Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 2.1. Atividades Efetivamente Licenciadas. 2.2. Atividades em Tese Licenciáveis mas não Licenciadas. 2.3. Atividades não Licenciáveis. 2.4. Medidas Cautelares Fiscalizatórias. 3. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO:
Imaginemos um caminhão carregando vários metros cúbicos de madeira em tora transitando por uma estrada de rodagem estadual sem a guia florestal que deve acompanhar a mercadoria (licença ambiental). Qual ente federado detém competência para abordar e autuar referido transporte irregular?
O presente artigo pretende responder estes e outros questionamentos a luz da recente regulamentação do tema e sobretudo diante da enfoque constitucional a abraçar as melhores interpretações das hipóteses surgidas que adiante mostraremos.
Em resumo trataremos de enfocar os critérios explícitos (literais);implícitos e omissos no que se refere ao critério de preponderância fiscalizatória em matéria ambiental trazido pela Lei Complementar 140/2011.
2. DESENVOLVIMENTO:
Nos termos da que dispõe Paulo Affonso Leme Machado, o “poder de polícia ambiental é a atividade da Administração Pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato em razão de interesse público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou de atividades dependentes de concessão, autorização/permissão ou licença do Poder Público, de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza.”[1]
O poder de policia ambiental está previsto, de forma mais enfática, em dois dispositivos constitucionais, os quais merecem atenta leitura(art. 225 e 23):
Art. 225 CF/88: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
O constituinte outorgou um direito fundamental à toda coletividade, qual seja, a existência de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, incumbindo o poder público o dever de protegê-lo e de sancionar administrativamente as condutas lesivas a um dos mais caros bens da sociedade.
Tal poder foi constitucionalmente atribuído a todos os entes da federação, numa clara opção de máxima efetividade e proteção em matéria ambiental.
Art. 23 CF/88: É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
Cuida-se da repartição material de competências entre o poder público, não só afiançando, mas impondo um dever de agir as três esferas federativas no que tange ao controle administrativo ambiental, atuação esta sempre reconhecida pela doutrina e pela legislação, ex vi da lei de crimes ambientais.
(...)
Em sintonia com a cooperação comum dos entes federativos, a denominada Lei dos Crimes Ambientais inclui, como habilitados, para fins de lavratura de autos de infração e de instauração de processos administrativos, todos os o?rga?os ambientais integrantes do Sisnama, no âmbito das três esferas da Federação brasileira. [2]
Em que pese tal atividade pública já ter sido objeto de normatização, como a previsão do exercício do poder de policia na lei 6.938/81, dispondo sobre os órgãos integrantes do SISNAMA e suas atribuições ou na lei 9.605/98 e seu regulamento ao tratar das infrações administrativas ambientais, foi com a LC 140/2011 que se supriu antiga lacuna no ordenamento, eis que a mesma procura otimizar a repartição da competência comum, trazendo maior efetividade e racionalização à fiscalização, materializando o parágrafo único do art. 23 da CF/88:
Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
Desta feita, deixou-se para o legislador a tarefa de estabelecer critérios de cooperação de forma a equilibrar a atividade fiscalizatória entre os entes, sempre voltando os olhos para as diretrizes principiológicas previstas na carta magna no que toca a atuação administrativa, como a eficiência.
Com este desiderato, procurando evitar ao máximo superposição de autuações, o art. 17 da LC 140/2011 deu grande passo em regular a matéria, sem contudo aguçar a atividade da doutrina e jurisprudência sobre pontos omissos ou no mínimo nebulosos, conforme passaremos a abordarAntes, contudo, necessário registrar que algumas das situações abaixo delineadas ainda não foram abordadas pelos tribunais superiores após a LC 140/2011, no entanto as resoluções concretas aqui sugeridas baseiam-se na melhor doutrina e nos precedentes anteriores sobre o tema, ainda aplicáveis, já que antiga a competência fiscalizatória ambiental comum, sendo tema recorrente nos tribunais pátrios, sobretudo os federais.
Eis o art. 17 da LC 140/2011, tema central desta abordagem:
Art. 17. Compete ao o?rga?o responsa?vel pelo licenciamento ou autorizaça?o, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infraça?o ambiental e instaurar processo administrativo para a apuraça?o de infraço?es a? legislaça?o ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada.
§1o Qualquer pessoa legalmente identificada, ao constatar infraça?o ambiental decorrente de empreendimento ou atividade utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores, pode dirigir representaça?o ao o?rga?o a que se refere o caput, para efeito do exerci?cio de seu poder de poli?cia.
§ 2o Nos casos de iminência ou ocorrência de degradaça?o da qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato devera? determinar medidas para evita?-la, fazer cessa?-la ou mitiga?-la, comunicando imediatamente ao o?rga?o competente para as providências cabi?veis.
§ 3o O disposto no caput deste artigo na?o impede o exerci?cio pelos entes federativos da atribuiça?o comum de fiscalizaça?o da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislaça?o ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infraça?o ambiental lavrado por o?rga?o que detenha a atribuiça?o de licenciamento ou autorizaça?o a que se refere o caput. (grifos nossos)
Da leitura atenta dos dispositivos percebe-se de forma cristalina a tendência legislativa de vincular a atividade fiscalizatória à competência para licenciar. Registre-se que o termo relativo é de suam importância. Não poderia deixar de ser de outra maneira, sob pena de brotar inconstitucionalidade na regulamentação. É que em matéria de competência comum, qualquer regra que aniquile a atividade de outro entre cooperador acaba por açambarcar a própria divisão de tarefas, malferindo dispositivo constitucional. Não é por outro motivo que o § 3o dispõe que em nenhuma hipótese se prejudicará a atribuição comum do entes, esclarecendo que se busca apenas trazer um critério de prevalência explícito.
Fixada a principal premissa - competência fiscalizatória de todos os entes SEMPRE PRESERVADA, passemos a análise das situações específicas:
2.1. ATIVIDADES EFETIVAMENTE LICENCIADAS:
Não se adentrará nos contornos do licenciamento em si de modo a não fugir do tema proposto. Para nós aqui importa que quando determinada atividade ou empreendimento é efetivamente licenciado a competência para fiscalização com eventual aplicação de medias de policia, p. ex. multa ou embargo, serão do órgão ambientalmente licenciador.
Art. 17 Compete ao o?rga?o responsa?vel pelo licenciamento ou autorizaça?o, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infraça?o ambiental e instaurar processo administrativo para a apuraça?o de infraço?es a? legislaça?o ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. (grifo nosso)
A vinculação legal, criando o princípio do licenciador –fiscalizador primário possui alto grau de justificativa: o órgão licenciador detém conhecimentos técnicos sobre a situação determinada eis que já se debruçou anteriormente sobre o empreendimento, é de eficiência que se trata ao fiscalizar eventuais condicionantes da licença anteriormente expedida, por exemplo.
A vinculação (relativa) configura-se apenas na hipótese de haver licença efetivamente expedida pelo órgão. A relatividade se destaca na medida que o caput é esmiuçado pelo § 3o, onde se enaltece a proteção ao bem de terceira geração, destacando-se o que a constituição já dispõe sobre a competência comum. Cuida-se, pois, de um sistema de prevalências, prevalecendo o auto de infração lavrado pelo órgão licenciador em caso de dupla autuação.
Desta feita, realizada a fiscalização pelo órgão licenciador não caberá mais a outros órgãos do SISNAMA a instauração de processo administrativo, encerrando-se o caso pela aplicação do art. 17, caput.
Vemos que em nenhuma hipótese há de se admitir a prevalência da opinião técnica do órgão fiscalizador supletivo sobre o primário, seja pela lavratura de dois autos, seja pelo reconhecimento da inexistência da infração.
Entretanto, faz-se questão de repisar. Apensar deste sistema de prevalência, a atuação supletiva não está vedada, é garantida pelo § 2o e pelo § 3o do dispositivo, no mais, pela Constituição Federal.
A comunicação entre as esferas, muitas vezes provocada pelo autuado, levará ao levantamento de medidas administrativas não confirmadas pelo órgão primário e cancelamento de autos nos respectivos sistemas de controle. A cooperação e comunicação entre os órgãos é medida salutar para a eficiência, ocorre que, apesar de não ser recomendável, muitas atividades são fiscalizadas duas vezes, quer pela proximidade com o possível dano quer pela falha comunicativa.
Ressalte-se que, diferentemente do sistema previsto na lei 9605/98, art. 76, não há compensação de multas e sim aplicação de uma ou de outra.
Outro ponto de destaque é o limite temporal para aplicação do critério de prevalência da autuação das atividades efetivamente licenciadas.
Entendemos legítima a prevalência da autuação do órgão primário durante toda a tramitação do processo administrativo do órgão supletivo, podendo aquele entender pela inocorrência de infração ou por aplicação de penalidades, caindo por terra as atividades supletivas de cautela não mantidas, conforme se verá com maior vagar.
Tal substituiça?o so? deve operar ate? o momento em que a sança?o pecunia?ria se tornar definitiva, com a decisa?o irrecorri?vel que homologa o auto de infraça?o. A partir desse momento, fica constitui?do o cre?dito da entidade, deixando de ser regido pela legislação ambiental e passando a fazer reverência às normas financeiras e de execuça?o fiscal, em especial pelas Leis no 4.320/64 e 6.830/80.
Isto posto, o limite temporal de aplicação do disposto no art. 17, § 3o é a constituição definitiva do crédito não tributário, ou seja, o “transito em julgado administrativo” restando plenamente configurada e constituída a fiscalização supletiva.
2.2. ATIVIDADES EM TESE LICENCIÁVEIS MAS NÃO LICENCIADAS:
Está é a situação das mais corriqueiras. A atividade ou empreendimento demandava licença mas a mesma não foi obtida. Pela leitura do art. 17 da LC 140/2011,percebe-se desde logo que tal situação não foi contemplada no critério de prevalência. A leitura dos parágrafos do art. 17, por questões de hermenêutica, deve ser feita a luz do caput, este, voltado para atividades efetivamente licenciadas ou autorizadas.
Em nenhuma hipótese podemos aplicar a regra do art. 17 as atividades licenciáveis. De outro banda, em que pese a LC 140/2011? dispor genericamente que cada esfera de governo exercerá fiscalização em empreendimentos cuja atribuição para licenciar ou autorizar lhe foi cometida (art. 7o, inciso XIII; art. 8o, inciso XIII e art. 9o, inciso XIII), tais disposições sob pena de afronta a constituição, não podem vedar a atribuição comum para fiscalizar a órgão não licenciador, sobretudo quando verificada omissão.
Profícua a seguinte análise:
“Como a lei na?o tem palavras inu?teis e na?o admite contradiça?o, a interpretaça?o correta do texto leva a? conclusa?o de que na?o ha? limitaça?o dos demais entes quando se descreve as aço?es administrativas do responsa?vel pelo licenciamento. Quer o texto reafirmar que cabe ao ente licenciador “exercer o controle”. Ou seja, na?o pode o o?rga?o licenciador apenas autorizar, mas deve ter mecanismos e instrumentos adequados e eficientes para o controle conti?nuo das atividades potencialmente poluidoras. Este controle se faz tambe?m pelo instrumento da fiscalizaça?o. Mas e? obrigaça?o do ente licenciador organizar o aparato estatal para o controle conti?nuo e na?o episo?dico. O controle na?o pode se restringir ao momento do processo de licenciamento. Deve-se observar que aqui a LC 140/11 foi extremamente cautelosa em prever expressamente esta obrigaça?o do ente licenciador, sem afastar, em nada, a obrigaça?o de fiscalizaça?o comum e geral que cabe a todos os entes da federação.”[3]
Não existente solução adequada na lei, o intérprete deve buscar outro critério pautado nas disposições constitucionais sobre a atividade administrativa. De certo que em casos como os aqui analisados, deve-se priorizar a atuação pelos órgãos ambientais de atividades ainda não fiscalizadas, ocorre que as diversas situações vividas na prática levam a outra conclusão.
Sem sombra de dúvidas o ente fiscalizatório mais atuante, em que pese as deficiências estruturais é o IBAMA. Deparando-se com um desmatamento em sobrevôo de atividade licenciável por órgão estadual mister se faz sua pronta atuação, sobretudo em caso de iminente necessidade de aplicação de medidas cautelares. Tal atividade não impede que o órgão competente para o licenciamento se movimente. Em tais casos qual o critério deve ser aplicado?
Como não há motivos justificáveis para se vincular as atividades fiscalizato?rias e licenciato?rias é teleologicamente justificável a adoção de Princi?pios Administrativos, tais como o da eficiência, da celeridade e da economia processual.
Pugna-se pelo aproveitamento de atos instruto?rios ja? realizados no processo administrativo mais avançado, ou seja, ha? de prevalecer o auto de infração primeiramente lavrado, aplicando se o crite?rio cronolo?gico na verificação da “prevalência”.
Neste passo: atividade não licenciada, lavrando-se dois autos de infração, prevalece o auto lavrado em primeiro lugar. Esta conclusão importa em franco respeito a vedação do retrocesso das atividades já desenvolvidas a celeridade processual e a eficiência. Ainda, não colide com a regra de prevalência anterior (licença-fiscalização) eis que naquele caso a razão técnica e de conhecimento prévio afiançam aquela escolha. No presente caso, não há licença previa, no sentido leigo do termo.
O recurso ao critério cronológico não é novidade em tema de solução de questões jurídicas.
A exigência de coordenaça?o sistema?tica aqui proposta, que garante a prevalência da fiscalização primeiramente realizada, atende tambe?m a?s ana?lises desenvolvidas no campo da doutrina. Paulo de Bessa Antunes, por exemplo, afirma que o art. 23 da Constituição Federal especifica as competências comuns, veiculando um comando constitucional para a colaboraça?o administrativa entre as diferentes esferas poli?tico-administrativas. Tal colaboraça?o, segundo o autor, obviamente deve ser feita com base em uma racionalidade que possa ser extrai?da do texto constitucional e que, evidentemente, indique a necessidade de que os serviços sejam prestados da forma mais eficiente possi?vel e com a maior economia de recursos pu?blicos. [4]
Em suma, em casos de atividades licenciáveis, em que pese ser recomendável a fiscalização pelo órgão licenciador aplicando-se o modelo cooperativo/comunicativo entre os órgãos de diversas esferas, não se pode vedar a atuação dos demais entes, sobretudo em operações já iniciadas; em casos de medidas cautelares urgentes ou em caso de inércia após as tratativas de comunicação. Até porque, entendimento contrario afrontaria o texto constitucional e, por ausência de opção legislativa, deve-se utilizar o critério cronológico de autuação, em nome dos princípios administrativos aplicáveis e da boa técnica jurídica.
Percebe-se assim que a atuação fiscalizatória jamais pode ser estanque, aniquilando a atividade de outro ente. Deve, sim, buscar a cooperação e a máxima eficiência, atingida sem sombra de dúvida pela aplicação do critério cronológico em caso de ausência de licença, aproveitando-se eficazmente todo o movimento da maquina estatal anteriormente produzido.
2.3. ATIVIDADES NÃO LICENCIÁVEIS:
A existência de demanda fiscalizatória abrange um sem-número de situações praticas no cotidiano social, basta remetermos ao conceito de poder de policia para chegarmos a esta conclusão. Como já dito, o art. 17 da LC 140/2011 não é exaustivo, traça limites razoáveis e cooperativos ao exercício da fiscalização comum no caso de atividades licenciadas, não abraçando os casos “licenciáveis mas não licenciados ”e os “não licenciáveis”.
Nesta categoria aqui estudada imaginemos a pesca com explosivos ou a caça, ambas vedas em nosso ordenamento, portanto, impossíveis de licenciamento. No entanto, ninguém olvida que tais atividades podem existir no mundo dos fatos e, por obvio, merecem a devida repressão administrativa, civil e até penal. Fiquemos no aspecto administrativo.
Como o campo de atuação da regulamentação destina-se a atividades licenciadas, a competência fiscalizatória aqui deve ser feita de forma plena, sem qualquer limitação aos entes federados.
Com a fiscalizac?a?o busca-se, muitas vezes, cessar o dano ambiental em regime de urge?ncia, sendo que tal importante mister na?o possui crite?rio ri?gido de definic?a?o de atuac?a?o, o que se manteve no caso de atividades na?o sujeitas a procedimento administrativo licenciato?rio, raza?o pela qual podera? ser exercido por qualquer ente federado. Assim, a interpretac?a?o do art. 23, no que tange a ac?o?es na?o licencia?veis, deve ser feita de forma ampliativa, no sentido de que a desejada ac?a?o seja exercida cumulativamente por todos os entes federativos. [5]
Desta feita, em que pese não ser salutar o dispêndio de recursos públicos já escassos na fiscalização repetida de atividades e ser consentâneo com o princípio da eficiência exatamente o contrario, em harmonia com os princípios de cooperação erigidos pela própria LC 140/2011, inevitável em certa medida que a sobreposição ocorra faticamente.
Em ocorrendo dois autos em face da mesma infrac?a?o administrativa, sendo esta na?o sujeita a licenciamento ambiental, impo?e-se a prevale?ncia do primeiro auto cronologicamente lavrado, pelas mesmas razo?es e considerac?o?es ja? apresentadas, em relac?a?o a?s atividades na?o efetivamente licenciadas traçadas no tópico anterior.
2.4. MEDIDAS CAUTELARES FISCALIZATÓRIAS:
Há determinadas infrações administrativas que, pela sua natureza, tendem a prolongar-se no decurso do tempo, não se consumando em um único ato e tendo potencial de causar danos recorrentes. São denominadas, em razão desta peculiaridade, de infrações continuadas.
Imaginemos o despejo continuo de um substância tóxica em um rio ou, mais consentâneo com a região amazônica, a utilização fraudulenta de empresa comercializando madeiras provenientes de desmatamentos irregulares, utilizando-se de guias florestais com dados falsos.
No primeiro caso a suspensão das atividades e no segundo, o bloqueio de uso dos sistemas virtuais de compra e venda de produto florestal são medidas impositivas. (embargo)
Assim, a Administração Pública deve preocupar-se não apenas em aplicar a sanção correspondente, mas também em garantir a imediata cessação da prática ilícita.
Justamente para estas hipóteses é que o decreto 6.514/08, regulamentando a lei 9505/98, trouxe a previsão de determinadas medidas administrativas que se prestam a paralisar uma determinada prática ilegal, como é o caso da medida administrativa de embargo/interdição de atividade.
O Decreto Federal nº 6.514/2008 é claro ao determinar, no art. 101 (caput, inciso II e §1º), que poderá ser adotada, na ocasião da constatação da infração administrativa, pelo próprio agente autuante, no uso do seu poder de polícia, bem como que tal medida tem como objetivo prevenir a ocorrências de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo, além de visar (artigo 110 do decreto nº 6.514/08) impedir a continuidade de processos produtivos em desacordo com a legislação ambiental.
Nesse sentido, vale transcrever as linhas de Wagner Antônio Alves que assim leciona:
O princípio da prevenção tem guarida, principalmente, na imposição de medidas administrativas que impedem a efetivação do dano. Como os efeitos da atividade lesiva já são conhecidos, a utilização do princípio da prevenção fica mais adstrita ao controle administrativo e criminal dos agentes passíveis de causar danos ambientais.[6]
Nessa mesma esteira de entendimento, a jurisprudência consagra o princípio da precaução na hipótese de se proteger bens ambientais, dada a irreversibilidade dos danos, como fundamento para a suspensão das atividades econômicas exercidas por pessoas físicas e jurídicas autuadas por prática de ilícitos contra o meio ambiente.
Digno de registro que não se deve confundir medidas de policia com sanção devidamente aplicada. As primeiras, aplicadas de forma prévia dada a urgência de intervenção, constituem-se definitivamente após o curso do processo administrativo e são de legalidade e necessidade amplamente reconhecida em jurisprudência e doutrina.
Sobre o tema, eis o que dispõe a LC no 140/11:
Art.17.
(...)
§ 2o Nos casos de imine?ncia ou ocorre?ncia de degradac?a?o da qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato devera? determinar medidas para evita?-la, fazer cessa?-la ou mitiga?-la, comunicando imediatamente ao o?rga?o competente para as provide?ncias cabi?veis.
O o?rga?o ambiental que tomar conhecimento da situac?a?o de risco, ainda que na?o seja o ente licenciador competente (em caso de atividades licencia?veis ou licenciadas), devera? agir de imediato. Na?o sendo sua a atribuic?a?o prima?ria para tanto, cabera? ao atuante comunicar o o?rga?o competente as das medidas inicialmente adotadas.
Tal comunicação poderá surtir conseqüências de diferentes efeitos. Como visto acima, em caso de atividade na?o licencia?vel ou na?o licenciada, o ente ambiental que atuou primeiro vai ver prevalecido o seu auto de infrac?a?o ambiental e, consequentemente, as medidas cautelares eventualmente aplicadas.
De outra banda, caso o empreendimento autuado esteja efetivamente licenciado por outro ente, o o?rga?o na?o licenciador, diante da constatac?a?o de infrac?a?o, podera?, adotar duas medidas: (i) Lavrar desde ja? auto de infrac?a?o, que ser arquivado, em caso de lavratura de outro auto por parte do o?rga?o primariamente competente; ou (ii) Deixar de lavrar o competente auto e comunicar ao o?rga?o licenciador acerca da irregularidade constatada, para possi?vel atuac?a?o.
Nesta segunda hipótese aplicar-se-á a literalidade do disposto no art. 17 § 2° da LC140/11. Lavra-se o auto, faz-se as comunicações devidas, inclusive com prazo para providências, que em caso de inércia chamam novamente a aplicação sistemática das regras de competência comum, podendo-se lavrar o respectivo auto de infração pelo órgão supletivo.
Chama-se a atenção para os casos de lavratura de auto pelo órgão licenciador e para a emissão de posicionamento te?cnico no sentido da inocorre?ncia da infrac?a?o ambiental ou da inexiste?ncia/cessac?a?o das razo?es que motivaram a realizac?a?o da medida de urgência, situac?o?es que ensejam o imediato cancelamento da medida administrativa anteriormente adotada , pois, não configuram inércia do órgão.
Por fim, em se tratando de medias de policia, urge anotar que jamais se pode desfazer o que não tem volta. Falamos das medias que exauriram seus efeitos. O retorno de peixes ao seu habitat ou a demolição de uma obra, como exemplos.
Nesses casos de efeitos exauridos o processo devera? prosseguir perante o o?rga?o que a aplicou, exclusivamente para julgamento das medidas acautelato?rias, nos termos do que dispo?e o art. 124, § 1o, do Decreto 6.514/0819, comunicando-se ao o?rga?o licenciador-primeiro fiscalizador a exaurie?ncia da medida suma?ria adotada. Tal fato se impõe inclusive para eventual responsabilização do ente que aplicou a medida.
3. CONCLUSÕES:
Diante de toda a abordagem realizada cremos que as principais idéias a nortear o intérprete sejam as seguintes:
1. A competência comum dos entes federados jamais pode ser amesquinhada ou vedada por completo.
2. Qualquer lei que regulamentar o tema deve obediência a diretriz acima fixada, tratando apenas de harmonizar as atividades.
3. A LC 140/2011 tratou no seu art. 17 e parágrafos de estabelecer critério de prevalência em casos de atividades efetivamente licenciadas.
4. As atividades licenciáveis mas não licenciadas e as que não se submetem a processo licenciátorio podem ser exercidas de forma ampla, prevalecendo a primeira autuação.
5. Quanto as medidas cautelares deve-se observar, em regra, as mesmas disposições quanto ao auto de infração, com a atenção para as medidas que já exauriram seus efeitos, as quais, devem prosseguir no órgão que as exerceu.
Bibliografia:
TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanço?es e processo administrativo, 2° ed. Editora Forum.
LEME, Paulo Affonso Machado. Direito Ambiental Brasileiro. 16 ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
MILARE?, E?dis. Direito do ambiente: a gesta?o ambiental em foco: doutrina, jurisprudencia, glossa?rio. 7. Ed. rev., atual., e reform. Sa?o Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e competências ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
[1] Direito Ambiental Brasileiro. 16 ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 327 e 328.
[2] MILARE?, E?dis. Direito do ambiente: a gesta?o ambiental em foco: doutrina, jurisprudencia, glossa?rio. 7. Ed. rev., atual., e reform. Sa?o Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. P. 1135
[3] PEREIRA, Henrique Albino. Competência para fiscalizar na Lei Complementar no 140/11. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3363, 15 set. 2012 . Disponi?vel em: <http://jus.com.br/revista/texto/22623>. Acesso em: 15 12. 2013.
[4] Federalismo e competências ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 183-184
[5] MILARE?, Edis. Direito do Ambiente. 6. ed. rev. atual. e ampl. Sa?o Paulo: RT, 2009, p. 881.
[6] Princípios da Precaução e da Prevenção no Direito Ambiental Brasileiro. Editora Juarez de Oliveira, 2005.
Procurador- AGU/PGF. Pós-graduação em Advocacia Pública (2015) - Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Coimbra. Pós-Graduação em Direito Processual Civil (2009) - PUC/SP. Graduado em Direito pela Universidade da Amazônia- UNAMA (2002). Atuação profissional na área cível, em direito público, com destaque para Direito Ambiental, Tributário, Administrativo, Constitucional.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NORAT, Ygor Villas. Poder de policia ambiental: superposições de autuações por parte dos entes federados Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 fev 2014, 06:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38225/poder-de-policia-ambiental-superposicoes-de-autuacoes-por-parte-dos-entes-federados. Acesso em: 27 dez 2024.
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
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