Introdução
Com os recentes resultados da atividade de Exploração e Produção (E&P) de petróleo e gás natural (P&G) em blocos concedidos pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) por meio dos contratos de concessão assinados pela OGX, tenta-se responsabilizar a ANP e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pelos resultados que estão aquém das expectativas divulgadas pela concessionária.
Abordarei aqui que a ANP, no exercício da competência da regulação do contrato e da atividade de E&P, não tem a atribuição de avaliar o risco do investimento nem interferir na avaliação da rentabilidade do negócio, não podendo interferir na divulgação das informações das concessionárias feitas ao mercado, mesmo quando as ações são negociadas em bolsa.
A Regulação do Contrato e da atividade de E&P pela ANP
A ANP, instituída pelo art. 7º da Lei n.º 9.478/97, tem suas competências definidas pelos arts. 8º e 8º-A desta lei, dentre as quais o dever de regular e fiscalizar as atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, fazendo cumprir as Melhores Práticas da Indústria do Petróleo[1] e de conservação e uso racional do petróleo, gás natural e de preservação do meio ambiente, exigindo dos concessionários e agentes de mercado autorizados o envio de informações relativas às operações executadas sujeitas à regulação.
Na qualidade de administradora de todos os direitos de exploração e produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos em território nacional, pertencentes à União[2], a ANP elabora os editais de licitação de concessão de blocos e contratos que tutelam os direitos e deveres dos concessionários.
A atividade de E&P de P&G regulada pela ANP é atividade cujo risco é integralmente do concessionário[3]. Na exploração/pesquisa de P&G, o concessionário executa as atividades exploratórias para tentar fazer uma descoberta, cuja a comercialidade é avaliada de forma subjetiva.
Esta atividade é constituída de duas fases[4]: Exploração e Produção.
Na Fase de Exploração[5], cabe ao concessionário executar as atividades de exploração da área objeto do contrato e, em caso de descoberta, avaliar a sua comercialidade.
A Fase de Exploração pode ser divida em Períodos Exploratórios (PEx) que contém Programas Exploratórios Mínimos (PEM) de execução obrigatória e cujo inadimplemento implica em extinção do contrato. Todas as atividades exploratórias são fiscalizadas pela ANP que é obrigada a ser informada no prazo de 72 horas de qualquer Descoberta[6], nos termos da cláusula 7.1[7] do contrato de concessão da 11ª Rodada. (Os editais, contratos, áreas, blocos e resultados de todas as rodadas de licitação feitas pela ANP podem ser acessadas pelo sítio eletrônico www.brasil-rouds.gov.br).
O contrato pode se encerrar ao fim da fase de exploração sem a comunicação de qualquer descoberta. No mundo, dos poços que são perfurados, o índice de descobertas são de 30%, ou seja, a cada dez poços perfurados, apenas um apresenta indícios a ocorrência de Petróleo, Gás Natural, independentemente de quantidade, qualidade ou comercialidade.
Após comunicar uma Descoberta, o concessionário pode apresentar um Plano de Avaliação de Descoberta (PAD), documento definido na cláusula 1.3.35 do Contrato de Concessão da 11ª Rodada, que deve especificar os programas de trabalho e investimento necessário para as atividades destinadas à avaliação, em conformidade à Resolução ANP n.º 31/2011 (Anexo II).
Os dados obtidos no momento da declaração da descoberta podem ser interpretados por geólogos de muitas formas, pois eles são ainda perfunctórios, ou seja, ainda demandam muitos estudos e interpretações, além de integração com outros dados, para se obter informações adequadas para avaliar o êxito. Esta informações também admitem avaliações otimistas ou pessimistas com um grau de incerteza muito elevados, não podendo a ANP interferir na avaliação do concessionário.
Após a realização do PAD, o concessionário é obrigado a entregar um Relatório Final de Avaliação de Descoberta (RFAD)[8], documento definido na cláusula 1.3.44 do Contrato de Concessão da 11ª Rodada, que deve contemplar a descrição das atividades realizadas, os resultados alcançados em cada uma delas e conclusões advindas da avaliação da descoberta, enumerando as razões que fundamentam a comercialidade da jazida, nos termos da Resolução ANP n.º 31/2011.
Na Fase de Exploração compete à ANP verificar se as atividades exploratórias estão sendo executadas conforme PEM e PAD obedecendo as melhores práticas da indústria do petróleo e respeitando a legislação de segurança operacional e legislação aplicável.
A atividade de exploração e produção de petróleo é uma atividade de risco que é executada por conta do concessionário[9]. Assim, em caso de descoberta de jazida que se tenha avaliado e verificada a sua comercialidade, o concessionário declara a Descoberta Comercial[10] e entra na Fase de Produção[11], obrigando-se a encaminhar para a ANP o Plano de Desenvolvimento de Produção - PD.
Importa destacar que a Declaração de Comercialidade de uma Descoberta é um ato unilateral do concessionário que faz uma avaliação de cunho econômico subjetivo de exclusiva discricionariedade do concessionário, cabendo à ANP avaliar se o PD contempla o desenvolvimento da produção dentro das Melhores Práticas da Indústria do Petróleo e a tempestividade do concessionário na execução das atividades para o desenvolvimento do Campo[12]. A liberdade na avaliação da comercialidade por uma concessionária deve considerar os riscos associados, premissas técnicas e econômicas de investimento, Valor Presente Líquido - VPL e Taxa Interna de Retorno -TIR além de muitas outras variáveis, não cabendo ao Estado por meio da ANP, determinar que a descoberta seja declarada comercial e desenvolvida.
Nestes termos, as informações que são divulgadas pela imprensa, as informações que são divulgadas pelas concessionárias de exploração de produção para o mercado e utilizadas pelos investidores em ações de companhias de capital aberto não são objeto de regulação e fiscalização pela ANP, mas devem obrigatoriamente estar alinhadas com as informações prestadas à ANP e aos planos aprovados pela ANP.
As informações relativas aos fatos relevantes fornecidos ao mercado de valores mobiliários são reguladas e fiscalizadas pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, nos termos da Lei n.º 6.385/76, instituição esta que poderá subsidiar o MPF com outros elementos necessários para a investigação prevista na Lei n.º 7.913/89.
Conclusão
A ANP tem aperfeiçoado a troca de informações com a CVM, firmando convênios e aprimorando os esclarecimentos de dúvidas técnicas para a CVM bem exercer suas atividades.
Não é por serem reguladores que a ANP e a CVM são responsáveis pelas informações divulgadas pelas concessionárias. A ANP protege os interesses da União e não dos investidores nas concessionárias.
É dever dos investidores conhecer a atividade exercida pelas empresas que estão aplicando recursos e ao risco que estão expostos, não cabendo ao estado tutelar o risco sob pena de os investidores obterem dos entes reguladores um seguro contra a risco pelo qual se submetem para obter elevados lucros.
[1] 1.3.28 Melhores Práticas da Indústria do Petróleo: práticas e procedimentos geralmente empregados na Indústria de Petróleo em todo o mundo, por Operadores prudentes e diligentes, sob condições e circunstâncias semelhantes àquelas experimentadas relativamente a aspecto ou aspectos relevantes das Operações, visando principalmente à garantia de: (a) aplicação das melhores técnicas e procedimentos mundialmente vigentes nas atividades de Exploração e Produção; (b) conservação de recursos petrolíferos e gasíferos, o que implica a utilização de métodos e processos adequados à maximização da recuperação de hidrocarbonetos de forma técnica, econômica e ambientalmente sustentável, com o correspondente controle do declínio de reservas, e à minimização das perdas na superfície; (c) segurança operacional, o que impõe o emprego de métodos e processos que assegurem a segurança das Operações, contribuindo para a prevenção de incidentes; (d) preservação do meio ambiente e respeito às populações, o que determina a adoção de tecnologias e procedimentos associados à prevenção e à mitigação de danos ambientais, bem como ao controle e ao monitoramento ambiental das Operações de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural. Contrato de Concessão da 11ª Rodada).
[2] Art. 21. Todos os direitos de exploração e produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos em território nacional, nele compreendidos a parte terrestre, o mar territorial, a plataforma continental e a zona econômica exclusiva, pertencem à União, cabendo sua administração à ANP, ressalvadas as competências de outros órgãos e entidades expressamente estabelecidas em lei. (Lei nº 9.478/97).
[3] Art. 26. A concessão implica, para o concessionário, a obrigação de explorar, por sua conta e risco e, em caso de êxito, produzir petróleo ou gás natural em determinado bloco, conferindo-lhe a propriedade desses bens, após extraídos, com os encargos relativos ao pagamento dos tributos incidentes e das participações legais ou contratuais correspondentes.
[4] Art. 24. Os contratos de concessão deverão prever duas fases: a de exploração e a de produção.
§ 1º Incluem-se na fase de exploração as atividades de avaliação de eventual descoberta de petróleo ou gás natural, para determinação de sua comercialidade.
§ 2º A fase de produção incluirá também as atividades de desenvolvimento. ( Lei nº 9.478/97).
[5] 1.3.23 Fase de Exploração: período contratual em que deve ocorrer a Exploração e a Avaliação. (Contrato de Concessão da 11ª Rodada).
[6] 1.3.19 Descoberta: qualquer ocorrência de Petróleo, Gás Natural, outros hidrocarbonetos, minerais e quaisquer outros recursos naturais na Área de Concessão, independentemente de quantidade, qualidade ou comercialidade, verificada por, pelo menos, dois métodos de detecção ou avaliação. (Contrato de Concessão da 11ª Rodada).
[7] 7.1. Qualquer Descoberta de Petróleo ou Gás Natural na Área de Concessão deverá ser notificada pelo Concessionário à ANP, em caráter exclusivo e por escrito, no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas. (Contrato de Concessão da 11ª Rodada).
[8] 1.3.44 Relatório Final de Avaliação de Descoberta: documento apresentado pelo Concessionário e sujeito à aprovação da ANP, em que se descreve o conjunto das Operações empregadas para a Avaliação de Descoberta de Petróleo e/ou Gás Natural, os resultados desta Avaliação e, eventualmente, a área que o Concessionário pretende reter para Desenvolvimento.
[9] Art. 26. A concessão implica, para o concessionário, a obrigação de explorar, por sua conta e risco e, em caso de êxito, produzir petróleo ou gás natural em determinado bloco, conferindo-lhe a propriedade desses bens, após extraídos, com os encargos relativos ao pagamento dos tributos incidentes e das participações legais ou contratuais correspondentes.
§ 1° Em caso de êxito na exploração, o concessionário submeterá à aprovação da ANP os planos e projetos de desenvolvimento e produção.
§ 2° A ANP emitirá seu parecer sobre os planos e projetos referidos no parágrafo anterior no prazo máximo de cento e oitenta dias. ( Lei nº 9.478/97).
[10] Art. 6º, XVIII - Descoberta Comercial: descoberta de petróleo ou gás natural em condições que, a preços de mercado, tornem possível o retorno dos investimentos no desenvolvimento e na produção; ( Lei nº 9.478/97).
[11] 1.3.24 Fase de Produção: período contratual em que deve ocorrer o Desenvolvimento e a Produção.
[12] Art. 6º, inciso XIV - Campo de Petróleo ou de Gás Natural: área produtora de petróleo ou gás natural, a partir de um reservatório contínuo ou de mais de um reservatório, a profundidades variáveis, abrangendo instalações e equipamentos destinados à produção; ( Lei nº 9.478/97).
Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Pós Graduado em Direito Público pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal (AMAGIS-DF). Exerce o cargo de Procurador Federal da Advocacia-Geral da União desde 2004, e desde 2010 atua como Procurador-Geral na Procuradoria Federal junto à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MACEDO, Tiago do Monte. Regulação dos contratos de concessão pela ANP e ausência de responsabilidade pelo investimento Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 dez 2013, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37754/regulacao-dos-contratos-de-concessao-pela-anp-e-ausencia-de-responsabilidade-pelo-investimento. Acesso em: 23 dez 2024.
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