I - INTRODUÇÃO
Advindo de reivindicações e preocupações da sociedade quanto ao funcionamento dos órgãos públicos e, principalmente, do Poder Judiciário, o poder constituinte reformador, introduziu à Carta Magna, através da Emenda Constitucional nº 45/2004, o inciso LXXVIII, ao artigo 5º, assegurando à todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
De fato, a inserção do dispositivo antes mencionado ao texto constitucional buscou consagrar expressamente o princípio constitucional da celeridade ou brevidade processual, que, não era expressamente previsto em nível constitucional, embora previsto expressamente em algumas normas pátrias, como por exemplo na Lei nº 9.099/95, que em seu artigo 2º prevê que, nos juizados especiais, o processo se orientará pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.
O princípio constitucional à razoável duração do processo, inserido assim no rol dos direitos e garantias fundamentais, trata-se de um direito subjetivo, constituindo em garantia essencial ao ser humano posto que o processo é o instrumento que viabiliza o exercício dos demais direitos previstos constitucionalmente.
Destarte, dentro da premissa de tratar-se de direito fundamental, demonstrar-se-á a duração razoável do processo como meio de se efetivar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, do devido processo legal e da proporcionalidade.
Outrossim, o presente texto buscará, ainda, analisar o princípio da duração razoável do processo sob o aspecto do direito constitucional, bem como especificar os titulares e destinatários.
II - A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO COMO EFETIVIDADE AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, AO DEVIDO PROCESSUAL LEGAL E A PROPORCIONALIDADE.
Através da Emenda Constitucional nº 45/04, o poder constituinte reformador inseriu no rol dos direitos e garantias fundamentais, o direito público subjetivo à celeridade processual, ao introduzir o inciso LXXVIII ao artigo 5º à Constituição Federal, estabelecendo que:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
Se vislumbra, assim, que a Emenda Constitucional nº 45/2004, trouxe inegável avanço ao inserir, de forma expressa, no rol pétreo dos direitos e garantias fundamentais, o direito público subjetivo à razoável duração do processo, embora já previsto em normas infraconstitucionais, como por exemplo no artigo 2º da Lei nº 9.099/95, ao estabelecer que:
Art. 2º. O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.
O princípio da razoável duração do processo busca, assim, a dar efetividade a vários princípios previstos constitucionalmente, dentre os quais se destacam a dignidade da pessoa, o devido processual e a proporcionalidade.
Dentre os fundamentos da República Federativa do Brasil, encontra-se o princípio da dignidade da pessoa humana.
Previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, a dignidade da pessoa humana se realiza na existência de um mínimo vital ao ser humano, afirmando ser vedado a utilização do ser humano como meio ou instrumento, sendo um fim em si mesmo, dotado de autonomia, sendo o acesso à justiça o elemento instrumental ao referido princípio posto que através dele é que o ser humano pode exigir e efetivar os seus direitos.
Destarte, há de se vislumbrar que o acesso à justiça não constitui apenas na possibilidade de ingresso no Judiciário, mas também a garantia de um processo célere com respeito aos princípios processuais.
O doutrinador OLIVEIRA (2006, p. 103), ao discorrer sobre o tema, assim dispõe:
A razoável duração do processo insere-se como um acréscimo ao princípio do acesso à justiça, ampliando-o. Denota, a partir da recém aprovada emenda, a preocupação do legislador constitucional com a temática do tempo na prestação da tutela jurisdicional, nos Estados que se constituem em Estado Democrático de Direito. Tem como fundamento o pleno exercício da cidadania e o respeito à dignidade da pessoa humana, atributos que consolidam a compreensão dos princípios inerentes aos Direitos Humanos.
Outrossim, o princípio do devido processual legal destina-se a garantir a realização de julgamento por meio de um procedimento adequado e justo, bem como é utilizado como meio de controle da razoabilidade dos atos estatais.
A garantia do devido processo legal está previsto constitucionalmente no artigo 5º, inciso LIV, da Carta Magna, ao estabelecer que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
Através do devido processo legal, é garantido às partes o tratamento igualitário, observando-se determinadas garantias inerentes ao processo, como por exemplo o contraditório, ampla defesa e a possibilidade de interposição de recursos.
Deve-se, assim, entender que a garantia à duração razoável do processo está inserida na cláusula do devido processo legal, posto que através da referida cláusula deve-se buscar uma solução rápida à solução ao conflito de interesses.
Acerca do assunto, ZARIF (2006, p. 140) assim dispõe:
uma das garantias intrínsecas ao devido processo legal é o de que os processos devem ser céleres, buscando uma rápida solução para o conflito de interesses levado ao Judiciário, sem que se deixe de lado o respeito a outros princípios também decorrentes do due process, como o da ampla defesa e do contraditório
Há de se destacar, ainda, que a duração razoável do processo está intrinsecamente correlacionada ao princípio da proporcionalidade, este entendido como instrumento indispensável ao aplicador das normais, estabelecendo limites e dirimindo conflitos diante dos casos concretos.
Através da proporcionalidade se fazem ponderações e harmonizações aos bens constitucionalmente tutelados, em vista das peculiaridades de cada caso concreto.
A proporcionalidade exige adequação ao meio ou instrumento utilizado para se alcançar a finalidade desejada, a necessidade, entendida como a exigência da adoção do meio mais suave dentre os previstos ao alcance do resultado almejado, bem como a formulação de um juízo de sopesamento entre o meio adotado e a limitação sofrida pelo individuo, ou seja, exige que a relação meio e fim seja proporcional.
A proporcionalidade terá, desta forma, suma importância ao caso concreto para verificação da razoável duração do processo, devendo-se sopesar os meios e os fins a serem alcançados em relação aos procedimentos pleiteados e às decisões tomadas pelo julgador.
III - DESTINATÁRIOS DO INCISO LXXVIII DO ARTIGO 5º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Tratando-se de norma de aplicação imediata, nos termos do §1º do artigo 5º da Constituição Federal, se vislumbra que da simples leitura do inciso LXXVIII do artigo 5º da Carta Magna que os titulares do direito à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação são aqueles que sejam partes, intervenientes ou terceiros interessados em qualquer processo, seja judicial ou administrativo, podendo ser pessoas físicas ou jurídicas, o Ministério Público e até mesmo próprio Estado.
Acerca do assunto, GAJARDONI (2006, p. 158), esclarece:
Na dimensão subjetiva, é certo afirmar que a garantia da tutela jurisdicional tempestiva concede a todo e qualquer jurisdicionado o direito de ver seu processo se desenvolver em tempo razoável, assegurado ainda, os meios necessários para que tal desiderato seja alcançado. Além de medidas correicionais contra os violadores da garantia (art. 198 do CPC), já tive oportunidade de sustentar o cabimento de mandado de segurança contra a letárgica omissão institucional, sem prejuízo, por óbvio, de eventual reparação a ser obtida contra o Estado pelo mau funcionamento de seu sistema judicial.
Esclareça-se, por oportuno, que o texto constitucional ao se referir às instancias judicial e administrativa, indica que o processo é atinente ao modo de decisão que concretiza e individualiza, no caso concreto, as normas genéricas e abstratas.
Outrossim, os principais destinatários do princípio insculpido no inciso LXXVIII do artigo 5º da Carta Magna e dos meios que garantam a celeridade de sua tramitação são os poderes públicos, seja o Legislativo, Judiciário ou Executivo, visto que compete à eles a efetivação da norma.
No tocante ao Poder Legislativo, tendo como função precípua a implementação do direito fundamental garantido na Constituição Federal, ao criar normas especificas com o fito de dar mais celeridade e principalmente efetividade, sem distanciar-se da segurança jurídica.
Assim, compete ao Poder Legislativo, por exemplo, proceder as alterações nas leis processuais, principalmente no Código de Processo Civil, visando acelerar os processos e tornar mais efetiva a tutela jurisdicional.
Quanto ao Poder Executivo, compete alocar mais verbas e a reestruturação funcional ao Poder Judiciário, posto que no âmbito deste é onde se torna mais necessária a efetividade da razoável duração do processual, como bem discorre ALVIM (2005, p. 189):
Aa agilidade do nosso Poder Judiciário, com vistas a adequar-se a uma economia mais moderna e com o fito de atender às necessidades desta e às expectativas sociais que existem, depende, principalmente, de mais verbas e de uma reestruturação funcional, especialmente à luz de organização racional do trabalho.
Outrossim, o Poder Judiciário implementará o inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal através de decisões que garantam a celeridade na tramitação do processo para a duração razoável do processo, isto porque o processo deve caminhar sem dilações indevidas, respeitando sempre as garantias constitucionais das partes, devendo, entretanto, o magistrado corrigir atos meramente protelatórios, para que chegue ao final em menor tempo possível.
A doutrinadora PIERI (2005, p. 189), esclarece que
O magistrado deverá agir imediatamente, sem ser omisso, e interpretar a lei, adaptando o procedimento quando viável; fiscalizar, inclusive, o comportamento das partes, evitando-se conduta protelatória do andamento processual, aplicando as sanções já previstas em lei; justificar a eventual demora, ou descumprimento dos prazos legais, para fazer valer como verdadeiro o processo civil brasileiro.
Destaque-se, ainda, que a doutrina e os profissionais do direito, devem ser tratados como destinatários do princípio da duração razoável do processo e dos meios que assegurem a celeridade da sua tramitação.
Através da doutrina é que se extraem os princípios magnos que norteiam o ordenamento jurídico, buscando verificar a ilegitimidade das normas ou atos processuais que importem em obstáculo injustificável ao bom andamento do processo ou propor a criação de outras normas ou atos que garantam a celeridade processual sem descurar das demais garantias constitucionais, como por exemplo o contraditório.
Os profissionais do direito devem colaborar na aplicação do princípio, fazendo requerimentos apenas quando diante a condutas irrazoáveis e desproporcionais que apenas procrastinam o regular andamento do processo, bem como peticionando diante da verificação de se estar diante de conduta irrazoável do próprio juiz.
Deve, então, o profissional do direito, procurar soluções alternativas, como acordos ou a utilização da arbitragem ou a mediação que podem ser mais interessantes que um eventual litígio judicial.
IV - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse contexto, se vislumbra que, mesmo antes da inserção do inciso LXXVIII ao artigo 5º da Constituição Federal através da Emenda Constitucional nº 45/2004, já vigorava no sistema jurídico pátrio, o princípio da celeridade ou brevidade processual.
Ademais, inserto no rol dos direitos e garantias fundamentais, o direito público subjetivo à duração razoável do processo, seja nas instâncias judicial e administrativa, alcança as pessoas físicas ou naturais, as pessoas jurídicas ou morais, incluídos os três poderes: o Legislativo, o Judiciário e Executivo.
Assim, como direito fundamental, há a necessidade de se assegurar o direito à duração razoável do processo. As disposições constitucionais correlacionadas, bem como as legais, revelam determinações impositivas para que todos os destinatários da norma assumam suas responsabilidades no sentido de implementar condições materiais à concretização do direito à celeridade processual.
V - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVIM, ARRUDA. Manual de Direito Processual Civil, Vol 1, Parte Geral, 9ª Ed., RT, São Paulo, 2005 p. 189
GAJARDONI, FERNANDO DA FONSECA. Revista de Processo 141, ano 31, nov. de 2006, in O Princípio Constitucional da Tutela Jurisdicional sem dilações Indevidas e o Julgamento Antecipadíssimo da Lide, RT, São Paulo, 2006, p. 158
OLIVEIRA, LUIZ FLÁVIO DE. A Reforma do Poder Judiciário, Coordenador Jorge Luiz de Almeida, “A Razoável Duração do Processo na Perspectiva dos Direitos Humanos”, Millennium, Campinas, 2006, p. 103.
PIERI, SUELI APARECIDA DE. A Reforma do Poder Judiciário, Coordenação Jorge Luiz de Almeida, “Princípio da Celeridade Processual”, Millennium, Campinas, 2006, p. 109.
ZARIF, Cláudio Cintra. Da Necessidade de Repensar o Processo para que ele seja realmente efetivo. In: Processo e Constituição: Estudos em homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira. Coordenação Luiz Fux, Nelson Nery Júnior, Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 140.
Procuradora Federal em exercício na Procuradoria Federal junto à Fundação Universidade Federal do Tocantins - UFT.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, Patricia Bezerra de Medeiros. A garantia constitucional à duração razoável do processo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jan 2014, 08:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37986/a-garantia-constitucional-a-duracao-razoavel-do-processo. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
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