Resumo: Dedica-se ao estudo da extradição, analisando as hipóteses constitucionais materiais e demais requisitos formais que a autoriza, perscrutando o seu procedimento até a decisão; distingue-se, também, a extradição da expulsão, deportação e surrender; a metodologia adotada foi a bibliográfica, do tipo qualitativo.
Palavras-chave: extradição; hipóteses materiais; requisitos formais.
Abstract: The present article is devoted to the she studies of the extradition, being verified the hypotheses constitutional matters and other formal requirements that they authorize the extradition, searching your procedure until the decision; distinguished, also, the extradition of the expulsion, deportation and surrender; the adopted methodology was the bibliographical, of the qualitative type.
Keywords: extradition; material hypotheses; formal requirements.
Sumário: INTRODUÇÃO. 1. EXTRADIÇÃO – DO CONCEITO. 2. HIPÓTESES MATERIAIS: AUTORIZATIVOS CONSTITUCIONAIS PARA A EXTRADIÇÃO. 3. ESTATUTO DO ESTRANGEIRO (L. 6.815/80): REQUISITOS FORMAIS PARA A EXTRADIÇÃO. 4. DO PROCEDIMENTO E DA DECISÃO. 5. DISTINÇÃO ENTRE EXTRADIÇÃO, EXPULSÃO, DEPORTAÇÃO E ENTREGA. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
INTRODUÇÃO
Por vezes, ocorre que uma pessoa comete um delito em um Estado e foge para outro, objetivando evitar a impunidade. Entre dois países, onde um efetuou a prisão do infrator, e o outro que é a vítima, prepondera o interesse do segundo em detrimento do primeiro a fim de levar a efeito a punição do transgressor, considerando que o judiciário deve uma resposta a população local: diretamente interessada na repressão delitiva.
Ademais, a jurisdição de um Estado é limitada aos seus limites territoriais. Assim, em princípio, a nenhum Estado é dado o Poder de Dizer o Direito em outro Estado, pois cada um ostenta soberania para dizer o próprio Direito. Se é assim, o que legitimaria um Estado a julgar uma pessoa que cometeu um delito em outro Estado? Aliás, pergunta-se: quem é o maior interessado em punir o infrator que praticou um delito em seu território? Obviamente que é o Estado-vítima do delito. Nesse caso, tem-se a extradição, onde um Estado entrega uma pessoa a justiça do outro, a fim de evitar a impunidade, pois, do contrário, estar-se-ia motivando aqueles que cometeram infrações em um Estado a se refugiarem em outro Estado.
Levando em consideração os conceitos, hipóteses materiais e demais requisitos formais que autorizam o deferimento do pleito extradicional, esse trabalho se inicia, analisando em outro momento o procedimento e a decisão, distinguindo-se extradição de expulsão, deportação e da entrega (surrender). Adotou-se a metodologia bibliográfica, do tipo qualitativo.
1. EXTRADIÇÃO – DO CONCEITO
Extradição é um ato político-jurídico de ‘cooperação internacional na repressão a atos de criminalidade comum’[1], onde um Estado-pátria entrega uma pessoa que se encontra dentro do seu território, acusada ou já condenada pela prática de crime, a outro Estado competente, que o requer, para julgá-lo e puni-lo.
A existência de um processo penal no Estado-requerente, em que pese acusação ou decreto condenatório sobre o extraditando, é pressuposto para a extradição, isto é, inadmite-se extradição com base em procedimentos de cunho administrativo investigatório que, casualmente, podem dá azo a instauração de processo crime. Portanto, faz-se mister o curso processual ou decisão da qual emana ordem de autoridade competente, impondo cumprimento de pena, observando o disposto no ordenamento jurídico vigente.
Têm-se, na extradição, um ato integrado por duas vontades, uma do Poder Executivo da União, outra do Poder Judiciário Federal. Assim, o pedido de extradição é dirigido a União, na pessoa do seu representante: Presidente da República, que, mediante análise discricionária (leia-se: liberdade dentro dos limites estreitos da lei), opta por extraditar ou não a pessoa reclamada. Noutra face, caso entenda conveniente tal extradição, cumpre ao Poder Judiciário, especificamente ao Supremo Tribunal Federal, analisar todas as questões legais atinente ao pleito, tais são, por exemplo, as hipóteses materiais constitucionais autorizativas do ato concessivo e, além disso, os requisitos formais previstos no Estatuto do Estrangeiro.
Uma vez julgada procedente a extradição, a sentença ostenta natureza jurídica constitutiva, formando-se “título jurídico apto a legitimar o Poder Executivo da União a efetivar, com fundamento em tratado internacional ou em compromisso de reciprocidade, a entrega do súdito reclamado”.[2]
A Carta Republicana brasileira dá tratamento diferenciado aos brasileiros natos, naturalizados e aos estrangeiros, estabelecido nos incisos LI e LII, do art. 5º, que:
“LI – nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei”;
“LII – não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião”;
Por imperativo constitucional, já se vê, que a extradição só será cabível dentro dessas hipóteses; entretanto, nada impede que a ordem jurídica infraconstitucional preveja de natureza formal, imprescindíveis para a concessão da extradição requisitos. Essa disciplina jurídica sobre a extradição, a toda evidência, se liga a pedidos formulados por Estados soberanos à República Federativa do Brasil. Dessa forma, temos duas espécies de extradição:
a) Ativa: o Brasil requer a outros Estados-pátrias;
b) Passiva: é requerida por outro Estado ao Brasil.
Para o nosso estudo, interessa-nos a extradição passiva, posto que analisaremos as normas internas, constitucionais e federais que constituem imperativos autorizativos ou restritivos da extradição. Vejamo-las.
2. HIPÓTESES MATERIAIS: AUTORIZATIVOS CONSTITUCIONAIS PARA A EXTRADIÇÃO
Vigora o princípio geral de inextraditabilidade do brasileiro, seja nato ou naturalizado[3]. A Constituição Federal (art. 5º, LI e LII) porém e como visto, dá tratamento diferenciado, sob o prisma extradicional, aos brasileiros natos, naturalizados e aos estrangeiros, excepcionando a regra e dispondo que:
1. O brasileiro nato, em nenhuma hipótese, será extraditado;
2. O brasileiro naturalizado pode ser extraditado apenas em duas hipóteses:
I. Pela prática de crime comum antes da extradição;
II. Quando comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, não importando se antes ou depois da naturalização.
3. O estrangeiro, regra geral, poderá ser extraditado, salvo em caso de crime político[4]-[5] ou de opinião[6]. Em havendo cometimento de crime por motivos políticos e comum, a extradição será indeferida. Nesse sentido “uma vez constatado o entrelaçamento de crimes de natureza política e comum, impõe indeferir a extradição. Precedentes: Ext 493-0 e 694-1 (...).” (Ext 994, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 14-12-2005, Plenário, DJ de 4-8-2006);
4. O português equiparado, segundo o §º2 do art. 12 da CRFB, tem a seu favor estendido todos os direito do brasileiro naturalizado. Sendo assim, poderá ser extraditado, bastando configurar as hipóteses autorizativas do inciso LI, do art. 5º da CRFB. Entretanto, esta possibilidade restou-se prejudicada, haja vista que o Brasil é signatário de tratado internacional, incorporado ao ordenamento jurídico pelo Decreto n. 3.927/2001, onde o Congresso Nacional promulgou o Tratado de Cooperação, Amizade e Consulta entre Brasil e Portugal, determinando que o português somente será extraditado para Portugal.
Perceba-se, do exposto, que, como regra absoluta, o brasileiro nato não pode ser extraditado, independentemente do crime praticado. Porém, por motivos éticos-jurídicos incide sobre o infrator a extraterritorialidade da lei penal, cujo fito volta-se a impedir que práticas delitivas, oriundas de condutas de brasileiros, não fiquem impunes. Nesse sentido, apregoa o Tribunal Constitucional, acentuando que:
“O brasileiro nato, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode ser extraditado, pelo Brasil, a pedido de governo estrangeiro, pois a CR, em cláusula que não comporta exceção, impede, em caráter absoluto, a efetivação da entrega extradicional daquele que é titular, seja pelo critério do jus soli, seja pelo critério do jus sanguinis, de nacionalidade brasileira primária ou originária. Esse privilégio constitucional, que beneficia, sem exceção, o brasileiro nato (CF, art. 5º, LI), não se descaracteriza pelo fato de o Estado estrangeiro, por lei própria, haver-lhe reconhecido a condição de titular de nacionalidade originária pertinente a esse mesmo Estado (CF, art. 12, § 4º, II, a). Se a extradição não puder ser concedida, por inadmissível, em face de a pessoa reclamada ostentar a condição de brasileira nata, legitimar-se-á a possibilidade de o Estado brasileiro, mediante aplicação extraterritorial de sua própria lei penal (...) – e considerando, ainda, o que dispõe o Tratado de Extradição Brasil-Portugal (...) –, fazer instaurar, perante órgão judiciário nacional competente (...), a concernente persecutio criminis, em ordem a impedir, por razões de caráter ético-jurídico, que práticas delituosas, supostamente cometidas, no exterior, por brasileiros (natos ou naturalizados), fiquem impunes.” (HC 83.113-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 26-6-2003, Plenário, DJ de 29-8-2003.) No mesmo sentido: Ext 916, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 19-5-2005, Plenário, DJ de 21-10-2005.
Por outro lado, o brasileiro naturalizado, excepcionalmente, poderá ser extraditado, desde que a) cometa crime comum, antes da extradição, ou b) comprovado envolvimento efetivo em tráfico ilícito de entorpecente, antes ou depois da extradição. Já o estrangeiro, que tem menor proteção legal, pode, em regra, ser extraditado, salvo nas hipóteses constitucionais, excepcionais, de crime político ou de opinião.
3. DUE PROCESS OF LAW: OBSERVÂNCIA AO ESTATUTO DO ESTRANGEIRO (L. 6.815/80) – REQUISITOS FORMAIS PARA A EXTRADIÇÃO
Os requisitos infraconstitucionais para a extradição, estão previstos na L. 6.815/80. Assim, o Estado estrangeiro que pretenda o pleito, deverá cumprir, cumulativamente, os seguintes requisitos:
– hipóteses materiais: estudada no tópico anterior (incisos LI e LII do art. 5º, da CF);
– requisitos formais[7]: estão previstos no Estatuto do estrangeiro, arts. 91 ss, e no Regimento interno do STF, nos art. 207 a 214. Destacam-se:
1. Reciprocidade: esse requisito traduz-se na existência de tratados internacionais, que constitui o fundamento do pedido extradicional; porém, quando inexistente, suprir-lhe-á à processa de reciprocidade em casos análogos.[8] Tal promessa, ressalte-se, deve ser integral, significando dizer que não será considerada quando encontrar obstáculos na Constituição ou leis do Estado requerente. Nesse ponto, o Tribunal Constitucional brasileiro indeferiu extradição requerida pela Alemanha, sob o fundamento de, inobstante a promessa de reciprocidade, firmada pelo Governo Alemão, a Constituição alemã não permite a extradição de alemão naturalizado, dado que evidencia a instabilidade da promessa, aduzindo que o
“Pedido de extradição, formulado com base em promessa de reciprocidade, de cidadão brasileiro naturalizado, por fatos relacionados a tráfico de drogas anteriores à entrega do certificado de naturalização. Inviabilidade da extradição, por impossibilidade de cumprimento da promessa de reciprocidade, uma vez que, no país requerente, a vedação de extradição de seus nacionais não admite exceções como as previstas na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (art. 5º, LI). Questão de ordem resolvida pela extinção da extradição, sem julgamento de mérito. Determinada a remessa de cópia dos autos ao Ministério Público, para as finalidades cabíveis, verificando-se a possibilidade de aplicação extraterritorial da lei penal brasileira.” (Ext 1.010-QO, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 24-5-2006, Plenário, DJ de 19-12-2006.)
2. Competência jurisdicional absoluta do Estado requerente, para conhecer, processar e julga o extraditando. O Brasil, neste caso, é incompetente, absolutamente, para o processo-crime do reclamado;
3. Existência de processo penal, onde há mandado de prisão ou de decreto condenatório, expedido em observância as regras vigentes e legais, por autoridade competente: juiz, Tribunal, etc.;
4. Dupla incriminação (princípio da dupla tipicidade): o fato criminoso tem que constituir crime no ordenamento jurídico brasileiro e no ordenamento jurídico do Estado requerente, passíveis, pois, de punição pelas duas ordens jurídicas.
Se se o fato for considerado crime no sistema jurídico estrangeiro e, no Brasil, contravenção penal, ou fato atípico, a extradição será julgada improcedente, por impossibilidade jurídica do pedido;
5. Inexistência da extinção da punibilidade, como, v. g., inocorrência da prescrição, considerando às leis brasileiras ou estrangeiras[9];
6. A infração não pode ter caráter político;
7. Insujeitabilidade do extraditando a julgamento em juízo ou Tribunal de exceção[10], no Estado requerente;
8. Ausência de cominação de pena, pela lei brasileira, igual ou inferior a um ano de prisão;
9. O Estado requerente deve se comprometer, formalmente, a:
I. Proceder a detração penal, computando o tempo de prisão que no Brasil foi cumprido, por imperativo da extradição;
II. Comutar penas cruéis ou degradantes que ultrajam a dignidade da pessoa humana, pena de morte, ressalvada em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX, da CRFB, em pena privativa de liberdade ou restritivas de direito.
III. Não valer-se de critérios políticos com fito a agravar a pena do extraditando;
IV. Não entregar o extraditando a outro Estado que o reclame (leia-se: reextraditá-lo), sem o consentimento do Brasil.
Esses requisitos, frise-se, deverão ser cumpridos cumulativamente, sob pena de indeferimento da extradição.
Cumpre ao Estado requerente, de forma objetiva e articulada, a exposição fática-jurídica que enseja e delimita o seu pedido extradicional.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal na Extradição 667-3, República Italiana, pleno, tendo como relator Min. Celso de Mello, assentou
“com a necessária síntese descritiva dos fatos, incide sobre o Estado requerente, não se justifica que este, mediante sumária nota verbal, transfira o encargo em causa a esta Suprema Corte, que se veria na contingência de extrair, das peças documentais – com inadmissível substituição da atividade processual que compete, inicialmente, ao autor da ação de extradição passiva –, os elementos à própria delimitação material da presente extradição. O dever de expor, ainda que sucintamente, mas sempre de modo claro e objetivo, os episódios motivadores da postulação extradicional pertence ao Estado requerente, até mesmo em função da exigência legal que impõe, em sede de extradição, a observância do princípio da dupla tipicidade”. (apud: MORAES, 2011, p.103)
3.1. Hipóteses que não obsta a extradição
Consoante entendimento do Supremo Tribunal Federal, o fato do alienígena ser casado ou viver em união estável com brasileira ou ter filho brasileiro, não obsta a extradição. A propósito, eis o teor do enunciado da súmula 421: “Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro”.
Assim, manifesta o STF
“A existência de relações familiares, a comprovação de vínculo conjugal e/ou a convivência more uxorio do extraditando com pessoa de nacionalidade brasileira constituem fatos destituídos de relevância jurídica para efeitos extradicionais, não impedindo, em consequência, a efetivação da extradição. (...) Não obsta a extradição o fato de o súdito estrangeiro ser casado ou viver em união estável com pessoa de nacionalidade brasileira, ainda que, com esta, possua filho brasileiro. A Súmula 421/STF revela-se compatível com a vigente CR, pois, em tema de cooperação internacional na repressão a atos de criminalidade comum, a existência de vínculos conjugais e/ou familiares com pessoas de nacionalidade brasileira não se qualifica como causa obstativa da extradição.” (Ext 1.201, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17-2-2011, Plenário, DJE de 15-3-2011.) No mesmo sentido: Ext 1.196, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 16-6-2011, Plenário, DJE de 26-9-2011.
Diferentemente da extradição, em matéria de expulsão de estrangeiro, não se procederá a expulsão quando implicar extradição inadmitida pela lei brasileira, ou, também, quando o estrangeiro tiver cônjuge brasileiro do qual não esteja divorciado ou separado, de fato ou de direito, e desde que o casamento tenha sido celebrado há mais de 5 (cinco) anos; ou, ainda, tiver filho brasileiro que, comprovadamente, esteja sob sua guarda e dele dependa economicamente. Porém, ressalva-se a hipótese de uma vez verificados o abandono do filho, o divórcio ou a separação, de fato ou de direito, a expulsão poderá efetivar-se a qualquer tempo (art. 75, I, II, a, b, e §2º da lei 6.815/80).
Por outro lado, não constituem impedimento à expulsão a adoção ou o reconhecimento de filho brasileiro supervenientes ao fato que a motivar (art. 75, §1º da lei 6.815/80). É de se ressaltar, no entanto, em caso de reconhecimento superveniente de filho brasileiro, proceder-se-á a expulsão, porém, o estrangeiro expulso não está impedido de ver o filho. Na mesma linha, ensina Alexandre de Moraes (2011, p. 110) “o estrangeiro que tenha filho brasileiro, cujo reconhecimento da paternidade, todavia, foi superveniente ao fato que motivou a expulsão, não está impedido legalmente de vê-la efetivada”.
4. DO PROCEDIMENTO E DA DECISÃO
O Estado estrangeiro que reclama o extraditando deverá efetuar o pedido mediante via diplomática, em Nota Verbal[11], reproduzida em documento escrito autenticado[12], endereçado ao Presidente da República, pois cabe-lhe manter relações com os Estados estrangeiros (art. 84, VII, da CRFB).
Realizado o pedido, endereçado ao Presidente ao República, o Ministro da Justiça o remeterá ao Supremo Tribunal Federal, para que se manifeste previamente sobre a legalidade e procedência do pedido, hipótese em que o extraditando deverá está preso preventivamente para a extradição, em disposição do STF. No caso da prisão preventiva para extradição, esta incumbe ao relator, que conduzirá o processo. Nesse momento, o processo extradicional tem início, com rito especial, onde inexiste dilação probatória, pois, como já evidenciado, cumpri ao STF analisar, tão só, a legalidade da medida, e não julgar o extraditando, competência do Estado requerente. Desse modo,
“o processo de extradição passiva ostenta, em nosso sistema jurídico, o caráter de processo documental, pois ao Estado requerente é exigível a obrigação de produzir, dentro outros elementos, aqueles que constituem os documentos indispensáveis à própria instauração do juízo extradicional” (RTJ, 147/894).
No curso do procedimento extradicional pode ocorrer a desistência do ato, dado que se revela admissível. Não se considera, todavia, a aquiescência do extraditando sobre sua real vontade em ser ou não extraditado.
Concluído o feito, caso o STF entenda pela impossibilidade da extradição, sob o argumento de inobservância das hipóteses materiais ou requisitos formais, tal decisão vinculará o Presidente da República que não poderá conceder a extradição. Noutro lado, se o STF declarar preenchidos os requisitos e hipóteses materiais, favoráveis, pois, a extradição, tal decisão, neste caso, não vinculará o Presidente da República, que poderá ou não conceder a extradição, haja vista que o procedimento extradicional reveste-se de manifestação de soberania estatal, e, porquanto, discricionário.
5. DISTINÇÃO ENTRE EXTRADIÇÃO, EXPULSÃO, DEPORTAÇÃO E ENTREGA
Extradição, expulsão, deportação e entrega (surrender), não se confundem. Como visto, na extradição, há um pedido para que o estrangeiro seja entregue a outro Estado, a fim de submetê-lo a julgamento ou, existindo condenação, cumprimento de pena. De acordo com o enunciado da súmula 421, do STF, “Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro”.
Já na expulsão, temos que o estrangeiro é retirado coercitivamente do Estado, independentemente de manifestação do Estado de origem do estrangeiro. Para tanto, é necessário que o estrangeiro tenha entrado ou se mantém irregularmente em nosso território, ou, ainda, praticou atos que violam à ordem jurídica do Estado em que se encontra. Tais hipóteses são constatadas em inquérito instaurado pelo Ministro da Justiça, que, ao concluir, o enviará ao Presidente da República para em um juízo de conveniência e oportunidade decida a sorte do estrangeiro, expulsando-o, ou não (L. 6.815/80, art. 66). Veja-se que, tal discricionariedade, é liberdade dentro das possibilidades dada pela lei, há possibilidade de combater abuso no ato de expulsão, quando este não for motivado, ou o sendo, não está lastreado na legalidade. Nesse caso, se admite recurso administrativo: pedido de reconsideração, “e apelo ao judiciário” (MORAES, 2011, p. 109).
Diferentemente da extradição,
“não se procederá a expulsão quando o estrangeiro tiver cônjuge brasileiro, do qual não esteja divorciado ou separado, de fato ou de direito, e desde que o casamento tenha sido celebrado há mais de cinco anos; ou, ainda, se tiver filho brasileiro que, comprovadamente, esteja sob a sua guarda e dele dependa economicamente”.
Em suma,
“Portanto, as hipóteses (extradição e expulsão) são diferentes. A extradição é pedido formulado por Estado estrangeiro, em virtude de crime cometido no exterior. Já a expulsão decorre de atentado à segurança nacional, ordem política ou social ou nocividade aos interesses nacionais. Na primeira hipótese, o fato motivador ocorreu no Brasil, e procede-se ex officio da autoridade nacional” (MORAES, 2011, p. 108)
Na deportação, ocorre a devolução compulsória do estrangeiro ao seu Estado de origem, ou a outro que consinta em recebê-lo, considerando que a sua entrada ou permanência no Estado em que se encontra é irregular. Em princípio, tal fato se origina do exaurimento do prazo facultativo, ou violação das condições concessivas da sua estadia no território do país que o deporta; exercício de atividades incompatíveis, ou mudança de atividades, não prevista no visto etc. Aliás, sanadas as eventuais irregularidades, nada impede que o estrangeiro deportado retorne ao país.
A entrega, também conhecida como surrender, está prevista no art. 102 do Estatuto de Roma, consistindo na entrega de uma pessoa por um Estado a um Tribunal, e não ao Estado estrangeiro.
Aos brasileiros natos não se aplicam, em nenhuma hipótese, os quatro institutos. Penalizar brasileiro nato com expulsão ou deportação, enviando-o compulsoriamente para o estrangeiro, constitui pena de banimento, vedada pela Carta Republicana (art. 5º, XLVII, d).
CONCLUSÃO
Devido a limitação territorial da função jurisdicional, faz-se necessário o diálogo entre os Estados-pátrias, cujo fito é a efetividade da justiça, de modo que não fiquem impuníveis àqueles infratores que evadem para outro Estado.
Nesse contexto, a extradição opera como instituto hábil a trazer o infrator para o local do cometimento do crime (Estado-vítima), a fim de julgá-lo e puni-lo segundo a lei vigente do local e ao tempo do crime. Demonstra-se fundamental tal atuação, uma porque põe os Estados, requerido e requerente, em diálogo, prol da justiça e em detrimento da impunidade, duas porque dá resposta a população local, evidenciando que nem a questão territorial é apta a evitar o julgamento e punibilidade do infrator.
Dependendo da conduta do estrangeiro, esta poderá se moldar a diversas situações nas quais ganha contorno de punição. Assim, v. g., se o estrangeiro comete crime comum antes da naturalização, poderá ser eventualmente extraditado. O mesmo ocorre com aquele que, sendo estrangeiro, envolve-se, e é comprovado o envolvimento efetivo, com tráfico ilícito de drogas ou entorpecentes. Já, em outro exemplo, se o estrangeiro entra ou permanece de forma irregular em nosso território, poderá ser expulso ou deportado, a depender da gravidade da conduta. Há, também, possibilidade do Estado entregar uma pessoa para ser julgada por um Tribunal, diz-se que nesse caso ocorre a surrender ou entrega (art. 102 do Estatuto de Roma). Vê-se, do exposto, que se trata de institutos diferentes, cada um com suas peculiaridades e funções, onde, em última análise, todos pugnam por um fim comum: evitar a impunidade do infrator que cometeu crime em um Estado e evade-se para outro Estado. Ademais, tal solução aproxima os Estados, colocando-os em diálogos diplomáticos, consubstanciados em tratados internacionais ou, até mesmo, em promessa de reciprocidade em casos análogos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. – 16. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. – 4. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2009.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. – 27. ed. – São Paulo: Atlas, 2011.
TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. – 10 ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
[1] Ext 1.201, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17-2-2011, Plenário, DJE de 15-3-2011.
[2] STF, Ext. 667-3- República italiana, rel. Min. Celso de Melo, j. 25/9/95, DJU, 29/09/95.
[3] “Ao princípio geral de inextraditabilidade do brasileiro, incluído o naturalizado, a Constituição admitiu, no art. 5º, LI, duas exceções: a primeira, de eficácia plena e aplicabilidade imediata, se a naturalização é posterior ao crime comum pelo qual procurado; a segunda, no caso de naturalização anterior ao fato, se se cuida de tráfico de entorpecentes: aí, porém, admitida, não como a de qualquer estrangeiro, mas, sim, ‘na forma da lei’, e por ‘comprovado envolvimento’ no crime: a essas exigências de caráter excepcional não basta a concorrência dos requisitos formais de toda extradição, quais sejam, a dúplice incriminação do fato imputado e o juízo estrangeiro sobre a seriedade da suspeita. No ‘sistema belga’, a que se filia o da lei brasileira, os limites estreitos do processo extradicional traduzem disciplina adequada somente ao controle limitado do pedido de extradição, no qual se tomam como assentes os fatos, tal como resultem das peças produzidas pelo Estado requerente; para a extradição do brasileiro naturalizado antes do fato, porém, que só a autoriza no caso de seu ‘comprovado envolvimento’ no tráfico de drogas, a Constituição impõe à lei ordinária a criação de um procedimento específico, que comporte a cognição mais ampla da acusação na medida necessária à aferição da concorrência do pressuposto de mérito, a que excepcionalmente subordinou a procedência do pedido extraditório: por isso, a norma final do art. 5º, LI, da CF não é regra de eficácia plena, nem de aplicabilidade imediata.” (Ext 541, Rel. p/ o ac. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 7-11-1991, Plenário, DJ de 18-12-1992.)
[4] Crimes políticos são aqueles que atentam contra a soberania nacional e a estrutura política brasileira, motivados por fins eminentemente políticos e que lese, real ou potencialmente, bens jurídicos tutelados.
[5] “Não configura crime político, para fim de obstar o acolhimento de pedido de extradição, homicídio praticado por membro de organização revolucionária clandestina, em plena normalidade institucional de Estado Democrático de Direito, sem nenhum propósito político imediato ou conotação de reação legítima a regime opressivo. (...) Não caracteriza a hipótese legal de concessão de refúgio, consistente em fundado receio de perseguição política, o pedido de extradição para regular execução de sentenças definitivas de condenação por crimes comuns, proferidas com observância do devido processo legal, quando não há prova de nenhum fato capaz de justificar receio atual de desrespeito às garantias constitucionais do condenado.” (Ext 1.085, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 16-12-2009, Plenário, DJE de 16-4-2010.)
[6]“A inextraditabilidade de estrangeiros por delitos políticos ou de opinião reflete, em nosso sistema jurídico, uma tradição constitucional republicana. Dela emerge, em favor dos súditos estrangeiros, um direito público subjetivo, oponível ao próprio Estado e de cogência inquestionável. Há, no preceito normativo que consagra esse favor constitutionis, uma insuperável limitação jurídica ao poder de extraditar do Estado brasileiro. [...]” (Ext 524, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 31-10-1989, Plenário, DJ de 8-3-1991).
[7] O Estatuto do Estrangeiro (lei 6.815/80) estabelece as hipóteses nas quais não será concedida a extradição. São elas: Art. 77. Não se concederá a extradição quando:
I – se tratar de brasileiro, salvo se a aquisição dessa nacionalidade verificar-se após o fato que motivar o pedido;
II – o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente;
III – o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando;
IV – a lei brasileira impuser ao crime a pena de prisão igual ou inferior a 1 (um) ano;
V – o extraditando estiver a responder a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido;
VI – estiver extinta a punibilidade pela prescrição segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente;
VII – o fato constituir crime político; e
VIII – o extraditando houver de responder, no Estado requerente, perante tribunal ou Juízo de exceção.
[8] Lei 6.815/80, art. 76. “A extradição poderá ser concedida quando o governo requerente se fundamentar em tratado, ou quando prometer ao Brasil a reciprocidade” (itálico e negrito nosso).
[9] Veja-se, por todos, STF, Ext. 1140, República Italiana, Pleno Rel. Min. Gilmar Mendes, 21/10/2010.
[10] “A presente extradição (...) reveste-se de caráter instrutório, eis que o ora extraditando ainda não sofreu condenação penal definitiva pela suposta prática do crime de conduzir veículo, sob influência de bebida alcoólica e com velocidade excessiva, em contexto de que resultou a morte de sua passageira (...). A infração penal atribuída ao extraditando acha-se desvestida de caráter político. Constitui delito comum, insuscetível de julgamento perante órgãos judiciário ou tribunais de exceção no Estado requerente.” (Ext 1.203, voto do Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 2-12-2010, Plenário, DJE de 25-2-2011).
[11] Perceba que tal pedido não se dá mediante carta rogatória, e sim por Nota Verbal emanada do governo do Estado estrangeiro.
[12] STF, HC 72.998-3/SP, Pleno Rel. Min. Sydney Sanches, DJ, S. 1, 16/02/2001, p. 90.
Acadêmico de Direito na Universidade Estadual do Piauí - UESPI.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ROSA, Leonardo Sérgio Cesar Lopes Moreira. Da extradição: uma análise das hipóteses materiais e dos requisitos formais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 jan 2014, 03:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38127/da-extradicao-uma-analise-das-hipoteses-materiais-e-dos-requisitos-formais. Acesso em: 23 dez 2024.
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