I – CONCEITO E FASES DA TOMADA DE CONTAS ESPECIAL
A tomada de contas especial – TCE encontra-se definida no art. 2º da Instrução Normativa TCU n.º 71/2012 e no art. 82 da Portaria Interministerial MPOG/MF/CGU n.º 507/2011:
“Tomada de Contas Especial é um processo administrativo devidamente formalizado, com rito próprio, para apurar responsabilidade por ocorrência de dano à administração pública federal, com apuração de fatos, quantificação do dano, identificação dos responsáveis e obter o respectivo ressarcimento.” (art. 2º, caput, da IN/TCU n.º 71/2012).
“A Tomada de Contas Especial é um processo devidamente formalizado, dotado de rito próprio, que objetiva apurar os fatos, identificar os responsáveis e quantificar o dano causado ao Erário, visando ao seu imediato ressarcimento.” (art. 82 da Portaria Interministerial MPOG/MF/CGU n.º 507/2011).
Na acepção de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes [1]:
Tomada de contas especial é um processo excepcional de natureza administrativa que visa apurar responsabilidade por omissão ou irregularidade no dever de prestar contas ou por dano causado ao erário.
Ainda segundo o mestre Jorge Ulisses Jacoby Fernandes [2]:
Tomada de contas é, na fase interna, um procedimento de caráter excepcional que visa determinar a regularidade na guarda e na aplicação de recursos públicos e, diante da irregularidade, na fase externa, um processo para julgamento da conduta dos agentes públicos.
Por fim, arremata [3] :
A rigor, os processos de julgamento das contas nos tribunais de contas só assumem a natureza de processo a partir do seu ingresso na corte, na chamada
fase externa. Antes dessa fase não apresenta partes ou litigantes, porque inexiste uma lide, mas somente uma unidade dos atos investigatórios rumo à verdade material.
No relatório final de uma comissão de tomada de contas especial, por exemplo, poderá essa firmar a irregularidade das contas, hipótese em que, após a manifestação do órgão de controle interno e da autoridade (ministro, secretário de Estado ou equivalente), serão os autos remetidos ao tribunal de contas, para julgamento. Precisamente nesse momento, a TCE assume a condição de processo, quando o órgão instrutivo, apreciando a apuração promovida pela comissão e os demais elementos dos autos, destacará os principais aspectos, passando diretamente, ou após a deliberação do colegiado das cortes de contas — plenário ou câmara —, para a manifestação do ministério público, que funciona em caráter especializado junto ao tribunal.
Nesse momento, presenciando a existência de indícios, formaliza-se a acusação,
seguindo-se citação, defesa e julgamento pelo tribunal de contas (FERNANDES,
2003, p. 523).
Assim, podemos conceituar a TCE como um instrumento de que dispõe a Administração Pública para se ressarcir de eventuais prejuízos que lhes foram causados. Possui rito próprio e configura um procedimento de exceção, de forma que apenas pode ser instaurada depois de esgotadas todas as medidas administrativas para reparação do dano.
A necessidade de prévio esgotamento das vias administrativas vem expressamente prevista nos arts. 3º e 4º da Instrução Normativa TCU n.º 71/2012:
Art. 3º Diante da omissão no dever de prestar contas, da não comprovação da aplicação de recursos repassados pela União mediante convênio, contrato de repasse, ou instrumento congênere, da ocorrência de desfalque, alcance, desvio ou desaparecimento de dinheiro, bens ou valores públicos, ou da prática de ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano ao Erário, a autoridade competente deve imediatamente, antes da instauração da tomada de contas especial, adotar medidas administrativas para caracterização ou elisão do dano, observados os princípios norteadores dos processos administrativos.
Art. 4º Esgotadas as medidas administrativas de que trata o art. 3º desta Instrução Normativa sem a elisão do dano, a autoridade competente deve providenciar a imediata instauração de tomada de contas especial, mediante a autuação de processo específico, observado o disposto nesta norma.
Segundo o Supremo Tribunal Federal, a TCE não é um procedimento administrativo disciplinar e sim uma medida que tem por objetivo proteger a coisa pública:
A tomada de contas especial não consubstancia procedimento administrativo disciplinar. Tem por escopo a defesa da coisa pública, buscando o ressarcimento do dano causado ao erário. Precedente (MS 24.961, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 4-3-2005)." (MS 25.880, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 7-2-2007, Plenário, DJ de 16-3-2007).
Importante ressaltar que a TCE não é julgada pela autoridade administrativa instauradora, mas sim pelo Tribunal de Contas da União - TCU. Configura-se, portanto, um ato jurídico composto em que prevalece a decisão da Corte de Contas.
Dessa forma, embora o tomador de conta e o dirigente do órgão de controle interno tenham que emitir um parecer conclusivo quanto à comprovação da ocorrência do dano, à sua quantificação e à correta imputação da obrigação de ressarcir a cada um dos responsáveis (art. 10, I, h e III da IN nº 71/2012), compete ao Tribunal de Contas da União o julgamento final. Tanto é assim que a autoridade competente providenciará baixa pela responsabilidade do débito caso o TCU: (i) considere elidida a responsabilidade pelo dano inicialmente imputada ao responsável; (ii) considere as contas iliquidáveis; (iii) der quitação ao responsável quando o débito for recolhido; (iv) arquive o processo por falta de pressupostos de instauração ou desenvolvimento regular ou considere não haver dano imputável ao responsável. Assim, a decisão final é do TCU.
Acerca das fases da Tomada de Contas Especial, cabe a transcrição das palavras de Ubiratan Aguiar, Ana Cláudia Messias de Lima Martins, Paulo Roberto Wiechers Martins e Pedro Tadeu Oliveira da Silva, extraídas do livro Convênios e Tomadas de Contas Especiais [4]:
Não obstante a mesma denominação, a TCE, em sua fase interna e na sua fase externa, se diferencia de forma substancial. Na fase interna, é simples procedimento administrativo, assemelhado ao inquérito, que se movimenta por vontade exclusiva daqueles que possuem competência para instaurá-la – administrador público e os respectivos tribunais de contas.
Na fase externa, entretanto, adquire as feições de processo, ainda que de caráter administrativo especial, por meio do qual o responsável pelas supostas irregularidades apuradas na fase interna, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, será chamado a apresentar alegações de defesa ou recolher o valor do débito que lhe está sendo atribuído. Exceto por alguma medida saneadora que precise ser realizada, na fase externa a TCE se desenvolve exclusivamente no âmbito dos tribunais de contas.
(...)
A fase interna tem como objetivo precípuo a apuração dos fatos, a identificação dos responsáveis e a quantificação do valor do dano. Tanto no que se refere à Administração quanto no que diz respeito ao TCU, o requisito básico para instauração de tomada de contas especial é a existência de um possível dano ao erário, seja por ato doloso seja por ato culposo.
(...).
Na fase denominada externa, a tomada de contas especial adquire as feições de processo e se desenvolve exclusivamente no âmbito do Tribunal de Contas da União, nos termos fixados na Lei nº 8.443/92 e demais normas processuais da Corte, sendo utilizado subsidiariamente outras normas processuais, independentemente de sua origem: se instaurada pelo próprio TCU ou por autoridade administrativa.
Independentemente da origem, os autos da TCE serão encaminhados às respectivas unidades técnicas do Tribunal, que adotará as providências de suas alçadas. Dentre essas providências, realiza um exame preliminar se seu conteúdo, com vistas a verificar se a mesma contempla todas as peças exigidas pela legislação específica. Não cumpridos os requisitos exigidos, mediante despacho fundamentado o processo será devolvido ao controle interno.
Dessa forma, concluída a TCE na fase interna e desde que não tenha havido o recolhimento do débito, o valor seja superior a R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais) e haja comprovação de comprovação de danos imputáveis aos responsáveis, o procedimento será encaminhado ao Tribunal de Contas da União.
II – A TOMADA DE CONTAS ESPECIAL NA FASE INTERNA E INSCRIÇÃO NO CADASTRO INFORMATIVO DE CRÉDITO NÃO QUITADOS DE ÓRGÃOS E ENTIDADES FEDERAIS – CADIN.
Considerando que a tomada de contas especial ainda na fase interna se trata de mero procedimento não findo, não caberia a imediata inclusão do(s) responsável (s) no Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de Órgãos e Entidades Federais – CADIN pelo débito enquanto o processo de TCE não tiver a decisão final do TCU. Isso porque, conforme foi citado, o processo de TCE, quando ainda no âmbito interno da autoridade instauradora, trata-se de mero procedimento e não de processo finalizado. Tal ilação, a meu ver, foi reforçada pelo art. 4º, parágrafo único da Decisão Normativa TCU nº 126/2013, que sucede a Decisão Normativa TCU nº 45/2002. Veja-se:
Art. 4º As providências para inclusão no Cadin apenas serão tomadas após transitado em julgado o acórdão condenatório e caso não comprovado, no prazo estabelecido, o recolhimento da dívida.
Parágrafo único. Para os fins desta decisão normativa, considera-se transitado em julgado o acórdão que não mais se sujeita aos recursos previstos nos arts. 32, incisos I e II, e 48 da Lei nº 8.443, de 1992, nos seus prazos normais de interposição.
Aliás, o dispositivo acima já tinha sido previsto ipsis litteris na Decisão Normativa TCU nº 45/2002:
Art. 4º As providências para inclusão no CADIN apenas serão tomadas após transitado em julgado o acórdão condenatório e caso não comprovado, no prazo estabelecido, o recolhimento da dívida.
Parágrafo único. Para os fins desta decisão normativa, considera-se transitado em julgado o acórdão que não mais se sujeita aos recursos previstos nos arts. 32, incisos I e II, e 48 da Lei nº 8.443/92, nos seus prazos normais de interposição
Uma interpretação sistemática da Lei nº 10.522/2002, que regula a inscrição no Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de Órgãos e Entidades Federais – CADIN, corrobora o entendimento citado.
De fato, a Lei nº 10.522/02 fixou o procedimento a ser adotado para a inscrição do devedor no CADIN - banco de dados onde se acham registrados os nomes de pessoas físicas e jurídicas em débito com órgãos e entidades federais -, estabelecendo que os órgãos da Administração Pública efetuarão as inclusões no cadastro segundo normas próprias:
Art. 2º. O Cadin conterá relação das pessoas físicas e jurídicas que:
I - sejam responsáveis por obrigações pecuniárias vencidas e não pagas, para com órgãos e entidades da Administração Pública Federal, direta e indireta; (...)
§ 1º Os órgãos e as entidades a que se refere o inciso I procederão, segundo normas próprias e sob sua exclusiva responsabilidade, às inclusões no Cadin, de pessoas físicas ou jurídicas que se enquadrem nas hipóteses previstas neste artigo.
§ 2º A inclusão no Cadin far-se-á 75 (setenta e cinco) dias após a comunicação ao devedor da existência do débito passível de inscrição naquele Cadastro, fornecendo-se todas as informações pertinentes ao débito. (g.n).
Desse modo, a lei que disciplina a inscrição no CADIN dispõe que os órgãos da Administração Pública Federal devem inscrever no cadastro as pessoas que sejam responsáveis por débitos vencidos e não pagos, para com aqueles órgãos, segundo suas próprias normas e sob sua exclusiva responsabilidade.
Nesse diapasão cabe uma indagação: qual o conceito de débito vencido? O art. 201 do Código Tributário Brasileiro fornece um conceito objetivo do que seria dívida vencida:
Art. 201. Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessanatureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular.
Pelo disposto acima, débito vencido seria aquele devido depois de esgotado o prazo para pagamento fixado na lei ou em decisão final proferida em processo regular. Levando tal conceito para o presente estudo, em processo de TCE remetido ao TCU só existe débito vencido depois da decisão final proferida pela Corte de Contas. Em conseqüência, em TCE, o débito somente estará regularmente constituído após a decisão do TCU.
Portanto, enquanto a TCE não for julgada pelo TCU, não é possível a inscrição dos possíveis devedores no CADIN. Isso porque, repita-se, a TCE, enquanto na fase interna da autoridade instauradora, e ainda que certificada pela Controladoria Geral da União, trata-se de mero procedimento e não de processo findo.
Sobre o assunto, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem assim se posicionado:
"É ilegítima a inscrição de Município no Cadastro de Inadimplentes do SIAFI, antes do julgamento da Tomada de Contas Especial (TCU), por violação ao princípio do devido processo legal no âmbito administrativo." (TRF 1ª Região, REOMS 96.01.25274-6/DF, Juiz Federal Vallisney de Souza Oliveira, DJ de 09/12/2004, p. 71).
O próprio Supremo Tribunal Federal - STF, nas situações em que determinado Estado ou Município é inscrito no SIAFI/CAUC, tem deferido cautelar para a retirada da inscrição, sob o argumento de que os prejuízos decorrentes da inscrição no SIAFI/CAUC para os exercícios da função primária do ente político, “sobretudo no que se refere à continuidade da execução das políticas públicas”, são maiores do que a ausência de inscrição do Estado, supostamente devedor, nesse banco de dados. (confira-se: AC nº 39 (MC), Rel. Min. Ellen Gracie, monocrática, DJ 11.07.03; AC 223 (MC), Rel. Min. Gilmar Mendes, monocrática, DJ 23.04.04; AC 266 (MC), Rel. Min. Celso de Mello, monocrática, DJ 31.05.04; AC nº 259 (MC), Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, unânime, DJ 03.12.04; AC nº 659 (MC), Rel. Min. Carlos Britto, Plenário, unânime, julg. 12.06.06).
Por fim, na seara judicial, o STF reconheceu a repercussão geral da questão relativa à necessidade de prévio julgamento de Tomada de Contas Especial como exigência para a inclusão de ente federativo no SIAFI, discutida no Recurso Extraordinário – RE nº 607.420/PI.
É certo que as decisões acima citadas se referem à inscrição de ente público no SIAFI/CAUC, mas não deixam de ser um balizador para a necessidade de julgamento final da TCE para inscrição no CADIN.
Bom, em que pese o acima exposto, o TCU tem entendido de forma diferente. É que embora tenha sido editada a Decisão Normativa nº 126/2013 (que, conforme visto, dispõe que a inscrição no CADIN será feita apenas após o trânsito em julgado do acórdão condenatório e caso não comprovado, no prazo estabelecido, o recolhimento da dívida), uma análise do art. 5º dessa mesma Decisão Normativa, conduz ao entendimento de que a Corte de Contas ventila a possibilidade de inscrição no CADIN antes mesmo do julgamento final da TCE. Para facilitar referida conclusão confira-se o disposto no art. 5º da Decisão Normativa TCU nº 126/2013:
Art. 5º O Tribunal de Contas da União comunicará à AGU, em caso de multa, ou ao órgão ou entidade a que se vincula originariamente o crédito, ou ao seu sucessor, em caso de débito, para que faça a exclusão do nome do responsável do Cadin, caso não haja outro débito em seu nome, conforme as atribuições indicadas nos arts. 2º e 3º, nos seguintes casos:
I – quitação da dívida, com os devidos acréscimos legais, dada pelo Tribunal;
II – julgamento das contas pela regularidade ou pela isenção da responsabilidade, com o trânsito em julgado do acórdão;
III – deferimento de pedido de parcelamento da dívida, depois de comprovado o pagamento da primeira parcela; ou
IV – afastamento da dívida, por meio de decisão do Tribunal em recurso sem efeito suspensivo. (g.n.).
Ou seja, pelo acima disposto, o TCU comunicará a Advocacia-Geral da União - AGU para que faça a exclusão do nome do responsável do CADIN nos casos dos incisos I a IV do citado art. 5º. Disso facilmente se conclui que, na visão do TCU, o órgão responsável pela TCE pode sim incluir o nome do responsável no CADIN.
Essa mesma conclusão se extrai da Instrução Normativa TCU nº 71/2012. De fato, os arts. 15 e 16 da IN dispõem expressamente:
Art. 15. A autoridade competente deve:
I - registrar nos cadastros de devedores e nos sistemas de informações contábeis, especialmente no previsto na Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, as informações relativas ao valor do débito e à identificação dos responsáveis;
II - dar ciência da providência indicada no inciso anterior ao responsável.
Art. 16. A autoridade competente providenciará baixa da responsabilidade pelo débito se o Tribunal de Contas da União:
I - considerar elidida a responsabilidade pelo dano inicialmente imputada ao responsável;
II - considerar não comprovada a ocorrência de dano;
III - arquivar o processo por falta de pressupostos de instauração ou desenvolvimento regular;
IV - considerar iliquidáveis as contas;
V - der quitação ao responsável pelo recolhimento do débito; ou
VI - arquivar a tomada de contas especial com fundamento no art. 7º, inciso II, desta Instrução Normativa.
Parágrafo único. Na hipótese de o Tribunal de Contas da União concluir por débito de valor diferente daquele originalmente apurado, incumbe à autoridade competente efetuar os ajustes adicionais que se façam necessários com relação às medidas indicadas no art. 15 desta Instrução Normativa. (g.n.).
Ora, providenciar baixa da responsabilidade pelo débito equivale a dizer que a autoridade competente irá retirar o nome do CADIN nas hipóteses acima elencadas.
Aliás, a própria Portaria Interministerial nº 507/2011 – que regula os convênios, os contratos de repasse e os termos de cooperação celebrados pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal - dispõe que, no caso de processos de TCE relacionados a convênios, contratos de repasse ou instrumentos congêneres, deverá ser feito o registro da convenente como INADIMPLENTE no SIAFI/SICONV, o que é um procedimento similar a inscrição no CADIN, no ato de instauração da TCE e não apenas com a decisão final do TCU. Confira-se:
Art. 82 – (...);
§ 3º A instauração de Tomada de Contas Especial ensejará:
I - a inscrição de inadimplência do respectivo instrumento no SICONV, o que será fator restritivo a novas transferências de recursos financeiros oriundos do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social da União mediante convênios, contratos de repasse e termos de cooperação, nos termos do inciso V do art. 10 desta Portaria; e
II - o registro daqueles identificados como causadores do dano ao erário na conta "DIVERSOS RESPONSÁVEIS" do SIAFI.
Assim, a Corte de Contas caminha no sentido de que é necessária, sim, a prévia inscrição no CADIN antes do julgamento final da TCE. Via de conseqüência, o TCU, quando menciona no art. 4º da Decisão Normativa nº 126/2013 que há necessidade do trânsito em julgado para inscrição no CADIN, na verdade ele se refere a processos de TCE que se iniciam no seu próprio âmbito, não sendo aplicável, portanto, as hipóteses em que a TCE começa em órgão externo. Entretanto, tal entendimento advém de uma interpretação sistemática e não de uma interpretação literal da referida DN/TCU nº 126/2013.
Aliás, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em sentido oposto ao decidido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, já manifestou entendimento de que não é necessário aguardar o julgamento final da tomada de contas pelo TCU para promover a inscrição no CADIN, conforme ementa abaixo transcrita:
ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. SIAFI E CADIN. EXAME DA PRESTAÇÃO DE CONTAS PELA SUDENE. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REGISTRO NO SIAFI. ATRIBUIÇÃO NÃO EXCLUSIVA DO TCE. DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. - A matéria sub examine cinge-se a análise da possibilidade de imposição de sanção, como inclusão nos cadastros de inadimplentes, antes da instauração e julgamento final da Tomada de Contas Especial pelo C. Tribunal de Contas da União, bem como analisar se restou configurado o contraditório e a ampla defesa na Auditoria Interna promovida pela agravada. - Como se observa na decisão agravada durante o procedimento administrativo de prestação de contas, a SUDENE concedeu a agravante todas as oportunidades para sua defesa. - No que tange à alegação de necessidade de instauração de Tomada de Contas Especial para a inscrição da ora agravante no cadastro de inadimplentes, é cediça a jurisprudência desta Corte no sentido de que a inscrição no SIAFI e CADIN não se encontra subordinada à instauração e finalização do processo administrativo de Tomada de Contas Especial perante o TCU. - Agravo de instrumento não provido. Agravo regimental prejudicado.(AG 200905001124309, Desembargador Federal PAULO GADELHA, TRF5 - Segunda Turma, DJE 25/03/2010, p. 169).
Conclui-se, portanto, que a questão sob análise dá margem a dois entendimentos diametralmente opostos, os quais podem ser assim resumidos: (i) o art. 2º da Lei nº 10.522/02 c/c uma interpretação literal do art. 4º da Decisão Normativa nº 126/2013 e, ainda, as decisões judiciais do TRF 1ª Região e STF citadas ao longo deste estudo amparam o entendimento de que a inscrição no CADIN só pode ser feita após o esgotamento final da TCE. Compartilho tal entendimento; (ii) o art. 16 da Instrução Normativa TCU nº 71/2012; o art. 82 da Portaria Interministerial nº 507/2011 e o art. 5º da Decisão Normativa TCU nº 126/2013 c/c decisão do TRF da 5ª Região entendem que a inscrição no CADIN/SIAFI/CAUC pode ser feita quando a TCE estiver concluída no âmbito interno do órgão instaurador.
Ressalte-se, ainda, que os questionamentos suscitados ao longo deste estudo são aplicáveis em processos de TCE encaminhados ao TCU. Assim, qualquer outro processo que tenha início e fim dentro do próprio órgão, sem necessidade de ratificação por outro ente, e que culmine em responsabilização (p. ex., PAD que resulte em condenação do servidor a devolver determinado numerário; processos com valor inferior ao limite para instauração de TCE, etc) deve, após obediência ao contraditório e devido processo legal e, ainda, após ciência do responsável, ensejar inscrição no CADIN.
Referências Bibliográficas
FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tomada de contas especial: processo e procedimento nos tribunais de contas e na administração pública. 3ª edição
AGUIAR, Ubiratan. MARTINS, Ana Cláudia Messias de Lima. MARTINS, Paulo Roberto Wiechers. SILVA, Pedro Tadeu Oliveira da. Convênios e Tomadas de Contas Especiais, Belo Horizonte, Editora Forum, 2005, 2ª ed.
Notas:
[1] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tomada de contas especial: processo e procedimento nos tribunais de contas e na administração pública. 3ª edição, p. 31.
[2] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tomada de contas especial: processo e procedimento nos tribunais de contas e na administração pública. 3ª edição, p. 31-32.
[3] FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tomada de contas especial: processo e procedimento nos tribunais de contas e na administração pública. 2ª edição, p. 523.
[4] AGUIAR, Ubiratan. MARTINS, Ana Cláudia Messias de Lima. MARTINS, Paulo Roberto Wiechers. SILVA, Pedro Tadeu Oliveira da. Convênios e Tomadas de Contas Especiais, Belo Horizonte, Editora Forum, 2005, 2ª ed., p. 96/97.
Procuradora Federal. Chefe da Divisão de Precatórios e Dívida Ativa do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Especialista em Direito Público pela Universidade de Brasília.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARTINS, Patricia Cristina Lessa Franco. Tomada de Contas Especial: Conceito, fases e sua repercussão quanto à inscrição no Cadastro Informativo dos Créditos Não Quitados de Órgãos e Entidades Federais - CADIN Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 dez 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37453/tomada-de-contas-especial-conceito-fases-e-sua-repercussao-quanto-a-inscricao-no-cadastro-informativo-dos-creditos-nao-quitados-de-orgaos-e-entidades-federais-cadin. Acesso em: 23 dez 2024.
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