Introdução
Analisarei neste artigo a natureza jurídica da Taxa Anual por Hectare – TAH devida pelos titulares de alvará de pesquisa mineraria, com fulcro no art. 20, inciso II, do Código de Mineração a fixação de seu valor, o prazo para recolhimento fixado por portaria e a prescrição da pretensão executória deste crédito.
Abordarei também a fixação da multa pelo não pagamento da TAH e a aplicação dos institutos da decadência e da prescrição da multa.
Da natureza da Taxa Anual por Hectare – TAH
2. As taxas decorrem do poder de polícia do Estado ou são resultantes da utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição (C.F., art. 145, inciso II). O poder de polícia está conceituado no art. 78, do Código Tributário Nacional - CTN.
3. A taxa anual por hectare não decorre do poder de polícia do Estado, tampouco a taxa é resultante da utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição.
4. O que se tem é a exploração, pelo particular, de um bem da União (C.F., art. 20, IX; art. 176 e §§), mediante o pagamento de um preço estabelecido pela lei. Não se tem, na situação sub examine, um tributo, no exato conceito jurídico, mas um preço público que o particular paga à União pela exploração de um bem do domínio desta.
5. A Portaria nº 663, de 31/05/1990 estabeleceu os valores, os prazos de recolhimento e demais critérios e condições de pagamento (art. 20, inc. II, da Lei n.º 7886/89 – altera o Código de Mineração). Por se tratar de preço, discute-se muito a legalidade da fixação desses parâmetros por Portaria. Contudo, a jurisprudência já reconheceu a legalidade deste ato normativo.
“PROCESSO Nº 2001.02.01.016873-4
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL POUL ERIK DYRLUND
APELANTE :DEPARTAMENTO NACIONAL DE PRODUCAO MINERAL - DNPM
ADVOGADO : IVONE VILANOVA DE SOUZA
APELADO : MARCELO AZEREDO DE ARAUJO
ADVOGADO : ANGELA MARIA DA SILVA LOPES
REMETENTE : JUÍZO FEDERAL DA 7ª VARA – VITÓRIA/ES
ORIGEM : SÉTIMA VARA FEDERAL DE VITÓRIA (9600075360)
E M E N T A
ADMINISTRATIVO – PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA DECLARAÇÃO DE CADUCIDADE DE ALVARÁ DE PESQUISA MINERAL.
1 - Exsurge do art. 20, II, do Decreto-Lei nº 227/67, com redação dada pela Lei nº 7.886/89, que a regulamentação dos critérios, valores e condições de pagamento do preço público de que trata resta a cargo de ato normativo do Ministro das Minas e Energias, não se submetendo à reserva de lei, em que pese a redação do § 4º, do dispositivo legal em apreço, o qual, considerado o princípio da unidade, prescinde de lei formal em sentido estrito.
2 – Apelação e remessa necessária providas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Membros da Oitava Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso e à remessa necessária, nos termos do voto do relator, que fica fazendo parte do presente julgado.
Rio de Janeiro, 18 de julho de 2006 (data do julgamento).
POUL ERIK DYRLUND
Relator”
6. Com a introdução da alteração do art. 20, inciso II, feito pela Lei n.º 9.314 de 14.11.96 no Código de Minas, a Portaria n.º 663/90 foi revogada pela Portaria n.º 13 de 20/01/1997 que subsequentemente foi revogada pela Portaria 503, de 28/12/99.
7. Posteriormente, usando das prerrogativas estabelecidas no Decreto nº 3.576, de 30/08/00, o Diretor-Geral do DNPM informou aos interessados a conversão para o Real dos valores referentes aos emolumentos, taxas e multas que passaram a vigorar, a partir da publicação da Circular nº 09, de 17/11/00, em face da extinção da UFIR pela Medida Provisória nº 1.973-67.
8. Passados aproximadamente 4 (quatro) anos da fixação do valor em Real, não havia mais condições operacionais do DNPM manter o mesmo preço público, razão pela qual corrigiu monetariamente pelo índice oficial, isto é, nada acrescentou, apenas preservou o valor da moeda aviltada pelo processo inflacionário, não constituindo, portanto, um plus, mas sim um minus.
9. Logo, adveio à publicação da Portaria nº 304, de 08/09/04 (DOU de 09/09/04), que nada mais fez que dispor sobre a conversão para o Real e atualizar os valores referentes a emolumentos, taxas e multas fixados na legislação mineraria em unidades de referência (UFIR).
10. Portanto, não se enquadrando a taxa anual por hectare no conceito jurídico de tributo, apesar da denominação traçada pela legislação pertinente, perfeitamente legal a edição dos atos administrativos retromencionados, pois, tratando-se de preço público, sua fixação não depende de lei em sentido estrito.
Inocorrência de Prescrição da TAH
11. A prescrição pressupõe a existência de um direito anterior e a lei exige que o interessado promova o seu exercício sob pena da inércia caracterizar-se em negligência que, em virtude da decorrência dos prazos estabelecidos, faz desaparecer este direito.
12. A prescrição dos preços públicos é regulada pelo Código Civil. Antes da entrada em vigor do Novo Código Civil a prescrição dessa tarifa era de 20 anos nos termos do art. 177, havendo precedente do STJ balizado em uníssona jurisprudência do STF, infra consignada:
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL - SERVIÇOS PÚBLICOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTO - NATUREZA DO "PREÇO PÚBLICO" - COMPETÊNCIA DA Eg. PRIMEIRA SEÇÃO (1ª E 2ª TURMA) - IUJ JULGADO NA CORTE ESPECIAL, EM 05.05.2004 - PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA - ART. 177 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 - PRECEDENTES DO STJ E STF.
- Os serviços públicos de fornecimento de água e esgoto, essenciais à cidadania, se caracterizam pela facultatividade e não pela compulsoriedade, prestado diretamente pelo Estado ou por terceiro, mediante concessão, submetendo-se à fiscalização, princípios e regras condicionadores impostos pelo ente público, e por isso remunerados por tarifas ou preços públicos, regendo-se pelas normas de direito privado.
- Competência da Primeira Seção do STJ.
- A prescrição da ação para cobrança de preços públicos rege-se pelo art. 177, "caput", do Código Civil de 1916, sendo portanto vintenária.
- Precedentes do STJ.
- Recurso especial conhecido, mas desprovido.
(REsp 149.654/SP, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06.09.2005, DJ 17.10.2005 p. 233)
13. Após a publicação do Código Civil de 2002, Lei n.º 10.406 de em 10 de janeiro de 2003, (entrada em vigor Código Civil ocorreu em 10/01/2003) o prazo prescricional geral foi reduzido para 10 anos nos termos do art. 205. Não havendo prazo mais reduzido para a prescrição da TAH, segue-se o prazo geral de 10 anos.
14. Problema de grande complexidade a ser resolvido se dá com relação à conciliação dos prazos prescricionais que estão transcorrendo normalmente no presente com aqueles que sofreram redução com a entrada da vigência do atual CC.
15. O que fazer com uma relação jurídica que tinha uma dilação temporal de 20 anos para o titular exercitar seu direito como dispunha no CC anterior, se com o CC atual este prazo tiver sido reduzido à sua metade ?
16. Na tentativa de superar tal problema, o legislador criou uma regra, por alguns chamada de “regra de transição”, onde determina-se qual o prazo a ser aplicado em face de determinada relação jurídica se iniciada na vigência do CC pretérito e ainda em andamento for reduzida com a entrada em vigência do atual CC para a mesma situação fática.
17. Assim, dispõe o art. 2.028, CC: “Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.
18. Importante atentar ao fato da regra de transição para os seguintes aspectos:
a) naquelas hipóteses em que a lei tenha diminuído os prazos;
b) nas hipóteses em que no momento da vigência do novo Código (10 de janeiro de 2003) o transcurso do lapso temporal já tenha decorrido mais da metade do tempo;
c) nas hipóteses em que haja o concurso dos seguintes requisitos: que o prazo tenha sido diminuído e tenha decorrido mais da metade do lapso temporal.
19. Para a análise pormenorizada do caso em apreço, faz-se necessário saber quando se iniciou o prazo prescricional da TAH, ou seja, quando se iniciou a violação pelo não pagamento dando início à pretensão executiva do Estado.
20. A violação ao direito que faz gerar a pretensão do DNPM é o não pagamento na data do vencimento do preço público que pode ocorrer no dia 31/01 ou no dia 31/07, a depender de quando foi expedido do alvará de pesquisa, conforme estatuído no art. 4 da Portaria n.º 013 de 16 de janeiro de 1997, in verbis:
21. Assim, para os alvarás publicados entre 01/07 a 31/12, o vencimento ocorrerá dia 31/01. Já para os alvarás publicados entre 01/01 a 30/06, o vencimento ocorrerá dia 31/07. mente em 10/01/2013.
22. Desta forma, o prazo de prescrição de 10 anos só se inicia em 01/08 ou 01/02, observadas as regras de transição para os créditos vencidos antes de 10/01/2003.
Prescrição da Multa – Lei n.º 9.873/99
23. Para que se configure a prescrição da multa, imprescindível a ocorrência de quatro requisitos, a saber:
a) Existência de uma pretensão exercitável, que é seu objeto, em virtude da violação do direito, que ela tem por fim remover;
b) Inércia do titular da ação pelo seu não-exercício, que é sua causa eficiente, mantendo-se em passividade ante a violação que sofreu em seu direito, deixando que ela permaneça;
c) Continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo, que é o seu fator operante, pois o que a norma jurídica pretende punir é a inércia prolongada e não a passageira;
d) Ausência de algum fato ou ato a que a lei confere eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva de curso prescricional, que é o seu fator neutralizante.
24. A Lei n.º 9.873/99 define que a prescrição das ações punitivas do Estado contra o administrado se dará no prazo de 5 (cinco) anos da data da prática do ato, in verbis:
Art. 1o Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
25. O inadimplemento do pagamento da TAH, nos termos do art. 20, inciso II, do C.M. implica na infração constante do art. 20, §3º, inciso II, alínea “a” do C.M., in verbis:
Art. 20. A autorização de pesquisa importa nos seguintes pagamentos: (Redação dada pela Lei nº 9.314, de 1996)
II - pelo titular de autorização de pesquisa, até a entrega do relatório final dos trabalhos ao DNPM, de taxa anual, por hectare, admitida a fixação em valores progressivos em função da substância mineral objetivada, extensão e localização da área e de outras condições, respeitado o valor máximo de duas vezes a expressão monetária UFIR, instituída pelo art. 1º da Lei nº 8.383, de 30 de dezembro de 1991. (Redação dada pela Lei nº 9.314, de 1996)
§ 3º. O não pagamento dos emolumentos e da taxa de que tratam, respectivamente, os incisos I e II do caput deste artigo, ensejará, nas condições que vierem a ser estabelecidas em portaria do Ministro de Estado de Minas e Energia, a aplicação das seguintes sanções: (Redação dada pela Lei nº 9.314, de 1996)
II - tratando-se de taxa:(Incluído pela Lei nº 9.314, de 1996)
a) multa, no valor máximo previsto no art. 64;(Incluído pela Lei nº 9.314, de 1996)
26. Antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.873/99, o crédito público proveniente de multa tinha seu prazo prescricional regulado pelo Código Civil, ou seja, 20 anos, por não se tratar de tributo, mas de multa por não pagamento de preço público.
27. Ocorre que com o advento da Lei n.º 9.873/99 a ação punitiva passou a ter prazo prescricional de apenas 05 anos nos termos de seu art. 1º. No entanto, como só entrou em vigor em 23/11/99, para fatos pretéritos (com exceção do caso descrito no art. 4º) o prazo prescricional só iniciou-se da data que entrou em vigor, ou seja, 23/11/99.
28. Assim, mesmo nos casos em que a violação tenha ocorrido antes, a prescrição da pretensão punitiva do Estado inicia-se apenas em 23/11/99.
Conclusão
29. Assim, a TAH é um preço público regulado pelo Código Civil, tendo a Administração que observar os prazos máximos para a cobrança desses valores e observar os prazos prescricionais que extinguem a pretensão de cobrança, evitando a propositura de execuções irregulares e que só vão gerar a sucumbência do DNPM.
30. Importante também observar o prazo máximo para a aplicação da multa e o prazo prescricional de 05 anos para a constituição do crédito.
Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Pós Graduado em Direito Público pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal (AMAGIS-DF). Exerce o cargo de Procurador Federal da Advocacia-Geral da União desde 2004, e desde 2010 atua como Procurador-Geral na Procuradoria Federal junto à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MACEDO, Tiago do Monte. A Taxa Anual por Hectare (TAH) a aplicação de multa pelo não pagamento. Incidência da prescrição e da decadência Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 dez 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37701/a-taxa-anual-por-hectare-tah-a-aplicacao-de-multa-pelo-nao-pagamento-incidencia-da-prescricao-e-da-decadencia. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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