A definição de princípio é antiga e muitos são os critérios para defini-lo e diferenciá-lo de regra. Para Robert Alexy a diferenciação da definição de princípio e regra é um dos pilares fundamentais do edifício da teoria dos direitos fundamentais.[1]
Princípios segundo definição de Robert Alexy, “son mandatos de optimización, que están caracterizados por el hecho de que pueden ser cumplidos en diferente grado y que la medida debida de su cumplimiento no sólo depende de las posibilidades reales sino también de las jurídicas.”[2] Entende ele que a diferença entre regra e princípio é qualitativa e não de graduação. As regras contêm uma determinação, enquanto os princípios apenas uma direção a ser seguida, pois não contém determinações diretas.[3]
Para Dworkin “a legislação deve ser entendida, até onde for possível, como a expressão de um sistema coerente de princípios”, [4] pois é por intermédio do princípio que poderá ser obtido o exato significado e alcance da lei.
Nesse sentido é a definição de Aurélio Buarque de Holanda[5] ao entender que princípios são proposições diretoras de uma ciência, aos quais todo o desenvolvimento posterior dessa ciência deve estar subordinado.
Portanto, adotar-se-á a definição que compreende princípios como os mandamentos previstos num ordenamento jurídico e que determinam o alcance e significado das regras legais que a eles se submetem. Os princípios subordinam as leis, na medida em que os conteúdos destas leis devem ser entendidos conforme os princípios. O descumprimento de um princípio viola o sistema por ele estruturado, enquanto o descumprimento da lei ocasiona apenas afronta a um único comportamento exigido. O sistema jurídico continua inalterado.
2.1 Os princípios implícitos no Código Penal brasileiro.
Princípios implícitos são aqueles mandamentos utilizados como fontes do direito penal e também na interpretação da lei penal incriminadora, Obviamente não estão expressos na lei penal, mas são extraídos do contexto da lei penal.
2.1.1 O princípio da prevalência do objeto jurídico.
Os objetos jurídicos enumerados pelo Código Penal Brasileiro foram estabelecidos a partir de sua prevalência sobre os demais que sequer foram mencionados. Daí dizer-se que há uma prevalência do bem jurídico protegido sobre outros, de forma que cada um dos crimes mencionados visa a proteção de um bem, motivo pelo qual cada um deles é estabelecido no Código Penal, em cada Título, capítulo e seção. Para tanto o legislador utilizou uma técnica própria par a o estabelecimento dos tipos penais.. Utiliza-se como núcleo do tipo um ou mais verbos no imperativo, para destacar a conduta infracional, que viola o bem protegido. Ao invés de se descrever o mandamento proibitivo, e logo a conduta que não deve ser realizada, porque criminosa, descreve-se a conduta proibida e que deverá ser realizada para que o crime se consume, em decorrência do princípio da reserva legal.
Por intermédio da técnica legislativa utilizada se determina o objeto jurídico tutelado, como por exemplo, no caso de genocídio, onde a vida de grupos de pessoas de determinada etnia, raça nacionalidade e religião são protegidas. Não apenas a vida humana, mas a vida humana de pessoas pertencentes aos grupos definidos. Esta técnica utilizada no Estatuto de Roma é idêntica à adotada no Brasil, pois o legislador pátrio define os crimes descrevendo sempre a conduta proibida, que traz implicitamente o mandamento proibido, e que determina o objeto jurídico tutelado.
2.2.2 O princípio da fragmentariedade
O princípio da fragmentariedade está diretamente relacionado com o da prevalência do objeto jurídico, pois o Direito Penal somente intervém ou deve intervir quando justificadamente houver necessidade, o que implica a grave ofensa ao bem ou interesse jurídico.
Fragmentar significa para o Direito Penal selecionar criteriosamente as condutas que merecem estar disciplinadas em lei, logo isolar as condutas para pinçá-las segundo sua importância, prevendo-as em norma incriminadora.
Nesse sentido, Luis Flávio Gomes afirma entender que o princípio da fragmentariedade é expresso pelo “ataque intolerável” ao objeto jurídico, e que “pode ser penalmente castigado”. [6]
Portanto, o Código Penal ao estabelecer em seu bojo as normas incriminadoras que visam a prevenir ou reprimir a prática de crimes graves adotou o princípio da fragmentariedade, pois o Estado somente intervirá nos casos estritamente previstos, onde efetivamente outros mecanismos de prevenção não foram suficientes e eficazes na proteção dos valores erigidos a bens ou interesses jurídicos.
2.2.3 O princípio da adequação social
Por intermédio do princípio da adequação social, que segundo Welzel[7] é princípio geral de hermenêutica, a conduta humana poderá ser socialmente adequada e logo excluída do rol das condutas típicas.
Prosseguindo, Francisco de Assis Toledo afirma que “a ação socialmente adequada está, desde o início, excluída do tipo, porque se realiza dentro do âmbito de normalidade social [...]”.[8]
Note-se que pelo princípio exposto, ainda que a ação desejada e realizada possa ser considerada criminosa e enquadrada no tipo descrito na lei, o autor age “dentro do que é normalmente aceito e tolerado”[9] motivo pelo qual “não há que se falar, desde o início, em tipicidade material, dispensando-se o agente de ter que recorrer a uma causa de justificação para alcançar a impunidade do fato”.[10]
2.2.4 O princípio da intervenção mínima
O princípio em análise preconiza que a intervenção do Estado nas relações humanas e para exercer controle social deve ser a menor possível, em razão dos princípios já mencionados, como o da prevalência do objeto jurídico e também da fragmentariedade, porque a norma penal somente terá eficácia se for aplicada para proteger um bem jurídico relevante, previamente selecionado.
O supracitado princípio tem sua origem na legislação Alemã, datada de 1969, por meio da qual a sanção penal “dever ser a necessária e a mínima das possíveis”.[11]
Arnaldo Siqueira afirma com proeminência que “a intervenção mínima do direito penal é resultado de princípios democráticos do Estado moderno que norteiam as constituições do mundo civilizado, dentre elas a brasileira”.[12] Note que se depreende da afirmação que a comunidade internacional comunga desse princípio de forma a erigi-lo à categoria de princípio basilar no Estatuto de Roma.
Não se justifica a intervenção do Estado em qualquer caso, mas apenas naqueles casos em que outros ramos do direito se quedaram ineficazes. Nesse sentido afirma, com veemência, Cezar Bittencourt: “o princípio da intervenção mínima, também conhecida como ultima ratio, orienta e limita o poder incriminador do Estado”[13] de forma que “a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico”.[14]
Entretanto, não se pode olvidar de que todos os sistemas vão se complementando, visando a proteção irrestrita da pessoa humana na esfera internacional.
2.2.5. O princípio da proporcionalidade
Como a denominação está a indicar, o princípio da proporcionalidade, adotado pelo Código Penal, afigura-se como um instrumento de proteção dos direitos fundamentais às limitações impostas pelo Estado a tais direitos e como critério para a resolução de conflitos de direitos fundamentais, por intermédio de três vertentes: a necessidade da medida, a sua adequação e o seu custo-benefício.
Segundo Paulo Bonavides o princípio da proporcionalidade tem sua autoridade expressa “toda vez que ocorre antagonismo entre direitos fundamentais” e aplicando-se o referenciado instrumento de interpretação se pode chegar a uma solução conciliatória, [15] implicando ainda eficiente “instrumento de apoio às decisões judiciais que, após submeterem o caso a reflexões prós e contras, a fim de averiguar se na relação entre meios e fins não houve excesso, concretizam assim a necessidade do ato decisório de correção”. [16]
Também Maurício Antônio Ribeiro Lopes afirma que o princípio da proporcionalidade entre os norte-americanos é denominado razoabilidade para demonstrar a interpretação dos preceitos constitucionais segundo a equidade, a adequação, a aceitabilidade, enfim uma interpretação razoável.[17]
No direito Alemão o princípio, sob exame, foi pela primeira vez utilizado, mas na área do direito administrativo. Como princípio de direito Constitucional foi previsto primeiramente na Suíça e somente depois no Direito Constitucional Alemão, com a designação de proporcionalidade ou proibição de excesso, sendo expresso, segundo Jellinek, em 1791, em conferência acerca do direito de polícia, nos termos seguintes: “O Estado somente pode limitar com legitimidade a liberdade do indivíduo na medida em que isso for necessário à liberdade e à segurança de todos”.[18] A partir desse preceito o princípio foi migrando para a área constitucional, principalmente em decorrência da Segunda Guerra Mundial, e da jurisprudência do Tribunal Constitucional, sendo consolidado com a decisão proferida em 16 de março de 1971, tratando de armazenagem de petróleo:
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessário para alcançar o objetivo procurado. O meio é adequado quando com seu auxílio se pode alcançar o resultado desejado: é necessário, quando o legislador não poderia ter escolhido outro meio, igualmente eficaz, mas que não limitasse ou limitasse da maneira menos sensível o direito fundamental. [19]
Note-se que essa transformação do princípio da proporcionalidade da esfera do direito administrativo para a do direito constitucional, se deve a atuação das Cortes Constitucionais, não apenas na Europa, mas também no Brasil, onde o Supremo Tribunal Federal não raras vezes tem decidido segundo o que entende aceitável, extraindo esse conceito da relação entre os fundamentos da causa de pedir e da pretensão a ser alcançada, utilizando para tanto a denominação de razoabilidade.[20]
O mencionado princípio, segundo Suzana de Toledo Barros, foi admitido como escrito em nossa Constituição Federal, por intermédio do devido processo legal, “por ele devendo entender-se que nenhuma restrição a direitos pode ocorrer, em razão de qualquer ato estatal, sem que seja razoável, isto é, adequada, necessária e proporcionada aos fins a que se destina”.[21]
No tocante à aplicação do princípio, no âmbito do Tribunal Internacional, o princípio da proporcionalidade funciona como instrumento para a ponderação da limitação do direito a liberdade, devendo ser ponderado: a necessidade da punição, a sua adequação e a relação custo-benefício da punição aplicada.
A necessidade da pena é evidenciada por intermédio da ofensa ao bem jurídico relevante e a gravidade da lesão, demonstrando que “a resposta penal é meio indispensável para a proteção de um determinado bem jurídico”.[22] Além de necessária a punição deve ser adequada. Esta adequação encontra sintonia com a revisão da norma penal incriminadora, descrevendo a conduta com todas as suas elementares, bem como a previsão em abstrato da pena cominada. Nesse sentido é a posição de Luiz Luisi ao afirmar que “o princípio em causa está presente na norma penal incriminadora ao fixar in abstrato, a medida da pena”.[23]
Note-se que o princípio não atinge apenas a cominação da pena abstratamente, mas também o momento da aplicação da pena, após o julgamento da ação penal, isto é a apreciação do caso concreto. É necessário ponderar “ao lado da intensidade objetiva da ofensa, a maior ou menor culpabilidade, com que se houve o agente”. [24]
2.2.6. O princípio da necessidade
O princípio da necessidade é corolário do princípio da proporcionalidade e expressa a motivação fundamentada para que se dê a privação da liberdade quando a pena é imposta ou quando os direitos fundamentais da pessoa humana são restringidos, para que outros direitos sejam protegidos. Certamente, o princípio da necessidade ressalta a colisão entre dois ou mais direitos, a priori, considerados absolutos, sendo certo que a colisão somente poderá ser resolvida na medida em que um dos direitos for restringido.
O referenciado princípio está implícito no Código Penal, expresso pelo teor do art. 75, que prevê “o tempo de cumprimento das penas privativas da liberdade não pode ser superior a trinta anos”. Pelo teor do dispositivo, se extrai que a privação da liberdade individual do indivíduo somente poderá se dar quando o crime praticado for de extrema gravidade ou as condições pessoais do infrator justifiquem.
Note-se que, por intermédio deste princípio, a liberdade que é um bem considerado inviolável poderá ser mitigada em razão da ofensa a outro bem jurídico, caracterizado como indisponível e que exige o sacrifício da liberdade individual. Nesse sentido é o pensamento de Luiz Luisi ao afirmar que “sendo as penas, em suas várias espécies formas de privação e/ou restrição desses direitos invioláveis, só se justificam quando a resposta penal é meio indispensável para a proteção de um determinado bem jurídico”.[25] Deve pois existir uma relação entre o bem jurídico lesionado e a necessidade de sua proteção, porque de maior relevância.
2.2.7 O princípio da ofensividade
O princípio da ofensividade é caracterizado, segundo Luís Flávio Gomes, como mais um mecanismo de “limite da intervenção penal”.[26]
A tipificação do delito não comporta mais apenas a adequação da conduta à descrição contida na norma, é necessário que no bojo deste requisito exista a relevante ofensa ao bem jurídico. Daí poder-se destacar dois aspectos do princípio da ofensividade, ambos referentes ao processo legislativo, o primeiro relativo à eleição do bem jurídico a ser protegido e sua relevância, exigindo a interferência do Direito Penal, e o segundo, referente à estrutura do tipo que passa também a ser composta pelo bem jurídico protegido e a relevância da ofensa a esse bem.[27]
Somente são enumeradas as condutas relevantes e que podem violar ou representar um perigo significativo aos bens jurídicos, igualmente relevantes, e logo exigem que haja interferência do Estado.
Por fim, deve ser mencionado que o principio da ofensividade está estreitamente relacionado com os princípios acima analisados, “daí a necessidade de que sejam estabelecidos não somente as adequadas indicações que permitem ao legislador selecionar legitimamente o bem objeto da tutela penal, senão, sobretudo, os limites estreitos da proteção penal”.[28]
Além dos princípios implícitos, vários outros, explícitos, são adotados pelo Código Penal, que serão objeto do subitem seguinte.
2.3. Os princípios explícitos adotados pelo Sistema Normativo Brasileiro.
Ao contrário dos implícitos, os princípios explícitos são aqueles que se encontram expressamente previstos, pois estão escritos na Constituição Federal e também no Código Penal. São eles:
2.3.1 princípio da reserva legal
O princípio da reserva legal não se confunde com o da legalidade. O princípio da legalidade exige conformidade de conduta consoante a lei. Já o princípio da reserva legal tem como fundamento a lei para que se possa restringir direitos e garantias individuais, no tocante a previsão de crimes.Logo, está reservado à lei diminuir direitos ou até privar o indivíduo por determinado tempo de exercê-los.
A lei penal, de conteúdo incriminador não determina que se conforme a conduta a lei penal. Ao contrário determina o que não deve ser realizado.
Consagrado em nossa Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXIX, também está previsto nos arts. 1º do Código Penal e nos arts. 22, 23 e 24, do capítulo III, do Estatuto de Roma.
Outro axioma que decorre do princípio da reserva legal é o de que não há pena sem lei, posto que somente haverá punição se houver tipo penal em abstrato e tipicidade, pois deve a conduta humana se amoldar no tipo para ser típica. O Tribunal Penal Internacional prevê que “qualquer pessoa condenada pelo Tribunal só poderá ser punida em conformidade com as disposições do Estatuto” e ainda que a lei é irretroativa e somente excepcionalmente poderá retroagir para beneficiar o indiciado, acusado ou condenado..
Do teor do disposto nos artigos acima se depreende que o princípio da legalidade contém segundo Luiz Luisi, três postulados. O primeiro referente às fontes das normas penais incriminadoras, equivalentes a reserva legal; o segundo, a enunciação dessas normas, equivalente a determinação taxativa e o terceiro, as disposições penais no tempo, ou seja, a irretroatividade da lei penal. [29]
O princípio da reserva legal, primeiro desdobramento da legalidade, é secular no direito brasileiro. Desde a Constituição de 1824 estava previsto, e na atual Constituição Federal está elencado entre os direitos e garantias individuais dos cidadãos brasileiros e estrangeiros, como já mencionado, no art. 5º, inciso XXXIX, ao determinar que não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. A reserva legal constitui a forma encontrada pelo legislador de limitar o poder estatal, no caso o poder de punir do Estado. Também representa uma limitação da intervenção desregrada do Estado nos direitos e liberdades individuais.
Deve-se ressaltar que o princípio da reserva legal atualmente é aceito por muitas Nações, daí estar previsto em suas Constituições, motivo pelo qual sua previsão no Tribunal Penal não é novidade, porque já fora previsto na Declaração Dos Direitos do Homem e do Cidadão, no art. 5º, e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no art. XII, 2.[30]
No tocante ao segundo postulado, a lei penal deve ser taxativa quando da descrição da conduta humana, que constitui o tipo, com todos os seus requisitos e suas circunstâncias, bem como no quantitativo das penas a serem aplicadas, se privativa de liberdade ou apenas restritivas de direitos ou de multa. Logo, como corolário da legalidade se extrai a necessidade de que a norma penal incriminadora possua preceito primário e secundário. O primário individualizando a conduta e estabelecendo de forma estrita os seus elementos, e o secundário estabelecendo os tipos de sanções cominadas e o seu quantitativo.
Nesse particular, Ney Moura Teles enfatiza:
[...] a lei penal há de ser certa, exata, precisa, proibida a utilização de fórmulas excessivamente genéricas ou de interpretação duvidosa, devendo, pois o legislador, no momento definir os comportamentos humanos que deseja considerar crimes, evitar a utilização de expressões vagas ou ambíguas, a fim de que todos os indivíduos possam, com facilidade, compreender a extensão e o alcance das normas de proibição. [31]
Portanto, a determinação taxativa da conduta ilícita e sua respectiva punição revelam um dos prismas do princípio da legalidade, não implicando a impossibilidade de se estabelecer à interpretação analógica ou as chamadas normas penais em branco, quando o legislador utiliza no conteúdo do tipo requisitos que devem ser completados ou por outros ramos do direito ou outras áreas do conhecimento, como é o caso da expressão “experiências biológicas”, utilizada no Estatuto de Roma, em seu art. 8, § 2, alínea a, inciso ii, ao tratar dos crimes de guerra, bem como a interpretação analógica prevista no mesmo Tratado, também no art. 8, § 2, alínea a, inciso xviii, ao referir-se à utilização de gases tóxicos ou similares ou qualquer líquido, material ou dispositivo análogo.[32]
Em outro giro, há os elementos normativos que exigem, para ser decifrados e provados, um juízo de valor a ser feito pelo julgador e vinculado às circunstâncias objetivas do fato criminoso. Encontra-se exemplo de elemento normativo no art. 8, § 2, letra b, inciso xxi, do Estatuto de Roma, ao prever a conduta ilícita de “cometer ultrajes contra a dignidade de indivíduos, em particular tratamentos humilhantes e degradantes”.[33] Neste dispositivo deverá ser verificado o que é, em cada caso concreto, tratamento humilhante e degradante, elementos normativos do tipo. Logo, a taxatividade da conduta humana descrita na norma penal incriminadora não encontra óbice na interpretação analógica, nos elementos normativos, ou nas normas penais em branco.
Por intermédio do princípio da determinação ou da taxatividade, chamado por Luiz Luisi de determinação taxativa, a norma penal deve ser estrita, além de prévia, escrita, certa, necessária e atual. Este princípio estabelece a proibição de “elaboração de tipos penais com a utilização de expressões ambíguas, equívocas e vagas de modo a ensejar diferentes e mesmo contrastantes entendimentos”. [34]
A elaboração da lei penal pelo legislador deve ser clara e inequívoca para que alcance todos de forma uniforme, evitando-se “formas diferenciadas, e, pois, arbitrárias na sua aplicação, ou seja, para reduzir o coeficiente de variabilidade subjetiva na aplicação da lei”. [35]
O último dos postulados decorrentes do princípio da reserva legal é o da irretroatividade da lei penal que implica a validade e eficácia da lei penal para fatos ocorridos após a sua entrada em vigor. Expressa a atualidade da lei penal, que somente poderá ser aplicada a fatos ocorridos sob a vigência de norma diversa. Daí falar-se em anterioridade da lei penal e na retroatividade da lei para beneficiar o réu.
A anterioridade da lei penal se apenas no direito pátrio é princípio inderrogável, passou a constituir um dos pilares do sistema penal internacional no Estatuto de Roma, visando evitar as críticas sofridas pelos julgamentos levados a efeito pelos Tribunais de Nuremberg, para o Extremo Oriente e pelos Tribunais ad hoc e particularmente evitar que condutas gravemente lesivas a bem jurídicos ficassem impunes por falta de regime estabelecido em tratados. O art. 24 do Estatuto de Roma prevê expressamente a anterioridade da norma penal.
Também prevê no mesmo dispositivo a retroatividade da lei penal para beneficiar o réu, ao dispor que será aplicado “o direito mais favorável à pessoa objeto de inquérito, acusada ou condenada, se o direito aplicável a um caso for modificado antes de proferida sentença definitiva”. [36]
Portanto, o princípio da irretroatividade da lei penal consagrado no art. 5º, inciso XI, de nossa Constituição Federal, é adotado pelo Estatuto de Roma, em seu art. 24, demonstrando que os sistemas nacional e internacional estão em sintonia na adoção e aplicação dos princípios penais.
2.3.2 Princípio do ne bis in idem
O princípio do ne bis in idem, também conhecido como da proibição de duas ou mais condenações pelo mesmo fato ou a utilização de uma mesma circunstância ou requisito duas ou mais vezes, está inserido no art. 20 do Tribunal Penal Internacional, com fórmula semelhante no Código Penal Brasileiro, no art. 8º.
Consiste o referenciado princípio em expressamente proibir a punição de indivíduo que já tenha sido julgado pelo próprio Tribunal, pelo mesmo fato. Tenha sido condenado ou absolvido
No sistema normativo brasileiro há previsão do princípio no art. 8º, do CPB, com o seguinte teor: “a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas ou nela é computada, quando idênticas”. Trata-se da diversidade qualitativa ou quantitativa. A primeira refere-se ao abatimento do quantum da pena imposta no Brasil, caso o condenado tenha cumprido parte da pena no estrangeiro, havendo coincidência de crimes e diversidade de penas. A segunda se refere a atenuação da pena, desde que seja idêntica a imposta no estrangeiro, e lá o condenado tenha cumprido parte da pena.
Por intermédio do referenciado princípio um requisito ou circunstância não poderá ser utilizado duas ou mais vezes para caracterizar o mesmo delito, valendo dizer, para punir o autor do fato. O que eventualmente poderá ocorrer é a voluntariedade e consciência em praticar uma conduta infracional, que possua um requisito que seja também circunstância. Nessa hipótese será punido pelo crime e não pela circunstância, que será absorvida pela infração.
No direito brasileiro, quando uma conduta é caracterizada como crime autônomo e também como circunstância ou requisito de outra infração penal aplica-se um dos princípios do conflito aparente de normas, o da especialidade, da consunção, da subsidiariedade ou da alternatividade. Exemplo significativo desse conflito aparente é o crime lesão corporal grave que é absorvido pelo homicídio contra grupo racial, de forma a caracterizar o crime de genocídio.
2.3.3 Princípio-não há crime sem lei - nullum crimen sine lege
O princípio de que não há crime sem lei decorre do princípio já mencionado da legalidade. Note-se que esse princípio possui vários desdobramentos, como já apreciado anteriormente, sendo um deles o princípio em exame, que retrata a tipicidade ou a determinação taxativa, implicando a descrição da conduta humana de forma precisa e descrevendo de forma taxativa todas as elementares, sem que seja necessário recorrer-se a interpretações extensivas ou analógicas, para se ter uma completa compreensão da norma penal incriminadora.
Deve ser mencionado que o princípio da taxatividade ou da determinação taxativa nem sempre foi uma exigência intransponível. No Brasil, por exemplo, não eram raros os casos em que a norma penal incriminadora possuía a descrição de condutas, já existentes no Código Penal Brasileiro, com outra denominação de infração penal, gerando o chamado conflito aparente de normas. Exemplo deste fato é o crime de homicídio qualificado, que está previsto nos incisos do art. 121, § 2º, do CPB, e ao mesmo tempo é descrito como crime de genocídio, no art. 1º, da Lei nº 2889, de 1º de outubro de 1956, ao disciplinar: “quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal: a) matar membros do grupo [...] será punido com as penas do art. 121, §2º, do Código Penal, no caso da letra a”.[37] Observe-se que além da mesma sanção, o crime de genocídio possui as mesmas elementares que o crime de homicídio, porque o legislador ao editar a Lei nº 2889, restringiu-se a reproduzir os tipos existentes. O fato diferenciador dos dois tipos será a intenção do agente.
No Brasil, o princípio da determinação taxativa ou da tipicidade restrita vem sendo observado com rigor. Este rigor também está sendo observado no tocante às regras do Estatuto de Roma, pois apesar do referenciado Tratado ter sido ratificado pelo Brasil, implicando dizer que foi aprovado pelo Poder Legislativo e promulgado pelo Presidente da República, nos termos do inciso VIII, do art. 84, da Constituição Federal Brasileira[38], e portanto incorporado legislativamente pelo sistema jurídico brasileiro, foi encaminhado, ao Poder Legislativo projeto de lei que terá por objeto as regras constantes do Estatuto, as descrições de crimes e regras procedimentais. Trata-se de uma reprodução integral do texto do Estatuto de Roma, visando inviabilizar qualquer questionamento quanto à hierarquia do Tratado que impossibilite sua aplicação.
2.3.4. Princípio- não há pena sem prévia cominação legal- nulla poena sine lege.
O princípio constitui matéria reservada à lei, daí princípio da reserva legal. É denominado da anterioridade da pena. Coexiste ao lado do princípio da anterioridade do crime e sem ele não sobrevive. Ambos, como já analisado, são decorrentes do famigerado princípio da legalidade, assim como o da reserva legal e da irretroatividade da lei penal.
Referenciado princípio constitui um dos pilares do Direito Penal Moderno, embora esteja diretamente vinculado aos movimentos revolucionários franceses que pregavam a igualdade dos Homens. Entretanto, pode ser encontrado de forma tênue na Magna Charta , de 1215, onde o Rei João Sem Terra, temendo perder os benefícios da Coroa em razão da revolta dos burgueses, concedeu-lhes alguns direitos, dentre eles o da anterioridade de crimes e penas. Entretanto o princípio do nulla poena sine lege somente foi sistematizado com os iluministas e filósofos franceses, como Beccaria e Feuerbach, significando “um princípio político, pois representa um anteparo da liberdade individual em face da expansiva autoridade do Estado”[39]. Representa uma “reação a estatolatria medieval, adotou-o a Revolução Francesa, incluindo-o em fórmula explícita, entre os direitos fundamentais do homem”.[40]
Previsto em todas as Constituições brasileiras e expressamente no inciso XXXIX, do art. 5º da Constituição Brasileira de 1988. Foi adotado pelo Tribunal Internacional Penal, no art. 23, ao dispor que “qualquer pessoa condenada pelo Tribunal só poderá ser punida em conformidade com as disposições do presente Estatuto”.[41]
Decorrem do princípio em exame outros quatro. São eles: o princípio da individualização da penal; da responsabilidade pessoal ou da personalidade da pena; da limitação da pena e da sua humanização.
Deve-se entender, segundo Nelson Hungria, o princípio da individualização da pena como a norma por meio da qual é estabelecido o processo para “retribuir o mal concreto do crime, com o mal concreto da pena, na concreta personalidade do criminoso”[42], o que implica exata adequação da pena ao fato praticado, levando-se em conta a pessoa do condenado e as circunstâncias em que o fato se desenvolveu. É de se notar ainda que a conceituação de Nelson Hungria, acerca da individualização da pena, entende-a como retribuição do mal concreto do crime. Entretanto, na atualidade, a sanção penal não é entendida como a retribuição do mal ocasionado com a prática do crime, cominando-se um castigo, a pena, mas a reinserção do criminoso a sociedade em que vive.
Quanto à finalidade da pena as opiniões dos juristas não são acordes. Zaffaroni utiliza a expressão “ingerência ressocializadora sobre o condenado” [43] para exprimir o significado da pena, enquanto Capez a define como “a sanção penal [...] cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade”. [44]
A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execuções Penais, menciona em seu art. 1º, que “execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado” [45] (negritou-se). Também utilizou o legislador, no art. 10 da mencionada norma, a expressão “retorno à convivência em sociedade”.[46] Não se deve entender que se aplicando uma sanção penal haverá a ressocialização do preso, pois o homem sendo ser social por excelência, não será novamente socializado, mas readaptado ao meio social que vivia e do qual foi segregado.
O princípio da individualização da pena não está definido no ordenamento jurídico brasileiro, mas sua previsão é expressa, bem como os tipos de sanções penais previstas. Está inserto no inciso XLVI, do art. 5º da Constituição Federal Brasileira, de forma indireta, ao descrever o legislador os tipos de sanções cabíveis, como a pena privativa ou restritiva da liberdade; a perda de bens; a multa; a prestação social alternativa e a suspensão ou interdição de direitos. As cominações das sanções penais estão adstritas à observância da prevalência do bem jurídico atingido pelo fato criminoso.
A individualização da pena deve ser feita em três fases: a cominação, aplicação e execução.
A cominação das penas é de exclusiva competência do Poder Legislativo, pois somente a União cabe legislar em matéria penal, ao estabelecer as condutas humanas criminosas e de estabelecer o quantum da pena, isto é a quantidade e a qualidade. A quantidade está adstrita aos anos de privação de liberdade, enquanto a qualidade se refere ao tipo de pena, se privativa da liberdade, restritiva de direitos ou pecuniária, bem como se poderá sofrer aumentos ou diminuições, em razão de condições pessoais do condenado ou das circunstâncias do crime.
No ordenamento jurídico brasileiro a pena privativa da liberdade somente poderá ser cumprida pelo prazo máximo de trinta anos, conforme art. art. 75, do Código Penal, podendo ser o autor do crime condenado a mais de tinta anos, hipótese em que a as penas serão unificadas, de forma a atender o limite máximo de os trinta anos.
Não havendo cominação de sanção penal, de seu mínimo e máximo, o princípio sofre violação, e logo a lei será inconstitucional, pois infringe regra constitucional, ao excluir o preceito secundário dos tipos.
O primeiro momento da individualização da pena é abstrato porque fixado pelo Legislador ao elaborar a norma que tem caráter geral, porque atinge a todos.
O segundo momento, chamado de aplicação da sanção, é o momento concreto da individualização da pena. Aplicar a sanção penal, e logo a lei ao caso concreto dizendo o direito, é atribuição exclusiva do Poder Judiciário.
Cabe ao Juízo criminal apreciar as provas que elucidaram a autoria do crime e comprovaram a materialidade do fato e as suas circunstâncias. Todavia está obrigado a seguir o limite estabelecido pelo Legislativo, ao deixar de analisar culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do criminoso, os motivos, as circunstâncias e conseqüências do fato e a vitimologia, segundo o art. 59 do Código Penal Brasileiro.[47] Observando as circunstâncias judiciais se chega a pena base, que poderá ser agravada ou atenuada, se existirem circunstâncias qualificadoras ou de privilégio, agravantes ou atenuantes e por fim as causas de aumento ou diminuição de pena. Após fixar a pena, deverá estabelecer o regime de cumprimento, que poderá ser o fechado, o semi-aberto ou aberto.
Ao depois, nova fase se impõem, a terceira, quando não recai sobre a sentença condenatória qualquer recurso. A fase da execução da pena, que será de competência do Executivo. O estabelecimento, pelo Juiz, do regime de cumprimento de pena é direito do preso e constitui regra constitucional, pois no inciso XLVIII, do art. 5º, o legislador determina que as penas sejam cumpridas em estabelecimentos distintos, conforme a natureza do fato, a idade e o sexo do apenado.
Diferentemente do Direito Brasileiro o Estatuto de Roma admite a pena de prisão perpétua, que será objeto de analise de outro capítulo. Todavia, igualmente ao sistema brasileiro, não admite que a pena que tenha sido parcelada possa ser aplicada em quantum inferior ao da parcela de quantum mais alto, bem como não poderá ser superior a 30 anos de prisão ou ir além da pena de prisão perpétua prevista no artigo 77.º, n.º 1, alínea b, do Tribunal Penal Internacional.
Outro desdobramento do princípio da nulla poena sine lege é a responsabilidade pessoal ou personalidade da pena, também chamada por Luiz Luisi de pessoalidade. Por intermédio deste princípio somente o autor do crime poderá estar sujeito às sanções penais. Encontra sua expressão no inciso XLV, do art. 5º, da Constituição Federal, quando dispõe: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado [...]”.[48] Ressalva, todavia o legislador constitucional, no mesmo dispositivo, que poderão “a obrigação de reparar o dano e a decretação de perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido”.[49] Esta parte final do dispositivo não constitui exceção ao princípio da pessoalidade da pena, mas a necessidade de reparação do dano causado pela prática do crime, que é uma sanção civil, e como tal deve obedecer às regras do direito das sucessões. Sobrevindo a morte do condenado por prática do crime e havendo decisão judicial para reparar o dano causado, esta obrigação será transmitida aos sucessores, assim como os direitos.
O terceiro desdobramento do princípio é o de que a limitação da pena, que não encontra seu patamar apenas na quantidade da pena, mas também no tipo de pena a ser aplicada.
No Brasil, o limite quantitativo da pena privativo de liberdade está previsto no art. 75, ao determinar o máximo de 30 anos para cumprimento, podendo a condenação ser superior a 30 anos, ocasião em que a pena será unificada. Também as penas restritivas de direito e a pena pecuniária são limitadas. Segundo o art. 49, do CPB, a pena de multa será de dez, no mínimo, e de 360 dias-multa, no máximo, enquanto as penas restritivas de diretos serão: a - na condenação igual ou superior a um ano – uma pena de multa ou uma restritiva de direitos; b- na condenação superior a um ano- uma pena restritiva de direitos e multa ou duas restritivas de direitos, conforme § 2º, do art. 44, do CPB.
Além da limitação quantitativa, existe também a qualitativa referente ao tipo de pena imposta. Esse limite está expressamente previsto no Texto Constitucional, no seu inciso XLVII, ao dispor que não serão impostas penas de trabalhos forçados, de banimento, cruéis, de caráter perpétuo e de morte, salvo em caso de guerra declarada nos termos do art. 84, inciso XIX.
A pena de trabalhos forçados é incoerente com o Estado Democrático de Direito, porque este tem como um dos fundamentos a dignidade da pessoa humana. Isto posto, não se pode submeter alguém, ainda que na condição de condenado, ao trabalho forçado, reduzindo a pessoa à condição análoga de escravo, que caracteriza inclusive crime contra a liberdade individual, porque cerceia o livre arbítrio, inclusive de escolher, se possível, o seu trabalho.
Não se deve olvidar, todavia, que a Lei de Execuções penais determina que o trabalho realizado pelo condenado terá finalidade educativa e produtiva, bem como é dever social e condição da dignidade humana.[50]
Em que pese atribuir ao trabalho do condenado uma obrigação do Estado para a realização da dignidade da pessoa humana, prevê um pagamento inferior ao salário mínimo e ainda o exclui de sujeição à Consolidação das Leis Trabalhistas, criando um sistema jurídico diferenciado para o preso. Curiosamente, dispõe que o trabalho do condenado a pena privativa da liberdade é obrigatório, segundo suas capacidades e aptidões.[51]
As previsões acima se afiguram como contraditórias, na medida em que submetem os condenados a regime laboral diverso do estabelecido para todos os brasileiros, inclusive com pagamento abaixo do salário mínimo. Em outro giro, não se pode olvidar que a imposição de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, nos termos do inciso IV, do art. 43 do CPB, caracteriza um trabalho não voluntário e que deve ser prestado por aqueles que praticam crimes cuja pena privativa de liberdade não seja superior a quatro anos e o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; se o crime for culposo, qualquer que seja a pena, ou ainda, quando o réu não for reincidente em crime doloso ou a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do condenado, os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos foi suficiente, nos termos do art. 44.
Logo, se depreende que o condenado por crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa; crime hediondo; ou então aquele que não atenda as condições do art. 44, do CPB, e não possa ter a pena substituída terá o trabalho como obrigatório, bem como para aquele que tenha sido condenado à prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, por crime menos grave e que tenha direito a substituição das penas. Entretanto a imposição do trabalho não tem o mesmo reflexo jurídico nas hipóteses acima mencionadas, porque enquanto o que foi condenado à pena restritiva de direitos, deve cumpri-la sob pena de reversão da substituição, na outra hipótese, não. Ou porque não há onde trabalhar ou por total inércia do Estado, que não dispõem de locais onde o trabalho seja efetivamente realizado, como caráter de obrigatoriedade, nos termos da LEP, de forma que o trabalho, de fato, passa a ser obrigatório apenas para os que sejam submetidos a pena restritiva de direitos e não para o condenado à pena privativa de liberdade.
Todavia, não se pode deixar de estabelecer que o nosso sistema jurídico diferencia trabalho forçado do trabalho obrigatório, segundo seja decorrente de constrangimento ilegal ao qual a pessoa é submetida, sendo privada de sua liberdade individual, do seu livre arbítrio, sendo reduzida à condição análoga de escravo, e, portanto vítima de crime, ou conseqüência de uma sanção penal imposta pelo Poder Judiciário.
A pena de banimento também está excluída do ordenamento jurídico brasileiro por disposição expressa do inciso XLVII, do art. 5º da Constituição Federal. Apesar de ter vigorado no Brasil durante o Código Criminal do Império, foi limitada no Código Penal Republicano, e expurgada com o advento da CF de 1891. Todavia, no período pós-golpe militar de 1964, a pena de banimento foi novamente instituída, agora com a denominação de exílio político, porque não decorria de aplicação de sanção pena, mas de “instrumento de ação do poder Executivo, que o aplicou a seus adversários políticos”.[52]
As penas cruéis também são proscritas no Ordenamento jurídico brasileiro, segundo o princípio constitucional, porque se opõem ao fundamento do Estado Democrático de Direito, a dignidade da pessoa humana.
O meio cruel empregado na prática de crime está previsto, no sistema brasileiro, como circunstância qualificadora e torna o crime hediondo, nos termos da Lei nº 8.072/90. Não seria razoável prever a crueldade como qualificadora do crime de homicídio e permiti-la como espécie de sanção penal.
O ordenamento jurídico brasileiro também proscreve a pena de morte, como regra. Admite-se, apenas, no caso do art. 84, inciso XIX, que regula a competência privativa do Presidente da República, no caso de agressão estrangeira, de fazer declaração de guerra, “autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional”.[53]
A pena de morte foi prevista no nosso ordenamento jurídico desde as Ordenações do Reino, por influência do Direito Português e persistiu até o advento do Código Penal do Império, de 1830, sendo abolida definitivamente em 1855. [54]
As Constituições Brasileiras Republicanas previam a proibição de aplicação da pena de morte, excepcionando os casos previstos no Código Penal Militar referente à guerra externa.
Excepcionalmente é admitida em caso de guerra declarada pelo Presidente da República, decorrente de agressão estrangeira. Esta hipótese encontra consonância no fundamento do Estado Democrático Brasileiro, qual seja a defesa da soberania, bem como nos princípios adotados. São eles: da independência nacional; prevalência dos direitos humanos; autodeterminação dos povos; não intervenção; igualdade entre os Estados; defesa da paz; solução pacífica dos conflitos; repúdio ao terrorismo e racismo; cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e a concessão de asilo político, conforme art. 4º da Constituição Federal.
Deve-se entender que a influência dos diversos movimentos mundiais em favor da proteção dos direitos humanos tem gerado o repúdio à pena de morte. No Brasil, tem foro constitucional, como já afirmado, a não aplicação da pena de morte, que sequer pode ser introduzida por meio de emenda à CRFB, porque existe a proibição expressa no art. 60, § 4º, inciso IV, quando dispõe acerca da proibição da emenda tendente a abolir os direitos garantias individuais.
A proibição da aplicação da pena de morte, como sanção penal, representa a expressão de um sistema jurídico, daí porque é proibida em diversos países da Europa, como Portugal, Espanha, Itália, França, Áustria, Finlândia, Noruega, Suíça, Suécia, bem como no Canadá e na América Latina. Por outro lado, há países que a adotam há muito, em especial, países do oriente.
Também constitui limitação às sanções penais, a aplicação da pena de prisão perpétua em nosso ordenamento jurídico, que, igualmente à pena de morte, tem foro constitucional, não podendo ser objeto de emenda constitucional, porque visa à supressão de direitos e garantias individuais.
O último desdobramento do princípio da anterioridade da previsão da pena é a sua humanização, que no ordenamento jurídico nacional encontra-se inserto nos incisos XLVIII, XLIX e XLIX, art. 5º, da Constituição Federal, ao assegurar o cumprimento da pena em lugares distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; o respeito à integridade física e moral do preso, bem como a permanência das presidiárias com seus filhos no período da amamentação. [55]
Além da previsão constitucional, o princípio da humanização da pena que é expresso pelo respeito ao preso está previsto no art. 38 do Código Penal, além da previsão nos arts. 40 e 88 da Lei de Execuções Penais.
O referenciado princípio está estritamente vinculado à limitação das penas, porque a pena deve ser aplicada proporcionalmente ao dano provocado com a prática do delito. Zaffaroni entende que o princípio da humanidade “é o que dita a inconstitucionalidade de qualquer pena ou conseqüência do delito que crie um impedimento físico permanente, [...] como também qualquer conseqüência jurídica indelével do delito”.[56]
Deve-se ressaltar que a humanização da pena não deve ser observada apenas na fase judicial. Ao revés, deve ser observada, com cautela, pelo legislador ao estabelecer as penas a serem cominadas aos crimes. Logo, na elaboração da norma penal o preceito de caráter genérico e abstrato deve observar o princípio em exame.
A inobservância da humanização da pena pelo legislador acarreta conseqüências graves, porque a sua aplicação deverá ser realizada pelo Judiciário e cumprida pelo Executivo, sendo, portanto, inexeqüível uma pena que seja desproporcional ou que despreze ou viole a limitação das penas ou os direitos do preso. Nesse diapasão, pode-se mencionar o exemplo, no direito brasileiro, da Lei nº 8.072/90, que gerou e vem gerando muita polêmica no âmbito das decisões judiciais, em razão do regime de cumprimento das penas, ao instituir os crimes hediondos e incluir entre eles o crime de tortura, que foi disciplinado pela Lei nº 9.455/97. No entanto, previa a Lei de Crimes Hediondos o regime de pena integralmente fechado, e na Lei de Tortura, Lei nº 9.455/97, o regime de pena inicialmente fechado, possibilitando que para o crime de tortura houvesse a progressão de regime, e simultaneamente, proibindo a progressão para os demais crimes hediondos.
A questão acima foi submetida ao Supremo Tribunal Federal, sob o fundamento de que a Lei de Crimes Hediondos era inconstitucional, porque violava a individualização da pena. A decisão foi no sentido de que a norma é constitucional e que a diferenciação existente ente os regimes de cumprimento de pena se dava em razão da especialidade da Lei de Tortura. Possuindo especializantes poderia disciplinar diversamente da Lei de Crimes Hediondos.
Em que pese a decisão do STF, as decisões continuam díspares, porque não há uniformidade nos julgamentos, pois existem autores de crimes hediondos a que foram concedidos o benefício da progressão de regime de cumprimento de pena, enquanto outros, persistem no regime integralmente fechado.[57]
Como princípio, a pena deve ser proporcional, racional e humana, porque deve propiciar o retorno da pessoa ao convívio social.
2.3.5. Princípio do tempo do crime ou irretroatividade ratione personae
Como postulados do princípio da legalidade têm-se a reserva legal, a tipicidade ou determinação taxativa e a irretroatividade da norma penal, que são princípios adotados pelo Estatuto de Roma. Entretanto, mais precavidas foram os Estados-partes ao estabelecerem a regra da irretroatividade ratione personae, que não é senão a aplicação dos princípios da irretroatividade e da anterioridade da norma penal.
Referenciado princípio está diretamente relacionado com a eficácia da lei no tempo, pois a norma penal segue restritamente a aplicação do princípio tempus regit actum, implicando a eficácia da norma penal incriminadora sobre o fato praticado durante a sua vigência. Decorre desse princípio a extra-atividade da lei penal mais benéfica, pois sendo editada norma penal com sanções mais graves ou prevendo crimes que não eram previstos, a lei a ser aplicada é a anterior mais benéfica, desde que o fato seja também anterior, porque a norma mais grave é irretroativa. Entretanto, se a nova norma penal for mais favorável ao infrator, deve retroagir para beneficiá-lo. Logo, a norma penal é irretroativa. Somente retroage para beneficiar o criminoso.
A regra do tempo do crime e da irretroatividade da norma penal foi estabelecida no art. 24, §§ 1 e 2, do Estatuto de Roma, ao prever que o tempo do crime é o do momento da pratica do crime, e ainda que nenhuma pessoa será considerada criminalmente responsável por uma conduta anterior à sua entrada em vigor, bem como será aplicável o direito mais favorável ao indiciado, acusado ou condenado, se, antes da sentença definitiva, o direito aplicável ao caso, for modificado.
Por fim, merecem destaque as hipóteses de aplicação de norma penal mais favorável ao infrator: a - se a norma penal, e logo, o crime deixa de existir, porque a lei foi revogada. É o caso da abolitio criminis; b- se lei nova modificar a anterior, reduzindo a pena; c- se o regime de pena for modificado, beneficiando o condenado; d- o caso de ultra-atividade da lei, quando ocorrer a hipótese de lei, que deveria ser aplicada ao fato, mas no curso do processo foi modificada por outra que comine pena mais favorável e que também seja revogada por uma terceira norma, prevendo pena mais grave, que deva ser aplicada porque é a lei do tempo. Todas estas hipóteses são adotadas pelo Direito Penal Brasileiro.
2.3.6. Princípio da imputabilidade penal aos 18 anos
O sistema jurídico brasileiro prevê, em seu art. 26, a responsabilidade individual, considerando imputáveis somente às pessoas que possuam dezoito anos. Será imputável apenas a pessoa que além dos dezoito anos completos, na data da prática do fato, tenha condições de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se segundo seu entendimento. Implica dizer que o agente deve atuar intencionalmente, com consciência e vontade..
2.3.7. Princípio da responsabilidade individual penal
O direito brasileiro adota a responsabilidade penal individual, ao estabelecer, indiretamente, no seu art. 27, que somente são imputáveis os maiores de dezoito anos, sendo os menores submetidos à legislação especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que considera criança aquela pessoa que conte com 11 anos, e adolescente, aquela que possua entre 12 e 17 anos. Aos dezoito anos é imputável.
Observe-se que no Direito Nacional o agente provocador ou que ordenou a prática do delito somente será punido se há, ao menos, tentativa do crime. Também no caso da instigação, desde que não se caracterize como crime autônomo.
2.3.8. Princípio - crimes somente dolosos
No direito nacional há previsão expressa no art. 18 do CP que os crimes são praticados com dolo ou então culpa, diferenciando-se os elementos subjetivos segundo a voluntariedade e a consciência do autor no momento em que pratica o crime. O dolo é caracterizado no art. 18, inciso I, “quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”, [58] enquanto a culpa “quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia”. [59] Logo, no direito penal brasileiro, “ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente”. [60] O crime culposo somente poderá ser imputado a alguém se houver previsão expressa.
2.3.9. Princípio da imprescritibilidade
A imprescritibilidade não é inovação no sistema brasileiro, porque já prevista para os crimes de racismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático, conforme incisos XLII e XLIV, do art. 5º, da Constituição Federal. Entretanto, há regra da prescritibilidade para todos os outros crimes.
O Código Penal prevê a prescrição da pretensão punitiva (da ação) e a executória (da pena, da condenação ou da execução), nos seus arts. 109 a 111. Segundo o CPP, a prescrição é matéria de ordem pública, devendo ser decretada de ofício pelo juiz ou a requerimento das partes, em qualquer fase do processo.
Prevê a legislação penal brasileira prescrição da pena privativa de liberdade, bem como da pena restritiva de direitos e multa.
A prescrição da pena privativa de liberdade está regulada pelos art. 108 e seguintes do CP, sendo fixado o tempo de prescrição pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, em abstrato, e em concreto, após o trânsito em julgado da sentença para a acusação. Os prazos prescricionais se regulam pelo art. 109, que prevê:
[...] I - em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a 12 (doze);
II - em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) anos e não excede a 12 (doze);
III - em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) anos e não excede a 8 (oito);
IV - em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não excede a 4 (quatro);
V - em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a 1 (um) ano ou, sendo superior, não excede a 2 (dois);
VI - em 2 (dois) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano[...].
A prescrição das penas restritivas de liberdade também segue os prazos previstos para as privativas de liberdade, por força do art. 109, parágrafo único, do CPB.
Está prevista ainda a prescrição etária, no art. 115, “quando o criminoso for ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos”.[61] Já no art. 110, os prazos prescricionais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.
A multa terá seu prazo prescricional regulado no art. 114, do CPB e ocorrerá em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada e ainda, no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada.[62]
Os termos iniciais de contagem do prazo prescricional estão regulados nos arts. 111, 112 e 113 do CP e são especificados conforme trânsito em julgado da sentença. Se antes de transitar em julgado a sentença, correm do dia em que o crime se consumou; no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa; nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência, ou ainda nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido. Se depois de transitar em julgado a sentença condenatória, a prescrição começa a correr do “dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional, ou do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena” [63], nos termos do art. 112, do Código Penal.
A imprescritibilidade dos crimes contraria a tendência mundial do Direito Penal, no sentido de mínima intervenção. Ademais, há que se concordar com Zaffaroni quando afirma que “as expectativas comunitárias de reafirmação da validade da ordem jurídica não perduram indefinidamente”. [64]
A prescrição do crime se afigura também como uma garantia do indivíduo de que será processado e julgado em determinado lapso de tempo, sob pena de ocasionar-se grande dificuldade não apenas na apuração do fato, mas também em sua comprovação.
2.3.10. Princípio da exclusão de responsabilidade penal
O Estatuto de Roma possui norma semelhante ao direito brasileiro, ao excluir a responsabilidade penal nos casos em que o agente, no momento da prática do crime, não tenha condições de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se segundo esse entendimento, em razão de enfermidade ou deficiência mental, o que significa doença mental. A regra está prevista no art. 26 do CPB, ao dispor acerca da inimputabilidade.
Além da exclusão da responsabilidade penal em razão da inimputabilidade, no direito nacional há previsão da diminuição da responsabilidade, no art. 26, parágrafo único, quando “o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”, motivando a redução da pena de um a dois terços. [65]
As previsões acima do direito penal brasileiro estão em consonância com o disposto no art. 31, § 1, letra a, do Estatuto de Roma, ao prever que será excluída a responsabilidade criminal da pessoa que “no momento da prática de determinada conduta sofrer de enfermidade ou deficiência mental que a prive da capacidade para avaliar a ilicitude ou a natureza da sua conduta, ou da capacidade para controlar essa conduta criminosa”.[66]
No direito penal pátrio, a responsabilidade penal somente não será excluída, nos termos do art. 28, inc. II, se a embriaguez for voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos. Todavia, se a embriaguez for proveniente de caso fortuito ou força maior, e impossibilitar, ao tempo da ação ou da omissão, a inteiramente capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, haverá exclusão de responsabilidade penal. Poderá ainda, segunda a regra nacional, ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. [67] A emoção e a paixão não são excludentes de imputabilidade penal, segundo o art. 28 do CP.
Outra hipótese de exclusão de responsabilidade penal refere-se a legítima defesa própria e de terceiros, bem como o estado de necessidade. Afiguram-se aqui as chamadas causas de exclusão de ilicitude ou de antijuridicidade, que não retiram a responsabilidade, mas descaracterizam o próprio tipo, porque retiram a sua antijuridicidade. Esta previsão está no direito nacional que autoriza, no art. 21, a exclusão da ilicitude quando ocorrer à legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever e o exercício regular de direito.
Por fim, tem-se a exclusão da responsabilidade penal, em razão de coação e do estado de necessidade novamente. A coação realizada por ameaça, decorre do prenúncio de causar um mal injusto e grave, sendo este mal grave caracterizado pela iminência de morte ou ofensas corporais graves para si ou para outrem. Já a coação decorrente de circunstâncias independentes ao controle do agente tem a característica de estado de necessidade, porque o agente deve fazer a ponderação de bens a serem ofendidos. Para se beneficiar com a hipótese, deve atuar de forma necessária e razoável para evitar essa ameaça, e não ter a “intenção de causar um dano maior que aquele que se propunha evitar”. Logo, o dispositivo apresenta dois tipos de ameaça: a que se constitui em coação e a que se afigura como estado de necessidade.
O erro de fato e o erro de direito, bem como a ordem de superior hierárquico, figuram no rol de possíveis causas de exclusão de responsabilidade criminal. Todavia, é necessário que o erro de direito e o de fato excluam o elemento subjetivo de intencionalidade, isto é, os requisitos do crime praticado.
Já a ordem superior, emitida por um militar ou civil, somente excluirá a responsabilidade se a ordem não for manifestamente ilegal; não sabia o agente que a ordem era ilícita e ainda estivesse obrigado a obedecer a ordens emitidas pelo governo ou pelos superiores hierárquicos, em virtude de lei. Deve-se ressaltar que “qualquer decisão de cometer genocídio ou crimes contra a humanidade será considerada como manifestamente ilegal”.[68]
[1] Robert ALEXY. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro De Estudios Políticos Y Constitucionales, 2002.p.82.
[2] Ibidem. p.86.
[3] Ibidem. p.87.
[4] Ronald DWORKIN. O Império do Direito; Tradução Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes. 1999.p.403.
[5] Segundo Aurélio Buarque de Holanda, em seu Novo Dicionário Aurélio, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, p.1393.
[6] Luiz Flávio GOMES. Princípio da Ofensividade no Direito Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. Série as Ciências criminais no século XX; v. 6.. 45
[7] Apud TOLEDO, Francisco de Assis.Princípios Básicos de Direito Penal. São Paulo: Saraiva 1991.p.16.
[8] Francisco de Assis TOLEDO. Princípios Básicos de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1991.p.16.
[9] Francisco de Assis TOLEDO. Op cit. p. 186.
[10] Francisco de Assis TOLEDO. Op.cit. p. 186.
[11] Luigi FERRAJOLI. Direito e Razão - teoria do Garantismo Penal. Tradutores Ana Poaula Zomer, Fauzi Hazzan Choukr, Juarez Tavares, Luiz Flávio Gomes. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.p. 464
[12]ARNALDO Siqueira de LIMA. O Direito à Imagem: Proteção Jurídica e limites de violação.Brasília: Universa. 2003.p. 96.
[13]Cezar Roberto BITENCOURT,. Tratado de Direito Penal – Parte Geral. Vol. I, 8ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 11.
[14] Cezar Roberto BITENCOURT. Op. Cit. p.11
[15]Paulo BONAVIDES. Curso de Direito Constitucional, 9ªed., São Paulo: Malheiros. 2000. p.p.386-387
[16] Paulo BONAVIDES. Op.cit. p.387.
[17]Maurício Antônio Ribeiro LOPES. Teoria Constitucional do Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p.450.
[18]Wlalter JELLINEK. Gesetz, Gesetzesanwendung und Zweckmässigkeitserwägung. Neudruck der Ausgabe, Tübingen 1913, Scientia Aaalen, Tübingen, 1964. pp. 290 e 291. Apud Paulo BONAVIDES. Curso de Direito Constitucional, 9ªed., São Paulo: Malheiros, 2000.p.370.
[19]Paulo BONAVIDES. Curso de Direito Constitucional, 9ªed., São Paulo: Malheiros. 2000. p.370.
[20] Suzana de Toledo BARROS. O Princípio da Proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica. 2000. p. 125.
[21] Ibidem. p. 125
[22] Luiz LUISI. Os Princípios Constitucionais Penais. 2ª ed. Revista e atualizada Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2003. p.184.
[23] Luiz LUISI. op. cit. p.184.
[24] Ibidem. p.184.
[25] Luiz LUISI. Op. cit. p.184.
[26] Luiz Flávio GOMES. Op.cit. p.18.
[27] Luiz Flávio GOMES. Op.cit. p.18.
[28] Ibidem. p.21.
[29] Luiz LUISI. Op. cit. p.184. Senado Federal. Direitos Humanos, Instrumentos Internacionais e Documentos Diversos. 2ªed. Brasília: Senado Federal. 1997.p.p.15 e 133.
[30] Senado Federal. Direitos Humanos, Instrumentos Internacionais e Documentos Diversos. 2ªed. Brasília: Senado Federal. 1997.p.p.15 e 133.
[31] Ney Moura TELES. Direito Penal. Parte Geral. Volume I, São Paulo: Atlas S.A., 2004. pp.73-74.
[32] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. p.791-792
[33] Ibidem. p.791-792
[34] Luiz LUISI. Os Princípios Constitucionais Penais. 2ª ed. Revista e atualizada Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor. 2003. p.24.
[35] Ibidem. p. 24.
[36] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. p.791-792.
[37] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p..200.
[38]BRASIL. Constituição (1988). CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, São Paulo. Coleção Saraiva de Legislação. Editora Saraiva. 1998. p. 63
[39] Nelson HUNGRIA. Comentários ao Código Penal. v. 1, tomo 1. 3ª. ed. Rio de janeiro: Forense, 1955. p.12.
[40] Nelson HUNGRIA. Op. cit. p.12.
[41] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p.974.
[42] Nelson HUNGRIA. Op. cit. p.117.
[43] Eugenio Raúl ZAFFARONI e José Henrique PIERANGELI. Manual de Direito Penal Brasileiro – Parte Geral. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais. 1997.p.170.
[44]Fernando CAPEZ. Curso de Direito Penal- Parte Geral, volume 1, 4ªed. São Paulo: Saraiva. 2002. p.319
[45] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p.381.
[46] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p.382.
[47] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p.59.
[48] Brasil. Constituição ( 1988)CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, São Paulo. Coleção Saraiva de Legislação. Editora Saraiva. 1998. p. 63.
[49] Fauzi Hassan CHOUKR e Kai AMBOS. op. cit. p. 194.
[50] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p.386. Confira no art. 28.
[51] BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 386. Confira no art.28.
[52] Ney Moura TELES. Direito Penal. Parte Geral. Volume I, São Paulo: Atlas S.A., 2004. pp.87.
[53]BRASIL. Constituição (1988) CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, São Paulo. Coleção Saraiva de Legislação. Editora Saraiva. 1998. p. 64.
[54] A pena de morte, segundo Luiz Luisi decorreu do injusto enforcamento de Mota Coqueiro, que sempre afirmou ser inocente. Daí em diante, Dom Pedro II, comutava a pena de morte pelas pena de prisão perpétua.
[55] BRASIL. Constituição (1988) CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.Brasília: Senado Federal Subsecretaria de Edições Técnicas, 2001. p.18 .
[56] Eugenio Raúl ZAFFARONI e José Henrique PIERANGELI. Manual de Direito Penal Brasileiro – Parte Geral. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais. 1997.
[57] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Habeas Corpus nº HC nº 77060-8-SP, Relator: Ministro Sydnei Sanches; Pacte: Carlos Alberto T. de Aquiles; Coator: TJSPEMENTA: HABEAS CORPUS – DIREITO CONSTITUCIONAL – PENA E PROCESSO PENAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA (LEIS 8.07290, ART. 2º, § 1º E 9.455 DE 7-7-1997) – OFENSA AO PRINCÍPIO DO REFORMATIO IN PEIUS. 1 – Ao contrário do alegado na impetração, a Lei nº 9.455/97 não revogou o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, na parte que impôs o regime integralmente fechado, no cumprimento da pena, por crime de tráfico de entorpecentes, norma, aliás, declarada constitucional pelo STF (HH CC nº 69.657 e 69.603).2 – Firmou-se, nesse sentido, a jurisprudência da Corte (HH CC nº 786.543 e 76.371).3- Todavia, no caso sub judice, a sentença de 1º grau impôs ao réu o regime inicialmente fechado. E o acórdão, em recurso somente por este interposto, aplicou o regime integralmente fechado, incidindo em reformatio in peius, que o invalida nesse ponto. Por esse fundamento e não pelos demais do Habeas Corpus é deferido para se restabelecer a sentença de 1º grau, na parte em que impôs o regime apenas inicialmente fechado. 4- “A ordem estendia ao co-réu, que se encontra na mesma situação”.Disponível em www.stf,gov.br. Acesso em 26.07.04.
BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 819.
BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 819.
[58] Ibidem. p.47.
[59] Ibidem. p.47.
[60] BRASIL. BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 73.
[61] Ibidem. p. 74.
[62] BRASIL. BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 75.
[63] Ibidem. p. 75.
[64] Ibidem. p.75.
[65] BRASIL Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 50.
[66] Ibidem. p. 50.
[67]BRASIL. Código Penal. 41ªed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 43
[68] BRASIL. Código Penal. 52 Ed. São Paulo: Saraiva. 2013. p. 798.
Doutoranda em Direito das Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Brasília, Mestre em Direito das Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Brasília (2006) e Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília (2004). Delegada de Polícia Aposentada da Policia Civil do Distrito Federal. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal,Direito Internacional e Direitos humanos e humanitário. Integrante do Observatório de Segurança Pública do Distrito Federal. Autora de três livros: Crimes Contra os Costumes; Tribunal Penal Internacional e Temas de Direito Penal e Direito Processual.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TAQUARY, Eneida Orbage de Britto. Princípios penais e processuais adotados pelo sistema normativo penal brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 dez 2013, 07:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37455/principios-penais-e-processuais-adotados-pelo-sistema-normativo-penal-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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