PALAVRAS CHAVES: Auxílio-Reclusão. Requisitos. Segurado de Baixa Renda. Jurisprudência. DIB. Suspensão. Cessação.
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O AUXÍLIO-RECLUSÃO
O auxílio-reclusão, consoante dispõe o artigo 201, IV, da Constituição Federal (redação conferida pela EC n.º 20/98) é devido aos dependentes de segurado de baixa renda em caso de prisão em regime fechado ou semi-aberto, nos termos do artigo 80 da Lei 8.213.
2 REQUISITOS
O benefício está amparado no princípio humanitário da intransmissibilidade da pena aos dependentes ou familiares, sendo de devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido a prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço. São requisitos:
(a) a qualidade de segurado e de dependente previdenciário: a qualidade de dependente é comprovada mediante análise das regras previstas no artigo 16 da Lei nº 8.213. Possuem direito a postular o benefício os segurados inseridos na primeira, segunda e terceira classe de dependentes, aplicando-se as regras de exclusão, comprovação e prioridade de requerimento previstas para a pensão por morte.
(b) a concessão do benefício independe de carência, forte no disposto no artigo 80 da Lei nº 8.213/1991.
(c) a não-percepção, pelo recluso, de qualquer remuneração ou proventos decorrentes de benefício previdenciário: a regra tem como objetivo impedir que o recluso seja duplamente beneficiado pelo RGPS ou que cumule remuneração com o auxílio-reclusão. É que o benefício é renda substitutiva dos rendimentos do recluso que tem por objetivo amparar os dependentes de segurado de baixa renda na ocorrência do infortúnio. Desta forma, se o segurado recluso continuar percebendo benefício previdenciário ou remuneração, não haverá renda a ser substituída.
(d) o segurado de baixa renda: a renda bruta mensal percebida pelo segurado deve ser igual ou inferior a 360 reais, corrigidos periodicamente pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do RGPS (art. 13 da EC 20/98). Atualmente, o valor equivale em R$ 971,78 (Portaria Interministerial nº 15, de 10 de janeiro de 2013).
(e) prisão em regime fechado ou semi-aberto: o requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão de efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário. Somente possui direito a postular e receber o benefício os dependentes de segurado que estiver em regime-aberto ou fechado, sendo o benefício mantido enquanto perdurar a prisão.
2.1 Segurado de Baixa Renda
Por força do inc. IV do art. 201 da Constituição da República, o auxílio-reclusão passou a ser devido apenas aos dependentes de segurado de baixa renda. A norma constitucional de eficácia contida foi regulamentada pelo art. 116 do Decreto n.º 3.048/99. Ibrahim esclarece que “a limitação deste benefício aos dependentes do segurado de baixa renda (...) foi inovação da EX 20/98, pois anteriormente qualquer segurado preso daria direito (...) à percepção desta prestação [auxílio-reclusão]”[1].
A restrição sofreu críticas da doutrina especializada por ter restringido a cobertura previdenciária. Note-se que, após seu advento, somente terá direito ao benefício os dependentes de segurado que comprove seu último salário-de-contribuição inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais).
Ainda sobre a alteração constitucional, pondera-se que, durante muito tempo a jurisprudência reconheceu o direito dos dependentes de baixa renda receberem o benefício, independentemente da renda do segurado recluso. A questão somente foi pacificada em 25/03/2009 quando o Supremo Tribunal Federal decidiu que a renda a ser considerada para a concessão do auxílio-reclusão é a do segurado preso e não a de seus dependentes. Cita-se:
"PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes. II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários. III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade. IV - Recurso extraordinário conhecido e provido."(RE 587365, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 25/03/2009, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO. DJe-084 DIVULG 07/5/2009 PUBLIC 08/5/2009 EMENT VOL-02359-08 PP-01536)
"PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CF. DESTINATÁRIO. DEPENDENTE DO SEGURADO. ART. 13 DA EC 20/98. LIMITAÇÃO DE ACESSO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO. I - Nos termos do art. 201, IV, da CF, o destinatário do auxílio-reclusão é o dependente do segurado recluso. II - Dessa forma, até que sobrevenha lei, somente será concedido o benefício ao dependente que possua renda bruta mensal inferior ao estipulado pelo Constituinte Derivado, nos termos do art. 13 da EC 20/98. III - Recurso extraordinário conhecido e provido."
(RE 486413, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 25/03/2009, DJe-084 DIVULG 07/05/2009 PUBLIC 08/05/2009 EMENT VOL-02359-06 PP-01099)
Todavia, ainda hoje existem controvérsias sobre a comprovação da “baixa renda”, especialmente quando o segurado é preso no seu período de graça. Nessas situações, parte da jurisprudência tem entendido que deve ser o salário-de-contribuição equiparado a “zero”, entendimento que não se coaduna com a posição administrativa da autarquia previdenciária.
O INSS considera como critério para análise da baixa renda o último salário-de-contribuição recolhido. É que o escopo constitucional do benefício (Supremo Tribunal Federal, RE 587.365-0) é de recompor o status financeiro anterior da família do recluso de baixa renda. Cita-se trecho do voto do Ministro Carlos Ayres Britto nesse sentido:
O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO – (...) Subjacente ao “para quê” da norma” está a necessidade de recompor a renda doméstica, recolocar a família no status financeiro anterior, no mínimo. Busca-se suprir a falta de quem está faltando. O que é que está faltando? É a renda do segurado. (...) A Constituição está protegendo a família do segurado de baixa renda, recolocando a família no status financeiro anterior. (...) É um direito do segurado, uma contrapartida do sistema de previdência, propiciar à família, aos dependentes do segurado o auxílio-reclusão num contexto contributivo/retributivo, ou seja, de previdência social. Quando o contexto não é de previdência social, o capítulo constitucional é outro, é da assistência social, aí independe de contribuição.
Em outras palavras, a proteção especial conferida pela Constituição não tem como finalidade a tutela assistencial dos dependentes (proteção àqueles que necessitam), mas conceder ao segurado de baixa renda o direito de propiciar aos dependentes benefício que substitua a renda que percebia antes da prisão.
Desta forma, tem-se que a situação de desemprego não autoriza o afastamento do requisito objetivo previsto no caput sob pena de se considerar que todos os dependentes dos segurados desempregados em "período de graça" teriam acesso ao benefício, independentemente da última remuneração do recluso.
O critério da baixa renda, em tais casos, deve ser verificado com base no último salário-de-contribuição registrado pelo segurado em consonância com a legislação vigente na data da última remuneração integral, já que o próprio período de graça pressupõe a extensão dos efeitos decorrentes do último vínculo empregatício ou filiação ao RGPS. É dizer que, durante o período de graça, o segurado mantém-se filiado ao Regime Geral nos exatos termos em que se encontrava no último vínculo de emprego ou na última atividade exercida.
Nesse sentido, há destacar entendimento da Turma Nacional de Uniformização, inadmitindo o salário-de-contribuição ficto. Veja-se:
“VOTO DO RELATOR: Ademais, dada a natureza contributiva do Regime Geral da Previdência Social, deve-se afastar interpretações que resultem em tempo ficto de contribuição, conforme decidiu, recentemente, o STF (RE 583.834/SC, Relator Min. Ayres Britto, julgado em 21.9.2011, Informativo 641). Pela mesma razão, não se pode considerar, na ausência de renda – decorrente de desemprego – salário-de-contribuição equivalente a zero, por tratar-se de salário-de-contribuição ficto”. (TNU, PEDILEF 201070540021448, JUIZ FEDERAL GLÁUCIO FERREIRA MACIEL GONÇALVES, TNU, DOU 15/03/2013.)
3 BENEFÍCIO
O benefício, como explicam Fortes e Paulsen, tem a Data de Início do Benefício (DIB) fixada na data da prisão, caso o requerimento ocorra 30 (trinta) dias após a contingência, ou na Data da Entrada do Requerimento (DER), quando for feito após o prazo de 30 (trinta) dias.
A renda mensal inicial é equivalente a “cem por cento do valor da aposentadoria por invalidez a que faria jus na data da prisão, ou seja, cem por cento do salário-de-benefício”[2]. O benefício será mantido enquanto o segurado permanecer recluso em regime fechado ou aberto. Se fugir da prisão, o benefício será suspenso e, posteriormente, cessado, podendo ser restabelecido com a recaptura.
A cessação do benefício pode ocorrer:
a) Morte do segurado.
b) Liberdade pelo cumprimento da pena, mudança de regime prisional para o aberto e livramento condicional.
c) Perda da qualidade de dependente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pelo exposto, conclui-se que:
a) o auxílio-reclusão é benefício devido aos dependentes de segurado de baixa renda como uma forma de substituir a remuneração que deixaram de auferir com a prisão;
b) trata-se de benefício amparado no princípio da intransmissibilidade da penas;
c) devido aos dependentes (artigo 16 da Lei nº 8.213/1991) do segurado que tenha o último salário-de-contribuição igual ou inferior a 360 reais, corrigidos periodicamente pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do RGPS (art. 13 da EC 20/98)[3].
d) no caso do segurado desempregado, deve-se considerar o último salário-de-contribuição antes do recolhimento à prisão.
e) tem a Data de Início do Benefício (DIB) fixada na data da prisão, caso o requerimento ocorra 30 (trinta) dias após a contingência, ou na Data da Entrada do Requerimento (DER), quando for feito após o prazo de 30 (trinta) dias.
f) a renda mensal inicial é equivalente a “cem por cento do valor da aposentadoria por invalidez a que faria jus na data da prisão, ou seja, cem por cento do salário-de-benefício”[4].
g) o benefício será mantido enquanto o segurado permanecer recluso em regime fechado ou aberto.
h) a cessação do benefício pode ocorrer pela morte do segurado; liberdade pelo cumprimento da pena, mudança de regime prisional para o aberto e livramento condicional; perda da qualidade de dependente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAGONÉS, João Ernesto. Curso de Direito Previdenciário. São Paulo: LTr, 2007. 343p.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. DOU 05.10.1988.
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. DOU 25.07.1991.
BRASIL. Medida Provisória nº 619, de 06 de junho de 2013. Exposição de Motivos. DOU 07.06.2013.
FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade Social. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2005. 560p.
TAVARES. Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 10.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. 622p.
[1] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 10.ed. Niterói: Impetus, 2007. p. 570.
[2] TAVARES, Marcelo. Direito Previdenciário. 10.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 178.
[3] R$ 971,78 (Portaria Interministerial nº 15, de 10 de janeiro de 2013).
[4] TAVARES, Marcelo. Direito Previdenciário. 10.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 178.
Procuradora Federal, Coordenadora de Gerenciamento e Prevenção de Litígios e Coordenadora-Geral Substituta da Matéria de Benefícios da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS, Direção Central em Brasília/DF. Professora Tutora Professora Tutora do Curso Aspectos Práticos e Relevantes do Direito Previdenciário da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Conselho Nacional de Justiça (ENFAM/CNJ). Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais - Direito - pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Gabriela Koetz da. Auxílio-reclusão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 dez 2013, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37684/auxilio-reclusao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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