e probidade, Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (2011, página 55) observam que:
“[...] em que pese ser a observância ao princípio da moralidade um elemento vital importância para aferição da probidade, não é ele o único. Todos os anos dos agentes públicos devem observar a normatização existente, o que inclui toda a ordem de princípios, e não apenas moralidade, mas jamais terá a sua amplitude delimitada por esta.”
Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2007, página 334) enumeram o princípio da probidade administrativa como aquele que influencia todos os princípios da atuação administrativa porque “conforme as circunstâncias, a afronta a qualquer dos princípios administrativos, expressos ou implícitos, pode configurar ato de improbidade administrativa.”
Natália Hallit Moyses (2012, p. 2) no estudo sobre a modalidade culposa do art. 10 da lei de improbidade ensina que:
“numa primeira aproximação, improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano), revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo tráfico de influência nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos”.
Traçando uma viagem aos conceitos acerca da improbidade administrativa, a ilustre autora (2012, p. 2) conceitua improbidade como:
“conduta humana positiva ou negativa, ilícita, que, também, poderá acarretar uma sanção civil, administrativa e penal, em virtude dos bens jurídicos atingidos pelo fato jurídico. Para estar caracterizada a improbidade administrativa basta a violação aos princípios insculpidos no caput do artigo 37, da Constituição da República de 1988 (CR/88), não sendo imperativa a necessidade de prejuízo ao erário.”
Para a improbidade administrativa não é suficiente a irregularidade ou ilegalidade do ato. No julgamento do REsp n. 827.445-SP, o Ministro Teori Zavascki define a improbidade administrativa como a ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente.
Para que a conduta do agente público seja considera ímproba é necessário o desvio ético, com a violação aos princípios gerais que regem a Administração Pública.
As condutas do agente público que representam a violação ao dever de honestidade pelo agente público ou a ele equiparado, consolidado nos princípios constitucionais que regem a Administração Pública, encontram-se tipificada na Lei n. 8.429/92 de forma exemplificativa.
A violação ao dever de honestidade é tratada como um mal extremamente grave pelo legislador de forma que a condenação nas penas impostas na lei de improbidade impõe ao agente público a suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade de seus bens e obrigação de ressarcimento aos cofres públicos, quando houver prejuízo causado.
Num conceito amplo consideram-se agentes públicos todos aqueles que prestam serviços à Administração Pública, direta e indireta, e que a ela estão vinculados, titulares de cargo ou emprego público, submetidos a regime jurídico único, administrativo especial ou celetista e mediante remuneração paga pelo erário público.
Assim, a expressão agente público abrange desde o Presidente da República até o servidor que exerce atividade meramente executória, como serviço de limpeza.
Carvalho Filho (2011, página 537) conceitua agentes públicos como conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem funções públicas como prepostos do Estado.
É através da manifestação volitiva dos agentes públicos que se expressa a manifestação do próprio ente público.
Por fim, para a Lei n. 8429/92 reputa-se agente público todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades da Administração direta e indireta (art. 2º).
Os agentes públicos em sentido amplo compreendem os servidores estatutários, os empregados públicos e os servidores temporários.
Como agentes públicos estatutários compreendem-se aqueles que estão submetidos ao regime estatutários e são ocupantes de cargos públicos.
Os empregados públicos são aqueles agentes contratados sob regime da legislação trabalhista (Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT) e ocupantes de emprego público.
Os agentes públicos temporários são aqueles contratados por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, conforme autorização constitucional (art. 37, IX), exercendo função pública, sem vinculação a cargo ou emprego público.
Carvalho Filho (2011, página 538 a 541) classifica os agentes públicos em agentes políticos, particulares colaboradores ou em colaboração, servidores públicos e agentes de fato.
Os agentes políticos compreendem aqueles aos quais incumbe a execução das diretrizes traçadas pelo Poder Público. São os Chefes do Executivo e seus auxiliares e os membros do Poder Legislativo;
Os agentes particulares colaboradores ou em colaboração compreendem aqueles que executam certas funções especiais que pode se qualificar como públicas, sempre como resultado do vínculo jurídico que os prende ao Estado, alguns deles exercendo um verdadeiro munus público e sem remuneração como os jurados e os convocados para os serviços eleitorais. Inclui também os titulares de ofícios de notas e registros não oficializados (art. 236, da Constituição Federal) e os concessionários e permissionários de serviços públicos;
Os servidores públicos compreendem aqueles que se encontram vinculados ao Estado por uma relação permanente de trabalho, recebendo por cada período trabalhado a respectiva remuneração.
Por fim, os agentes de fato compreendem aqueles que desempenham uma função pública em razão de uma situação excepcional, sem prévio enquadramento legal, mas suscetível de ocorrência no âmbito da Administração. Segundo Carvalho Filho (2011, página 541), há duas categorias: i) agentes necessários, que praticam atos e executam atividades em situações excepcionais/emergenciais em colaboração com o Poder Público e com se fossem agentes de direito e ii) agentes putativos, que desempenham uma atividade pública na presunção de que há legitimidade, embora não tenha havido investidura dentro do procedimento legalmente exigido.
Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (2011, página 359) observam que “toda atividade administrativa, qualquer que seja ela, pressupõe a existência de uma norma jurídica que a autorize e deve ter por finalidade a consecução do interesse público,o que conduz a plano secundário a vontade do administrador e eleva a impessoalidade da voluntas legis a um estamento superior.”
Tal norma jurídica ao autorizar a atividade administrativa impõe a obediência a certos deveres visando à proteção do interesse público.
Assim, prescreve a lei de improbidade que será considerado ímprobo o ato que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições (art.11 da Lei 8.429/92).
O dever de lealdade impede que o agente atue contra as finalidades públicas da Administração, impondo-lhe respeito às leis e às instituições constitucionais.
A obediência ao dever de honestidade está vinculada à observância do fim protegido por lei, na satisfação do interesse público.
A imparcialidade é a obediência ao dever de tratamento igualitário/isonômico, na satisfação dos interesses da coletividade.
A legalidade impõe o dever de obediência às normas legais enquanto que o dever de lealdade está vinculado à concepção de boa-fé indicando a obrigação do agente de observar os caminhos traçados pela norma para a consecução do interesse público e permanecer sempre ao lado da administração.
Esses são os deveres funcionais impostos aos agentes públicos para consecução do interesse público tutelado.
Tais deveres são necessários à boa gestão da função pública como ensina Pessoa Alves (2010, p. 318):
“A boa-gestão pública, observância da probidade, a honestidade e a ética no trato de bens materiais e imateriais que pertencem à coletividade são deveres, legalmente destacados, aos quais correspondem os direitos dos indivíduos de verem tais interesses observados e de vê-los cobrados pelos meios postos à disposição.”
Por fim, deve ser destacado um dever que não se encontra elencado no artigo 11 da Lei 8.429, que muitos consideram um princípio e que deve ser considerado o mais importante imposto ao agente público: o dever de probidade, que impõe uma atuação pautada pelos princípios da honestidade e da moralidade quer em face dos administrados, quer em face da Administração (CARVALHO FILHO, p. 60).
2.4. Agente público equiparado.
Para fins penais, equipara-se a funcionário público aquele que exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública (art. 37, §1º. do art. 327 do Código Penal). É o conceito penal de agente público equiparado.
Para lei de improbidade será considerado agente público todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função.
O agente público equiparado não se confunde com os chamados particulares em colaboração que exercem funções especiais, consideradas públicas, como o os jurados, os convocados para fins eleitorais e os notários e tabeliões de cartórios extrajudiciais. Eles possuem vínculos com a Administração, com ou sem remuneração.
O conceito de agente público sujeito às penas da lei de improbidade envolve tanto aqueles que possuem como aqueles que não tem vínculo com a Administração Pública, sendo que, neste último caso é necessário o recebimento de numerário de origem pública.
Assim, a definição de agente público para fins de improbidade administrativa é muito mais ampla do que o utilizado no Código Penal estando sujeito às sanções da Lei n. 8.429/92 não só os agentes que exercem atividades junto à Administração Pública direta ou indireta, mas também aqueles que não possuam vínculo com o Poder Público.
O ato administrativo é sempre a manifestação de vontade da Administração Pública no exercício de suas funções, apta a produzir efeitos jurídicos para os administrados, para a própria Administração ou para seus servidores. Essa manifestação de vontade se perfaz por meio da conduta praticada pelo agente público.
Para Hely Lopes (2001, p.141) ato administrativo “é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si próprio.”
3.2. Requisitos do ato administrativo (noções gerais)
Os requisitos do ato administrativo são a competência, finalidade, forma, motivo e objeto.
A competência é determinada por lei, tratando-se de um poder atribuído ao agente da Administração para o desempenho específico de suas funções.
A finalidade é o interesse público a ser atingido, indicado explicita ou implicitamente pela lei. É elemento vinculado de todo ato administrativo, porque mesmo na escolha discricionária o que se busca é o fim público com a realização do ato administrativo.
A forma é o elemento exteriorizador do ato administrativo, de forma que a manifestação da Administração exige a procedimentos especiais e forma determinada por lei para ser expressamente validada.
O motivo é a situação de direito ou de fato que determina ou autoriza a realização do ato administrativo. Para Hely Lopes (2001, p.145) “na atuação vinculada ou discricionária, o agente da Administração, ao praticar o ato, fica na obrigação de justificar a existência do motivo sem o quê o ato será inválido ou, pelo menos, invalidável, por ausência de motivação.”
Por fim, o objeto nada mais é do que o próprio conteúdo do ato administrativo, através do qual é manifestada a vontade da Administração.
3.3. Legitimidade do ato administrativo (noções gerais)
O ato administrativo que traz em si a presunção de legitimidade, ou seja, presunção de que nasceu em conformidade com as devidas normas legais. Como ensina Carvalho Filho (2011, p. 106) “essa característica deflui da própria natureza do ato administrativo, como ato emanado de agente integrante da estrutura do Estado.”
A presunção de legitimidade decorre do principio da legalidade da Administração, necessária para o exercício das atividades do Poder Público e autorizando a imediata execução dos atos administrativos, necessárias às exigências de segurança e celeridade para a manifestação de vontade da Administração.
Ensina Maria Sylvia (2010, p.197/198) que “a presunção de legitimidade diz respeito à conformidade do ato com a lei; em decorrência desse atributo, presumem-se, até prova em contrário, que os atos administrativos foram emitidos com observância da lei.”
A ilustre autora (2010, página 198) distingue presunção de legitimidade e de veracidade, discorrendo que “a presunção de veracidade diz respeito aos fatos; em decorrência desse atributo, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pela Administração.”
A presunção de legitimidade trata de um atributo do ato administrativo, fundamentado no princípio da legalidade, o qual presume que todos seus atos tenham sido praticados em conformidade com lei e na necessidade de garantir celeridade e segurança no cumprimento dos atos administrativos, visando ao atendimento do interesse público.
Cassagne apud Maria Sylvia (2010, página 198) ensina que:
“A presunção de legitimidade constitui um princípio do ato administrativo que encontra seu fundamento na presunção de validade que acompanha todos os atos estatais, princípio em que se baseia, por sua vez, o dever do administrado de cumprir o ato administrativo’. Acrescenta que se não existisse esse princípio, toda a atividade administrativa seria diretamente questionável, obstaculizando o cumprimento dos fins públicos, ao antepor um interesse individual de natureza priva ao interesse coletivo ou social, em definitivo, o interesse público.”
Assim, a princípio todo ato praticado pelo agente público no interesse da Administração tem, no seu nascedouro, a presunção de legitimidade, como forma de garantir o cumprimento interesse público.
O Poder Público desenvolve suas atividades administrativas visando à consecução do interesse público. A ausência desse objetivo necessariamente resulta no desvio de finalidade do ato administrativo, maculando-o de tal forma que a sua invalidação é inevitável.
O destinatário da atividade administrativa é a sociedade e não o indivíduo. Esse é a premissa do Estado do bem-estar social ou Welfare State, que tem por finalidade ao atendimento do interesse público. Mas o que seria interesse público?
Interesse público trata-se de um conceito jurídico indeterminado. Na tentativa de conceituá-lo, Carvalho Filho (2011, p. 29) afirma que,
“[...] é possível ao intérprete, à luz de todos os elementos do fato, identificar o que é e o que não é interesse público. Ou seja: é possível encontrar as balizas do que seja interesse público dentro de suas zonas de certeza negativa e de certeza positiva. Portanto, cuida-se de um conceito determinável.”
Celso Antônio (2006, p. 60) sustenta que existem dois princípios basilares que informam o regime jurídico-administrativo a supremacia do interesse público sobre o privado e a indisponibilidade dos interesses públicos.
Mesquita, Alencar e Castro (2011, p. 41) ensinam que a supremacia do interesse público sobre o privado importa na “superioridade do interesse da coletividade, firmando a prevalência dele sobre o do particular, como condição, até mesmo, da sobrevivência e asseguramento deste último.”
Dessa forma, o princípio da indisponibilidade do interesse público pela Administração, por ser considerado interesse qualificado como próprio da coletividade, é inapropriável.
Vicente Paulo assinala (2007, p. 245) que o princípio do interesse público veda a atuação administrativa que vise realizar interesses do agente público ou terceiros e “impede perseguições ou favorecimentos, discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados.”
Numa concepção de moralidade, o princípio do interesse público proíbe a vinculação de atividades da Administração à pessoa dos administradores, evitando que estes utilizem a como aferir vantagens pessoais.
Na verdade o ordenamento jurídico apresenta um conceito de interesse público, quando veda a renúncia total ou parcial de poderes ou competências relacionadas ao atendimento a fins de interesse geral (art. 2º, da Lei n. 9.784/99).
O interesse público pode ser assim conceituado como aquele destinado ao atendimento da coletividade– bem estar social - disposto expressa ou implicitamente no ordenamento jurídico normativo.
4.2. Interesse Público Primário e Secundário
Para Celso Antônio (2006, p. 63) “o interesse público primário corresponde ao interesse geral, da coletividade, dos grupos sociais como um todo, ao passo que o interesse público secundário é o que pertence ao próprio Estado como pessoa jurídica pública.”
O interesse do Estado (Poder Público) não necessariamente coincide com o da sociedade, razão pela qual Renato Alesse apud Mazilli (2005, p. 45) considerou oportuno distinguir o interesse público primário (o bem geral) do interesse público secundário (o modo pelo qual os órgãos da administração vêem o interesse público).
O interesse público primário compreende a Administração Pública como ente imparcial, no exercício da proteção dos interesses da sociedade, do bem social.
O interesse público secundário por ser conceituado como aquele decorrente do desempenho da atividade da Administração no exercício de sua atividade de gestão, na proteção de seus interesses e na qualidade de pessoa jurídica.
Nesse sentido, Mazilli (2005, p. 45) assinala que o interesse público primário pode ser identificado com o interesse social, o interesse da sociedade ou da coletividade, e até mesmo como alguns dos mais autênticos interesses difusos.
O interesse público é o fim visado pela Administração, quando pratica os atos administrativos, tendo em vista que a organização administrativa existe com o objetivo de assegurar o bem da coletividade.
5. Ação Civil Pública Por Improbidade Administrativa
Após tratarmos sobre conceitos acerca da improbidade administrativa e interesse público, bem como agentes públicos e ato administrativo, necessários para compreensão do presente estudo, é necessário tecermos distinção entre ação privada e ação pública.
Piero Calamandrei apud por Mazzili (2005, p. 69) anota que:
“Como entre os poderes de disposição está compreendido também o poder de invocar a garantia jurisdicional, a distinção entre direito privado e direito público no campo substancial se projeta no processo através da legitimação para agir: e se tem, em consequência, ação privada quando o poder de provocar o exercício da jurisdição está reservado de um modo exclusivo ao titular do interesse individual que a norma jurídica protege, e ação pública quando tal poder é confiado pelo Estado a um órgão público especial, que age, independente de qualquer estímulo privado, por dever de ofício.”
Utilizando a distinção de Calamandrei, podemos conceituar ação civil pública como ação que tem como objeto a defesa de interesse público e é proposta por entes públicos (Administração Pública ou Ministério Público).
Pessoa Alves (2010, p. 320) coloca a ação civil pública por improbidade administrativa como um dos instrumentos processuais utilizados para a defesa do patrimônio público, assim como a ação civil pública e a ação popular, possuindo natureza qualificada e transindividual e com legitimação ordinária concedida entes públicos e ao Ministério Público.
Assim como a ação civil pública (Lei nº 7.347/85), a ação popular (Lei nº 4.717/65), a ação por improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92) é uma ação coletiva, ajuizada pela pessoa jurídica de direito público ou privada interessada ou pelo Ministério Público, visando à tutela do interesse público e à preservação da probidade administrativa.
A ação de improbidade administrativa enquadra-se no rol das ações civis constitucionais, sendo considerada uma espécie de ação coletiva, de forma que lhe são aplicados os princípios e regras de direito processual coletivo.
5.1. Ingresso da Pessoa Jurídica na ação por improbidade administrativa
Estabelece o art. 17, § 3º da LIA que “no caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que couber, o disposto no §3º do art. 6º da Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965.”
O § 3º do art. 6º da Lei nº 4.717 dispõe que “a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.”
A legitimação do ente público para ingresso na ação civil por improbidade administrativa se justifica na defesa da coletividade, defendendo direito próprio (interesse jurídico secundário) e da sociedade (interesse jurídico primário).
Assim, na ação civil pública por improbidade administrativa, a pessoa jurídica de direito público, cujo ato do seu agente público seja objeto de impugnação, deverá ser intimada para se manifestar nos autos judiciais, podendo contestar o pedido, atuar ao lado do autor (caso a ação tenha sido proposta pelo Ministério Público) ou abster-se, tendo em vista a tutela do interesse público.
A manifestação da pessoa jurídica de direito público é necessária ao interesse e patrimônio público, cujo dever de zelo encontra-se disposto no art. 23, I, da Constituição Federal.
Tendo em vista que o ingresso da pessoa jurídica na ação civil pública de improbidade administrativa resulta na possibilidade de formação de litisconsórcio, teceremos breves noções sobre tal instituto.
Ensina Daniel Amorim (2011, p. 181) que o litisconsórcio pode ser conceituado como a pluralidade de sujeitos em um ou nos dois polos da relação jurídica processual que se reúnem para litigar em conjunto.
As hipóteses de cabimento do litisconsórcio previstas no art. 46 do Código de Processo Civil são a possibilidade de comunhão de direitos ou de obrigações entre os sujeitos; direitos e obrigações derivados do mesmo fundamento de fato ou de direito; conexão pelo objeto ou causa de pedir e afinidade de questão por um ponto comum de fato ou de direito
Na hipótese da comunhão de direitos ou de obrigações entre os sujeitos pressupõe-se a existência de uma pluralidade nos polos da relação jurídica material, resultando no surgimento de direitos e obrigações com mais de um sujeito como titular.
Na possibilidade de direitos e obrigações derivados do mesmo fundamento de fato ou de direito não há uma relação jurídica de direito material em que fazem partes os litisconsortes, sendo que somente a existência de ma fato ou de identidade de conseqüências jurídicas de fatos diversos que legitima a formação do litisconsórcio.
Também haverá litisconsórcio quando há conexão pelo objeto ou causa de pedir, que resulta na reunião perante o mesmo juízo para julgamento em conjunto (art. 105 do Código de Processo Civil).
Por fim, prevê o código de processo a possibilidade de formação de litisconsórcio quando há afinidade de questão por um ponto comum de fato ou de direito, sendo suficiente a semelhança de questões por um ponto comum de fato ou de direito.
O litisconsórcio pode ser classificado de acordo com a posição da relação processual em que foi formado; o momento da sua formação; a obrigatoriedade ou não da sua formação ou segundo o destino dos sujeitos na relação de direito material.
De acordo com a posição da relação processual em que foi formado, o litisconsórcio será ativo quando a pluralidade de sujeitos for verificada no pólo ativo; será passivo quando tal pluralidade se verificar no pólo passivo e misto quando a pluralidade de sujeitos for constatada nos dois pólos da demanda.
Segundo o momento da sua formação, o litisconsórcio poderá ser inicial quando a pluralidade de sujeitos for formada desde a propositura da ação, no momento de apresentação petição inicial em juízo ou será ulterior quando tal pluralidade se verificar após o momento inicial da propositura da ação.
Segundo a obrigatoriedade ou não da sua formação, o litisconsórcio será necessário quando é obrigatória a sua formação por expressa determinação legal, em virtude da natureza indivisível da relação de direito material. Será facultativo, quando a formação do litisconsórcio depende da conveniência no litigar em junto com outra parte da demanda para que lhe atinja os efeitos jurídicos do processo.
De acordo o destino dos sujeitos na relação de direito material, o litisconsórcio poderá ser unitário, quando o juiz estiver obrigado a decidir de maneira uniforme para todos os sujeitos em litisconsórcio ou simples, quando houver a possibilidade de decidir de forma diferente para todos os litisconsortes.
É uma espécie de intervenção de terceiros. Trata-se do ingresso voluntário em processo alheio para auxiliar uma das partes da relação processual, tendo em vista a sua vitória na demanda. Para que seja deferida a assistência é necessária a existência de interesse jurídico do terceiro na solução do processo, não bastando o mero interesse econômico (art. 50 do Código de Processo Civil). Nesse sentido encontra-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: AgRg no REsp 1241523/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 12/05/2011.
Como assinala Daniel Amorim (2011, p. 207) “por intervenção de terceiros entende-se a permissão legal para que um sujeito alheio à relação jurídica processual originária ingresse em processo já em andamento.”
Ao ser admitido no processo, o assistente passa a ser considerado parte, cujos atos processuais se encontram limitados de acordo com a qualidade de sua intervenção.
Acerca do interesse jurídico ensina Daniel Amorim (2011, p. 221) que
“Só se permite a assistência se houver um interesse jurídico do terceiro na solução da demanda, representado no caso pela existência de uma relação jurídica controvertida, distinta daquela discutida no processo entre o assistente (terceiro) e o assistido (autor ou réu), que possa vir a ser afetada pela decisão a ser proferida o processo do qual não participa.”
Interesse jurídico significa a possibilidade de um terceiro, que não faz parte da relação jurídica material, ser afetado juridicamente pela decisão proferida em processo judicial do qual não é parte (EDcl no AgRg no REsp 1180487/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 29/06/2011).
A intervenção da pessoa jurídica como assistente deve estar relacionada ao interesse público do processo submetido à análise judicial. Esse interesse público que legitima a participação processual da pessoa jurídica de direito público.
A assistência pode ser simples ou litisconsorcial. Conceitua-se como simples aquela em que não há relação jurídica do assistente com o adversário do assistido, apenas o interesse jurídico na vitória deste na demanda judicial, tendo em vista a possibilidade dos efeitos da decisão judicial atingirem o assistente.
Na litisconsorcial, o terceiro é titular da relação jurídica de direito material discutido na demanda. Assim, o assistente litisconsorcial é o sujeito que, desde o início do processo, poderia ter sido litisconsorte unitário do assistido.
Como observado por Daniel Amorim (2011, p. 222),
“[...] causa estranheza num primeiro momento a verificação de que para que exista a assistência litisconsorcial seja necessário que o titular do direito não faça parte do processo que tenha como objeto justamente o seu direito. Em regra, tal situação não poderia ocorrer, mas excepcionalmente admitir-se-á que terceiro titular do direito não participe do processo em que o seu direito é discutido.”
O assistente pode ingressar no processo a qualquer momento do procedimento, ainda que haja preclusão. Nesse caso, conforme dispõe o art. 50, parágrafo único, do Código de Processo Civil, o assistente recebe o processo no estado em se encontra, não havendo repetição dos atos já praticados.
5.3.1.2. Assistente simples
Como o assistente simples não tem relação jurídica com o assistido, apenas auxiliando na defesa do seu direito, a sua atuação está condicionada à vontade do assistido.
Ocorre que tal subordinação não significa que o assistente só possa praticar atos que o assistido já tenha praticado. Não há vedação para que o assistente possa ser praticar atos diante da omissão do assistido, desde que não contrarie a expressa vontade do mesmo.
É admitido o pedido de produção da prova por parte do assistente, bem com interposição de recurso. Ressalta-se que a eficácia do ato praticado pelo assistente na omissão do assistido está condicionada à ausência de manifestação contrária por parte do assistido.
Assim, não pode o assistente se opor aos atos de disposição praticados pelo assistido, como renúncia ou transação, dada a sua qualidade inerente de auxiliar do assistido.
Na hipótese de ser decretada a revelia do assistido, o assistente poderá assumir no processo a qualidade de substituto processual (art. 52, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Nesse caso, a sua atuação processual é plena, sendo-lhe vedado apenas praticar atos de disposição de direito material.
5.3.1.3. Assistente litisconsorcial
O assistente litisconsorcial atua como se litisconsorte fosse e, pelo fato de também ser titular do direito material que compõe o objeto do processo, os atos de disposição do assistido não geram efeitos ao assistente litisconsorcial, tendo em vista a sua natureza autônoma em relação à ação principal.
Na assistência litisconsorcial, o assistente atua com poderes equivalentes ao do litisconsorte, vez que detém a legitimidade para discutir a relação de direito material, individualmente ou em litisconsórcio com o assistido (AgRg no REsp 916.010/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 03/09/2010).
Sempre que a ação for proposta pelo Ministério Público, o Juízo determinará a notificação da pessoa jurídica para, querendo, integrar a lide, seja contestando o pedido, assumindo a condição de litisconsorte ativo ou se omitindo.
No sentir de Rodrigo Mazzei (2010, p.454) o artigo 6º, §3º, da Lei de Ação Civil Pública “prevê uma forma de intervenção móvel da pessoa jurídica em ações de índole coletiva, uma vez que tal norma há a possibilidade da mesma transitar nos pólos passivo e ativo”.
A mobilidade de intervenção da pessoa jurídica de direito público é possível sempre que presente o interesse público, a juízo do se representante legal ou do dirigente (art. 6º, § 3º, da Lei 4.717/1965, combinado com o art. 17, § 3º, da LIA).
Nesse sentido cita-se o julgado do Superior Tribunal de Justiça, de lavra do Ministro HERMAN BENJAMIN: AgRg no REsp 1012960/PR, Rel., SEGUNDA TURMA, DJe 04/11/2009.
Na ação improbidade administrativa, a pessoa jurídica pode adotar uma das três posições: i) no polo ativo, colocando-se ao lado do autor, sendo considerado como litisconsorte; ii) no polo passivo, colocando-se ao lado do réu, na qualidade de assistente simples e iii) pode-se omitir, deixando de intervir no processo.
6. O ingresso da pessoa jurídica na ação por improbidade administrativa
6.2.1. Ingresso da pessoa jurídica no polo ativo
A pessoa jurídica de direito público quando ingressa no polo ativo, figura ao lado do autor como assistente litisconsorcial.
Nos termos do artigo 48 do Código de Processo Civil, os litisconsortes serão considerados como litigantes distintos, ou seja, os seus atos ou omissões não prejudicam nem beneficiam uns aos outros.
O litisconsórcio pode ser facultativo e unitário, segundo o qual não há a obrigatoriedade de ingresso de todas as partes legitimadas para propor a ação judicial, mas uma vez verificada, cria para o juiz a obrigatoriedade de decisão de forma uniforme para todos os litisconsortes. Assim, o ingresso da pessoa jurídica ao lado do autor da ação civil pública de improbidade administrativa importa na decisão uniforme para todos no plano do direito material (item 5.2.1).
Figurando ao lado do autor, a pessoa jurídica atua como se fosse litisconsorte unitário. Nesse caso, a natureza do litisconsórcio unitário, na qual o destino dos litisconsortes é o mesmo, importa na necessidade de concordância dos demais litisconsortes na prática do ato de disposição de direito praticado por um deles.
Na assistência litisconsorcial, o assistente é titular do direito discutido, o que neste caso afasta a natureza acessória da assistência definida no artigo 53 do Código de Processo Civil.
6.2.2. O ingresso da pessoa jurídica no pólo passivo
Se a proteção do interesse público pelo ato administrativo impugnado se fizer necessário, a pessoa jurídica de direito público lesado poderá ingressar ao lado do réu, como assistente simples.
Nesse caso, diferentemente da assistência litisconsorcial, a atuação da pessoa jurídica é acessória. Não há vedação para a prática de atos no caso de omissão do assistido, mas apenas quanto aos atos que contrariem expressamente a vontade do assistido.
Apesar da condição de assistente simples, não significa que a pessoa jurídica de direito público só possa praticar atos que o assistido já tenha praticado. Como assistente simples, o ente público integra a lide, auxiliando o assistido na defesa do ato administrativo legítimo praticado pelo agente público, podendo atuar diante da mera omissão do mesmo e praticar demais atos processuais concernentes à defesa do ato administrativo (5.3.1.2).
O ingresso da pessoa jurídico no pólo passivo na defesa do interesse jurídico protegido será analisado mais pormenorizadamente adiante no item 8.
6.2.3. A omissão da pessoa jurídica
Ao ser notificada para manifestar o interesse em ingressar na lide, a pessoa jurídica de direito público poderá deixar de apresentar qualquer manifestação, deixando transcorrer in albis o prazo para manifestação.
Tendo em vista o interesse público tutelado, a pessoa jurídica de direito público poderá ingressar na lide posteriormente, podendo integrar no pólo ativo ou passivo da demanda, característica da qualidade de intervenção móvel da pessoa jurídica em ações civis públicas.
Presente o interesse jurídico de sua atuação, a pessoa jurídica de direito público detém legitimidade para ingresso na lide.
Nesse caso a sua atuação será determinada de acordo com o polo que integrará. Se ingressar no polo ativo e aditar a inicial para alterar ou ampliar o objeto do processo (pedido ou causa de pedir) será litisconsorte ulterior; se ingressar no polo ativo e não alterar o processo, será assistente litisconsorcial e se passivo, atuará na qualidade de assistente simples.
7. A intervenção móvel ou mobilidade ou migração interventiva da pessoa jurídica de direito público
A defesa do interesse público por meio da ação civil pública é composta dentro de sistema especialíssimo, tendo em vista a sua finalidade, razão pela qual as disposições regulam a legitimidade de forma diferenciada.
A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigura útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente. É o que dispõe o art. 6º,§ 3º, da Lei 4.717/1965.
Trata-se da chamada intervenção móvel (Mazzei, página 469) ou mobilidade interventiva da pessoa jurídica nas ações coletivas (ação popular e ação civil pública). Tal mobilidade encontra fundamento na tutela do interesse público, objeto da demanda judicial.
A possibilidade de migração entre o pólo ativo e passivo na demanda está vinculada à decisão do representante legal da pessoa jurídica e na finalidade pública (proteção do interesse público tutelado).
A mobilidade encontra fundamento na possibilidade de reconhecimento da ilegitimidade do ato administrativo e impossibilidade do saneamento do vício que o macula, bem como na punição do agente público de forma a proteger a coletividade dos efeitos nocivos do ato impugnado.
Essa característica da intervenção da pessoa jurídica nas ações civis públicas permite, ainda, que no mesmo processo o ente ocupe posição no polo ativo e no passivo, tendo em vista a defesa do ato administrativo legítima e a impugnação àquele eivado de vício.
Essa singularidade presente nas ações coletivas, além de conjurar as soluções ortodoxas, implica na decomposição dos pedidos formulados, razão pela qual o poder público pode assumir o pólo ativo em relação a um dos pedidos cumulados e manter-se no pólo passivo em relação aos demais (REsp 791.042/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ 09/11/2006 p. 261).
Não há preclusão para a mudança de intervenção, porque além da ausência de disposição legal que limite temporalmente esse tipo de mobilidade ou migração, há sempre a possibilidade de reconhecimento da lesividade do ato no momento da instrução probatória.
Ademais, de acordo com art. 17 da Lei de Ação Popular, o próprio ente pode, ainda que contestada a ação, proceder à execução da sentença na parte que lhe caiba, ficando evidente a viabilidade de composição do pólo ativo a qualquer tempo (REsp 945.238/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,SEGUNDA TURMA, DJe 20/04/2009).
8. O ingresso da pessoa jurídica na defesa do ato administrativo objeto da ação de improbidade
Para Wallace Paiva apud por Mazzili (2011, p. 798) “a possibilidade de a pessoa jurídica interessada defender o ato impugnado amesquinha os princípios da moralidade e da impessoalidade e a noção de interesse público primário”.
Para Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (2011, p. 798) tal raciocínio:
“Além de contra legem, é um tanto quanto preconceituoso na medida em que toma como certa a ocorrência da improbidade, o que em regra, é impossível no momento preambular da relação processual. Acaso proposta uma ação pelo Parquet destituída de base razoável, tendo sido a inicial, par faz ou por nefas, recebida pelo Magistrado, porque não poderia a pessoa jurídica de direito público refutar a ocorrência de improbidade?Imagine-se, por outro lado, que a pessoa jurídica supostamente disponha de elementos seguros no sentido de demonstrar a inocorrência do ato ou, ainda, que o agente imputado a ele não concorreu. Será razoável negar a ela a possibilidade de opor-se ao pleito formulado? Note-se que não haverá, a rigor, conflito de interesses entre o Ministério Público (ou a associação) e a pessoa jurídica; ‘existirá quando muito, contraste de valoração’, elegante e precisa lição de Barbosa Moreira, acima transcrita.”
O ingresso da pessoa jurídica ao lado do autor deve ser analisado sob o enfoque do interesse público. O objeto da ação civil pública de improbidade administrativa é a conduta ativa ou omissiva do agente público, se pode ser considerada ímproba ou não.
Como já discutido anteriormente, a improbidade trata-se de uma ilegalidade ou irregularidade qualificada pela conduta do agente (dolo ou culpa), mas se não houve prática de ato ilegal ou irregular? Se o ato administrativo for legítimo?
É esse motivo que justifica a intervenção da pessoa jurídica de direito público. O ato administrativo tem presunção de legitimidade, de que foram observadas, para sua formação, às disposições legais para sua formação (competência, finalidade, forma e objeto). E se for verificado que não há vício que macule a formação do ato? Então nesse caso não haveria irregularidade ou ilegalidade do ato, o que afasta a primeira premissa do ato ímprobo.
Aliado a esse fato, verifica-se a inexistência de instauração de procedimento administrativo disciplinar em face do agente público ou até de procedimento finalizado, cuja decisão foi pela inexistência de ato infracional do agente. Assim, verifica-se que administrativamente não houve discussão acerca da qualificação ímproba na conduta do agente (má-fé).
Então, configurada a hipótese em que se verifica a constatação de legitimidade do ato e ausência de decisões disciplinares acerca da conduta do agente, a Administração não teria justificativa para ingressar no pólo ativo e muito menos omitir manifestação na ação judicial.
O agente público é o preposto da Administração Pública, que se manifesta através dele. Se não há vício na sua manifestação de vontade, é necessário o ingresso do ente público na defesa do ato administrativo legítimo na consecução do interesse público.
Aliás, sob o fundamento da proteção do interesse público, é justificada a execução da sentença condenatória pela pessoa jurídica de direito público, mesmo que tenha oferecido contestação na ação civil (art. 17 da Lei de Ação Popular).
Ademais, a possibilidade de apresentar contestação não significa que a representação judicial do agente público, réu na ação civil de improbidade, visto que a advocacia pública deverá atuar exclusivamente na representação da pessoa jurídica de direito público.
Para o ingresso da pessoa jurídica no pólo passivo da ação civil pública por improbidade administrativa se faz necessário quando se afigurar útil ao interesse público.
O fim a que se destina a prática dos atos administrativos é a realização do interesse público, ou seja, o bem-estar da coletividade. Essa finalidade é expressa na manifestação de vontade da Administração Pública, através de seus prepostos, os agentes públicos.
O objeto de análise da ação por improbidade administrativa é a conduta do agente público assim considerado nos termos do art. 2º da Lei no. 8.429/92, com a perquirição da má-fé (dolo ou culpa) associada à prática de ato administrativo ilegítimo ou irregular.
Dessa forma, se verificado que o ato administrativo praticado obedeceu aos ditames legais (obediência quanto à formação da competência, finalidade, forma e objeto), sem vício que o macule e que a conduta do agente público encontra-se ausente de vícios (ausência de procedimento administrativo disciplinar instaurado ou existência de decisões administrativas absolutórias sobre o fato narrado na inicial), torna-se necessária a intervenção da Administração Pública na defesa do ato administrativo como expressão da sua manifestação de vontade.
Aliás, fundamentada na singularidade da intervenção móvel ou migração interventiva do ente público, mesmo que este apresente contestação, defendendo o ato administrativo, é possível que durante a instrução probatória se verifique que vício no ato ou na vontade do agente, o que justifica a migração da pessoa jurídica do pólo passivo para o pólo ativo, fundamentado na proteção do interesse público, sempre.
A atuação do ente público é regida pela consecução do interesse público, seja nos atos administrativos, seja na necessidade de intervenção nas ações judiciais, com a prática de atos processuais na defesa do ato administrativo legítimo, seja como parte no polo ativo, seja no polo passivo da relação processual.
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Procuradora Federal junto ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, Chefe do Serviço de Gerenciamento Estratégico, pós graduada em Direito Processual pela AVM Faculdade Integrada e pós-graduanda em Direito Administrativo. Fui analista judiciária do Superior Tribunal de Justiça, com exercício nos Gabinetes dos Ministros Maria Thereza de Assis Moura e Nilson Naves. Fui também advogada da Embrapa, com exercício na Embrapa-Sede.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Agueda Cristina Galvão Paes de. Ação de improbidade administrativa:o ingresso da pessoa jurídica de direito público no pólo passivo na proteção do interesse público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 out 2013, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36808/acao-de-improbidade-administrativa-o-ingresso-da-pessoa-juridica-de-direito-publico-no-polo-passivo-na-protecao-do-interesse-publico. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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