SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Desenvolvimento: 2.1 Conceito e Breve Histórico da Tutela Antecipada no Ordenamento Jurídico Brasileiro; 2.2. Modalidades de Tutela Antecipada; 2.3 Requisitos para a concessão da Tutela Antecipada do art. 273 do Código de Processo Civil de 1973; 2.3.1 Requerimento da Parte; 2.3.2 Prova inequívoca acerca da existência do direito; 2.3. convencimento do juiz acerca da verossimilhanças da alegação de violação ao direito;2.3.4 reversibilidade da medida; 2.4 As espécies de Tutela Antecipada previstas no art. 273 do Código de Processo Civil de 1973: 2.4.1 Antecipação de Tutela pelo risco de dano irreparável ou de difícil reparação; 2.4.2 Tutela Antecipada por abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu.; 2.4.3 A Antecipação da Tutela em face de Pedido Incontroverso; 2.5 Tutela Antecipada e Tutela Cautelar: diferenças; 3. Conclusão; 4. Referências
1-Introdução
Antes da Lei 8952/94, necessitava-se de instrumentos que adiantasse ao autor os efeitos da prestação jurisdicional, afinal, não raras vezes, o longo tempo do procedimento ordinário pode fazer com que o titular do direito não possa usufruir do mesmo ao final da lide. Os operadores do direito, então, utilizavam, além de diversas ações específicas como os alimentos provisionais e a justificação, a “ação cautelar satisfativa”, desviando completamente o objetivo deste tipo de tutela.
A reforma, então, veio para adequar o processo civil aos seus objetivos e aos mandamentos constitucionais, garantindo a satisfação dos efeitos da tutela jurisdicional nas hipóteses legais e diferenciando melhor a compreensão entre acautelar e satisfazer.
O presente artigo tem por objetivo geral a análise do instituto da antecipação de tutela como um todo, analisando suas diferenças com a tutela cautelar e analisando os principais pontos do art. 273 do Código de Processo Civil..
2-DESENVOLVIMENTO
2.1. Conceito e Breve Histórico da Tutela Antecipada no Ordenamento Jurídico Brasileiro
Para Gláucia Carvalho Santoro tutela antecipada é “o Remédio jurídico que visa a satisfazer total ou parcialmente a pretensão do autor, tendo em vista a existência de fatos indicativos que a outra parte age com manifesto propósito protelatório, ou com o risco de que a demora da decisão terminativa permita a ocorrência de dano de difícil reparação”[1].
Já, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery entendem que: Tutela antecipatória dos efeitos da sentença de mérito é providência que tem natureza jurídica mandamental, que se efetiva mediante execução latu sensu, com o objetivo de entregar ao autor, total ou parcialmente, a própria pretensão deduzida em juízo ou os seus efeitos. É tutela satisfativa no plano dos fatos, já que realiza o direito, dando ao requerente o bem da vida por ele pretendido com a ação de conhecimento[2].
A Tutela antecipada foi inserida, oficialmente, no ordenamento jurídico brasileiro com a Lei 8952/1994, que deu novo texto ao art. 273 do Código de Processo Civil.
Tal reforma significou uma grande novidade no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista que permite ao autor tenha seu pedido atendido, parcial ou integralmente, antes do julgamento definitivo da lide, proporcionando a este fruição total ou parcial de seu direito.
Antes da introdução deste artigo, para tentar solucionar essa questão, o Legislador brasileiro inseria alguns institutos específicos no ordenamento jurídico, mas sempre de forma excepcional e restrita a procedimentos especiais, a exemplo das ações possessórias, da ação civil pública e com o Mandado de Segurança.
Porém, tais dispositivos têm caráter especial, tendo em vista que, conforme a sistemática do processo civil clássico, a execução deve ser precedida da fase de cognição. Isto quer dizer que, regra geral, só se admite a prática de atos coativos após a sentença que declare o direito.
Essa exigência de que fosse percorrido os dois processos distintos em sua inteireza para, só então, satisfazer o direito do credor, não obstante a evidência deste, transformava-se em um prêmio para o réu e uma penalização para o autor. Assim, pode-se dizer que ‘a grande luta do processualista moderno é contra o tempo”[3]
Os Tribunais passaram, então, a falar de “ação cautelar satisfativa” [4]. Tentava-se, na verdade, melhorar a inadequação do processo tradicional e a lentidão da justiça. Passou-se, então, a utilizar a tutela cutelar como forma de antecipação do mérito, para obter a satisfação do pedido inicial. Frustrava-se completamente o intuito das cautelares, dando-lhes a missão de satisfazer o direito subjetivo da parte.
Dessa forma, antecipava-se o direito subjetivo da parte, mesmo sem dispositivos legais expressos autorizativos. Conforme Donaldo Armelin, “uma das formas de distorção do uso da tutela cautelar verifica-se sempre que se dá ao resultado de uma prestação de tutela jurisdicional cautelar uma satisfatividade que não pode ter” [5]
Assim, a inovação trazida com a Lei 8952/1994 veio para atender os anseios dos operadores do direito e garantir a efetividade processual.Segundo Kazuo Watanabe, membro da Comissão que promoveu a revisão do Código de Processo Civil, as modificações do ordenamento jurídico brasileiro parte do direito constitucional do acesso à justiça, nos seguintes termos:
O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, inscrito no inc. XXXV do art. 5º da Constituição Federal, não assegura penas o acesso formal aos órgãos judiciários, mas sim o acesso à justiça que propicie a efetiva e tempestiva proteção contra qualquer forma de denegação da justiça e também o acesso à ordem jurídica justa. Cuida-se de um ideal que, certamente, está ainda muito distante de ser concretizado e, pela falibilidade do ser humano, seguramente jamais o atingiremos em sua inteireza. Mas a permanente manutenção desse ideal na mente e no coração dos operadores do direito é uma necessidade para que o ordenamento jurídico esteja em contínua evolução[6]
Segundo Humberto Theodoro Júnior, foi na perspectiva de estimular os responsáveis pela prestação jurisdicional a outorgarem às partes litigantes um processo caracterizado pela “efetividade” e “tempestividade da tutela”, foi que a lei 8952/94 concebeu a “antecipação de tutela”.[7]
Cabe, ainda, salientar que "antecipar a tutela nada mais é do que dar a gozar dos efeitos do bem da vida perseguido, de modo precoce e provisório, antes mesmo de ter sido levada a efeito a tutela em sua plenitude, e antes da prestação imediata – sentença".
2.2. Modalidades de Tutela Antecipada
No ordenamento jurídico brasileiro há três modalidades de antecipação de tutela. A primeira é a “antecipação de tutela genérica”, que está regulada no caput e incisos I e II do artigo 273 do CPC, ela é uma “categoria residual”, tendo em vista que é aplicada nas diversas espécies de ação não abrangidas pelas outras duas categorias.
A segunda modalidade é a prevista no §3º do artigo 461 do mesmo diploma processual, conhecida como “antecipação de tutela específica”, é aplicada nas ações de obrigação de fazer ou não fazer e nas ações que tenha por objeto a prestação envolvendo a entrega de coisa.
Por fim, a terceira categoria é a “medida liminar antecipatória”, que são aquelas formadas pelas diversas medidas liminares previstas para ações especiais e que, uma vez concedias, apresentam cunho satisfativo ao implicaram no adiantamento dos efeitos da tutela jurisdicional final pretendida.
Quanto a essa última categoria, cabe frisar que uma medida liminar é aquela que o juiz determina de logo, antes de ouvir o réu, portanto, antes de ocorrer o contraditório no processo. Ela pode ser cautelar ou antecipatória de acordo com os efeitos que produz, prevenção ou satisfação, respectivamente.
Segundo o professor acima citado, são requisitos para que haja antecipação de tutela em qualquer das modalidades referidas: a existência de uma ação em curso, uma concessão através de uma decisão interlocutória devidamente fundamentada, bem como a inexistência de perigo de irreversibilidade da medida.
Conforme visto acima, a antecipação de tutela prevista no art. 273 do PC é conhecida por “tutela antecipada genérica”. Para uma melhor análise dos requisitos necessários à concessão deste tipo de tutela antecipada, faz-se mister trazer à colação o artigo acima citado:
Artigo 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
§ 1º - Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.
§ 2º - Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
§ 3º - A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A.
§ 4º - A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 5º - Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.
§ 6º - A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.
§ 7º - Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.
Percebe-se, da leitura deste dispositivo, que o primeiro requisito para concessão da tutela antecipada é o requerimento da parte. Dessa forma, não pode o juiz agir de ofício, sendo necessária a manifestação expressa da parte.
Em relação à essa proibição da concessão da tutela antecipada ex officio, há duas correntes a respeito do tema.
A primeira defende a proibição da concessão ex officio pelo juiz, pois segundo Alexandre Freitas Câmara em Lições de Direito Processual Civil - volume I, " a lei processual, ao exigir o requerimento da parte, manteve-se consentânea com nosso sistema processual, onde prevalece o princípio da demanda, não podendo o órgão jurisdicional conceder à parte algo que não foi por ela pleiteado." Esse mesmo entendimento está presente também em vários julgados, nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. INEXISTÊNCIA DE REQUERIMENTO DA PARTE. IMPOSSIBILIDADE. TRABALHADOR RURAL. SEGURADO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR MEIO DE PROVA TESTEMUNHAL. DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. ISENÇÃO DE CUSTAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ( Apelação Cível nº 336991-PB (03720030125910), trf5, 2ª Turma. Relator: Desembargador Francisco Cavalcanti. Recife, DJ 02/05/2005)
Outrossim, a segunda corrente, que é defendida, entre outros doutrinadores, por Luiz Fux, critica com veemência, a necessidade de requerimento pela parte para que haja concessão da tutala antecipada. Defende que, estando presente os requisitos para sua concessão e não havendo dúvidas quanto a necessidade, o magistrado poderá concedê-la sem o requerimento da parte, dando assim mais celeridade ao processo. Nesse sentido também há posicionamentos jurisprudenciais:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ANISTIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL EX OFFICIO .
I - A tutela antecipada pode ser deferida de ofício quando presente, além da verossimilhança da alegação, o risco de dano irreparável pela demora na entrega da prestação jurisdicional por ser o autor pessoa de idade avançada. (Embargos de declaração na Apelação Cível nº 187858, TRF2, 3ª Turma. Relator: Desembargadora Tânia Heine. DJ 07/03/2005)
PREVIDENCIÁRIO, CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EX OFFICIO. CASO CONCRETO. POSSIBILIDADE. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PROVA MATERIAL E PROVA TESTEMUNHAL. VALIDADE. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. em homenagem à busca de uma real e efetiva prestação jurisdicional, conjugada com a necessária imediatidade que o fato concreto exige (a pretendente ao benefício de natureza alimentar tem sessenta e nove anos de idade), é viável a possibilidade da concessão da medida antecipatória de ofício[...] (Apelação Cível nº 345950 (2000.81.00.001652-0), TRF 5, 4ª Turma. Relator: Desembargador Luiz Alberto Gurgel de Faria. DJ 07/03/2005)
Frise-se, diante do exposto, que o ordenamento jurídico brasileiro elenca como requsito indispensável para a concessão da tutela antecipada o requerimento da parte, tendo em vista sua expressa previsão legal. Contudo, como se viu nos julgados acima colacionados, não é raro ver-se magistrados atuando de forma a garantir a efetividade da prestação jurisdicional, concedendo a tutela antecipada mesmo que ex officio.
2.3.2 – Prova inequívoca acerca da existência do direito
O segundo requisito é a prova inequívoca, termo de difícil definição, que, segundo Zavascki deve ser interpretada no contexto do relativismo próprio do sistema de provas. [8]A exemplo da necessidade deste requisito:
TUTELA ANTECIPADA- AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA - IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO - "Tutela antecipada - Revisão de Cláusula Contratual - controvérsia relacionada à desvalorização do real em face do dólar norte-americano. Indeferimento da antecipação da tutela para depósito das prestações vincendas. Ausência de prova inequívoca do fato constitutivo do direito do autor para aplicação da teoria da imprevisão. Inexistência de irreparabilidade do dano econômico ante o cabimento de eventual ação indenizatória. Descabimento de solução antecipada das questões que devem ser analisadas na ação principal. Recurso improvido." ( 1.°TACIVIL - 10.ª Câm., Ag. de Instr. n.° 853.548-8-Itapira-SP; Rel. Juiz Antônio de Pádua Ferraz Nogueira; j. 18.05.1999 )
Prova é o meio de levar ao convencimento do julgador a existência dos fatos para que possa atuar a jurisdição.[9]. Essa prova inequívoca está relacionada ao fato de ser necessário demonstrar a existência do direito material supostamente lesado ou ameaçado de sofrer lesão.
Cabe salientar que há críticas devido a utilização do termo prova inequívoca, já que, conforme observa Calmon de Passos, a prova em si não comporta qualificativos com conteúdo valorativo. A prova é documental, pericial, testemunhal, etc. A força do seu convencimento não está nela própria, mas no pensar do magistrado ao analisá-la.[10]
Para Athos Gusmão Carneiro, prova inequívoca é aquela apta a produzir um juízo de verossimilhança, capaz de autorizar a antecipação da tutela, como a prova documental, ou, mesmo, a prova produzida ad perpetuam, justificações prévias, testes de DNA, pareceres técnicos, dentre outros[11].
Já Barbosa Moreira, afirma que:
inequívoca é o antônimo de equívoca. Equívoco é o que permite mais de uma interpretação ou sentido e pode swer usado como sinônimo de ambíguo, cujo antônimo seria unívoco que, por sua vez, significa um atributo que se aplica a sujeitos diversos de maneira idêntica. Nessa linha de raciocínio, a prova inequívoca é aquela que somente pode ser interpretada em um único sentido. No entanto, não é pelo simples fato de ser unívoca que terá força persuasiva suficiente para embasar o convencimento do juiz; deve ser unívoca ou inequívoca e ainda possuir força persuasiva suficiente para produzir um juízo de verossimilhança quanto à veracidade dos fatos cuja prova se pretende.[12]
2.3.3 – convencimento do juiz acerca da verossimilhanças da alegação de violação ao direito
O terceiro requisito é a verossimilhança da alegação, que está relacionada à aparência de verdade das alegações. Vale salientar que ela não trata da qualidade do fato narrado, já que isto cabe à prova inequívoca.
Segundo algunas autores, não existe contradição entre os termos “prova inequívoca” e “verossimilhança”, tendo em vista que aquela se refere aos fatos e esta ao fundamento de direito[13]
Conforme Araken de Assis, alegação não possui um sentido unívoco. Ele abrange todo e qualquer requerimento, petição, razões, enfim, tudo que for formulado pelos procuradores das partes. Ao que parece, o texto da lei emprega o vocábulo em outra e diferente acepção, relacionada ao objeto da prova inequívoca, que é da causa de pedir resposta na inicial.[14]
Assim, a prova inequívoca dos fatos, somada à verossimilhança das alegações, confere uma possibilidade de existência do direito. A verossimilhança diria respeito ao pedido que será apreciado na sentença definitiva, pois não se pode antecipar efeitos que não são inerentes à snetença de mérito, havendo necessidade de sintonia entre a tutela natecipada e a definitiva [15]
Para que se conceda a tutela antecipatória, portanto, é necessário que haja um juízo de verossimilhança sobre o resultado da decisão. Em verdade, existirá uma expectativa de que a concessão será útil. Todavia, não se pode exigir que haja uma investigação aprofundada sobre a existência do direito, já que isso feriria, inclusive, o objeto de tal tutela de urgência.
Para Calamandrei, a cognição sumária sobre a existência do direito tem caráter de hipótese e não de declaração. Só se poderá verificar se essa hipótese corresponde à realidade na emanação da decisão principal. [16]
2.3.4 – reversibilidade da medida
O quarto requisito é a reversibilidade da medida, que se refere aos efeitos práticos do provimento antecipatório[17]. Ela é inerente à tutela antecipada em virtude do caráter provisório desta, já que ela só existirá enquanto a definitiva não substituí-la.
Assim, ela poderá ser susbtituída pela decisão final que mantê-la ou revogá-la ou até por outra decisão interlocutória que a revogue. Se ela fosse irreversível, a concessão da tutela antecipada iria privar o réu de um bem jurídico sem sequer estabelecer o contraditório no processo, o que violaria diversos princípios constitucionais, como a ampla defesa.
Assim, antecipar os efeitos da sentença significa antecipar os efeitos práticos decorrentes do conteúdo da sentença. [18]
Segundo Zavascki, esta antecipação só contribuirá para a efetividade do processo quando, pela sua natureza, se tratar de efeitos que provoquem ou impeçam mudanças no plano da realidade fática[19].
No entanto, cabe salientar que parte da doutrina dá uma interpretação mais branda ao dispositivo, em casos em que a tutela antecipada mostra-se imprescindível, em face da demora processual. Barbosa Moreira dá o exemplo de um menor que necessita de uma transfusão de sangue para salvar sua vida, mas os pais, por motivo religioso, requerem ao juiz o suprimento da autorização. Nesse caso, o suprimento será irreversível, porém, se não concedido, o dano será também irreversível e de copnsequências mais sérias.[20]
No art. 273 do Código de Processo Civil Brasileiro, exitem três hipóteses em que se justifica a antecipação provisória do provimento principal, que serão melhor analisadas no capítulo seguinte. A primeira é quando houver risco de aguardar o desfecho final do processo, a segunda quando o réu abusar do direito de defesa e a terceira quando não houver constestação a um ou mais dos pedidos cumulados.
A necessidade da presença dos requisitos analisados acima em conjunto com uma dessas três hipóteses elencadas para a concessão da tutela antecipada também é pronunciada pelos Tribunais. Nesse sentido:
TUTELA ANTECIPADA. REQUISITOS. DEFERIMENTO LIMINAR.
1. Ainda que possível, em casos excepcionais, o deferimento liminar da tutela antecipada, não se dispensa o preenchimento dos requisitos legais, assim a 'prova inequívoca', a 'verossimilhança da alegação', o 'fundado receio de dano irreparável', o 'abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu', ademais da verificação da existência de 'perigo de irreversibilidade do provimento antecipado', tudo em despacho fundamentado de modo claro e preciso. 2. O despacho que defere liminarmente a antecipação de tutela com apoio, apenas, na demonstração do fumus bonis iuris e do periculum in mora malfere a disciplina do art. 273 do CPC, à medida que deixa de lado os rigorosos requisitos impostos pelo legislador para a salutar inovação trazida pela Lei nº 8.952/94.
(STJ - Recurso Especial nº 131.853 S/C - 3ª Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).
2.4- As espécies de Tutela Antecipada previstas no art. 273 do Código de Processo Civil de 1973 -
2.4.1. Antecipação de Tutela pelo risco de dano irreparável ou de difícil reparação
Além dos requisitos anteriores, quais sejam, prova inequívoca, verossimilhança das alegações e a possibilidade de reversão da medida, há necessidade de se comprovar, nessa espécie, o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, conforme julgado abaixo colacionado:
TUTELA ANTECIPADA – (art.273 Lei 8952/94) – REQUISITOS PARA O DEFERIMENTO -NECESSIDADE DE JUSTIFICAR O JUSTO RECEIO OU RISCO DE LESÃO GRAVE E DE DIFÍCIL REPARAÇÃO - " Antecipação da tutela - Deferimento. Diante das lesões suportadas pela agravada e do justo receio de que ela não pudesse resistir até o final da lide, outra providência não poderia esperar do juízo agravado que não fosse a aplicação do disposto no artigo 273, I, do Código de Processo Civil." ( 1.°TACIVIL - 4.ª C. Esp.de Janeiro de 1997; Ag.de Instr. n.° 685.484-2-São Paulo; Rel.Juiz Tersio José Negrato, j.26.02.1997) AASP, Jurisprudência, 2065/653j - comentário: nas lições de Cândido José Dinamarco, nesse sentido : "As realidades angustiosas que o processo se revela impõem que esse dano assim temido não se limite aos casos em que o direito possa perder a possibilidade de realizar-se, pois os riscos dessa ordem são satisfatoriamente neutralizados pelas medidas cautelares. É preciso levar em conta as necessidades do litigante, privado do bem que provavelmente tem direito e sendo impedido de obtê-lo desde logo. A necessidade de servir-se do processo para obter a satisfação de um direito não deve reverter a dano de quem não pode ter seu direito satisfeito mediante o processo ( Chiovenda )." ( in "A Reforma do Código de Processo Civil, Malheiros, 2.ª edição, 1995, p.145)
Para Teori Zavascki o risco de dano irreparável ou de difícil reparação correspnde ao risco concreto, atual e grave, devendo esses elementos estarem presentes concorrentemente.[21]
No caso de o ato contrário ao direito ainda não ter sido praticado, , devem estar presentes elementos ou ccircunstâncias de fato que permitam ao juiz, ainda, que com base em uma probabilidade, que o ilícito é iminente, sendo, portanto, justificável a concessão da tutela antecipatória.
Já no caso de o ato contrério ao direito já haver sido praticado, há um acerta ligação entre a probabilidade e a continuação daquele, devendo a tutela antecipatória ser concedida para evitar a repetição do dano.
Calmon de Passos diferencia o dano irreparável, da tutela antecipada, do periculum in mora, requisito para a concessão das cautelares. Afirma o autor que:
nestas o juiz analisa o risco de ineficácia da futura tutela provável, já na antecipação, o juiz analisa a necessidade de ser executada, de logo, provisoriamente,a decisão de mérito, que proferiu ou vai proferir, em condições normais sem aptidão para cosntituir-se título legitimidor de execução provisória do julgado. Por isso mesmo, a cautelar requer exista ato da parte e dele derive o risco de dano, ao passo que na antecipação isso é de todo irrelevante, devendo o magistrado considerar apenas a necessidade de antecipação da eficácia do julgado porque, se não deferida, haverá risco de ocorrerem, para o autor, danos que serão eliminados, se antecipação houver. [22]
Já Marinoni afirma que há irreparabilidade quando os efeitos do dano não são reversíveis, podendo atingir direitos patrimoniais e não-patrimoniais. O dano será de difícil reparação se, por exemplo, as condições econômicas do réu não autorizam supor que o dano sera efetivamente reparado ou se dificilmente poderá ser individualizado ou quantificado com precisão.[23]
Há autores, no entanto, que afirmam ser desnecessária qualquer distinção entre os dois termos, tendo em vista que as medidas de urgência, cautelares ou tutelas antecipadas, são necessárias em virtude da demora processual . Em verdade, não haveria qualquer sentido falar-se em dano irreparável se não fosse em função da demora processual.
Nesse sentido, é a posição de J.E. Carreira Alvim afirma que a circunstância que, no âmbito da tutela cautelar, revela a presença do periculum in mora encontra, na antecipação de tutela, equivalência no receio de dano, pois, tanto quanto no processo cautelar, o p´rovimento antecipatório só se faz necessário pela impossibilidade de concluir-se o processo ordinário uno actu, com a mesma substituição, de imediato, do fato ao direito[24]
Na mesma linha, Eduardo Mello de Mesquita afirma que somente haverá periculum in mora se existir risco de dano, perecimento, destruição, desvio, deterioração, mutação de pessoas, bens ou provas, imprescindíveis à perfeita atuação do provimento final no processo principal.[25]
2.4.2- Tutela Antecipada por abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu.
Para que seja concedida a tutela antecipada nessa hipótese do art. 273, II, do CPC, também há necessidade de prova inequívoca, verossimilhança das alegações e reversibilidade do provimento antecipado. Todavia, é importante salientar que não há necessidade de perigo de dano.
O processo civil, para atender ao direito da tutela jurisdicional efetiva, deve ser capaz de otimizar o tempo do processo e de inibir as defesas abusivas. É certo que a defesa é um direito constiucionalmente garantido, mas deve ser exercida dentro de certos limites e de forma racional e justa, não retardando, de forma indevida, o direito do autor.
Em verdade, essa hipótese tem a finalidade de combater as condutas procrastinatórias do réu. Segundo Pontes de Miranda, a lei é mais exigente com o autor do com o réu[26]. A demora do processo e, consequentemente, da obtenção do bem significa a preservação no patrimônio do réu. Quanto maior a demora do cruso processual, maior o benefício conferido ao réu e maior o dano imposto ao autor.
Marinoni complementa dizendo que o procediemnto ordinário faz com que o ônus do tempo recaia exclusivamente sobre o autor .[27] Assim, a medida em análise possui o objetivo de impedir que o réu abuse do seu direito, agiindo de maneira a atrapalhar o curso de processo.
Importantes são as palavras de Castro Filho, segundo o qual compreende-se o abuso do direito quando se considera que o direito subjetivo, poder de agir, é, na sua realização normal, o uso, e , na sua realização anormal, o abuso.[28]
Uma importante premissa é que quem abusa de um direito possui este direito, mas o está utilizando mal. Nesse sentido, afirma Pontes de Miranda que ‘abusa-se de um direito que se tem” O autor continua suas palavras, afirmando que o abuso configura-se pela causa de dano e não apenas pelo exercício de um direito. O direito não cessa onde o abuso começa. [29]
O atual Código de Processo Civil Brasileiro dá grande ênfase ao “dever de veracidade, que abrange não só as condutas das partes, como também de todos aqueles que intervêm no processo. Exemplos dessa preocupação são os artigos 14 e 17, que arrolam as condutas que se esperam dos litigantes e indica aquelas que constituem a litigância de má-fé.
Dessa forma, a infração aos deveres do art. 14 ou a prática das condutas do art. 17 configuram abuso do direito de defesa ou ato protelatório. O abuso do direito de defesa pode dar ensejo a uma sanção de ordem pecuniária ou restritiva de direitos processuais. No art. 17, por exemplo, a prática de uma das condutas gera a multa e a indenização por perdas e danos. [30]
Já para Marinoni, não se deve confundir abuso de direito de defesa com litigância de má-fé. Diz o autor que é possível extrair do art. 17 do Código de Processo Civil alguns elementos que podem colaborar com a caracterização do abuso do direito de defesa. Isso não significa, porém, que as hipóteses do art. 17 possam servir de guia para a compreensão da tutela anteipatória fundada em abuso de direito de defesa.
Cabe salientar, ainda, que, para Castro Filho, o abuso do direito de defesa ao afirmar que é o mau uso, injustificado ou malicioso dos órgãos jurisdicionais, que autoriza a repressão do abuso do direito, mesmo quando não há dano à parte contrária.[31]
O mencionado inciso II do art. 273 do CPC autoriza, ainda, a tutela antecipada com base no manifesto propósito protelatório do réu. Zavascki critica a presença no art. das duas expressões ( propósito protelatório e abuso do direito de defesa), afirmando que as duas seriam sinônimas. Contudo, afirma o autor que, como a lei não possui palavras inúteis, faz-se necessária a distinção e conceitua: abuso do direito de defesa como ato ou conjunto de atos que o réu pratica para se defender e “propósito protelatório” como atos praticados pelo réu fora do processo, a exemplo de ocultação de provas, simulação de doenças, não atendimento de diligências, etc.[32]
Já Antônio Cláudio da Costa Machado entende que o propósito protelatório é um estado psicológico do réu, traduzido numa intenção que pode ter correspondência com inúmeros atos que se praticam no processo, inclusive os de defesa. [33]
Cumpre salientar que as principais referências legislativas para definir abuso de defesa e propósito protelatório são os art. 14 e 17 do CPC, já que os atos abusivos e protelatórios configuram-se litigância de má-fé [34]
Também se utiliza desses artigos, considerando abusivas as hipóteses de defesa contra texto expresso de lei, a dedução de defesa que altera a verdade dos fatos e a dedução de defesas de mérito diretas sem fundamento e como propósito protelatório do réu a resistência in justificada ao andamento do processo, a prática de incidente manifestamente infundados e o procedimento temerário em incidente ou ato do processo. [35]
Assim, os tipos do art. 17 do CPC, que configuram a chamada litigância de má-fé, constituem abuso do direito de defesa ou ato protelatório. Nestes, o mero propósito é suficiente para a concessão da tutela antecipada, ainda que os atos praticados não impliquem efetivo atraso no processo, a exemplo de ocultação para não receber citação e simulação de doença.
Zavascki é contrário a essa posição, entendendo que a tutela antecipada só pode ser concedida quando o atraso efetivamente é concretizado.[36]
Cabe salientar, contudo, que a conduta do réu só pode resultar na antecipação de tutela se colaborar, junto com outros elementos, para aumentar a verossimilhança das alegações do autor. Caso isso não ocorra, independente da atitude processual do réu, restará apenas a aplicação das pena spor litigância de má-fé. (yuri)
2.4.3. A Antecipação da Tutela em face de Pedido Incontroverso
Essa hipótese de antecipação é desvinculada das demais, não necessitando do perigo de dano nem de abuso do direito de defesa ou propósito protelatório do réu. Há quem chame esse tipo de tutela de “tutela de evidência”, a exemplo de José Roberto dos Santos Bedaque. [37]
Antes da inclusão do parágrafo 6º no artigo 273 do CPC, Luiz Guilherme Marinoni já falava sobre a possibilidade de concessão de tutela antecipada na hipótese de reconhecimento parcial da ação, ou quando verificasse a existência de pedido incontroverso.
Entretanto, a tese era baseada no inciso II do artigo 273 do CPC, através de interpretação analógica. Assim, a sustentação da possibilidade de concessão da tutela antecipada em razão de ponto incontroverso, que era de lege ferenda, depois da inclusão do referido dispositivo, passou a ser agora de lege lata.[38]
Cabe frisar que a concessão da tutela antecipada em razão de pontos incontroversos uma evidente evolução na sistemática processual brasileira, pois esse mecanismo vem agilizar o processo para entregar ao autor o direito que lhe é devido, da maneira mais rápida e segura para a jurisdição.
Com a possibilidade de se conceder a tutela antecipada em decorrência de pedido incontroverso, denota que o acesso à efetiva prestação jurisdicional torna-se uma questão de cidadania, garantindo aos membros da sociedade, uma tutela rápida, eficaz e segura, como reflexo de um Direito Processual que busca a eficácia de um processo justo, rápido e de efetiva finalidade.[39]
Essa hipótese de antecipação do § 6º do art. 273 do CPC brasileiro não pressupõe urgência e não pode ser concedida inaudita altera parte, já que para ela é necessário que haja resposta do réu. Contudo, para sua concessão, faz-se necessário a presença da verossimilhança das alegações e reversibilidade da medida.
Marinoni ensina diferente, em virtude de que trata tal hipótese de tutela antecipada como um juízo de certeza[40]. Sem embargo, como não é decisão final, o pedido será analisado de forma definitiva na sentença, sendo, portanto, cabível a exigência da verosimilhança das alegações e da reversibilidade da medida.
De grande importância é o que afirmam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:
Havendo admissão parcial da pretensão pelo réu, quando, por exemplo, o autor pede 200 e o réu admite a dívida mas diz que o valor é de 100, na verdade há parte da pretensão sobre a qual não houve controvérsia. Nada obsta que o autor peça adiantamento da parte incontrovertida, sob a forma de tutela antecipatória, como, aliás, vem previsto no art. 186 bis do Código de Processo Civil italiano, introduzido pela reforma que ocorreu naquele país em 1990.[41]
Antes da reforma trazida pela Lei nº. 10.444/02, a tutela antecipada era vista, sempre, como "medida provisória", já que, nela, faz-se uma cognição "sumária" . Porém, após a inserção do parágrafo 6º do artigo 273 do CPC, a cognição nesse caso passou a ser esgotada, quando o juiz conceder a tutela antecipada na existência de incontroversa de pedidos (ou parte deles) cumulados, pois o processo terá o seu trâmite, apenas no que tange aos pontos e pedidos controversos
Cabe salientar, ainda, que a incontrovérsia não gera a obrigatoriedade na concessão da medida antecipatória, a emplo de eventual existência de questões de ordem pública no processo, que devem ser analisadas de ofício. Outrossim, deve o juiz analisar a plausabilidade do pedido, mesmo que incontroverso e, ainda, não pode ele admitir pedidos incompatíveis com outros previstos na petição inicial.
Nesse sentido, aqueles pedidos incontroversos podem ser objeto de tutela antecipada, desde que não sejam juridicamente impossíveis, incompatíveis com outro da inicial e que os fatos e fundamentos não sejam insuscetíveis de confissão.
A incontrovérsia do pedido pode se dar pela revelia, que é a ausência de contestação, pela confissão dos fatos, ou pelo reconhecimento de pedido.
2.5 – Tutela Antecipada e Tutela Cautelar: diferenças
Na lição de Cintra, Grinover e Dinamarco, a atividade cautelar:
“Foi preordenada a evitar que o dano oriundo da inobservância do direito fosse agravado pelo inevitável retardamento do remédio jurisdicional (periculum in mora). O provimento cautelar funda-se antecipadamente na hipótese de um futuro provimento jurisdicional favorável ao autor (fumus boni iuris): verificando-se os pressupostos do fumus boni iuris e do periculum in mora, o provimento cautelar opera imediatamente, como instrumento provisório e antecipado do futuro provimento definitivo, para que este não seja frustrado em seus efeitos. “[42]
A diferença básica entre as duas tutelas de urgência é muito bem definida por Marinoni: A tutela cautelar possui a finalidade de assegurar a realização de um direito. Se uma tutela provisória vier a satisfazer um direito, será ela chamada de “satisfativa sumária”. A prestação satisfativa sumária, pois, nada tem a ver com a tutela cautelar. A tutela que satisfaz, por estar além do assegurar, realiza missão que é completamente distinta da cautelar. Na tutela cautelar há sempre referibilidade a um direito acautelado. O direito referido é que é protegido (assegurado) cautelarmente. Se inexiste referibilidade, ou referência a direito, não há direito acautelado. [43]
De grande importância são os ensinamentos de Ovídio Baptista, que afirma:
“A tutela cautelar é uma forma particular de proteção jurisdicional predisposta a assegurar, preventivamente, a efetiva realização dos direitos subjetivos ou de outras formas de interesse reconhecidos pela ordem jurídica como legítimos, sempre que eles estejam sob ameaça de sofrer algum dano iminente e de difícil reparação, desde que tal estado de perigo não possa ser evitado através das formas normais de tutela jurisdicional”[44].
Para Calmon de Passos, a Tutela antecipada não se cuida de medida cautelar, pela qual se resguarda (pelo meio próprio) a futura tutela que se consubstancia no pedido formulado pela parte. Aqui, há absoluta identidade entre a tutela passível de antecipação e o pedido formulado pelo autor, não podendo o juiz deferi-la nem ultra, nem extra petita[45] .
A tutela cautelar não tem conteúdo satisfativo, apenas servindo para preservar os efeitos úteis da tutela definitiva satisfativa. Assim, não basta a sumariedade, para que seja cautelar é necessário que a tutela não satisfaça o direito material.
Já a tutela antecipada, antecipa os efeitos da própria tutela definitiva satisfativa. Portanto a cautelar garante a futura eficácia da tutela definitiva (satisfativa) e a antecipada confere eficácia imediata à tutela definitiva ( satisfativa ou cautelar). [46]
A cautelar é medida habilitada a ter sempre duração limitada no tempo, não sendo sucedida por outra de mesmo conteúdo ou natureza, razão pela qual a situação fática por ela criada será necessariamente desfeita ao término de sua vigência; já a antecipatória pode ter seus efeitos perpetuados no tempo, pois destinada a ser sucedida por outra de conteúdo semelhante, a sentença final de procedência, cujo advento consolidará, de modo definitivo a situação fática decorrente da antecipação[47]
Além disso, a tutela cautelar exige apenas verossimilhança do direito, já a tutela antecipada necessita de verossimilhança fundada em prova inequívoca do direito a ser satisfeito antecipadamente.
Outrossim, a tutela cautelar não acrescenta nada ao ativo jurídico do autor, salvo a segurança, já o provimento antecipatório outorga-lhe o desfrute imediato do bem ou direito. A cautela só dá ao autor a expectativa favorável da efetiva fruição do direito no futuro; a antecipação o coloca, desde logo, em condições de fruir dele. Em simplificação talvez demasiada, mas certamente esclarecedora, em ambos os casos o demandado perde, mas só no último o autor ganha. O que se tira do réu mediante cautelar permanece sob custódia judicial, sem se transferir de imediato ao autor; o que a este se concede a título de antecipação, acrescenta-se prontamente ao seu patrimônio jurídico[48]
Outra característica da tutela cautelar é a referibilidade ao direito acautelado. Segundo Ovídio Baptista da Silva: na medida cautelar, se prestarmos atenção ao verbo assegurar, veremos que a referibilidade a que se dá proteção é inafastável.[49]
Assim, a tutela cautelar possui o objetivo apenas de assegurar uma pretensão, a qual não poderá ser satisfeita através da tutela de segurança. Já a tutela satisfativa ou antecipada é marcada pela não-referibilidade.
Excelente síntese das diferenças aqui expostas são ditas por Teori Zavascki, para o qual:
parcial, da própria fruição do direito, ou seja, há, em as medidas cautelares e as antecipatórias: a) identificam-se por desempenhar função constitucional semelhante, qual seja, a de propiciar condições para a convivência harmônica dos direitos fundamentais à segurança jurídica e à efetividade da jurisdição; b) sujeitam-se, contudo, a regimes processual e procedimental diferentes: a cautelar é postulada em ação autônoma, disciplinada no Livro do Processo Cautelar; a antecipatória é requerida na própria ação destinada a obter a tutela definitiva, observados os requisitos do art. 273 do CPC; c) a medida cautelar é cabível quando, não sendo urgente a satisfação do direito, for urgente, no entanto, garantir sua futura certificação ou sua futura execução; a medida antecipatória tem lugar quando urgente é a própria satisfação do direito afirmado; d) na cautelar há medida de segurança para a certificação ou segurança para futura execução do direito; na antecipatória há o adiantamento, total ou sentido lato, execução antecipada, como um meio para evitar que o direito pereça ou sofra dano (execução para segurança); e) na antecipação há coincidência entre o conteúdo da medida e a conseqüência jurídica resultante do direito material afirmado pelo autor; na cautelar o conteúdo do provimento é autônomo em relação ao da tutela definitiva; f) o resultado prático da medida antecipatória é, nos limites dos efeitos antecipados, semelhante ao que se estabeleceria com o atendimento espontâneo, pelo réu, do direito afirmado pelo autor; na cautelar, o resultado prático não tem relação de pertinência com a satisfação do direito e sim com a sua garantia; g) a cautelar é medida habilitada a ter sempre duração limitada no tempo, não sendo sucedida por outra de mesmo conteúdo ou natureza (ou seja, por outra medida de garantia), razão pela qual, a situação fática por ela criada será necessariamente desfeita ao término de sua vigência; já a antecipatória pode ter seus efeitos perpetuados no tempo, pois destinada a ser sucedida por outra de conteúdo semelhante, a sentença final de procedência, cujo advento consolidará de modo definitivo a situação fática decorrente da antecipação. [50].
Haverá, contudo, sempre situações de fronteira, que ensejarão dificuldades de ordem prática para joeirar com precisão uma e outra espécie de tutela. Não deve o juiz, na dúvida, adotar posição de intransigência. Ao contrário, deverá agir sempre com maior flexibilidade, dando maior atenção à função máxima do processo a qual se liga à meta da instrumentalidade e da maior e mais ampla efetividade da tutela jurisdicional.
É preferível transigir com a pureza dos institutos do que sonegar a prestação justa a que o Estado se obrigou perante todos aqueles que dependem do Poder Judiciário para defender seus direitos e interesses envolvidos em litígio. Eis a orientação merecedora de aplausos, sempre que o juiz se deparar com algum desvio procedimental no conflito entre tutela cautelar e tutela antecipatória.[51]
3- CONCLUSÃO.
Por tudo que foi dito, resta evidente que o instituto da tutela antecipada, introduzido pela Lei 8952/94, representou grande avanço no direito processual brasileiro.
O Direito Processual Civil teve sua evolução dividida em três fases. A primeira delas foi a imanentista, na qual não se falava em autonomia do direito processual, que era visto, apenas, como um conjunto de formalidades para a prática do direito material. Depois, veio a fase científica, em que se buscava afirmar o direito processual como um ramo autônomo, dotado de cientificidade e objeto próprio.
A terceira fase é chamada de instrumentalista, na qual passou o processualista a dedicar seus esforços no sentido de descobrir meios de melhorar o exercício da prestação jurisdicional, tornando-a mais segura e, na medida do possível, mais célere.
O processo passa, então, a ser visto como um instrumento a serviço da jurisdição. Notou-se que o processo não é um fim em si mesmo, em verdade, deve ele atuar em prol dos anseios da sociedade. Dessa forma, dentro dessa nova ótica estabelecida entre os processualistas, surgem as chamadas ondas renovatórias do direito processual, que objetivam assegurar aos jurisdicionados a efetividade, concedendo, por exemplo, assistência jurídica.
Resta evidente que o instituto das tutelas de urgência está em consonância com os valores da instrumentalidade do processo, já que possui o objetivo de assegurar um direito útil para as partes. Contudo, é necessário que se faça a distinção entre as duas espécies, quais sejam, a tutela cautelar e a tutela antecipada.
A cautelar já estava presente no ordenamento jurídico brasileiro bem antes da introdução do instituto da antecipação dos efeitos da tutela no Código de Processo Civil. Sabe-se que são bem distintos os objetos de cada uma delas. A tutela acautelatória possui o fim último de assegurar a realização de um direito, já a antecipatória, por sua vez, antecipa os efeitos da sentença final, concedendo à parte o objeto principal da demanda antes do fim do processo.
Um dos maiores problemas enfrentados pela justiça brasileira é a demora processual, a qual induz a um descrédito de nossos órgãos jurisdicionais, já que uma tutela intempestiva não leva à satisfação dos direitos buscados pelas partes.
Os processualistas brasileiros, preocupados com essa situação, que fere frontalmente a instrumentalidade do processo, começaram a estudar formas de minimizar os efeitos da demora processual. Percebeu-se que a tutela cautelar não era suficiente para solucionar este problema. Então, em 13 de dezembro de 1994, instituiu-se a tutela antecipada no ordenamento jurídico brasileiro, que se mostrou um eficiente meio de racionalização do tempo do processo entre autor e réu.
Contudo, vale salientar que o instituto da antecipação dos efeitos da tutela, embora seja um poderoso instrumento jurídico-processual neutralizador dos malefícios advindos da demora da prestação jurisdicional, para que seja deferido, é mister que se preencham os requisitos estabelecidos no art. 273 do Código de Processo Civil Brasileiro, como analisado alhures.
Nesse sentido, percebe-se que a tutela antecipada, além de ser uma técnica processual que dá efetividade ao processo judicial, é um importante meio para garantir ao jurisdicionado o direito ao devido processo legal.
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[1] SANTORO, Gláucia Carvalho. Tutela antecipada. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p.33
[2] NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. São Paulo: Revista do Tribunais, 2003. p.646
[3] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização, 2 ed, cit, p115
[4] MARINONI, LUIZ GUILHERME. Antecipação de Tutela. 10ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008
[5] “a tutela jurisdicional cautelar”, Revista da Procuradoria- Geral do Estado de São Paulo- 23/129- in MARINONI, LUIZ GUILHERME. Antecipação de Tutela. 10ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008
[6] WATANABE, Kazuo, Tutela Antecipatória e Tutela específica das Obrigações de Fazer e Não-Fazer – arts. 273 e 461 do CPC”, in Sálvio de Figueiredo Teixeira, Reforma do Código de Processo Civil, São Paulo, Ed. Saraiva, 1996, p. 20
[7] THEODORO JÚNIOR, HUMBERTO. Curso de Direito Processual Civil-Procedimentos Especiais. Vol. III. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p.675.
[8] ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela.São Paulo. Saraiva, 1997, p. 76.
[9] VAZ, Paulo Afonso Brum. Manual da Tutela Antecipada.Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 138
[10] CALMON DE PASSOS, J.J., da antecipação da tutela. In: Teixeira, Sálvio de Figueiredo (coord). Reforma do CPC. São Paulo: Sraiva, 1996, p. 195.
[11] CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação da Tutela. 6 ed. Rio de Janeio: Forense, 2005, p. 22
[12] BARBOSA MOREIR, José Carlos. Antecipação de tutela: algumas questões controvertidas.Revista de Processo, São Paulo, ano 26, nº. 104, out-dez. 2001, p. 104 em Yuri Grossi
[13] ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. São Paulo: Saraiva, 1997, p.76
[14] ASSIS, araken de. Antecipação de Tutela. In: Wambie, tereza arruda alvim (coord). Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 24..
[15] VAZ, Paulo Afonso Brum. Manual da tutela natecipada. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2002, p. 146
[16] CALAMANDREI, PIERO. Introdução ao estudo sistemático dos procedimentos cautelares. Campinas: Servanda, 2002, p. 99.
[17] BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Antecipação de tutela: algumas questões controvertidas. Revista de Processo, São Paulo, ano 26, n. 104, out-dez, 2001, p. 105.
[18] SILVA, Ovídio Baptista da. A antecipação de Tutela na recente reforma processual. In: Teixeira , Sálvio de figueiredo (coord). Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 131.
[19] ZAVASCKi, Teori Albino. Antecipação da tutela. São Paulo: Sraiva: 1997, p. 83
[20] BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Antecipação de tutela: algumas questões controvertidas. Revista de Processo, São Paulo, ano 26, n. 104, out-dez, 2001, p. 106 em Yuri
[21] ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. São Paulo: Sraiva: 1997, p. 83
[22] CALMON DE PASSOS, J.J.Inovações no Código de Proceso Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 17-18.
[23] MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória, julgamento antecipado e execução imediata da sentença. 4 ed. São Paulo: RT, 2000, P. 157-158
[24] CARREIRA ALVIM, J.E. Tutela antecipada na reforma processula. 2 ed. Curitiba: Juruá, 1999, p. 88.
[25] MESQUITA, Eduardo Melo de. As tutelas cautelar e antecipada. São Paulo: RT, 2002, P. 305.
[26] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Comentários ao Código de Processo Civil. 5. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. Tomo I, p. 145.
[27]MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória, julgamento antecipado e execução imediata da sentença. 4 ed. São Paulo: RT, 2000, P. 15.
[28] CASTRO FILHO, José Olímpio. Abuso do direito no rpocesso civil. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1960, p. 21.
[29] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado. 3 ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, v. LIII, P. 71-75.
[30] MAGADAN, Yuri Grossi. Hipóteses de Antecipação de Tutela: Exame do art. 273 do Código de Processo Civil. Ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2009, p. 105.
[31] CASTRO FILHO, José Olímpio. Abuso do direito no rpocesso civil. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1960, p. 132
[32] ZAVASCKI, Teori Albino, Antecipação da tutela,. São Paulo: Sraiva, 1997,p. 77
[33] MACHADO, Antônio Cláudio da costa. Tutela Antecipada. 3 ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 422
[34] DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 147-148
[35] MACHADO, Antônio Cláudio da costa. Tutela Antecipada. 3 ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 422
[36] ZAVASCKI, Teori Albino, Antecipação da tutela,. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 77
[37] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização, 2 ed, cit, p115).
[38] CARREIRA ALVIM, J. E. Tutela antecipada. Curitiba: Juruá, 2003. p.127
[39] BÜTTENBENDER, Carlos Francisco. A antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional pretendida. Porto Alegre: Síntese,1997. p.27/28.
[40] MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória, julgamento antecipado e execução imediata da sentença. 8 ed. São Paulo: RT, 2004, p. 344.
[41] NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. São Paulo: Revista do Tribunais, 2003. p.652.
[42] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. , 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 317
[43] MARINONI, LUIZ GUILHERME. Antecipação de Tutela. 10ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 107
[44] SILVA, Ovídio A. Baptista da. GOMES, Fábio. Teoria Geral do Processo Civil. 2ª ed. São Paulo: RT, 2000, p. 339.
[45] CALMON DE PASSOS, J.J. 'Inovações no Código de Processo Civil', Forense, 2ª ed. 1995, pág.08.
[46] DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: direito probatório, decisão judicial, cumprimento e liquidação da sentença e coisa julgada. V. 1. Salvador: Jus Podium, 2008. p. 597
[47] Zavascki, Teori Albino, Antecipação da tutela,. São Paulo: Sraiva, 1997, cit. Pg 57
[48] FABRÍCIO, Adroaldo Furtado. “breves notas sobre os provimentos antecipatórios, cautelares e liminares”. Estudos de Direito Processual em memória de Luiz Machado Guimarães. José Carlos Barbosa Moreira (coord). Rio de Janeio: Forense, 1999, p. 27-28.
[49] SILVA, Ovídio A. Baptista da. GOMES, Fábio. Teoria Geral do Processo Civil. 2ª ed. São Paulo: RT, 2000, p. 67
[50] ZAVASCKI, Teori Albino. Medidas cautelares e medidas antecipatórias: técnicas diferentes, função constitucional semelhante. Revista de Processo. São Paulo: RT, ano 21, nº 82, abr/jun 1996, p. 68-69.
[51] THEODORO JR, Humberto. Antecipação de tutela e medidas cautelares - Tutela de emergência. Revista Jurídica Síntese, nº 253, p. 42/3.
Advogada da União. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIBEIRO, Cynthia Arcoverde. Considerações acerca do instituto da Tutela Antecipada Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 dez 2013, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37757/consideracoes-acerca-do-instituto-da-tutela-antecipada. Acesso em: 23 dez 2024.
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