O presente artigo tem como finalidade discorrer sobre o poder exercido pelo Estado, com ênfase no poder de polícia – Administrativa ou Judiciária-, além de seus conceitos, diferenças, fundamentos, finalidades, atributos e limites, bem como quando os agentes públicos extrapolam os limites fixados em lei ou buscam finalidades diversas da do interesse público.
INTRODUÇÃO
O Poder, exercido por meio do Estado, baseia-se em leis, princípios,costumes e normas; criando, neste aspecto, obrigações, limitações, direitos, além de impor sanções. O Estado, porquanto, fazendo uso desta prerrogativa, promove a organização do sociedade, procurando construir e manter a ordem, a paz, bem como, garantir a isonomia e proporcionalidade, sanando conflitos aparentes de direitos e obrigações.
Este poder somente pode ser exercido na exata medida de satisfazer o interesse público, sendo balizado pela legalidade, proporcionalidade, impessoalidade, costumes e jurisprudências.
Para tanto, deve-se levar em consideração o que denota a Constituição Federal de 1988 em seu artigo primeiro, parágrafo único:
“Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
O Poder do Estado, soberano, dotado de coercibilidade, encontra como justificativa e amparo o poder jurídico, que o legitima para limitar, regrar e impor obediência e obrigações a comportamentos e condutas, além de fazer prevalecer o interesse da coletividade, possuindo prerrogativas, conferidas por lei, para se fazer valer o interesse comum sobre o particular.
Dentre os poderes, destacamos o Poder de polícia. Mas antes de tratar deste, devemos conhecer o termo polícia, bem como as formas existentes deste Poder.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
De forma geral, polícia é a atividade com o fim de certificar a segurança de bens e pessoas, sobremaneira por meio do uso da lei. O termo “polícia”, por decorrência histórica e temporal, é também aplicado para designar os órgãos, bem como os agentes públicos que têm como função precípua o exercício da citada atividade.
“Polícia designa o conjunto de instituições, fundadas pelo Estado, para que, segundo as prescrições legais e regulamentares estabelecidas, exerçam vigilância para que se mantenham a ordem pública, a moralidade, a saúde pública e se assegure o bem-estar coletivo, garantindo-se a propriedade e outros direitos individuais” (DE PLÁCIDO E SILVA).
A Atividade da polícia divide-se, principalmente, em administrativa e Judiciária, conforme os dizeres de José Afonso da Silva:
“A atividade da polícia realiza-se de vários modos, pelo que a polícia se distingue em administrativa e de segurança, esta compreende a polícia ostensiva e a polícia judiciária. A polícia administrativa tem "por objeto as limitações impostas a bens jurídicos individuais" (liberdade e propriedade). A polícia de segurança que, em sentido estrito, é a polícia ostensiva tem por objetivo a preservação da ordem pública e, pois, "as medidas preventivas que em sua prudência julga necessárias para evitar o dano ou o perigo para as pessoas". Mas, apesar de toda vigilância, não é possível evitar o crime, sendo pois necessária a existência de um sistema que apure os fatos delituosos e cuide da perseguição aos seus agentes. Esse sistema envolve as atividades de investigação, de apuração das infrações penais, a indicação de sua autoria, assim como o processo judicial pertinente à punição do agente. É aí que entra a polícia judiciária, que tem por objetivo precisamente aquelas atividades de investigação, de apuração das infrações penais e de indicação de sua autoria, a fim de fornecer os elementos necessários ao Ministério Público em sua função repressiva das condutas criminosas, por via de ação penal pública. ”
Poder de Polícia (Polícia Administrativa)
É a atribuição que a Administração tem, por meio de lei, de limitar, restringir ou condicionar o exercício de atividade particular e o uso de bens privados em favor do interesso coletivo. Considera-se que a atuação sempre nos limites legais, mediante motivação e observando-se o devido processo legal, norteado pela predominância do interesse público sobre o particular.
O poder de polícia pode ser exercido por meio de atos preventivos, fiscalizadores e repressivos.
Ex.: Edição de normas, como outorga de licenças e autorizações (atividade preventiva); inspeções e vigilância (atividade fiscalizadora); atividades materiais dotadas de autoexecutoriedade – aplicação de sanções, como apreensão de mercadorias, lavratura de uma multa de infração de trânsito, demolição de obra (atividade repressiva)
O Código Tributário Nacional expõe, em seu artigo 78:
“Art. 78. Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.
Segundo definição do ilustre Bandeira de Mello, polícia administrativa:
“É a atividade de Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coecitivamente aos particulares um dever de abstenção ('non facere') a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo”.
Polícia Judiciária
Polícia Judiciária embasa-se na atividade de promover a investigação de crimes e contravenções penais, constitui o procedimento preparatório ao processo penal, auxiliando ativamente o poder judiciário, através da coleta de provas e do esclarecimento da autoria e da materialidade do crime.
Nos dizeres de Amintas Vidal Gomes, a Polícia judiciária:
“destina-se a investigar crimes que não puderam ser prevenidos, descobri-lhes os autores e reunir provas ou indícios contra estes, no sentido de levá-los a juízo e, consequentemente, a julgamento; a prender em flagrante os infratores da lei penal; a executar os mandatos de prisão expedidos por autoridades judiciárias e a atender às requisições destas”.
Nos termos do Art. 144 (parágrafos 1° e 4°) da Constituição Federal, as atribuições de polícia judiciária são da competência da Polícia Federal e das Polícias Civis dos 27 entes federativos (Polícias Civis dos Estados e do Distrito Federal)
Art. 144. (...)
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
(...)
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
(...)
§ 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
DISTINÇÕES:
1. Incidência: Helly Lopes Meirelles “polícia administrativa incide sobre bens, direitos e atividades, ao passo que as outras (polícia judiciária e de manutenção da ordem pública) atuam sobre as pessoas, individualmente ou indiscriminadamente”.
2. Tipo de ilícito: polícia administrativa visa ao combate, exclusivamente, de ilícitos administrativos, já a Judiciária insurgem-se contra a prática de delitos penais, principalmente.
3. Atuação: administrativa atua de modo preventivo (predominantemente), repressivo; Judiciária atua de maneira repressiva (não de forma absoluta), contribuindo na formação da opinião delitiva do titular da Ação penal.
FUNDAMENTO
Decorre da Supremacia Geral do Estado.
FINALIDADE
a) Impedir ou evitar dano ao interesse coletivo causado por bens ou atividades particulares.
b) Fazer cessar ou interromper lesões ao interesse coletivo causados por particulares.
ATRIBUTOS
a) Coercibilidade: é a faculdade que a Administração tem de exercer o Poder de Polícia de forma Coativa ou Forçada. Ex.: Multa
b) Autoexecutoriedade: é a prerrogativa que a Administração tem de executar diretamente, por seus próprios meios e agentes, as medidas de polícia Administrativa adotadas, sem precisar recorrer previamente ao Poder Judiciário
A Autoexecutoriedade desdobra-se:
Ÿ Exigibilidade – possibilidade que a Administração tem de tomar decisões executórias (que dispensam a Administração de dirigir-se preliminarmente ao juiz para impor a obrigação ao administrado). Impõe-se ao particular ainda contra a sua concordância. Vale-se de meios indieretos para forçar o cumprimento do ato. Exemplo: multa
Ÿ Executoriedade – faculdade que tem a Administração, quando já tomou decisão executória, de realizar diretamente a execução forçada, usando, se for o caso, da força pública para obrigar o administrado a cumprir a decisão. Ex.: Dissolver reunião, apreender mercadoria.
a) Discricionariedade: é a possibilidade que a Administração tem de fazer um juízo de conveniência e oportunidade para escolher o ato de polícia Administrativo mais adequado ao caso concreto.
Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro:
“diante de determinados requisitos, a Administração terá que adotar solução previamente estabelecida, sem qualquer possibilidade de opção. Nesse caso, o poder será vinculado. O exemplo mais comum é o da licença”.
LIMITES AO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA
a) Observância dos Direitos Fundamentais. b) Observância dos princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade. c) Observância de outros preceitos legais.
ABUSO DO PODER
Inegável mencionar que os agentes públicos são detentores de uma prerrogativa que por si só encontra-se no limite do legal ou ilegal, oportuno ou inoportuno, conveniente ou inconveniente, de tal maneira que sua conduta deve ser condicionada pelo direito, regime democrático, prerrogativas individuais, princípios constitucionais, liberdades públicas, sendo que o agente público deve estar devidamente capacitado para decidir entre o mais justo, oportuno, conveniente, proporcional, tendo em vista que uma decisão mal tomada prejudicará fundamentos, princípios e objetivos do Estado Democrático de Direito.
Quando os agentes públicos extrapolam os limites fixados em lei ou buscam finalidades diversas da do interesse público ou, ainda, são omissos, incorrem no denominado Abuso de poder.
“...O governo em si, que é apenas o modo que o povo escolheu para executar sua vontade, está igualmente sujeito ao abuso e à perversão antes que o povo possa agir por meio dele...” (Thoreau, Henry David, a desobediência civil 1849, página 07, São Paulo: Penguin e companhia das letras).
A figura do Abuso de Poder desdobra-se em:
1. Excesso de Poder: Ocorre quando o agente competente atua extrapolando os limites dos poderes que têm.
2. Desvio de Poder: Ocorre quando o agente competente, mesmo atuando nos exatos limites do poder conferido por lei, busca alcançar finalidade diversa do interesse público.
O Estado dispõe de mecanismos para sanar esta ilegalidade e suas decorrências (danos físico, morais e financeiros), como o Código Penal Brasileiro, a Lei n° 4.898, de 9 de dezembro de 1965 (que regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa civil e penal, nos casos de abuso de autoridade), Lei 10.826 de 22 de dezembro de 2003, Código de Processo Penal, impondo sanções e penas, bem como definindo crimes, restrições e obrigações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, conclui-se que o Poder é uma prerrogativa conferida ao Estado, por meio de lei (tendo como base jurisprudências, costumes, princípios...) e decorrente da vontade coletiva, para que a Administração Pública, por meio de seus agentes, faça uso de sua autoridade, condicionando o exercício pleno de direitos, limitando, regulando, permitindo, sancionado, para assegurar a organização da sociedade, procurando construir uma sociedade livre justa e solidária, mantendo a paz, mitigando discriminações e infrações.
As ações dos agentes públicos são baseadas nos princípios que regem suas atribuições, no cumprimento do dever que a lei lhes impõe (poder de polícia) e em casos de necessidade do uso da força com a exata medida exigida. O intuito é sempre de evitar a intercorrência de abusos ou excessos e minimizar danos físicos e morais, considerando-se o respeito aos direitos humanos, a manutenção e aprimoramento dos direitos fundamentais.
Portanto, no tocante ao Poder de Polícia, notamos que este divide-se, principalmente, em duas atividades, quais sejam: a administrativa, que incide sobre bens, direitos e atividades combatendo, exclusivamente, ilícitos administrativos, ao passo que a polícia judiciária e de manutenção da ordem pública atuam sobre as pessoas, individualmente ou indiscriminadamente, insurgindo-se contra a prática de delitos penais, principalmente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Brasil, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Art. 1° Parágrafo único - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm (acesso em 06/01/2014)
Silva, de Placido e,Vocabulário Jurídico, 30ª edição, São Paulo: Saraiva, 2013
SILVA, José Afonso. Op. cit., p. 754-755
Brasil, Código Tributário Nacional, Art. 78 - http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/CodTributNaci/ctn.htm (acesso em07/01/2014)
Mello, Celso Antônio Bandeira de, Curso de Direito Administrativo, 25ª edição, São Paulo: Malheiros, 2007, p. 809
Gomes, Amintas Vidal, Manual do Delegado, 6ª edição, editora forense, 2011
Brasil, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Art. 144 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
Meirelles, Helly Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 33ª edição, São Paulo: Malheiros, 2007, p. 131
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2004.
Thoreau, Henry David, a desobediência civil (1849), São Paulo: editora Penguin e companhia das letras, 2013, p. 07.
Brasil, Código Penal Brasileiro - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm (acesso em 08/01/2014)
Brasil, Lei n° 4.898, de 9 de dezembro de 1965 - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4898.htm (acesso em 08/01/2014)
Brasil, Lei 10.826 de 22 de dezembro de 2003 - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm (acesso em 08/01/2014)
Winkipedia, http://pt.wikipedia.org/wiki/Pol%C3%ADcia (acesso em 07/01/2014)
Formado em Administração de Empresas (na Universidade de Brasília). Pós-graduando em Gestão de Segurança Pública pelo Instituto Marcelo Paiva de Brasília.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FARIA, Daniel Beltrame. Poder de Polícia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 jan 2014, 07:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38079/poder-de-policia. Acesso em: 23 dez 2024.
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