I – Conceito, Fundamento Legal e Requisitos da Repactuação.
A repactuação é modalidade específica de reajuste que se destina a recuperar os valores contratados da defasagem provocada pela inflação. Na repactuação, a correção dos valores se opera de acordo com a efetiva alteração dos custos contratuais, comprovada e demonstrada analiticamente.
O renomado Prof. Marçal Justen Filho[1], ao tratar do referido instituto, assevera que:
A chamada “repactuação” foi instituída no âmbito federal, tomando em vista especificamente as contratações de serviços contínuos subordinados ao art. 57, inc. II. No início o problema se relacionou com o Plano Real.
A figura foi tratada, basicamente, pela Res. nº 10 (de 8 de outubro de 1996), do antigo Conselho de Coordenação e Controle de Empresas Estatais – CCE. Ali se determinara a vedação, em todos os contratos de prestação de serviços, de cláusula de indexação (reajuste). Determinou-se que, nas contratações com prazo superior a um ano ou quando houvesse cláusula de prorrogação (entenda-se renovação), ocorreria uma repactuação de preços.
A repactuação assemelha-se ao reajuste, no sentido de ser prevista para ocorrer a cada doze meses ou quando se promover a renovação contratual. Mas aproxima-se da revisão de preços quanto ao seu conteúdo: trata-se de uma discussão entre as partes relativamente às variações de custo efetivamente ocorridas. Não se promove a mera e automática aplicação de um indexador de preço, mas examina-se a real evolução de custos do particular.
Posteriormente, a figura da repactuação de preços generalizou-se para as contratações do art. 57, inc. II. É que, nesses casos, a efetiva variação dos custos do particular pode ser inferior àquela retratada em índices gerais de preços. Veja-se que a finalidade da repactuação não é negar ao particular uma compensação automática, a cada doze meses, pelas elevações em seu custo, mas sim a de evitar que a adoção de índices genéricos produza distorções contrárias aos cofres públicos.
Como modalidade de reajuste, encontra seu fundamento legal nos arts. 40, XI, e 55, III, da Lei nº 8.666/93, bem com nos arts. 2º. e 3º. da Lei nº 10.192/01. Entretanto, o instrumento normativo que trata expressamente da repactuação é o Decreto nº 2.271/97, que dispõe sobre a contratação de serviços contínuos pela Administração Pública Federal.
Preceitua o art. 5º do citado normativo:
Art. 5º Os contratos de que trata este Decreto, que tenham por objeto a prestação de serviços executados de forma contínua poderão, desde que previsto no edital, admitir repactuação visando a adequação aos novos preços de mercado, observados o interregno mínimo de um ano e a demonstrarão analítica da variação dos componentes dos custos do contrato, devidamente justificada.
A Instrução Normativa MPOG/SLTI 02/2008 regulamenta o dispositivo acima transcrito, disciplinando a repactuação nos artigos 37 a 41, conforme:
“Art. 37. A repactuação de preços, como espécie de reajuste contratual, deverá ser utilizada nas contratações de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra, desde que seja observado o interregno mínimo de um ano das datas dos orçamentos aos quais a proposta se referir, conforme estabelece o art. 5º do Decreto nº 2.271, de 1997. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 1º A repactuação para fazer face à elevação dos custos da contratação, respeitada a anualidade disposta no caput, e que vier a ocorrer durante a vigência do contrato, é direito do contratado, e não poderá alterar o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos, conforme estabelece o art. 37, inciso XXI da Constituição da República Federativa do Brasil, sendo assegurado ao prestador receber pagamento mantidas as condições efetivas da proposta. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 2º A repactuação poderá ser dividida em tantas parcelas quanto forem necessárias em respeito ao princípio da anualidade do reajuste dos preços da contratação, podendo ser realizada em momentos distintos para discutir a variação de custos que tenham sua anualidade resultante em datas diferenciadas, tais como os custos decorrentes da mão de obra e os custos decorrentes dos insumos necessários à execução do serviço. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 3º Quando a contratação envolver mais de uma categoria profissional, com datas-base diferenciadas, a repactuação deverá ser dividida em tantas quanto forem os acordos, dissídios ou convenções coletivas das categorias envolvidas na contratação. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 4º A repactuação para reajuste do contrato em razão de novo acordo, dissídio ou convenção coletiva deve repassar integralmente o aumento de custos da mão de obra decorrente desses instrumentos. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Art. 38. O interregno mínimo de 1 (um) ano para a primeira repactuação será contado a partir:
I - da data limite para apresentação das propostas constante do instrumento convocatório, em relação aos custos com a execução do serviço decorrentes do mercado, tais como o custo dos materiais e equipamentos necessários à execução do serviço; ou (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
II - da data do acordo, convenção ou dissídio coletivo de trabalho ou equivalente, vigente à época da apresentação da proposta, quando a variação dos custos for decorrente da mão-de-obra e estiver vinculada às datas-base destes instrumentos. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Parágrafo único. (Revogado pela Instrução Normativa nº 18 de dezembro de 2009)
Art. 39. Nas repactuações subseqüentes à primeira, a anualidade será contada a partir da data do fato gerador que deu ensejo à última repactuação. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Art. 40. As repactuações serão precedidas de solicitação da contratada, acompanhada de demonstração analítica da alteração dos custos, por meio de apresentação da planilha de custos e formação de preços ou do novo acordo convenção ou dissídio coletivo que fundamenta a repactuação, conforme for a variação de custos objeto da repactuação. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 1º É vedada a inclusão, por ocasião da repactuação, de benefícios não previstos na proposta inicial, exceto quando se tornarem obrigatórios por força de instrumento legal, sentença normativa, acordo coletivo ou convenção coletiva.
§ 2º Quando da solicitação da repactuação para fazer jus a variação de custos decorrente do mercado, esta somente será concedida mediante a comprovação pelo contratado do aumento dos custos, considerando-se: (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
I - os preços praticados no mercado ou em outros contratos da Administração; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
II - as particularidades do contrato em vigência;
III - (Revogado pela Instrução Normativa nº 04, de 11 de novembro de 2009.)
IV - a nova planilha com variação dos custos apresentada; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 04, de 11 de novembro de 2009)
V – indicadores setoriais, tabelas de fabricantes, valores oficiais de referência, tarifas públicas ou outros equivalentes; e (Redação dada pela Instrução Normativa nº 04, de 11 de novembro de 2009)
VI - a disponibilidade orçamentária do órgão ou entidade contratante.
§ 3º A decisão sobre o pedido de repactuação deve ser feita no prazo máximo de sessenta dias, contados a partir da solicitação e da entrega dos comprovantes de variação dos custos.
§ 4º - As repactuações, como espécie de reajuste, serão formalizadas por meio de apostilamento, e não poderão alterar o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos, exceto quando coincidirem com a prorrogação contratual, em que deverão ser formalizadas por aditamento. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 5º O prazo referido no § 3º ficará suspenso enquanto a contratada não cumprir os atos ou apresentar a documentação solicitada pela contratante para a comprovação da variação dos custos; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 6º O órgão ou entidade contratante poderá realizar diligências para conferir a variação de custos alegada pela contratada.
§ 7º As repactuações a que o contratado fizer jus e não forem solicitadas durante a vigência do contrato, serão objeto de preclusão com a assinatura da prorrogação contratual ou com o encerramento do contrato. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Art. 41. Os novos valores contratuais decorrentes das repactuações terão suas vigências iniciadas observando-se o seguinte:
I - a partir da ocorrência do fato gerador que deu causa à repactuação; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
II - em data futura, desde que acordada entre as partes, sem prejuízo da contagem de periodicidade para concessão das próximas repactuações futuras; ou
III - em data anterior à ocorrência do fato gerador, exclusivamente quando a repactuação envolver revisão do custo de mão-de-obra em que o próprio fato gerador, na forma de acordo, convenção ou sentença normativa, contemplar data de vigência retroativa, podendo esta ser considerada para efeito de compensação do pagamento devido, assim como para a contagem da anualidade em repactuações futuras; (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§1º. Os efeitos financeiros da repactuação deverão ocorrer exclusivamente para os itens que a motivaram, e apenas em relação à diferença porventura existente. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 2º (revogado). (Revogado pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 3º (revogado). (Revogado dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
§ 4º (revogado). (Revogado dada pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Art. 41-A As repactuações não interferem no direito das partes de solicitar, a qualquer momento, a manutenção do equilíbrio econômico dos contratos com base no disposto no art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Art. 41-B A empresa contratada para a execução de remanescente de serviço tem direito à repactuação nas mesmas condições e prazos a que fazia jus a empresa anteriormente contratada, devendo os seus preços serem corrigidos antes do início da contratação, conforme determina o art. 24, inciso XI da Lei nº 8.666, de 1993. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009)
Além do Decreto 2.271/97 e da IN 02/2008, o instituto da repactuação observa também as orientações exaradas no Parecer AGU/JTB 01/2008, que foi aprovado pelo Presidente da República, nos termos dos artigos 41 e 42 da Lei Complementar 73/93, vinculando toda a Administração Pública Federal.
De modo conclusivo, a referida manifestação jurídica, de observância obrigatória, estabelece que:
a) a repactuação constitui-se em espécie de reajustamento de preços, não se confundindo com as hipóteses de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato;
b) no caso da primeira repactuação do contrato de prestação de serviços contínuos, o prazo de um ano para se requerer a repactuação conta-se da data da proposta da empresa ou da data do orçamento a que a proposta se referir, sendo certo que, considera-se como data do orçamento a data do acordo, convenção, dissídio coletivo de trabalho ou equivalente que estipular o salário vigente à época da apresentação da proposta;
c) no caso das repactuações subseqüentes à primeira, o prazo de um ano deve ser contado a partir da data da última repactuação;
d) quanto aos efeitos financeiros da repactuação nos casos de convenções coletivas de trabalho, tem-se que estes devem incidir a partir da data em que passou a viger efetivamente a majoração salarial da categoria profissional; e
e) quanto ao termo final para o contratado requerer a repactuação, tem-se que a repactuação deverá ser pleiteada até a data da prorrogação contratual subseqüente, sendo certo que, se não o for de forma tempestiva, haverá a preclusão do direito do contratado de repactuar.
Pertinente trazer à colação a Orientação Normativa nº 25 da Consultoria Jurídica da União – Minas Gerais, que, didaticamente, faz interpretação sobre os efeitos financeiros da repactuação dos serviços contínuos, conforme:
ORIENTAÇÃO NORMATIVA CJU-MG Nº 25, DE 17 DE MARÇO DE 2009: REPACTUAÇÃO. EFEITOS FINANCEIROS.
I - Os efeitos financeiros da repactuação deverão ocorrer exclusivamente para os itens que a motivaram, e apenas em relação à diferença porventura existente.
II - A vigência dos efeitos financeiros quanto aos custos decorrentes de mão de obra, realizada com fundamento em Dissídio Coletivo, Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, terá início a partir da data em que passou a viger efetivamente a majoração salarial da categoria profissional abrangida. (Art. 41, III da IN SLTI/MPOG nº 02/2008)
III - A vigência dos efeitos financeiros quanto aos demais insumos, terá início 12 meses após o dia fixado como data limite para a apresentação da proposta, na primeira repactuação, e 12 meses após o início dos efeitos financeiros da repactuação anterior, correspondentes à mesma parcela objeto da nova solicitação, nas repactuações subsequentes. (Art. 41, I da IN SLTI/MPOG nº 02/2008)
IV - A empresa contratada para a execução de remanescente de serviço tem direito à repactuação nas mesmas condições e prazos a que fazia jus a empresa anteriormente contratada, devendo os seus preços serem corrigidos antes do início da contratação, conforme determina o art. 24, inciso XI da Lei nº 8.666, de 1993. (Art. 41-B da IN SLTI/MPOG nº 02/2008)
Referências:
ON`s AGU n° 24, 25 e 26, de 1° de abril de 2009, revisadas em 14/12/2011. Parecer Nº AGU/JTB 01/2008 / Art. 41e 41-B da IN SLTI/MPOG nº 02, de 30 de abril de 2008 (Redação dada pela IN nº 3, SLTI/MPOG, de 15.10.2009)
Dentro de todo o contexto exposto, considerando o arcabouço normativo citado, extraem-se os seguintes requisitos que viabilizam a concessão da repactuação:
1. previsão no instrumento convocatório;
2. natureza contínua dos serviços contratados;
3. observância da anualidade na concessão do benefício, contada da data de apresentação da proposta, do orçamento a que ela se referir, ou do fato gerador que deu origem à última repactuação, conforme o caso;
4. demonstração analítica do aumento dos custos, de acordo com a planilha de custos e formação de preços e com a nova Convenção Coletiva de Trabalho;
5. disponibilidade orçamentária da entidade contratante;
6. requerimento efetivado até a data da prorrogação contratual, sob pena de preclusão lógica do direito de repactuar.
II – Dos limites para a alteração da proposta original do contrato – a repactuação não se presta a corrigir erros ou equívocos cometidos pelo particular na planilha de formação de preços.
Conforme ressaltado, o instituto da repactuação configura hipótese de reajustamento de preços que se destina a recuperar os valores contratados da defasagem provocada pela inflação. É aplicável, em especial, nos casos de serviços contínuos com dedicação exclusiva de mão de obra, a partir da variação efetiva dos custos do contrato, geralmente, em decorrência de novo acordo ou convenção coletiva de trabalho, mas desde que mantidas as condições efetivas da proposta (art. 37, §1º, IN 02/08).
Nesse sentido, o art. 40 da referida IN ainda assenta, in verbis:
Art. 40. As repactuações serão precedidas de solicitação da contratada, acompanhada de demonstração analítica da alteração dos custos, por meio de apresentação da planilha de custos e formação de preços e do novo acordo ou convenção coletiva que fundamenta a repactuação.
§ 1º É vedada a inclusão, por ocasião da repactuação, de benefícios não previstos na proposta inicial, exceto quando se tornarem obrigatórios por força de instrumento legal, sentença normativa, acordo coletivo ou convenção coletiva.
Observa-se, assim, que a viabilidade da alteração das condições inicialmente ajustadas na proposta de preços, mediante a aplicação do instituto da repactuação, repousa somente na hipótese de inserção de novos benefícios que, posteriormente, tornaram-se “obrigatórios por força de instrumento legal, sentença normativa, acordo coletivo ou convenção coletiva”.
Nesse ponto, a repactuação não é instrumento hábil, por exemplo, para promover a correção de omissões ou erros cometidos pela empresa contratada na planilha de formação de preços da proposta, que naturalmente reduziram o valor global apresentado e, por consequência, contribuíram para sagrá-la vencedora do certame. A admissão de alterações desta natureza privilegiaria a empresa contratada, em ofensa à isonomia, bem como admitiria, por via reflexa, a elevação do valor global do contrato, fora das condições definidas na proposta, o que afronta os princípios da legalidade e da economicidade.
A jurisprudência do Tribunal de Contas da União é assente no sentido de que a contratada deve suportar os ônus dos erros ou omissões apresentados quando da formulação da proposta e formação da planilha de preços. Mesmo nas hipóteses em que as falhas estejam adstritas a preços previstos a menor em relação a deveres de cunho legal, cabe à empresa, no caso de terceirização, cumprir com as obrigações laborais perante seus funcionários, sem que tais custos venham a ser repassados à Administração, modificando as condições inicialmente previstas e onerando o valor global do contrato.
Em que pese possível redução na margem de lucro da empresa, em razão de eventual cálculo a menor dos custos dos insumos previstos na planilha de composição de preços, cabe à contratada fazer cumprir a avença, nos termos assumidos quando da assinatura do avença. Repita-se a repactuação de preços não se presta a tal desiderato.
Senão vejamos o remansoso entendimento da Corte de Contas Administrativas:
DECISÃO Nº 0577/2001 – TCU – PLENÁRIO:
É certo que a todos quantos participem de licitação é dado o direito à observância dos procedimentos e ritos estabelecidos em lei. Também é certo que qualquer ato da Administração ou cláusula editalícia que caracterize lesão ou ameaça de lesão a esse direito poderá ser refutado pelas vias competentes. Todavia, é preciso um mínimo de objetividade nessa caracterização, não sendo suficiente, para tanto, o mero temor do licitante, desprovido de elementos que lhe dê razoável sustentação;
b) o mecanismo de convalidação previsto no edital é, a nosso ver, admissível. Não há modificação dos valores globais da proposta, sempre respeitados, em qualquer hipótese. Ocorre que esse valor vem acompanhado de sua memória de cálculo, ou seja da planilha demonstrativa dos componentes do custo, entre os quais alguns que decorrem de lei e de acordos coletivos. Evidentemente espera-se não haver diferenças entre a informação posta na planilha e aquela exigida pela lei ou pelo acordo. Mas, e se houver? Só há duas alternativas, cuja validade cabe discutir:
1ª) acata-se a proposta, mas o proponente tem que suportar o ônus do seu erro (que resulta em uma oferta menos competitiva, se o valor informado for maior que o exigido, ou em uma redução da margem de lucro inicialmente esperada, na situação inversa); ou
2ª) desclassifica-se a proposta sumariamente, o que não deixa de ser uma medida drástica, se considerarmos que a licitação não é um fim em si mesma, mas meio para a Administração selecionar a oferta que lhe for mais vantajosa, dentro dos limites de atuação estabelecidos pelo legislador.
Dentre essas alternativas, a SAA optou pela primeira: mantém a proposta, se verificar que, mesmo com a diminuição do lucro, a oferta ainda é exeqüível. Essa decisão nos parece válida, já que: 1º) o proponente continuará sujeito a cumprir a lei e os acordos firmados; sua declaração contida na planilha não tem a faculdade de afastar a incidência dessas obrigações; 2º) os valores globais propostos não poderão ser modificados; a proposta obriga o proponente, a quem cabe assumir as conseqüências de seus atos; e 3º) o procedimento previsto não fere a isonomia entre os licitantes: todos estarão sujeitos à mesma regra previamente estipulada no edital.
Ademais, esse procedimento respeita os limites de atuação estabelecidos pelo legislador, consoante o caput do art. 45 da Lei de Licitações, ou seja, o julgamento segue critérios que 1) não ferem disposições legais; 2) são objetivos - aplicados à mesma situação levam a resultados idênticos, independentemente do avaliador; 3) foram previamente estabelecidos no ato convocatório e devem ser apreciados de acordo com fatores exclusivamente nele referidos; e 4) possibilitam sua aferição por quaisquer dos licitantes e pelos órgãos de controle;
ACÓRDÃO 963/2004 - PLENÁRIO – TCU:
52. Inicialmente, cabe esclarecer que alguns dos elementos integrantes da planilha de custos são variáveis, e dependem da característica e estrutura de custos de cada organização. Outros são decorrentes de lei ou acordos coletivos, sendo responsabilidade da licitante informá-los corretamente. Caso a planilha apresentada pelo licitante esteja dissonante do previsto em lei, e ainda assim, for considerada exeqüível e aceita pela Administração, caberá ao licitante suportar o ônus do seu erro.
ACÓRDÃO 310/2006 - TCU - PLENÁRIO:
5. Tendo sido a MANA a vencedora da licitação (Contrato 250.2.078/01-8), a planilha e o demonstrativo de formação de preços apresentados por ela na licitação (fls. 46/49, anexo 1) vinculavam a empresa durante a execução do contrato. Não poderia a empresa vencer o certame declarando certos níveis de remuneração de mão-de-obra e, na execução do contrato, não observar esses níveis e ser remunerada conforme os patamares pactuados, o que significava, na prática, um aumento de sua margem de lucro em relação ao que foi declarado no demonstrativo de formação de preços.
ACÓRDÃO Nº 1597/2010 – TCU – PLENÁRIO:
27. Conforme se verifica, pela exegese dos dispositivos legais e pela consulta à jurisprudência desta Corte, a planilha de formação de preços, com a composição de todos os custos unitários da contratação, deve constar obrigatoriamente de todo processo licitatório, sendo parte integrante do edital, e do contrato administrativo que venha a ser celebrado, vinculando a execução contratual às condições nela contidas, não devendo, assim, ser entendida como peça meramente informativa.
ACÓRDÃO Nº 10604/2011 – TCU – 2ª CÂMARA:
6.7. Verificadas a exequibilidade e a legalidade da proposta, a proponente deverá, portanto, assumir toda a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações contratuais e arcar com qualquer eventual equivoco na apresentação de sua proposta global, conforme o disposto no parágrafo único do art. 22 da Instrução Normativa MP nº 2/2008, de 30/4/2008, alterada pela Instrução Normativa MP nº 3/2009, de 15/10/2009, Instrução Normativa MP nº 4/2009, de 11/10/2009, Instrução Normativa MP nº 5/2009, de 18/12/2009 e Portaria MP nº 7/2011, de 9/3/2011:
"Parágrafo único. A apresentação das propostas implica obrigatoriedade do cumprimento das disposições nelas contidas, assumindo o proponente o compromisso de executar os serviços nos seus termos, bem como fornecer todos os materiais, equipamentos, ferramentas e utensílios necessários, em quantidades e qualidades adequadas à perfeita execução contratual, promovendo, quando requerido, sua substituição."
6.8 Reza ainda o art. 23 da mencionada Instrução Normativa do então Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, o seguinte:
"Art. 23. A contratada deverá arcar com o ônus decorrente de eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos de sua proposta, devendo complementá-los, caso o previsto inicialmente em sua proposta não seja satisfatório para o atendimento ao objeto da licitação exceto quando ocorrer algum dos eventos arrolados nos incisos do § 1º do art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993."
(...)
6.11. O ônus inerente a qualquer impropriedade e omissão na planilha de custos e formação de preços deverá ser obrigatoriamente arcado pela proponente vencedora do certame, a LCM 2000 Informática Ltda., conforme entendimento fixado no Acórdão 1.791/2006-Plenário:
"39. A simples indicação de valor na planilha não tem o condão de alterar as obrigações a que a empresa está imposta, por lei, a seguir. Sendo assim, a empresa, se declarada vencedora, teria que arcar com os custos necessários para a contribuição da alíquota correta do FGTS, responsabilizando-se pelo preço anteriormente cotado. Logo, a Administração não seria prejudicada.
40. Na Decisão 577/2001-Plenário, o TCU assentou, conforme os trechos citados nas alegações da representante (fl.12), no sentido de que, em caso de impropriedade na planilha, a proposta deveria ser acatada e a empresa vencedora teria que suportar o ônus do seu erro.
ACÓRDÃO Nº 570/2013 – TCU – PLENÁRIO:
27. A previsão de preço em valor inferior não enseja revisão do contrato. Em casos como esse, assume-se que a licitante tenha acesso privilegiado ao item específico do contrato que se pretende firmar. Tanto é assim que, no edital em tela, em seu item 8.4 (peça 1, p. 10), parte final, está discriminado que, quanto a erros, equívocos e omissões na cotação de preço, não cabe à proponente "em caso de erro para menos, eximir-se do fornecimento do objeto da presente licitação". Mais uma vez, assim, não se infere inutilidade do certame.
Como se observa dos trechos das decisões acima, à empresa vencedora da licitação e, posteriormente, contratada cabe o ônus decorrente de eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos de sua proposta, nos termos do art. 23, da Instrução Normativa nº 02/2008, do MPOG, que dispõe sobre regras e diretrizes para a contratação de serviços, continuados ou não.
III – Conclusão
O instituto da repactuação, portanto, viabiliza, à empresa, o direito de ter os valores do contrato corrigidos em função de defasagens de preços provocadas pela inflação. É aplicável, em especial, nos casos de serviços contínuos com dedicação exclusiva de mão de obra, a partir da variação efetiva dos custos do contrato, geralmente, em decorrência de novo acordo ou convenção coletiva de trabalho.
Conforme definido no regramento que disciplina essa espécie de reajuste, devem ser mantidas as condições iniciais da proposta do contrato, admitindo-se alteração, tão somente, para a inserção de novos benefícios que, posteriormente, se tornaram “obrigatórios por força de instrumento legal, sentença normativa, acordo coletivo ou convenção coletiva”.
Ainda, a repactuação não se presta a corrigir erros ou equívocos cometidos pelo particular, quando da elaboração de sua planilha de formação de preços original. Mesmo nas hipóteses em que as falhas estejam adstritas a preços previstos a menor em relação a deveres de cunho legal, cabe à contratada, no caso de terceirização, cumprir com as obrigações laborais perante seus funcionários, sem que tais custos venham a ser repassados à Administração, modificando as condições inicialmente previstas e onerando o valor global do contrato.
IV – Referências Bibliográficas
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei das Licitações e Contratos Administrativos. 12ª Ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 732.
[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei das Licitações e Contratos Administrativos. 12ª Ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 732.
Procurador Federal. Procurador-Chefe da Procuradoria Federal junto à Universidade Federal do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Marcelo Morais. O instituto da repactuação e os limites para alteração dos termos da proposta original do contrato Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 dez 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37815/o-instituto-da-repactuacao-e-os-limites-para-alteracao-dos-termos-da-proposta-original-do-contrato. Acesso em: 23 dez 2024.
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