SUMÁRIO: 1. Considerações iniciais. 2. Mecanismos de revisão e reajuste de tarifas. 2.1. Reajuste tarifário. 2.2. Revisão tarifária. 3. A necessidade de pactuação do VU-M para se proceder ao reajuste tarifário das chamadas fixo-móveis e a impossibilidade de a Anatel adequar o pedido da concessionária. 4. Considerações finais. 5. Bibliografia.
RESUMO: O presente trabalho, no contexto da importância do controle de tarifas como forma de garantir acessibilidade aos serviços públicos e sua própria prestação adequada, busca traçar os parâmetros sobre os mecanismos de revisão e reajuste tarifários no setor de telecomunicações. Serão abordados os casos de revisão tarifária, em favor da concessionária ou dos usuários, instituto vinculado a questões pontuais, ou seja, ligado a evento único, bem como a forma como se procede ao reajuste das tarifas, instituto, por outro lado, vinculado a questões ordinárias de eficiência e mercado.
PALAVRAS-CHAVE: Direito administrativo – Serviços públicos – Setor de telecomunicações – Tarifas – Reajuste – Revisão.
Os serviços públicos devem ser prestados com adequação, expressão que abrange todos os elementos ligados à sua qualidade e acessibilidade. A Lei nº 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, aduz que o serviço adequado é aquele prestado com regularidade, continuidade, eficiência, segurança, generalidade, cortesia e a tarifas módicas. Veja-se seu art. 6º, in verbis:
Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.
§ 2º A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.
Um desses elementos essenciais à adequação do serviço diz respeito à modicidade tarifária, como se viu. De fato, o valor da tarifa é indissociável à acessibilidade que se pretende atribuir ao serviço público. De nada adianta massificar ou universalizar o serviço se o preço não foi acessível às pessoas, ou seja, se as tarifas não forem módicas.
Registra-se que a modicidade tarifária configura conceito variável no tempo e no espaço, a depender da população atingida pela oferta dos serviços públicos. Um mesmo valor pode assegurar a modicidade tarifária para uma comunidade de alto poder aquisitivo e, simultaneamente, representar forte barreira à acessibilidade de uma comunidade de áreas periféricas de baixo poder aquisitivo.
Do ponto de vista econômico, em que muitas situações são encaradas basicamente sob a óticas de uma análise de custo-benefício, o valor da tarifa deve ser devidamente controlado pelo Poder Público. Deve consubstanciar valor que possibilite o desenvolvimento adequado do serviço e simultaneamente permita a contratação por parte da população. Nessa esteira, chama-se atenção para o fato de que a questão tarifária, como se vê, não está atrelada apenas ao respectivo setor da economia, mas, numa visão holística, a todos os aspectos do país e do mundo, no contexto da forte globalização do mundo conectado. De fato, os rumos da economia mundial influenciam no poder de compra da população, tornando a acessibilidade volátil, sobretudo em economias periféricas e instáveis.
A título exemplificativo da importância da tarifa na regulação de um setor tarifado, colacionam-se as lições de Gustavo Kaercher Loureiro[1] sobre a política tarifária do setor de energia elétrica:
A política tarifaria sempre foi o ponto mais sensível da regulação da indústria ao longo de toda a sua vida e por esta época o valor fixado em contrato era lei entre as partes. E os critérios pelos quais era construído não guardavam, declaradamente, relação direta com o custo do serviço, de modo que não se pautavam por um equilíbrio econômico-financeiro entre “entradas e saídas” ou mesmo por qualquer diretriz valorativa, como “justa remuneração”, “modicidade” etc. A variação dos valores, se pactuada, era realizada pela própria concessionaria e atendia mais do que ao serviço, ao câmbio (revisões constantes), ou as circunstancias mais ou menos aleatórias, eleitas pelas partes e aferíveis de tempos em tempos (revisões periódicas). Com efeito, preponderava o sistema da “clausula- ouro”, isto e, vinculação do valor do serviço a moeda estrangeira que importava em mecanismos de revisão/reajuste de tarifas determinadas pelas oscilações cambiais.
Deve-se destacar, ainda, nestas linhas introdutórias, que nem todos os setores regulados são submetidos à tarifação de valores. No setor de telecomunicações, por exemplo, existem três níveis legais de política de valores: (i) os serviços de telecomunicações prestados no regime privado, como a telefonia e a banda larga móveis (Serviço Móvel Pessoal – SMP) e a banda larga fixa (Serviço de Comunicação Multimídia – SCM), são remunerados pelo consumidor por meio de preços – e não tarifas – livremente estabelecidos pelas prestadoras; (ii) os serviços de telecomunicações prestados no regime público, atualmente apenas a telefonia fixa (Serviço telefônico Fixo Comutado – STFC), são remunerados pelo consumidor por meio de tarifas fixadas pelo Poder Público, in casu, pela Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel; e (iii) os serviços de telecomunicações prestados no regime público podem ser submetidos ao regime de liberdade tarifária, se existir ampla e efetiva competição entre as prestadoras do serviço e considerados os interesses dos usuários, o que ocorreu com a telefonia fixa na modalidade Longa Distância Internacional – LDI[2].
A questão das tarifas, então, no setor de telecomunicações, só tem aplicabilidade, atualmente, ao STFC nas modalidades Local e Longa Distância Nacional – LDN. Embora a Lei nº 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações – LGT) não faça uso da expressão “modicidade tarifária”, como a Lei nº 8.987/95 – legislação, aliás, inaplicável ao setor de telecomunicações, consoante disposição expressa contida no 210 da LGT –, ela também consagra, na mesma linha, a razoabilidade dos valores. O art. 2º, inciso I, da LGT, dispõe ser dever do Poder Público garantir, a toda a população, o acesso às telecomunicações, a tarifas e preços razoáveis, em condições adequadas. Na verdade, o contrato de concessão é que utiliza a expressão “modicidade tarifária”, dispondo configurar princípio caracterizado pelo esforço da concessionária em praticar tarifas inferiores às fixadas pela Anatel.
Nesse contexto é que se pretende traçar um delineamento acerca dos mecanismos de revisão e reajuste tarifário no setor de telecomunicações, diferenciando os institutos segundo os regramento aplicáveis.
O reajuste tarifário, no setor de telecomunicações, se apresenta como mecanismo ordinário de alteração nos valores cobrados dos usuários, enquanto que a revisão se afigura como instituto basicamente extraordinário de alteração desses valores. Veja-se, a respeito, o art. 108 da LGT, que trata dos mecanismos para reajuste e revisão de tarifas:
Art. 108. Os mecanismos para reajuste e revisão das tarifas serão previstos nos contratos de concessão, observando-se, no que couber, a legislação específica.
§ 1° A redução ou o desconto de tarifas não ensejará revisão tarifária.
§ 2° Serão compartilhados com os usuários, nos termos regulados pela Agência, os ganhos econômicos decorrentes da modernização, expansão ou racionalização dos serviços, bem como de novas receitas alternativas.
§ 3° Serão transferidos integralmente aos usuários os ganhos econômicos que não decorram diretamente da eficiência empresarial, em casos como os de diminuição de tributos ou encargos legais e de novas regras sobre os serviços.
§ 4º A oneração causada por novas regras sobre os serviços, pela álea econômica extraordinária, bem como pelo aumento dos encargos legais ou tributos, salvo o imposto sobre a renda, implicará a revisão do contrato.
O reajuste tarifário no setor de telecomunicações ocorre com base em fórmula que leva em conta índices de inflação do setor e as determinações de compartilhamento com os usuários dos ganhos econômicos decorrentes de modernização, expansão ou racionalização dos serviços, bem como de novas receitas alternativas. Como se vê, ganhos econômicos relacionados a questões mercadológicas, associadas ou não às práticas empresariais, ou a questões empresariais, associadas ou não às questões mercadológicas, devem ser compartilhados com os usuários.
Há, portanto, quatro grandes espécies de ganhos econômicos que demandam compartilhamento com os usuários, nos termos do §2º do art. 108 da LGT, a saber: (i) decorrentes de modernização do serviço, o que inclui, por exemplo, a redução de custos advindos do avanço tecnológico. Aqui, além de a tecnologia estar disponível no mercado, por fatores muitas vezes alheios à conduta da concessionária, é preciso que ela a incorpore às suas rotinas; (ii) decorrentes da expansão do serviço, o que inclui, por exemplo, a redução de custos advindas de aumento da demanda, que pode ser originada por estímulo da própria concessionária ou por fatores externos, como diminuição da pobreza, crescimento da economia, etc. Nesse caso, além da expansão do serviço, não atribuível a fator único, ressalte-se, requer-se a capacidade da concessionária de absorver a crescente demanda; (iii) decorrentes da racionalização do serviço, em que a concessionária eleva os graus de organização e eficiência empresariais de modo a auferir mais ganhos econômicos; e (iv) decorrentes de novas receitas alternativas, exploradas economicamente pela concessionária dada a conjuntura que se apresenta. Aqui os ganhos econômicos advêm da capacidade empresarial de viabilizar novas receitas, o que, em última instância, se confunde com a própria racionalização. É o caso, por exemplo, das exploração econômica de propagandas em telefones de uso público, os chamados TUPs.
Como se vê, realmente os ganhos econômicos decorrentes de questões mais intrínsecas ao mercado ou mais intrínsecas à eficiência empresarial devem ser compartilhados com os usuários, por expressa disposição legal. E isso é feito por meio do chamado Fator de Transferência X (simplesmente “Fator X”), instrumento que capta esses ganhos econômicos e promove o compartilhamento na fórmula do reajuste tarifário.
Ao dispor que “serão compartilhados com os usuários, nos termos regulados pela Agência, os ganhos econômicos decorrentes da modernização, expansão ou racionalização dos serviços, bem como de novas receitas alternativas”, o §2º do art. 108 da LGT determinou à Anatel que regulasse a forma como tais ganhos econômicos seriam captados. Daí que foi aprovada a Norma da Metodologia para Cálculo do Fator de Transferência “X”, aplicado nos reajustes de tarifas do Serviço Telefônico Fixo Comutado, destinado ao uso do público em geral – STFC.
Por meio da metodologia aprovada, a Anatel capta essas questões de eficiência e de mercado e calcula os ganhos econômicos que precisam ser compartilhados com os usuários (decorrentes da modernização, expansão ou racionalização dos serviços, bem como de novas receitas alternativas), resultando num valor de Fator X, que se traduz em redutor no cálculo do reajuste tarifário.
Como visto, os mecanismos de revisão e reajuste tarifários são estabelecidos no próprio contrato de concessão, observando, no que couber, a legislação específica. O contrato, por sua vez, estabelece fórmula de reajuste tarifário que leva em conta basicamente o índice de inflação do setor (Índice dos Serviços de Telecomunicações – IST) e o Fator X. A tarifa, então, é reajustada pelo IST, aplicando-se, na sequência, o redutor materializado pelo Fator X, que promove o compartilhamento dos ganhos econômicos que devem ser compartilhados.
A cláusula 12.1. do contrato de concessão, ressalte-se, além de dispor que o reajuste tarifário pode ocorrer por iniciativa da Anatel ou da concessionária, aduz que ele será realizado a cada intervalo não inferior a doze meses. Veja-se cláusula de contrato de concessão do STFC na modalidade Local:
Cláusula 12.1. A cada intervalo não inferior a 12 (doze) meses, por iniciativa da Anatel ou da Concessionária, observadas as regras da legislação econômica vigente, as tarifas constantes do Plano Básico do Serviço Local - Anexo nº 03, poderão ser reajustadas mediante a aplicação das seguintes fórmulas: (...)
Sobre esse dispositivo, vale destacar, primeiramente, que ele aduz que as tarifas “poderão ser reajustadas”, e não que “deverão ser reajustadas”. Caso o órgão regulador não promova o reajuste por iniciativa própria, cabe à concessionária solicitar. E ainda que solicite, o reajuste só será deferido se cumprida as exigências legais, regulamentares e contratuais. Mais adiante, para fins de exemplificação, será apresentada hipótese de indeferimento de reajuste das tarifas relativas às chamadas fixo-móvel.
O contrato de concessão, portanto, não impõe o reajuste tarifário em intervalos não inferiores a doze meses. Na verdade, como se vê, o contrato expressamente consigna que estes reajustes poderão ser realizados, estando, por evidente, na dependência de uma série de fatores, em especial das regras vigentes no momento de sua apreciação.
Além disso, o contrato de concessão também não impõe que a cada período de doze meses haverá um reajuste. A cláusula afirma, na verdade, que o reajuste, quando existir, aplicado nas condições da regulamentação, não poderá ocorrer em período inferior a doze meses. Trata-se de dispositivo em benefício do consumidor e da própria economia, com o objetivo de não haver reajustes de tarifas em intervalos curtos, o que poderia gerar instabilidade nas relações consumeristas e no mercado como um todo.
Registra-se, por fim, que, ainda que o reajuste ocorra em períodos superiores a doze meses, e não em intervalos exatos de doze meses, tal situação não representa prejuízos à concessionária, uma vez que, quando da concessão do reajuste, a fórmula levará em consideração todo o período desde o último reajuste, aplicando-se o IST e o Fator X correspondentes.
essas considerações sobre o reajuste, passa-se a tratar da revisão tarifária, relacionada com acontecimentos extraordinários e pontuais, ou seja, dissociados da conjuntura ordinária do mercado e do comportamento empresarial.
De plano, o contrato de concessão, em sua cláusula 13.1, já dispõe que constitui seu pressuposto básico a preservação, em regime de ampla competição, da justa equivalência entre a prestação e a remuneração, vedado às partes[3] o enriquecimento imotivado às custas de outra parte ou dos usuários do serviço, nos termos do disposto neste Capítulo.
Por um lado, a concessionária só está obrigada a suportar prejuízos em decorrência do contrato de concessão se eles decorrerem de um dos seguintes fatores, conforme delineados no §1º da referida cláusula 13.1: (i) da sua negligência, inépcia ou omissão na exploração do serviço; (ii) dos riscos normais à atividade empresarial; (iii) da gestão ineficiente dos seus negócios, inclusive aquela caracterizada pelo pagamento de custos operacionais e administrativos incompatíveis com os parâmetros verificados no mercado; ou (iv) da sua incapacidade de aproveitar as oportunidades existentes no mercado, inclusive no atinente à expansão, ampliação e incremento da prestação do serviço objeto da concessão.
Como se vê, as hipóteses em que se admite que a concessionária sofra prejuízos em função do contrato celebrado são bastante amplas, seja por culpa sua ou por conjunturas ordinárias do mercado. É praticamente regra geral que ela suporte prejuízos decorrentes da prestação do serviço. Fará jus à recomposição da sua situação inicial de encargos e retribuições quando circunstâncias de força maior ou calamidades afetarem de forma significativa a exploração do serviço, observado sempre, como parâmetro, o reflexo destas situações nos prestadores de serviços no regime privado.
Além dessas hipóteses mais fáticas, o §4º do art. 108 da LGT dispõe que a oneração causada por novas regras sobre os serviços, pela álea econômica extraordinária, bem como pelo aumento dos encargos legais ou tributos, salvo o imposto sobre a renda, implicará a revisão do contrato.
Nesse caso, proceder-se-á à revisão tarifária em prol da concessionária, embora também se admita a utilização de outro mecanismo que, a critério da Anatel, seja considerado apto a neutralizar a situação verificada.
Além da revisão tarifária visando a evitar prejuízo à concessionária, nos casos de força maior ou calamidades, também é possível proceder-se à revisão tarifária em prol dos consumidores, a fim de evitar que a concessionária se enriqueça indevidamente. O §2º da cláusula 13.1 do contrato de concessão veda o que denomina de enriquecimento imotivado da concessionária:
§ 2º É vedado o enriquecimento imotivado da Concessionária decorrente:
I - da apropriação de ganhos econômicos não advindos diretamente da sua eficiência empresarial, em especial quando decorrentes da edição de novas regras sobre o serviço; e
II - do repasse de receitas a terceiros, em detrimento da aplicação do princípio da modicidade tarifária, conforme estabelecido no § 7º da Cláusula 6.1.
Nesse caso, sempre que
Nesse sentido é que a LGT dispõe, no §3º do art. 108, que serão transferidos integralmente aos usuários os ganhos econômicos que não decorram diretamente da eficiência empresarial, em casos como os de diminuição de tributos ou encargos legais e de novas regras sobre os serviços.
A revisão tarifária como mecanismos pontual e não ordinário de ajuste nos valores das tarifas fica clara quando o §2º da cláusula 13.2. do contrato de concessão aduz que a providência adotada para neutralizar uma distorção será única, completa e final relativamente ao evento que lhe deu origem. Ou seja, a revisão é vinculada a evento específico, e não à conjuntura do mercado e da conduta empresarial, associada ao reajuste tarifário.
Como se vê, a revisão tarifária pode ocorrer em favor da concessionária ou dos usuários, a depender do teor do evento que lhe dá origem. Nesse sentido, vale colacionar a cláusula 13.3. do contrato de concessão, que apresenta hipóteses de revisão tarifária decorrentes de atos praticados pelo Estado, como modificações contratuais, alterações legislativas, fato do príncipe, etc:
Cláusula 13.3. Independentemente do disposto na Cláusula 13.1, caberá revisão das tarifas integrantes do Plano Básico do Serviço Local em favor da Concessionária ou dos usuários, nos termos do art. 108 da Lei nº 9.472, de 1997, quando verificada uma das seguintes situações específicas:
I - modificação unilateral deste Contrato imposta pela Anatel, que importe variação expressiva de custos ou de receitas, para mais ou para menos, de modo que a elevação ou redução de tarifas seja imposta pela necessidade de evitar o enriquecimento imotivado de qualquer das partes;
II - alteração na ordem tributária posterior à assinatura deste Contrato que implique aumento ou redução da lucratividade potencial da Concessionária;
III - ocorrências supervenientes, decorrentes de fato do príncipe ou fato da Administração que resultem, comprovadamente, em alteração dos custos da Concessionária;
IV - alteração legislativa de caráter específico, que tenha impacto direto sobre as receitas da Concessionária de modo a afetar a continuidade ou a qualidade do serviço prestado; ou
V - alteração legislativa que acarrete benefício à Concessionária, inclusive a que concede ou suprime isenção, redução, desconto ou qualquer outro privilégio tributário ou tarifário, consoante do previsto no § 3º do art. 108 da Lei nº 9.472, de 1997.
§ 1º Não importará na revisão de tarifas o prejuízo ou a redução de ganhos da Concessionária decorrente da livre exploração do serviço em condições de competição ou da gestão ineficiente dos seus negócios.
§ 2º Não será aplicável a hipótese de revisão prevista no inciso II do caput desta Cláusula quando a alteração na ordem tributária implicar criação, supressão, elevação ou redução em impostos incidentes sobre a renda ou o lucro da Concessionária, como o Imposto sobre a Renda, que não impliquem oneração administrativa ou operacional.
§ 3º Não caberá revisão de tarifas nas hipóteses previstas nesta Cláusula quando os eventos ensejadores da revisão já estiverem cobertos pelo Plano de Seguros previsto na Cláusula 24.1.
§ 4º As contribuições da Concessionária ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações e ao Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações não ensejarão revisão das tarifas.
Por fim, deve-se consignar que não se procederá à revisão tarifária em favor da concessionária quando os impactos do evento apontado como motivador do pedido de revisão puderem ser neutralizados pela eficiente exploração do serviço, pela expansão do mercado ou pela geração de receitas alternativas ou complementares associadas ao objeto do contrato de concessão.
Delineados os meandros sobre os mecanismos de revisão e reajuste tarifários, passa-se a apresentar, para fins exemplificativos, hipótese de indeferimento de pedido de reajuste tarifário.
Pois bem.
A tarifa, comumente chamada de Valor de Comunicação (VC), é a designação genérica do valor de uma chamada com 1 (um) minuto de duração. No caso das chamadas fixo-móvel (aquelas originadas no STFC e destinadas aos serviços móveis, como SMP e Serviço Móvel Especializado – SME), ela possui os seguintes componentes: (i) custos; (ii) Valor de Uso da Rede Móvel (VU-M); e (iii) margem de lucro da concessionária.
A margem de lucro da concessionária, portanto, está atrelada ao valor do VU-M que ela deve pagar às prestadoras móveis e, obviamente, ao valor da tarifa (VC).
Por tal razão é que a regulamentação[4] exige, como condição para que o pedido de reajuste tarifário seja apreciado, que as concessionárias pactuem com as prestadoras móveis o referido valor do VU-M. Somente após tal pactuação é que será possível apreciação, pela Anatel, do pedido de reajuste.
O que deve ficar claro é que se a concessionária, por exemplo, apresenta um pedido de reajuste de X% após ter pactuado o VU-M em Y reais, o pedido dela traz embutido um outro pedido, de suma importância, qual seja, o pedido para que sua margem de lucro seja Z reais.
Em um exemplo hipotético, quando a concessionária pede 10% de reajuste em uma tarifa de 100 unidades, na verdade ela está pedindo que a tarifa seja de 110 unidades e, principalmente, se tiver pactuado o VU-M em, por exemplo, 60 unidades, está pedindo que sua margem de lucro seja de 50 unidades. Esse é o pedido principal contido num pedido de reajuste de X%.
Em suma, o pedido de reajuste tarifário representa um pedido a uma determinada margem de lucro em face do valor do VU-M anteriormente pactuado com as prestadoras móveis. No caso, portanto, de a concessionária pedir X% de reajuste e a Anatel, aplicando os critérios regulamentares para apreciar o pedido, entender que o reajuste deve ser em percentual diferente de X, ou seja, diferente do percentual apontado no pedido de reajuste, não se apresenta possível à Anatel, ela própria, adequar o pedido aos critérios regulamentares para fins de conceder reajuste diferente do pedido.
É que, se assim procedesse, a Anatel estaria, ela própria, definindo a margem de lucro da concessionária e, consequentemente, interferindo, em caráter primário (e não subsidiário, como determina a LGT), na pactuação do VU-M, o que não é possível.
A LGT, em seu art. 153, deixa claro que as condições para a interconexão de redes serão objeto de livre negociação entre os interessados, mediante acordo. Apenas no caso de não existir acordo é que haverá atuação da Anatel, que deverá arbitrar as condições para a interconexão, nos termos do § 2º do referido art. 153, que ora é colacionado:
Art. 153. As condições para a interconexão de redes serão objeto de livre negociação entre os interessados, mediante acordo, observado o disposto nesta Lei e nos termos da regulamentação.
§ 1° O acordo será formalizado por contrato, cuja eficácia dependerá de homologação pela Agência, arquivando-se uma de suas vias na Biblioteca para consulta por qualquer interessado.
§ 2° Não havendo acordo entre os interessados, a Agência, por provocação de um deles, arbitrará as condições para a interconexão.
A negociação para que se chegue a um acordo sobre o VU-M, que deverá ser formalizado por contrato entre a concessionária e a prestadora móvel, é justamente o momento em que se define: (i) quanto a prestadora móvel vai receber pelo uso de sua rede; e (ii) quanto a concessionária, com base nesse VU-M que terá que pagar, vai pleitear de margem de lucro perante a Anatel. Como dito, tal pedido de margem de lucro está contido no pedido de reajuste tarifário de X%.
Se a Anatel, por exemplo, ao apreciar o pedido de reajuste, identificar que este será em percentual inferior aos X% solicitados, e assim decidir ela própria, fatalmente estará interferindo, em caráter primário, no pacto do VU-M. Em outras palavras, se o reajuste for inferior ao solicitado, ou seja, se a margem de lucro da concessionária for menor do que a que ela pediu (margem de lucro esta considerada por ela para definir, mediante acordo com a prestadora móvel, o VU-M), estar-se-á impondo à concessionária um VU-M num cenário diferente daquele em que houve a negociação. Nesse caso, a concessionária poderia se sentir prejudicada.
O mesmo raciocínio se aplica na hipótese de a Anatel conceder, ela própria, um reajuste superior ao que foi solicitado pela concessionária. Estar-se-á impondo à prestadora móvel um VU-M num cenário diferente daquele em que houve a respectiva negociação para a determinação de seu valor. Nesse caso, a prestadora móvel poderia se sentir prejudicada.
Em suma, o fato é que, se se verificar que o pedido de reajuste não atende aos critérios regulamentares, não pode a Agência, ela própria, ajustá-lo aos referidos critérios se isso puder vir a impactar nos valores de VU-M pactuados entre as empresas ou na margem de lucro da concessionária. Como dito, estaria a Anatel interferindo de forma primária, e não subsidiária, como determina o art. 153, § 2º, da LGT, nas condições para a interconexão. O pedido de reajuste, então, deve ser indeferido, possibilitando-se à concessionária que renegocie o VU-M e, na sequência, requeira novamente o reajuste tarifário.
A modicidade tarifária se afigura como um desses elementos essenciais à prestação adequada do serviço. De fato, o valor da tarifa é indispensável à acessibilidade que se pretende atribuir ao serviço público. Nesse contexto se situa a importância dos mecanismos de revisão e reajuste de tarifas.
O reajuste tarifário, no setor de telecomunicações, se apresenta como mecanismo ordinário de alteração nos valores cobrados dos usuários, enquanto que a revisão se afigura como instituto basicamente extraordinário de alteração desses valores.
Por meio de metodologia aprovada, a Anatel capta as questões de eficiência e de mercado e calcula os ganhos econômicos que precisam ser compartilhados com os usuários (decorrentes da modernização, expansão ou racionalização dos serviços, bem como de novas receitas alternativas), resultando num valor de Fator X, que se traduz em redutor no cálculo do reajuste tarifário. A tarifa, então, é reajustada pelo IST, aplicando-se, na sequência, o redutor materializado pelo Fator X.
A revisão tarifária, por sua vez, encontra-se relacionada com acontecimentos extraordinários e pontuais, ou seja, dissociados da conjuntura ordinária do mercado e do comportamento empresaria. Tanto que a providência adotada para neutralizar os impactos de um evento motivador de uma revisão será única, completa e final relativamente a esse evento.
As hipóteses em que se admite que a concessionária sofra prejuízos em função do contrato celebrado são bastante amplas, seja por culpa sua ou por conjunturas ordinárias do mercado. É praticamente regra geral que ela suporte prejuízos decorrentes da prestação do serviço. Fará jus à recomposição da sua situação inicial de encargos e retribuições quando circunstâncias de força maior ou calamidades afetarem de forma significativa a exploração do serviço.
Além da revisão tarifária visando a evitar prejuízo à concessionária, nos casos de força maior ou calamidades, também é possível proceder-se à revisão tarifária em prol dos consumidores, a fim de evitar que a concessionária se enriqueça indevidamente.
Como se vê, a revisão tarifária pode ocorrer em favor da concessionária ou dos usuários, a depender do teor do evento que lhe dá origem. Por fim, deve-se consignar que não se procederá à revisão tarifária em favor da concessionária quando os impactos do evento apontado como motivador do pedido de revisão puderem ser neutralizados pela eficiente exploração do serviço, pela expansão do mercado ou pela geração de receitas alternativas ou complementares associadas ao objeto do contrato de concessão.
5. Bibliografia
ARAGÃO, Alexandre dos Santos de. Direito dos Serviços Públicos, Forense, 2ª ed.;
CORDOVIL, Leonor Augusta Giovine; A Intervenção Estatal nas Telecomunicações – A Visão do Direito Econômico. Belo Horizonte: Fórum, 2005;
ESCOBAR, João Carlos Mariense. Serviços de Telecomunicações – Aspectos Jurídicos e Regulatórios. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005;
MACHADO, Agapito; e Machado Junior, Agapito. Aspectos Cíveis e Criminais na Radiodifusão e Telecomunicações; 2004, Universidade de Fortaleza – UNIFOR;
MELLO, Celso Antônio Bandeira de; Curso de Direito Administrativo, 19ª ed., São Paulo: Malheiros, 2005;
MORAES, Alexandre de; Direito Constitucional, 13ª ed., São Paulo: Atlas, 2003;
PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo, 16ª ed., São Paulo: Atltas, 2003;
RAMIRES, Eduardo Augusto de Oliveira. Direito das Telecomunicações – A Regulação para a Competição. Belo Horizonte: Fórum, 2005;
SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação da Atividade Econômica. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
[1] LOUREIRO, Gustavo Kaercher. Direito Regulatório – Setor de Energia Elétrica.
[2] A referida liberdade tarifária das chamadas LDI do STFC foi materializada por meio da Norma para Implantação e Acompanhamento de Liberdade Tarifária no Serviço Telefônico Fixo Comutado destinado ao Uso Público em Geral, Modalidade Longa Distância Internacional, aprovada pela Resolução nº 573/2011
[3] As partes, aqui, são a Anatel, de um lado, e a concessionária, de outro.
[4] Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Móvel Pessoal – SMP, aprovado pela Resolução nº 438/2006: (...) Art. 10. Os valores reajustados de VC-1, VC-2 ou VC-3, nos Contratos de Concessão de Prestadora de STFC, somente serão homologados pela Agência após o estabelecimento do novo valor de VU-M, a vigorar após o reajuste, pactuado entre as partes ou fixado, cautelarmente ou não, em processo de resolução de conflitos.
Procurador Federal, pós-graduado em Regulação de Telecomunicações e pós-graduando em Direito Administrativo e em Direito Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOARES, Paulo Firmeza. Mecanismos de revisão e reajuste de tarifas no setor de telecomunicações Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 dez 2013, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37904/mecanismos-de-revisao-e-reajuste-de-tarifas-no-setor-de-telecomunicacoes. Acesso em: 23 dez 2024.
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