1. INTRODUÇÃO
O presente artigo se propõe a demonstrar a impossibilidade da incidência do imposto de renda sobre o adicional constitucional do terço de férias, por tratar-se de verba de natureza indenizatória, em consonância com a iterativa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça.
2. DA RETENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA SOBRE O ADICIONAL DO TERÇO DE FÉRIAS
A instituição do imposto em questão encontra supedâneo no artigo 146, inciso III, alínea “a”, e artigo 153, inciso III, da Constituição da República de 1988.
O artigo 43 do Código Tributário Nacional, norma geral em matéria tributária, dispõe que o imposto de renda tenha como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de proventos de qualquer natureza, sendo que define “renda” como “o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos” e “proventos de qualquer natureza” como “os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior”.
O terço constitucional de férias possui, tanto para efeito de contribuição previdenciária - conforme já decidido pelos Tribunais Superiores -, como para o Imposto de Renda - natureza jurídica indenizatória, que somente pode incidir em pagamentos que configuram aumento de riqueza ou aumento patrimonial, estando isentas, portanto, as parcelas indenizatórias.
O Supremo Tribunal Federal já se manifestou no sentido de que "somente as parcelas incorporáveis ao salário do servidor sofrem a incidência da contribuição previdenciária. Agravo regimental a que se nega provimento". (STF, Segunda Turma, AI nº 603537/DF, Rel. Min. Eros Grau, decisão de 27/02/2007, DJ de 30/03/2007, p. 92, decisão unânime).
Cabe lembrar, por oportuno, que a natureza jurídica do adicional de férias foi consignada no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº. 545.317-1 DF, do Supremo Tribunal Federal, que analisava a incidência da Contribuição Previdenciária sobre o adicional de férias, através do voto Ministro Gilmar Mendes:
“(...)
Portanto, a decisão foi proferida em consonância com iterativa jurisprudência de contribuição previdenciária sobre o adicional de férias e horas extras, por tratar-se de verbas indenizatórias. Nesse sentido, o RE 345.458, 2ª T., Rel. Ellen Gracie, DJ 11.3.2005, e o RE-AgR 389.903, 1ª T., Rel. Eros Grau, DJ 5.5.2006 ...”
Isto porque o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº. 603.537-7/DF, de Relatoria do Ministro Eros Grau, ao dar interpretação aos textos legais sobre a matéria, reconheceu expressamente a natureza compensatória/indenizatória do terço constitucional de férias. Cite-se o excerto da referida decisão:
2. Quanto à questão relativa à percepção do abono de férias e à incidência da contribuição previdenciária, a jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que a garantia de recebimento de, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal no gozo das férias anuais (CB, artigo 7º, XVII) tem por finalidade permitir ao trabalhador “reforço financeiro neste período (férias)” [RE nº 345.458, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 11.3.05], o que significa dizer que a sua natureza é compensatória/indenizatória. Ademais, conforme dispõe o artigo 201, § 11, da Constituição, “os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei”. (g.n.) (AgRg AI 603.537-7/DF, Relator Ministro Eros Grau, 2ª Turma, Publicado no DJ de 30/3/2007)
Vale ainda mencionar a decisão proferida no Agravo Regimental em Recurso Extraordinário nº. 545.317-1/DF, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, em que se reiterou a natureza indenizatória do terço constitucional de férias, cuja ementa transcreve-se abaixo:
EMENTA: Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Prequestionamento. Ocorrência. 3. Servidores públicos federais. Incidência de contribuição previdenciária. Férias e horas extras. Verbas indenizatórias. Impossibilidade. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 545317 AgR, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 19/02/2008, DJe-047 DIVULG 13-03-2008 PUBLIC 14-03-2008 EMENT VOL-02311-06 PP-01068 LEXSTF v. 30, n. 355, 2008, p. 306-311) (g.n.)
Há também vários outros precedentes do STF no mesmo sentido, dentre os quais se destacam o AgRg no AI 712.880-6/MG, DJe 11/9/2009; AgRg no AI 710.361-4/MG, DJe 8/5/2009; AgRg no AI 727.958-7/MG, DJe 27/2/2009; e AgRg no RE 589.441-0/MG, DJe 6/2/2009.
Com efeito, para o Pretório Excelso, não há se cogitar em incidência de contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias devido à sua natureza indenizatória.
Por ocasião do julgamento da Petição nº 7.296/PE, em 10 de novembro de 2009, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Primeira Seção, evoluiu seu posicionamento jurisprudencial no sentido da não incidência tributária sobre o terço constitucional de férias, tendo em vista sua natureza jurídica indenizatória. Veja-se o voto da Ministra Eliana Calmon a este respeito:
“O Supremo Tribunal, examinando a questão, concluiu pela não-incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias.
Na apreciação das teses em confronto parece-me pertinente examinar ontologicamente a exação.
A Constituição de 1988, no capítulo dedicado aos Direitos Sociais, estabeleceu como direito básico dos trabalhadores urbanos e rurais o gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do salário normal (art. 7º, XVII), vantagem que veio a ser estendida aos servidores ocupantes de cargos públicos, como consta do § 3º do art. 39, da Carta Magna.
O adicional outorgado tem por escopo proporcionar ao trabalhador (lato sensu), no período de descanso, a percepção de um reforço financeiro, a fim de que possa usufruir de forma plena o direito constitucional do descanso remunerado.
A partir da finalidade do adicional é que se desenvolveu a posição jurisprudencial do STF, cujo início está no julgamento do RE 345.458/RS (Segunda Turma, DJ 01/02/2005), em que a relatora, Min. Ellen Gracie, analisando a constitucionalidade da redução do período de férias de procuradores autárquicos, consignou, em obter dictum, que o abono de férias era espécie de "parcela acessória que, evidentemente, deve ser paga quando o trabalhador goza seu período de descanso anual, permitindo-lhe um reforço financeiro neste período". A partir daí firmou-se na Corte o entendimento pela não-incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias, ao fundamento de que a referida verba detém natureza compensatória/indenizatória e de que, nos termos do art. 201, § 11, da CF/88 (Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei), somente as parcelas incorporáveis ao salário do servidor para fins de aposentadoria sofrem a incidência da contribuição previdenciária.
O entendimento está consignado em diversos julgados, dentre os quais destaco os seguintes:
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. INCIDÊNCIA SOBRE TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
I - A orientação do Tribunal é no sentido de que as contribuições previdenciárias não podem incidir em parcelas indenizatórias ou que não incorporem a remuneração do servidor.
II - Agravo regimental improvido.
(AI 712.880/MG, Rel. Ministro Eros Grau, Segunda Turma, DJ 26/05/2009).
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO (SÚMULAS 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL). IMPOSSIBILIDADE DA INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. A matéria constitucional contida no Recurso Extraordinário não foi objeto de debate e exame prévios no Tribunal a quo. Tampouco foram opostos embargos de declaração, o que não viabiliza o extraordinário por ausência do necessário prequestionamento.
2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que somente as parcelas que podem ser incorporadas à remuneração do servidor para fins de aposentadoria podem sofrer a incidência da contribuição previdenciária.
(AI 710.361/MG, Rel. Ministra Carmen Lúcia, Primeira Turma, DJ 08/05/2009)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE AS HORAS EXTRAS E O TERÇO DE FÉRIAS. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
Esta Corte fixou entendimento no sentido que somente as parcelas incorporáveis ao salário do servidor sofrem a incidência da contribuição previdenciária.
Agravo Regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AI 727.958/MG, Rel. MINISTRO EROS GRAU, SEGUNDA TURMA, DJ 27/02/2009)
Reconhecendo o caráter indenizatório do terço constitucional de férias, já se manifestou também a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais no mesmo sentido, conforme exemplificam os seguintes julgados:
PROCESSUAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PRÓPRIA DO SERVIDOR PÚBLICO (PSS). ADICIONAL DE FÉRIAS OU TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. JUROS DE MORA. AUSÊNCIA DE INTERESSE. NÃO CONHECIMENTO.
1. Não tendo o acórdão recorrido nada decidido acerca de juros de mora, não há legítimo interesse na solução de divergência inexistente.
2. Considerando que o adicional de férias, ou terço constitucional de férias, tem natureza indenizatória, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal, e cuidando-se de vantagem não extensível aos inativos, afigura-se ilegítima a incidência de contribuição previdenciária própria do servidor público (PSS) sobre esta verba.
3. Incidente parcialmente conhecido e não provido.
(TNU - PEDILEF 200783005371345 INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA - Relatora Juíza Federal Jacqueline Michels Bilhalva – DJ de 09/03/2009)
Assim, o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça e a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, entendem que o terço constitucional de férias possui natureza jurídica indenizatória/compensatória e, por corolário lógico, deve ser afastada a incidência do imposto de renda, porquanto tal verba não se constitui em renda para o contribuinte.
Como dito acima, o STF tem entendido que o adicional de 1/3 de férias não integra o conceito de remuneração, não devendo, pois, haver incidência de contribuição previdenciária. Precedentes: STF, AI-AgRg nº 603.537/DF, Rel. Min. Eros Grau, in DJU 30.03.2007; AGA 2007.01.00.000935-6/AM, Rel. Des. Fed. Maria do Carmo Cardoso, 8ª T., in DJ 18/07/2008; AC 1998.35.00.007225-1/GO, Rel. Conv. Juiz Fed. Mark Yshida Brandão, 8ª T., in DJ de 20/06/2008; AG nº 2008.01.00.006958-1/MA; Rel. Des. Federal Luciano Tolentino Amaral, Sétima Turma, e-DJ de 20/06/2008, p.208.
O TRF da 5ª Região também possui entendimento favorável semelhante:
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL. ADICIONAL DE 1/3 (UM TERÇO) DE FÉRIAS. CARÁTER INDENIZATÓRIO. HORAS EXTRAS. NATUREZA SALARIAL.
1 - O adicional de 1/3 (um terço) de férias gozadas não deve sofrer incidência de imposto de renda, tendo em vista sua natureza indenizatória e também por não integrar o salário do empregado. (STF. AI-AgR 727958. DJ, 27/02/09). [...]
3 - Apelação do particular, apelação da Fazenda Nacional e remessa oficial improvidas.
(TRF5 – Processo 00007113220124058302 - APELREEX - Apelação / Reexame Necessário – 25104 – Relator Desembargador Federal Sérgio Murilo Wanderley Queiroga – DJ de 29/11/2012)
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL. ADICIONAL DE 1/3 (UM TERÇO). VERBAS QUE NÃO INTEGRAM O SALÁRIO DO EMPREGADO. CARÁTER INDENIZATÓRIO. NÃO INCIDÊNCIA. PRESCRIÇÃO. DECENAL EM RELAÇÃO ÀS PARCELAS RECOLHIDAS ANTES DO ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR 118/2005. QUINQENAL EM RELAÇÃO AOS RECOLHIMENTOS EFETUADOS A PARTIR DA SUA VIGÊNCIA.
1 - O adicional de 1/3 (um terço) de férias gozadas não deve sofrer incidência de imposto de renda, tendo em vista sua natureza indenizatória e também por não integrar o salário do empregado. (STF. AI-AgR 727958. DJ, 27/02/09).
2 - Às parcelas recolhidas, indevidamente, antes do advento da Lei Complementar 118/2005, aplica-se a regra da prescrição decenal, enquanto que aos valores recolhidos a partir da entrada em vigor da referida norma, valerá a prescrição quinquenal.
3 - Apelação e remessa oficial improvidas.
(TRF5 - Processo 200983000198897 - APELREEX - Apelação / Reexame Necessário – 11991 – Desembargador Relator Paulo Gadelha – DJ de 02/12/2010)
A propósito do tema - e confirmando esse entendimento - o Juízo da 3ª Vara dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária do Tocantins, nos autos do Processo nº 0011108-13.2010.4.01.4300, julgou procedente o pedido formulado por servidora pública federal, condenando a União a restituir à autora as parcelas eventualmente descontadas do adicional de um terço constitucional de férias, a título de Imposto de renda, determinando à União que se abstivesse de proceder a futuros descontos do IRRF sobre o referido adicional. Por se tratar de verba tributária, também determinou a correção, pela taxa SELIC, dos valores indevidamente retidos até a data de expedição da requisição de pagamento (art. 39, § 4º, da Lei nº 9.250/95). Vejam-se, a propósito, as razões da aludida sentença:
“Assim, para saber se incide o IR, é necessário analisar a natureza jurídica do terço constitucional de férias, para verificar se realmente se trata de renda ou proventos novos, que configurem efetivamente acréscimo patrimonial, restando lícita a tributação se for verificado o caráter remuneratório da vantagem.
Pois bem. A garantia de um período de descanso ao trabalhador, assegurando-lhe neste interregno a percepção de sua remuneração, visa proporcionar-lhe a reposição das energias antes do início de um novo ano de trabalho.
Tendo as férias o escopo acima alinhado, a verba remuneratória suplementar constitucionalmente garantida visa, obviamente, proporcionar ao trabalhador recursos extras para a realização, da forma mais completa possível, das atividades a que se dedique no período em questão.
Assim, o terço constitucional constitui, na verdade, um reforço financeiro ao trabalhador a fim de que no período de férias possa realizar com mais desenvoltura todas as atividades a que se disponha, de modo que este espaço de tempo livre possa ser aproveitado de forma mais ampla e completa possível cumprindo com eficiência suas múltiplas finalidades.
Na medida em que se reconhece ser o terço constitucional de férias um reforço financeiro, admite-se possuir natureza jurídica puramente indenizatória, pois não se trata de contrapartida pelo trabalho realizado.
Portanto, o terço constitucional de férias tem natureza indenizatória. Não é outro o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
"INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. NATUREZA JURÍDICA. 1. O terço constitucional de férias tem natureza indenizatória e. portanto, não integra a base de incidência da contribuição previdenciária. 2. Precedentes da Primeira Seção (Pet. 7.296/PE. Rei. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009. DJe 10/11/2009). Incidente improvido”. (STJ Ia Seção. PET 200901836391. Relator Ministro Hamilton Carvalhido) houve grifo.
[Processo n° 0011108- 13.2010.4.01.4300. Juíza Federal Substituta Ana Paula Martini Tremarin. 3ª Vara/TO].
O Recurso Inominado interposto pela União nesse processo não surtiu efeito e a Turma Recursal ratificou, por unanimidade, a decisão de primeiro grau, nos termos do Acórdão abaixo transcrito:
EMENTA: PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. RESTITUIÇÃO. RECOLHIMENTO INDEVIDO. COMPROVAÇÃO. DECLARAÇÃO ANUAL DE AJUSTE. PRESCRIÇÃO. LC N° 118/2005. JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. SENTENÇA LÍQUIDA. TAXA SELIC. TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE FÉRIAS. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
[...]
II O terço constitucional de férias gozadas não é fato gerador de imposto de renda, em virtude do caráter indenizatório do referido valor que não caracteriza acréscimo patrimonial.
[...]
III A taxa SELIC incide na repetição do indébito desde o recolhimento indevido.
[...].
7. Sentença mantida pelos próprios fundamentos.
[...].
(Recurso Cível JEF n° 0011108-13.2010.4.01.4300, Relator o Juiz José Godinho Filho).
O voto que fundamentou o referido acórdão novamente citou o entendimento já sedimentado pelas Cortes Superiores deste país. Aduziu que, em pelo menos três recentes oportunidades, o STF e o STJ reconheceram a natureza indenizatória do adicional de férias. E, ainda, citou o voto proferido pelo Ministro Eros Grau no Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 389.903-1/DF, em 21/2/2006, que já havia definido tal natureza jurídica, ressaltando que se referia a "reforço financeiro neste período (férias)", e que sua natureza seria compensatória/indenizatória.
Também mencionou decisão proferida pela Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência - TNU em 22/5/2009, nos autos do Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 2006.51.51.050824-8:
"Não está difundido em âmbito internacional o direito ao adicional de 1/3 de férias existente no Brasil. Cuida-se de um direito peculiar ao direito brasileiro que aqui assume feição indenizatória por não ser razoável entender que um mês de interrupção do trabalho por férias possa ser remunerado com um adicional de 1/3 justamente pelo não-trabalho, ou seja, justamente quando o não-trabalho não está propiciando nenhum proveito econômico. Logo, o adicional de 1/3 de férias ostenta um caráter indenizatório porque, na dicção da Min. Ellen Gracie, serve de reforço financeiro para o custeio das despesas extraordinárias inerentes às férias. Na dicção do Min. Carlos Ayres Britto (em voto-vista)... o instituto jurídico do terço feriai se destina a qualificar as férias, a torná-las produtivas no sentido de oferecer ao servidor que se afasta do trabalho uma oportunidade de lazer. Lazer não significa não fazer nada, mas sim, um fazer recreativo, sabendo-se que sem recreação não há recriação. Este é o objetivo do terço feriai: qualificar as férias, propiciar ao servidor público a oportunidade de, por um sobreganho obtido neste mês, poder quebrar a sua rotina, a sua vida habitual, sem prejuízo do pagamento de suas despesas normais. "
Com espeque na publicação “A Constituição no atual entendimento dos Tribunais Federais", constante do site do próprio Tribunal[i], respectivamente, às págs. 163 e 164, extraímos igual inteligência:
Ementa: [...] 11 - Não incide o imposto de renda sobre as verbas indenizatórias, tais como as férias — proporcionais, abono pecuniário, terço constitucional — e as percebidas em razão de adesão a Programa de Incentivo à Aposentadoria, cujo recolhimento restou comprovado por documentos acostados aos autos. [...]
(TRF 4ª Região. APELREEX2007.70.00.032452-5/PR. Rel. Des. Federal Alvaro Eduardo Junqueira. 1ª Turma. Decisão: 13/08/2008. DE de 02/09/2008.)
Ementa: Tributário. Agravo regimental em agravo de instrumento. Contribuição previdenciária. Terço constitucional de férias. Não incidência. Somente as parcelas incorporáveis ao salário do servidor sofrem a incidência da contribuição previdenciária. Assim, não incide contribuição previdenciária sobre o abono constitucional de terço de férias, porquanto tais valores não se incorporam aos proventos de aposentadoria. [...]
(TRF 1ª Região. AGA 2008.01.00.018500-2/BA. Rel. Des. Federal Maria do Carmo Cardoso. 8ª Turma. Decisão: 15/08/2008. e-DJFl de 29/08/2008, p. 439.) [g.n.]
Existem também vários precedentes oriundos de Turmas Recursais de outros Estados:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE TERÇO DE FÉRIAS. VERBA SOBRE A QUAL O STJ E A TNUJEF´S SE PRONUNCIARAM NO SENTIDO DE SER DE CARÁTER INDENIZATÓRIO. ACRÉSCIMO PATRIMONIAL. NÃO OCORRÊNCIA. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO TRIBUTO NÃO VERIFICADA. IMPROVIMENTO DO RECURSO.
1. Havendo o Egrégio STJ e a TNUJEF´s firmado a tese, ao apreciar a incidência de contribuição previdenciária sobre terço de férias, de que dita verba tem natureza indenizatória e, sendo assente o entendimento no âmbito do STJ e do STF de que rendas percebidas a título de indenização não se sujeitam a imposto de renda, há de ser mantida a sentença perseguida, porquanto decidira conforme raciocínio supra.
2. A acepção “acréscimos patrimoniais” a que se reporta o inc. II, do art. 43, do CTN, ali aposta com o propósito de alargar a delimitação prevista no inc. I da hipótese de incidência do tributo a que se refere seu caput, não pode ser tomada de forma literal e indiscriminada, sob pena de sujeitar aos impostos quaisquer espécies de rendas, sem exceção, porquanto a idéia de percepção de renda é indissociável da de acréscimo patrimonial, máxime se consideradas estritamente os conceitos contábeis relativas a patrimônio e a letra fria da Lei.
3. Recurso conhecido e improvido.
(TR/SE - Processo nº 0502098-10.2012.4.05.8501 – Data da inclusão: 18/10/2012)
INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA SOBRE TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. VERBA DE NATUREZA INDENIZATÓRIA. RECURSO DA UNIÃO IMPROVIDO.
I. Trata-se de recurso contra a sentença que considerou o terço constitucional de férias tem natureza indenizatória, motivo pelo qual não deve incidir o Imposto de Renda.
II. Mantenho a sentença por seus próprios fundamentos.
III. Recurso improvido.
(TR/SE - Processo nº 0503717-72.2012.4.05.8501 – Data da inclusão: 07/12/2012)[ii]
Turma Recursal do Rio Grande do Norte - Processo nº 0501884-62.2011.4.05.8401
[...]
- De igual forma, o adicional de férias, ou terço constitucional de férias, tem natureza indenizatória, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal (AI 712880 AgR/ MG, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, J. em 26/05/2009, Primeira Turma; AI 710361 AgR / MG - Relator(a): Min. Cármen Lúcia, Julgamento: 07/04/2009. Primeira Turma), sendo, portanto, ilegítima a incidência do imposto de renda sobre essa verba.
(TR/RN - Processo nº 0501884-62.2011.4.05.8401 – Juíza Relatora GISELE MARIA DA SILVA ARAÚJO LEITE – Data da inclusão: 10/08/2012)
Corroborando tudo que ora se aduz, confira-se a propósito as razões de mérito da recente sentença prolatada pelo Juízo da 17ª Vara Federal Cível do Distrito Federal que, julgando procedente pedido formulado pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), condenou a União a restituir os valores indevidamente recolhidos a título de Imposto de Renda sobre as parcelas recebidas referentes ao terço constitucional de férias e a se abster de reter doravante o IR sobre as parcelas recebidas a esse título pelos magistrados associados àquela associação, verbis:
“(...)
ll.3.Mérito
No mérito, assiste razão à parte autora.
Conforme a decisão interlocutória que proferi, às fls. 207/210, o deslinde da controvérsia posta nos autos impõe determinar-se se o terço constitucional de férias constitui fato gerador do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza (IR).
O art. 43 do Código Tributário Nacional dispõe:
Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
l - de renda, assim entendido como o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; '
IL- de proventos de qualquer natureza, assim entendidos como acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
(...)
(grifos aditados)
Ora, se proventos de qualquer acréscimo patrimoniais não compreendidos no inciso anterior (inciso II), a decorrência lógica é que o inciso anterior, qual seja, o inciso I, se refere aos acréscimos patrimoniais compreendidos no conceito de renda. Depreende-se, pois, do dispositivo supratranscrito que ambas as hipóteses de incidência se perfazem com a existência de acréscimos patrimoniais, compreendidos ou não no conceito de renda. Vejo, destarte, que o elemento nuclear definição de fato gerador do IR são os acréscimos patrimoniais.
Nesse ponto, de se averiguar o que se entende, por “acréscimo patrimonial”.
A propósito, Leandro Paulsen ensina que:
"[a]créscimo patrimonial significa riqueza nova (...). Sendo o acréscimo patrimonial o fato gerador do Imposto de Renda, certo é que nem todo o ingresso financeiro implicará a sua incidência. Tem-se de analisar a natureza de cada ingresso para verificar se realmente se trata de renda ou proventos novos, que configurem efetivamente acréscimo patrimonial. As indenizações em geral (...) não configuram o falo gerador do Imposto de Renda.[iii]”
Comungo do mesmo entendimento. Entendo que, para fins de incidência do IR, acréscimo pressupõe incremento do patrimônio do sujeito passive da relação tributária, e não a mera recomposição per uma perda sofrida. Dai a conclusão inexorável de que uma parcela indenizatória não constitui fato gerador do imposto sobre a renda. Nesse ponto, a jurisprudência é bastante tranqüila[iv].
A maior dificuldade, entretanto, reside em se determinar a natureza jurídica do adicional de férias.
A jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça havia se firmado no sentido de que “[o]s valores recebidos por servidores públicos federais a título de terço constitucional de férias gozadas possuem natureza remuneratória, por isso, sobre eles incide Imposto de Renda” (REsp 1115996/RS, Relatora Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe 14/10/2009). Confira-se ainda: AgRg no REsp 1112877/SP, Rel. Min. LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJe 03/12/2010, AgRg no REsp 1305039/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 08/02/2013, REsp 1123760/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010.
O entendimento Tribunal Regional Federal da 1ª Região também se pacificara no sentido ora exposto. Anote-se, a saber: AC 0006935-56.2012.4.01.3400/DF, Relator o Desembargador Federal REYNALDO FONSECA, Relator Convocado o Juiz Federal NAIBER PONTES DE AILMEIDA, SÉTIMA TURMA, e-DJF1 de 01/02/2013.
Sucede que a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 727.058-7/MG, Relator o Ministro EROS GRAU, entendeu pela não incidência da contribuição previdenciária sobre o adicional de férias, “por tratar-se de verbas indenizatórias” (cf. voto do Relator, à fl. 2378).
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, no julgamento de Incidente de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais (Pet. n° 7.296/PE, Relatora a Ministra ELIANA CALMON, DJe de 10/11/2009), adotou a orientação exposta, restando o aresto assim ementado:
TRIBUTARIO E PREVIDENCIÁRIO - INCIDENTE DE UNIFORMIZACAO DE JURISPRUDÊNCIA DAS TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS - CONTRIBUICAO PREYIDENCIARIA - TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS - NATUREZA JURÍDICA - NÃO-INCIDENCIA DA CONTRIBUIÇÃO - ADEQUAÇÃO DA JURISPRUDENCIA DO STJ AO ENTENDIMENTO FIRMADO NO PRETÓRIO EXCELSO.
1. A Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais firmou entendimento, com base em precedentes do Pretório Excelso, de que não incide contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias.
2, A Primeira Seção do STJ considera legÍtima a incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias.
3. Realinhamento da jurisprudência do STJ à posição sedimentada no Pretório Excelso de que a contribuição previdenciária não incide sobre o terço constitucional de férias, verba que detém natureza indenizatória e que não se incorpora à remuneração do servidor para fins de aposentadoria.
4. Incidente de Uniformização acolhido, para manter o entendimento da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, nos termos acima explicitados.
(grifos aditados) `
No recente julgamento do REsp 1322945/DF, em 27/02/2013, Relator o Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 08/03/2013, a Primeira Seção do STJ, no que interessa; reafirmou o entendimento supramencionado quanto à não incidência de contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias. Extrai-se da ementa do julgado:
5. O Pretório Excelso, quando do julgamento do AgRg no AI 727.958/MG, de relatoria do eminente Ministro EROS GRAU, DJe 27.02.2009, firmou o entendimento de que o terço constitucional de férias tem natureza indenizatória. O terço constitucional constitui verba acessória à remuneração de férias e também não se questiona que a prestação acessória segue a sorte das respectivas prestações principais. Assim, não se pode entender que seja ilegítima a cobrança de Contribuição Previdenciária sobre o terço constitucional, de caráter acessório, e legítima sobre a remuneração de férias, prestação principal, pervertendo a regra áurea acima apontada.
6. O preceito normativo não pode transmudar a natureza jurídica de uma verba. Tanto no salário-maternidade quanto nas férias usufruídas, independentemente do título que lhes é conferido legalmente, não há efetiva prestação de serviço pelo Trabalhador, razão pela qual, não há como entender que o pagamento de tais parcelas possui caráter retributivo. Conseqüentemente, também não é devida a Contribuição Previdenciária sobre férias usufruídas.
7. Da mesma forma que só se obtém o direito a um benefício previdenciário mediante a prévia contribuição, a contribuição também só se justifica ante a perspectiva de sua retribuição futura em forma de benefício (ADI-MC 2.010, Rel. Min. CELSO DE MELLO); destarte, não há de incidir a Contribuição Previdenciária sob tais verbas. (grifos aditados)
É certo que o caso dos autos diz com a incidência de imposto de renda, e não de contribuição previdenciária. Entretanto, não se pode admitir que a natureza jurídica de uma verba transmude-se a depender do tributo em questão.
Assim é que concluo que o adicional de férias tem natureza indenizatória, forte no entendimento da Primeira Seção do STJ e da Segunda Turma do STF, não havendo, pois, falar-se em acréscimo patrimonial apto a caracterizar o fato gerador do IR”. (grifos constantes do original)
(Processo nº 11963-68.2013.4.01.3400. Juíza Federal Substituta Maria Cândida Carvalho Monteiro de Almeida. 17ª Vara Federal Cível/DF)
3. CONCLUSÃO
Não obstante alguns dos julgados colacionados tenham reconhecido a não-incidência das contribuições previdenciárias sobre o dito adicional, espécie de tributo diversa do imposto de renda, a razão determinante da não-incidência de uma e do outro é a mesma, qual seja, a natureza jurídica dos valores pagos a título de terço de férias.
Note-se que não há como se considerar que as verbas decorrentes do terço constitucional de férias sejam de natureza indenizatória para os fins de (não) incidência de contribuição previdenciária, e ao mesmo tempo ter natureza remuneratória para fins de incidência de Imposto de Renda.
Assim, deve prosperar o entendimento que propugna a não-incidência de imposto de renda sobre o pagamento do adicional de um terço de férias, ante sua natureza indenizatória já reconhecida pelos Tribunais Superiores[v].
[i] [TRF1 http://www.trf1.jus.br/Publicacao/Arquivos/ConstituicaoEntendimentoTF.pdf. acesso em 9/8/2012]
[iii] Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e jurisprudência, 15ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 749.
[iv] Id., p. 761.
[v] O fato gerador do imposto de renda é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica decorrente de acréscimo patrimonial, nos termos do art. 43 do CTN. Não se enquadra nesse conceito, portanto, as verbas de caráter indenizatório destinadas ao custeio de despesas relacionadas à atividade parlamentar. (STJ. Primeira Turma. AgRg no REsp 1269269/PE. Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA. Data Julgamento: 19/06/2012. Publicação: DJe 26/06/2012)
Procurador Federal. Graduado pela Faculdade de Direito do Recife/UFPE. Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito do Recife/UFPE .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VILBERTO DA CUNHA PEIXOTO JúNIOR, . Da não-incidência do imposto de renda sobre o adicional de férias Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 mar 2014, 06:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38551/da-nao-incidencia-do-imposto-de-renda-sobre-o-adicional-de-ferias. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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