RESUMO: O presente estudo versa sobre a execução fiscal, notadamente os requisitos da Certidão de Dívida Ativa (CDA) e a possibilidade de sua substituição ou emenda durante o processamento dos embargos apresentados pelo executado. Visa a cotejar o entendimento doutrinário e jurisprudencial quanto à matéria, à vista da legislação pertinente e dos princípios gerais do direito tributário, expondo-o com a devida clareza e objetividade.
Palavras-chave: Execução fiscal – CDA – substituição – emenda – possibilidade.
INTRODUÇÃO
A execução fiscal é espécie do gênero processo de execução, regulada pela Lei nº 6.830, de 22 de setembro 1980, e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. O título extrajudicial que ampara a aludida ação executiva é a certidão de dívida ativa, documento produzido pela própria Fazenda Pública que contém todos os dados básicos sobre o crédito, em fiel observância à legislação pertinente.
O presente ensaio visa a discutir a possibilidade de substituição ou emenda da Certidão de Dívida Ativa (CDA) no curso do processo de execução fiscal, com as respectivas consequências processuais, à vista dos modernos princípios informadores da matéria, da legislação de regência e, sobretudo, do entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça.
DESENVOLVIMENTO
1. Certidão de dívida ativa e defesa do executado
A inscrição na dívida ativa se constitui no ato de controle administrativo de legalidade necessário para autorizar a emissão da Certidão de Dívida Ativa (CDA), segundo o §3º do art. 2º da Lei de Execuções Fiscais (LEF). A Certidão de Dívida Ativa (CDA), por sua vez, é o título executivo apto a aparelhar a futura execução fiscal, gozando, como tal, dos atributos de certeza, liquidez e exigibilidade. Decorre, como visto, do termo de inscrição na dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, o qual, na dicção do art. 202 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66), indicará obrigatoriamente:
I - o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros;
II - a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos;
III - a origem e natureza do crédito, mencionada especificamente a disposição da lei em que seja fundado;
IV - a data em que foi inscrita;
V - sendo caso, o número do processo administrativo de que se originar o crédito.
Regularmente inscrita, a CDA goza da presunção relativa de certeza e liquidez, consoante estabelece o art. 3º, parágrafo único, da LEF, in verbis:
Art. 3º - A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez.
Parágrafo Único - A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.
A presunção, como se denota, é relativa, servindo para inverter o ônus da prova. Ou seja, caberá ao sujeito passivo demonstrar a incerteza ou iliquidez da CDA. Por conta dessa presunção é que o STJ entende que, quando o nome do sócio já consta na CDA, caberá ao sujeito passivo demonstrar que não agiu com violação a dispositivo de lei, excesso de poder ou violação ao contrato para que a execução não seja “redirecionada” contra ele:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO À SISTEMÁTICA PREVISTA NO ART. 543-C DO CPC. EXECUÇÃO FISCAL. INCLUSÃO DOS REPRESENTANTES DA PESSOA JURÍDICA, CUJOS NOMES CONSTAM DA CDA, NO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE. MATÉRIA DE DEFESA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INVIABILIDADE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
1. A orientação da Primeira Seção desta Corte firmou-se no sentido de que, se a execução foi ajuizada apenas contra a pessoa jurídica, mas o nome do sócio consta da CDA, a ele incumbe o ônus da prova de que não ficou caracterizada nenhuma das circunstâncias previstas no art. 135 do CTN, ou seja, não houve a prática de atos "com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos". 2. Por outro lado, é certo que, malgrado serem os embargos à execução o meio de defesa próprio da execução fiscal, a orientação desta Corte firmou-se no sentido de admitir a exceção de pré-executividade nas situações em que não se faz necessária dilação probatória ou em que as questões possam ser conhecidas de ofício pelo magistrado, como as condições da ação, os pressupostos processuais, a decadência, a prescrição, entre outras. 3. Contudo, no caso concreto, como bem observado pelas instâncias ordinárias, o exame da responsabilidade dos representantes da empresa executada requer dilação probatória, razão pela qual a matéria de defesa deve ser aduzida na via própria (embargos à execução), e não por meio do incidente em comento. 4. Recurso especial desprovido. Acórdão sujeito à sistemática prevista no art. 543-C do CPC, c/c a Resolução 8/2008 - Presidência/STJ. (grifos nossos)
(STJ, Primeira Seção, REsp 1.104.900, Rel. Min. Denise Arruda, j. 25/03/2009, DJ 01/04/2009)
Observe-se que, nessa hipótese, consoante tese firmada no julgamento do recurso repetitivo (art. 543-C, CPC) reproduzido supra, a matéria de defesa deve ser aduzida pela via dos embargos à execução, uma vez que a exceção de pré-executividade só é admissível quando a matéria for cognoscível de ofício pelo magistrado ou não se fizer necessária dilação probatória.
2. Emenda ou substituição da CDA
Como se denota, a certidão de dívida ativa é um título formal, devendo ter seus elementos bem caracterizados para que se assegure a ampla defesa do executado. Assim, é necessário que a CDA contenha a descrição do fato gerador, bem como o respectivo fundamento legal e a data de inscrição do débito, sob pena de nulidade, justamente por arrostar a aludida garantia da ampla defesa.[1]
A Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/1980), precisamente em seu art. 2º, § 8º, estatui, todavia, a possibilidade de a CDA ser emendada ou substituída até a decisão de primeira instância, assegurando-se ao executado a devolução do prazo para a apresentação de embargos. No mesmo sentido é a previsão contida no art. 203 do Código Tributário Nacional, segundo o qual a omissão de quaisquer dos supramencionados requisitos contidos no art. 202 do mesmo diploma normativo, ou o erro a eles relativo, é causa de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente.
A nulidade, porém, “poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula, devolvido ao sujeito passivo, acusado ou interessado o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada” (art. 203, CTN).
Interpretando os referidos dispositivos, a jurisprudência consolidou o entendimento de que a certidão de dívida ativa pode ser substituída tão somente em caso de erro material ou formal, não se admitindo a modificação do sujeito passivo da execução. Ainda, a decisão de primeira instância à qual fazem referência a Lei de Execuções Fiscais e o Código Tributário Nacional é a sentença que julga os embargos do devedor[2] ou a exceção de pré-executividade, extinguindo a execução. Estes são os limites materiais e temporais à referida substituição, inteligência que se extrai da Súmula n° 392 do Superior Tribunal de Justiça, publicada no DJe de 07/10/2009, in verbis:
A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução.
Consentânea com a legislação pertinente, a jurisprudência dominante do STJ não admite a extinção da execução fiscal com base na nulidade da CDA sem antes ser oportunizada à Fazenda Pública a emenda ou substituição do título, conforme se extrai do seguinte julgado, da lavra do E. STJ:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. SUBSTITUIÇÃO OU EMENDA DA CDA. POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte é assente no sentido da possibilidade de se emendar ou substituir a CDA por erro material ou formal do título, até a prolação da sentença de embargos, desde que não implique modificação do sujeito passivo da execução, nos termos da Súmula 392 do STJ. 2. Entendimento ratificado pela Primeira Seção, ao julgar o REsp 1.045.472/BA, sob o regime do artigo 543-C do CPC. 3. Assim, não é viável a extinção da execução fiscal com base na nulidade da CDA sem antes oportunizar à Fazenda Pública emendar ou substituir o título. 4. Recurso especial provido. (grifos nossos)
(STJ, 2ª Turma, REsp 200800339763, Rel. Min, Mauro Campbell Marques, j. 19/08/2010, DJ 28/09/2010)
Cumpre observar, pois, que não há, em tal situação, extinção da execução, mantendo-se seu regular procedimento, com a substituição ou emenda da certidão de dívida ativa. Como não há extinção da execução, não há, por óbvio, sucumbência contra a Fazenda Pública[3].
3. CONCLUSÃO
Ante o exposto, conclui-se que, tratando-se de erro material ou formal, é admissível a manutenção do processo de execução, efetuando-se apenas o reparo da inscrição e a substituição da certidão, se o vício for suscitado e reconhecido antes da decisão de primeira instância no processo dos embargos à execução.
Logo, verificando-se, por exemplo, ausência de menção aos dispositivos legais nos quais se funda o crédito (tributário ou não tributário) que está sendo executado, bem como não havendo referência à data da inscrição do crédito em dívida ativa, mencionada execução fiscal não está necessariamente fadada ao insucesso. Deve-se, pois, em homenagem aos princípios da economia e da celeridade processuais, ante todo o conjunto de ideias acima colacionado, oportunizar à Fazenda Pública emendar ou substituir o título, de modo a possibilitar o regular processamento da execução[4], devolvendo-se ao sujeito passivo o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada.
4. REFERÊNCIAS
BRASIL, Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Legislação Federal. Disponível em: planalto.gov.br. Acessado em: 27 de fevereiro de 2014.
BRASIL, Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. Lei de Execução Fiscal. Legislação Federal. Disponível em: planalto.gov.br. Acessado em: 27 de fevereiro de 2014.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.104.900, proferido pela Primeira Seção. Relatora: Min. Denise Arruda. Data do julgamento: 25 mar. 2009. Data da publicação: 01 abr. 2009.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 200800339763, proferido pela Segunda Turma. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Data do julgamento: 19 ago. 2010. Data da publicação: 28 set. 2010.
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5. ed. São Paulo: Método, 2011.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2010.
ROCHA, João Marcelo. Direito Tributário. 7. ed. Rio de Janeiro: Ferreira, 2009.
[1] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 366.
[2] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5. ed. São Paulo: Método, 2011. p. 548.
[3] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 368.
[4] ROCHA, João Marcelo. Direito Tributário. 7. ed. Rio de Janeiro: Ferreira, 2009. p. 506.
Advogado. Graduado pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIRA, Frederico Jorge Magalhães Pereira de. Limites temporais e materiais à substituição da CDA no curso da execução fiscal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 mar 2014, 18:51. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38523/limites-temporais-e-materiais-a-substituicao-da-cda-no-curso-da-execucao-fiscal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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