PALAVRAS CHAVES: Princípio da Legalidade. Contribuições. Lei. Lei Complementar. Competência Residual.
RESUMO: A Constituição Federal exige lei para a instituição e majoração de tributos, consoante o disposto nos artigos 150, I, da CF/1988. O princípio da legalidade exige que se distingam as leis complementares e leis ordinárias, já que, embora não exista hierarquia entre as leis, algumas matérias estão submetidas à reserva de lei complementar.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Com o advento da Constituição Federal de 1988 – CF/1988, as contribuições previdenciárias readquiriram a natureza de tributo, já que, além de se localizarem topicamente dentro do capítulo do Sistema Tributário Nacional, são dotadas dos atributos previstos no artigo 3° do CTN e, assim, se submetem às limitações gerais ao poder de tributar.
Sobre as limitação gerais ao poder de tributar, como esclarece Ávila, “ao mesmo tempo que a Constituição Federal concede o poder de tributar, ela própria estabelece uma autolimitação ao exercício desta atividade legislativa vocacionada para a instituição de tributos”[1].
O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E AS CONTRIBUIÇÕES À SEGURIDADE SOCIAL
O princípio da legalidade está previsto na Constituição Federal, em seu artigo 150, I, que determina ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.
No § 6.º do artigo 150 da CF/1988, há referência de que qualquer remissão, isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, somente poderá ser concedida mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. Por fim, o § 7.º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
O princípio da legalidade, previsto no artigo 150, I, da CF, estabelece que somente por lei será possível a criação e a majoração de tributos. Para Amaro, o princípio da legalidade, informado pelos ideais de justiça e de segurança jurídica, vai além, exigindo que a lei defina “todos os aspectos pertinentes ao fato gerador, necessários à quantificação do tributo devido em cada situação concreta que venha a espelhar a situação hipotética”[2].
São exceções ao princípio da legalidade tributária: o disposto no artigo 97, § 2º, do CTN, cujo teor determina que a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo não se consubstancia em majoração; a alteração das alíquotas do Imposto de Importação, Imposto de Exportação, Imposto sobre Produtos Industrializados e Imposto sobre Operações Financeiras pode ser feita por decreto presidencial ou Portaria do Ministro da Fazenda (artigo 153, § 1º, da CF/1988); a redução ou restabelecimento da alíquota da Contribuição de Domínio Econômico (artgio 177, §4º, da CF/1988).
Em regra, a CF/1988 não exige a instituição de tributos por lei complementar. É que não há hierarquia entre ambas as leis, o que as distinguem são alguns aspectos do processo legislativo e a necessidade de que a CF estabeleça a matéria com reserva de lei complementar. Em matéria tributária, essas matérias estão previstas no artigo 146 da CF/1988.
A legalidade tributária não “resta satisfeita com a simples base legal, com a simples previsão legal de que determinado tributo será cobrado”, exigindo que a instituição do tributo ocorra por lei e na lei e que defina todos os aspectos da norma tributária impostiva.[3]
Vale dizer, os tributos devem ser instituídos ou majorados por lei ordinária (ou medida provisória), desde que possuam seu fato gerador previsto nas normas de competência da CF/1988. Nesse passo, as contribuições previdenciárias nominadas ou ordinárias também podem ser instituídas ou majoradas por lei ordinária. Nesse sentido:
“O § 4º do art. 195 da Constituição prevê que a lei complementar pode instituir outras fontes de receita para a seguridade social; desta forma, quando a Lei 8.870/1994 serve-se de outras fontes, criando contribuição nova, além das expressamente previstas, é ela inconstitucional, porque é lei ordinária, insuscetível de veicular tal matéria.” (ADI 1.103, Rel. p/ o ac. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 18-12-1996, Plenário, DJ de 25-4-1997.)
(...) Aduziu-se que a instituição simultânea dessas contribuições não estaria em confronto com a vedação de bis in idem, com invocação do art. 195, § 4º, da CF. Explicou-se que, na instituição de novas contribuições de seguridade social, haveria de ser observada a exigência de lei complementar, de não cumulatividade e a proibição de que tivessem fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nos incisos do art. 195. Dessa forma, não se haveria de falar sobre invalidade da instituição originária e simultânea de contribuições idênticas com fundamento no inciso IV do art. 195, com alíquotas apartadas para fins exclusivos de destinação. Justificou-se que, por constituírem contribuições cuja instituição fora devidamente prevista e autorizada, de modo expresso, em um dos incisos do art. 195 da CF, elas poderiam ser instituídas validamente por lei ordinária. Por se tratar de contribuições ordinárias de financiamento da seguridade social, com base no art. 195, IV, da CF, estaria afastada qualquer violação ao § 4º do mesmo preceito, o qual se limitaria a regular o exercício da competência residual e exigiria lei complementar, não cumulatividade, bem como fato gerador e base de cálculo distintos das contribuições ordinárias. Portanto, inaplicável o art. 195, § 4º, da CF, inviável concluir que as contribuições em questão deveriam ser necessariamente não cumulativas." (RE 559.937, rel. p/ o ac. min. Dias Toffoli, julgamento em 20-3-2013, Plenário, Informativo 699.)
Assim, somente se exige a instituição de tributos por lei complementar quando o entre tributante estiver no exercício de sua competência residual ou quando a lei vier a regulamentar as matérias previstas no artigo 146 da CF/1988. Também se exige lei complementar para instituição das contribuições previdenciárias inominadas, forte no disposto no artigo 195, § 4°, da CF/1988. Nesse sentido, é o entendimento do STF, cuja jurisprudência somente exige lei complementar para a instituição de contribuições previdenciárias inominadas[4].
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, o princípio da legalidade é exaustivamente esclarecido pela doutrina e jurisprudência do STF, consubstanciando-se na exigência de lei para majoração ou instituição de tributos. A CF/1988 estabeleceu, ainda, que a criação de tributos e contribuições à seguridade social inominados depende de lei complementar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARO, Luciano. Curso de Direito Tributário. 23.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 505 p.
ÁVILA, Alexandre Rossato. Curso de Direito Tributário. Verbo Jurídico: Porto Alegre, 2005. 366 p.
FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade Social. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2004. 560p.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 23.ed. São Paulo: Malheiros, 2003. 505p.
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 6.ed. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2004. 1300p.
[1] ÁVILA, Alexandre Rossato. Curso de Direito Tributário. Verbo Jurídico: Porto Alegre, 2005. p.24;
[2] AMARO, Luciano. Curso de Direito Tributário. 23.ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 24;
[3] FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade Social. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2004. p. 350;
[4] “(...) o art. 56 da Lei 9.430/1996 é dispositivo legitimamente veiculado por legislação ordinária (art. 146, III, b, a contrario sensu, e art. 150, § 6º, ambos da CF), que importou na revogação de dispositivo anteriormente vigente (sobre isenção de contribuição social) inserto em norma materialmente ordinária (art. 6º, II, da LC 70/1991). Consequentemente, não existe, na hipótese, qualquer instituição, direta ou indireta, de nova contribuição social, a exigir a intervenção de legislação complementar, nos termos do art. 195, § 4º, da CF.” (RE 377.457, voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 17-9-2008, Plenário, DJE de 19-12-2008.) No mesmo sentido: RE 522.719-AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 23-11-2010, Segunda Turma, DJE de 4-3-2011; AI 418.898-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 15-9-2009, Primeira Turma, DJE de 16-10-2009; RE 551.553-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 26-5-2009, Primeira Turma, DJE de 26-6-2009; AI 700.657-AgR, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 5-5-2009, Primeira Turma, DJE de 28-8-2009; AI 709.691-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 28-4-2009, Segunda Turma, DJE de 29-5-2009; AI 541.632–AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 17-3-2009, Segunda Turma, DJE de 17-4-2009.
"SEBRAE. Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. Lei 8.029, de 12-4-1990, art. 8º, § 3º. Lei 8.154, de 28-12-1990. Lei 10.668, de 14-5-2003. CF, art. 146, III; art. 149; art. 154, I; art. 195, § 4º. As contribuições do art. 149, CF, contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse de categorias profissionais ou econômicas, posto estarem sujeitas à lei complementar do art. 146, III, CF, isto não quer dizer que deverão ser instituídas por lei complementar. A contribuição social do art. 195, § 4º, CF, decorrente de 'outras fontes', é que, para a sua instituição, será observada a técnica da competência residual da União: CF, art. 154, I, ex vi do disposto no art. 195, § 4º.” (RE 396.266, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 26-11-2003, Plenário, DJ de 27-2-2004.) No mesmo sentido: RE 413.413-AgR, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 21-5-2013, Primeira Turma, DJE de 12-6-2013; AI 650.194-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 4-8-2009, Segunda Turma, DJE de 28-8-2009; ADI 1.924-MC, Rel. p/ o ac. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 20-5-2009, Plenário, DJE de 7-8-2009; RE 427.356, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 14-4-2009, Segunda Turma, DJE de 15-5-2009; AI 630.179-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 17-3-2009, Primeira Turma, DJE de 17-4-2009; AI 708.772-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 10-2-2009, Segunda Turma, DJE de 13-3-2009.
“A Lei 9.506/1997, § 1º do art. 13, acrescentou a alínea h ao inciso I do art. 12 da Lei 8.212/1991, tornando segurado obrigatório do regime geral de previdência social o exercente de mandato eletivo, desde que não vinculado a regime próprio de previdência social. Todavia, não poderia a lei criar figura nova de segurado obrigatório da previdência social, tendo em vista o disposto no art. 195, II, CF. Ademais, a Lei 9.506/1997, § 1º do art. 13, ao criar figura nova de segurado obrigatório, instituiu fonte nova de custeio da seguridade social, instituindo contribuição social sobre o subsídio de agente político. A instituição dessa nova contribuição, que não estaria incidindo sobre ‘a folha de salários, o faturamento e os lucros’ (CF, art. 195, I, sem a EC 20/1998), exigiria a técnica da competência residual da União, art. 154, I, ex vi do disposto no art. 195, § 4º, ambos da CF. É dizer, somente por lei complementar poderia ser instituída citada contribuição.” (RE 351.717, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 8-10-2003, Plenário, DJ de 21-11-2003.) No mesmo sentido: RE 343.801-AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 20-3-2012, Segunda Turma, DJE de 26-6-2012; RE 465.981-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 30-11-2010, Segunda Turma, DJE de 1º-2-2011; AI 716.481-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 5-10-2010, Segunda Turma, DJE de 4-11-2010; RE 599.023-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 9-2-2010, Segunda Turma, DJE de 12-3-2010.
“Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PIS/PASEP. Medida Provisória. Superação, por sua conversão em lei, da contestação do preenchimento dos requisitos de urgência e relevância. Sendo a contribuição expressamente autorizada pelo art. 239 da Constituição, a ela não se opõem as restrições constantes dos arts. 154, I, e 195, § 4º, da mesma Carta.” (ADI 1.417, Rel. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 2-8-1999, Plenário, DJ de 23-3-2001.) No mesmo sentido: RE 432.413-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 19-10-2010, Primeira Turma, DJE de 23-3-2011.
Procuradora Federal, Coordenadora de Gerenciamento e Prevenção de Litígios e Coordenadora-Geral Substituta da Matéria de Benefícios da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS, Direção Central em Brasília/DF. Professora Tutora Professora Tutora do Curso Aspectos Práticos e Relevantes do Direito Previdenciário da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Conselho Nacional de Justiça (ENFAM/CNJ). Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais - Direito - pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Gabriela Koetz da. O princípio da legalidade e as contribuições previdenciárias Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 nov 2013, 07:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37391/o-principio-da-legalidade-e-as-contribuicoes-previdenciarias. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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