No Brasil, a melhoria das condições sociais, como o avanço da medicina e o acesso a melhores recursos de saúde, fizeram com que a expectativa de vida da população aumentasse, permitindo que os trabalhadores passassem a laborar por mais tempo de suas vidas.
Com a inovação tecnológica e a oferta de mais bens de consumo, tornou-se necessário ter uma renda maior a fim de comprá-los, trazendo aos aposentados, com a redução de seus benefícios, a necessidade de se complementar suas rendas, perseverando no mercado de trabalho.
A mudança legislativa tornou o aposentado que continua a trabalhar um segurado obrigatório da Previdência Social, garantindo a ele apenas o salário-família e a reabilitação profissional e com a extinção do pecúlio, trouxe a necessidade de se criar uma maneira de aproveitar as contribuições pagas ao INSS após a aposentadoria.
Nesse contexto, desenvolveu-se o instituto da desaposentação, reconhecido apenas na doutrina e na jurisprudência, notadamente do Superior Tribunal de Justiça. Embora ainda carente de regulamentação legal, o que faz com que seja extirpada pelo INSS, trata-se de uma possibilidade a que podem se acudir os segurados que continuaram a trabalhar após sua aposentadoria.
É uma ferramenta importante na realização da justiça social e na busca pela efetivação de outros princípios constitucionais que passaram a ser explorados a seguir.
A APOSENTADORIA COMO DIREITO SOCIAL
Historicamente, os direitos fundamentais são agrupados conforme o seu surgimento. Nesse sentido, a doutrina os distingue em direitos de primeira geração, que são os direitos civis e políticos, que se dividem em: a) direitos de garantia, que são as liberdades públicas, de cunho individualista, como a liberdade de expressão e de pensamento, por exemplo; b) direitos individuais exercidos coletivamente: liberdades de associação, como a formação de partidos, sindicatos, direito de greve, por exemplo. Já, os direitos de segunda geração são os direitos sociais econômicos e culturais, constituindo herança socialista, a exemplo do direito ao bem estar social, direito ao trabalho, à saúde, à educação. De outra banda, os de terceira geração são direitos de titularidade coletiva, subdividindo-se em: a) no plano internacional: direito ao desenvolvimento e a uma nova ordem econômica mundial, direito ao patrimônio comum da humanidade, direito à paz; b) no plano interno: interesses coletivos e difusos, como, por exemplo, o direito ao meio-ambiente. [1]
Há uma forte discussão terminológica na doutrina acerca da utilização dos termos geração ou dimensão no processo de afirmação histórica dos direitos fundamentais. Paulo Bonavides[2] adotou o uso da expressão gerações para se referir a tal processo, no que é seguido por grande parte dos autores. Isso atrai a falsa compreensão de que o advento de uma nova geração viria a suplantar a anterior, dada por ultrapassada, o que não pode prosperar, uma vez que os direitos travam entre si uma relação de simultaneidade ou concomitância e não de sucessão ou superação. [3]
Nesta esteira, alguns autores[4] acabaram adotando a expressão dimensões, porém ela também não saiu ilesa às críticas, vez que tal palavra passaria a significar dois ou mais componentes do mesmo fenômeno, sendo que, ao revés, há casos em que há grupos de direitos fundamentais que se revelam ao mesmo tempo divergentes. Assim, passaram a sugerir o uso dos termos “famílias” ou “naipes”. [5] No entanto, no presente trabalho, tais expressões são empregadas como sinônimas.
Voltando ao foco quanto aos direitos sociais de segunda família, eles podem ser definidos como prestações positivas constitucionais, proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, que propiciam melhores condições de vida aos mais fracos, igualizando situações sociais desiguais, pertinentes, portanto, à igualdade. [6]
A Constituição Federal os enumera em seu artigo 6º, sendo a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. Destaque-se que devem ser garantidos na forma da própria Constituição. Assim, a Lei Maior também os disciplina em outros artigos, como 7º, 8º, 9º, 10 e 11, 193 (Ordem Social) e seguintes.
Os direitos sociais são classificados pela doutrina pátria, como: a) direitos sociais relativos ao trabalhador; b) direitos sociais relativos à seguridade, compreendendo os direitos à saúde, à previdência e assistência social; c) direitos sociais relativos à educação e à cultura; d) direito social relativo à família, criança, adolescente e idoso; e) direitos sociais relativos ao meio ambiente. ”[7]
O direito social à aposentadoria figura em dois itens desta classificação, considerando-se a partir da Constituição, sendo garantido como um direito social relativo ao trabalhador, constante de seu artigo 7º, inciso XXIV e um direito relativo à Previdência Social, tendo suas regras gerais tratadas a partir do artigo 193 e seguintes.
A aposentadoria é um benefício previdenciário, estatuída no artigo 201 da Constituição Federal, que pode ser conceituado uma prestação pecuniária, devida aos segurados de um regime de previdência, destinada a prover-lhes a subsistência, nas eventualidades que os impossibilite de, por seu esforço, auferir recursos para isto, ou a reforçar-lhes aos ganhos para enfrentar os encargos de família, ou amparar, em caso de morte ou prisão, os que dele dependiam economicamente. [8]
Da definição dada acima, verifica-se que ela visa substituir o salário ou a renda que o trabalhador tinha quando estava trabalhando. Não se trata de um prêmio, pois exige contribuição do trabalhador. Podem ser divididas em voluntárias e compulsórias, onde as primeiras dependem da vontade do segurado em requerer o benefício, como a aposentadoria por tempo de contribuição, por invalidez, especial, enquanto que as últimas ocorrem no serviço público, quando o servidor tem 70 anos e é obrigado a se aposentar. [9]
A aposentadoria pode ser definida como um benefício previdenciário disponível, cujo ato de requerimento e recebimento, concretiza a legítima expressão do princípio basilar da liberdade, e assim, a prática de tal direito pertence exclusivamente à discrição da pessoa, que, portanto, pode praticá-lo de acordo com circunstâncias pessoais. ”[10]
Pode ser requerida a qualquer tempo e sua concessão, dar-se-á somente quando forem preenchidos todos os requisitos postos pela legislação. A contrario sensu, por estar dentro do arbítrio da liberdade do segurado, caso este possua condições financeiras abastadas que propiciem condições de vida a contento, poderá nunca ser requerida, vigorando o princípio da solidariedade por excelência, pois o que contribuiu passará a custear os benefícios dos demais segurados.
Assim, como se percebe se o requerimento de aposentadoria é um ato voluntário – aposenta-se, somente quem deseja. A partir desta premissa, pode-se dizer que renunciar à condição de aposentado é um ato também voluntário, pois não pode ser uma obrigação ao segurado permanecer nesta condição, configurando a necessidade do instituto da desaposentação, a ser detalhado mais adiante.
Verifica-se que somente depois de cumpridos todos os requisitos legais, o segurado passará a fazer jus ao benefício e após a sua concessão, integrará a seara dos institutos do ato jurídico perfeito e da segurança jurídica.
Passa-se a abordar, em síntese, cada uma das espécies das aposentadorias garantidas pelo Regime Geral de Previdência, a fim de se analisar suas peculiaridades e a possibilidade de desaposentação.
ESPÉCIES DE APOSENTADORIAS
No Regime Geral de Previdência Social existem, basicamente, quatro espécies de aposentadorias, cada qual com seus próprios critérios, que são tratados na Lei n. 8.213/1991. Passar-se-á a analisar, em apertada síntese, a fim de que se possa ver o enquadramento da desaposentação, mais tarde, em cada uma delas.
A aposentadoria por invalidez é concedida ao segurado quando há incapacidade para o trabalho, sem perspectiva de reabilitação para o exercício de atividade capaz de lhe assegurar a subsistência. É tratata nos artigos 42 a 47 da Lei n. 8.213/1991.
É um benefício precário, pois o segurado em gozo deste benefício deve se submeter periodicamente a reavaliações. Só será definitiva quando o médico, a serviço do INSS, assim entender. Há proibição de retorno ao mercado de trabalho enquanto vigente o benefício, porém se tal situação for constatada, ele será cessado imediatamente. [11]
A aposentadoria por tempo de contribuição foi instituída com esta nomenclatura a partir da Emenda Constitucional nº 20/1998, sendo devida, conforme o texto constitucional, ao homem e à mulher, respectivamente, a partir de 35 anos e de 30 anos de contribuição.
Não há cobertura contra nenhum tipo de risco social, mas se constitui em benefício programável, uma espécie de compensação ou prêmio para o segurado que se manteve vinculado ao Regime Geral por um tempo dado. Pode-se, todavia, constatar que, indiretamente, acaba ofertando certo nível de proteção à situação de desemprego involuntário que acomete os trabalhadores de meia-idade, já que é justamente a faixa etária em que, no geral, se dá a aquisição do direito à aposentadoria por tempo de contribuição.[12]
A aposentadoria por idade é devida ao segurado que, cumprida a carência exigida legalmente, completar 65 anos de idade, se homem, ou 60 anos de idade, se mulher (redação dada pela Lei n. 9.032/95). Esses limites são reduzidos em cinco anos para os trabalhadores rurais de ambos os sexos conforme as regras especificadas no art. 201, parágrafo 7º, inciso II, da CRF B/88, com redação dada pela EC n. 20/98. Estes requisitos não precisam ocorrer simultaneamente.
A aposentadoria especial é uma espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, porém com redução do tempo necessário à inativação, concedida em virtude de atividades prejudiciais à saúde ou à integridade física, estabelecidas no Anexo IV do Decreto n. 3.048/99.
Por fim, cumpre ressaltar que a concessão da aposentadoria se perfaz por meio de ato da Administração Pública, ou seja, do órgão gestor da Previdência Social, o Instituto Nacional do Seguro Social, uma vez observados os requisitos legais do ordenamento jurídico pátrio no devido processo legal administrativo. A seguir, será possível ver em que hipóteses este ato administrativo pode ser renunciado, a fim de se obter uma nova aposentadoria mais vantajosa para o segurado.
O INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO
Segundo a doutrina, a desaposentação é o direito de o segurado retornar à atividade remunerada, com o desfazimento da aposentadoria por sua vontade, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário. [13]
Pode ser entendida também de uma maneira mais restrita, a fim de se aproveitar o tempo de filiação somente em outro regime, sendo definida como o desfazimento do ato administrativo concessivo da aposentadoria, no regime de origem, de forma a propiciar a contagem de tempo de contribuição prestado em outro regime. [14]
À luz da conceituação de Fábio Zambitte Ibrahim, ela traz a possibilidade de o segurado renunciar à aposentadoria com o propósito de obter benefício mais vantajoso, no regime geral de previdência social ou em regime próprio de previdência, mediante a utilização de seu tempo de contribuição, havendo melhoria de sua situação financeira. [15]
Portanto, a desaposentação pressupõe que o segurado renuncie ao seu benefício previdenciário vigente, a fim de obter outro com valor mais alto, conforme se verá adiante.
Em sendo a aposentadoria um direito patrimonial e subjetivo, decorrente da relação jurídico-previdenciária, considera-se, ontologicamente, um direito disponível. [16] Por estar na esfera de liberalidade do segurado, poderia ser renunciada a qualquer tempo, não havendo razão para oposição da Administração Pública.
Assim, entende-se que ninguém pode permanecer aposentado contra seu interesse. É perfeitamente possível ao segurado abdicar dos proventos, e não do tempo de contribuição que teve averbado, com o objetivo de obtenção futura de benefício mais vantajoso. [17]
A jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça, também adota estas afirmações, ao que se veja:
PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE.
1. Não há óbice legal à renúncia da aposentadoria previdenciária. A disposição do art. 58, parágrafo 2º, do Decreto 2.172/97, dada a sua natureza puramente regulamentar, não tem força para criar, extinguir ou modificar direitos, somente possível mediante lei em sentido formal.
4. Remessa oficial improvida. [18]
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. INVIABILIDADE. COMPETÊNCIA DO EXCELSO PRETÓRIO. APOSENTADORIA. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. RENÚNCIA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. A via especial, destinada à uniformização do Direito federal, não se presta à análise de dispositivos da Constituição da República, ainda que para fins de requestionamento, sob pena, inclusive, de usurpação de competência da Suprema Corte.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente se firmado no sentido de que é plenamente possível a renúncia à aposentadoria, por constituir direito patrimonial disponível.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.[19]
Portanto, distintos são os institutos da renúncia à aposentadoria (desconstituição do ato administrativo por vontade do segurado) e da desaposentação (é um plus em relação à renúncia, pois passa por esta, a fim de se obter um benefício mais vantajoso, com aproveitamento do tempo de serviço já contado). Aquela visa tão somente à desconstituição de um ato administrativo, por liberalidade do beneficiário; esta, embora passe pela renúncia à aposentadoria, visa à obtenção de benefício mais vantajoso, uma vez aproveitado o tempo de serviço já computado.
A jurisprudência diferencia-os:
“(...) na renúncia, o segurado abdica de seu benefício e, consequentemente, do direito de utilizar o tempo de serviço que ensejou sua concessão, mas não precisa restituir o que já recebeu a título de aposentadoria. Ou seja, opera efeitos “ ex nunc”.
Na desaposentação, o segurado também abdica do seu direito ao benefício, mas não do direito ao aproveitamento, em outro Benefício, do tempo de serviço que serviu de base para o primeiro. (...) [20]
Sobre a possibilidade da aplicação da desaposentação às espécies de aposentadorias do Regime Geral de Previdência já tratados acima, cabe aduzir que ela é possível em todas elas. Geralmente, é mais comum ocorrer na aposentadoria por tempo de contribuição, na qual o segurado tem o jubilamento mais cedo e existe a incidência do fator previdenciário, que diminui o valor do benefício, quanto menor a idade do cidadão. No entanto, nada impede que o segurado aposentado por idade também continue a trabalhar e possa mais tarde renunciar ao seu benefício, a fim de contar o tempo após o jubilamento.
Na aposentadoria especial também é possível a desaposentação. Há de se destacar que o aposentado nesta espécie não pode retornar ao trabalho em condições nocivas a sua saúde, sob pena de ter seu benefício cessado por força de lei, segundo o artigo 57 da Lei 8.213/1991. Seguindo a linha de raciocínio desta, pode-se afirmar que se o Estado pode cessar o benefício diante de condições prejudiciais à saúde do trabalhador, porque o próprio não poderia renunciar ao benefício, a fim de conseguir outro mais vantajoso.
Definidas as linhas gerais do instituto da aposentadoria, seu conceito e suas espécies e a oportunidade de vê-la melhorada após a sua concessão, pela desaposentação, passa-se a analisar a seguir os princípios que resguardam esta condição e os direitos dos trabalhadores aposentados.
DEFESA PRINCIPIOLOGICA DA DESAPOSENTAÇÃO COMO DIREITO SOCIAL
PROTEÇÃO SOCIAL DO TRABALHADOR E A DESAPOSENTAÇÃO
Quando escreveu sobre a teoria dos direitos fundamentais, Alexy afirmou que os princípios são normas que ordenam algo a ser realizado em toda sua extensão, de acordo com as possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Estabeleceu que as regras são normas que podem ser cumpridas, ou não. Por isso, os princípios, ao contrário das regras, são chamados de “mandados de otimização”, que podem ser realizados em diferentes graus, consoante as possibilidades jurídicas e fáticas. [21]
O princípio da proteção do trabalhador, amparado nos artigos 6º e 7º da Constituição Federal, núcleo norteador do Direito do Trabalho, trata da defesa do obreiro. A existência deste princípio tutelar se justifica pela história de séculos de dominação pelo mais forte sobre o mais fraco, que, de tanto desequilíbrio de forças e exploração humana, levou o Estado a intervir nas relações jurídicas de trabalho para assegurar ao trabalhador um mínimo de dignidade humana.
O princípio da proteção é o princípio basilar que norteia a criação de todos os demais direitos de defesa dos direitos e interesses do empregado, como a aposentadoria, não restando à menor dúvida de que se trata de um princípio guardião dos direitos fundamentais do trabalhador. [22] Ressalta-se que o princípio da proteção do trabalhador é dotado de normatividade jurídica, tanto quanto as demais normas, razão pela qual no confronto com as normas pode se sobrepor a elas.
Assim, tem-se que em sendo a aposentadoria um direito do trabalhador, notadamente um direito social, não se pode negar a um segurado que laborou e contribuiu durante vários anos para se aposentar, o direito a obter uma aposentadoria mais justa, sob pena de afronta ao princípio em comento.
Por mais que apenas a doutrina e a jurisprudência apregoem sobre a possibilidade da renúncia à aposentadoria, há de utilizar este princípio como um instrumento de resistência aos indeferimentos dos pleitos de desaposentação procedidos do INSS, vez que diante de uma norma ou de sua omissão, deve imperar os mandamentos principiológicos, como já asseverado.
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
Diante das disposições da Lei n.º 8.213/1991, em seus artigos 18, § 2º e 124, II, respectivamente, o segurado após o jubilamento só fará jus ao benefício do salário-família e do serviço de reabilitação profissional e que é vedada a concessão cumulativa de duas aposentadorias pelo mesmo regime previdenciário, inexiste proibição a que o cidadão procure melhorar o valor de sua aposentadoria, vez que ainda tem direito a outros benefícios no período pós-jubilação.
O artigo 11, § 3º, da lei 8.213/91, aduz que o aposentado, pelo Regime Geral de Previdência Social, que estiver exercendo, ou que voltar a exercer atividade laboral, fica sujeito às contribuições previdenciárias, como segurado obrigatório. Cumpre salientar que foi extinto em 1995 o chamado pecúlio que possibilitava ao aposentado que se mantivesse com vínculo empregatício, em sua rescisão contratual, reaver as contribuições previdenciárias pagas entre a concessão do benefício até o fim da relação de trabalho.
Restou, assim, um verdadeiro prejuízo ao segurado já aposentado, que continua contribuinte obrigatório e não que não pode ter devolvidas suas contribuições pagas, nascendo assim com a desaposentação, que não é vedada em lei, uma verdadeira forma de remediar os ônus a que se viam submetidos. Assim, ante a omissão legislativa no tratamento da desaposentação, não se pode dizer que há proibição, uma vez que se a norma pretende fazê-la deve contemplá-la clara e expressamente, pois, “se não está proibindo, enquanto convier ao titular do direito, é porque deseja acontecer”. [23]
Geralmente, o INSS indefere aos pedidos administrativos de desaposentação com base no artigo 181-B do Decreto 3.048/1991, que trata sobre a irreversibilidade e a irrenunciabilidade das aposentadorias por tempo de contribuição, idade e especial. No entanto, esta disposição contraria os ditames da Lei n.º 8.213/1999, que possui esta vedação.
Nesse sentido, manifesta-se o escolado de Celso Antônio Bandeira de Mello:
No Brasil, o princípio da legalidade, além de assentar-se na própria estrutura do Estado de Direito e, pois, do sistema constitucional como um todo, está radicado especificamente nos arts. 5º, II, 37, caput, e 84, IV, da Constituição Federal. Estes dispositivos atribuem ao princípio em causa uma compostura muito estrita e rigorosa, não deixando válvula para que o Executivo se evada de seus grilhões. É, aliás, o que convém a um país de tão acentuada tradição autocrática, despótica, na qual o Poder Executivo, abertamente ou através de expedientes pueris – cuja pretensa juridicidade não iludiria sequer a um principiante -, viola de modo sistemático direitos e liberdades públicas e tripudia à vontade sobre a repartição de poderes.
Nos termos do art. 5º, II, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei!”. Aí não se diz “em virtude de” decreto, regulamento, resolução, portaria ou quejandos. Diz-se “em virtude de lei”. Logo, a Administração não poderá proibir ou impor comportamento algum a terceiro, salvo se estiver previamente embasada em determinada lei que lhe faculte proibir ou impor algo a quem quer que seja. Vale dizer, não lhe é possível expedir regulamento, instrução, resolução, portaria ou seja lá que ato for para coatar a liberdade dos administrados, salvo se em lei já existir delineada a contenção ou imposição que o ato administrativo venha a minudenciar.[24]
Ao se interpretar este princípio, deve-se fazê-lo dentro do contexto constitucional que protege amplamente os direitos sociais. Em assim sendo, a aposentadoria a expressão por excelência do direito social à Previdência Social e como direito do trabalhador, possibilita que o segurado lance mão de todos os artifícios legais e éticos disponíveis para a melhoria de seu benefício, inclusive por respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Assim, não é mera retórica afirmar que a desaposentação deve se permitida por ser expressão maior de um direito social do trabalhador, que tem como pressuposto a descontituição da aposentadoria, por meio da renúncia do benefício de seu titular, a fim de obter um novo benefício mais vantajoso no futuro.
Sobre a necessidade de previsão legal para a desaposentação, argúi Rodrigo S. Cardoso[25]:
“Não se pode negar que o que se busca com a desaposentação é, em princípio, de iniciativa louvável, vez que os direitos sociais existem em favor de seus destinatários e, no caso específico do sistema da Seguridade Social, visa a proteção ao segurado. Por outro lado, também é incontestável que o mecanismo utilizado para tal consecução não encontra guarida no ordenamento jurídico brasileiro, e admitir o instituto da desaposentação sem que haja tratamento legal adequado é violar a teoria do desfazimento dos atos administrativos”.
Assim, em não havendo qualquer dispositivo que permita a desconstituição do ato concessivo da aposentadoria, há impedimento para que a Administração Pública reconheça o ato de desaposentação, sendo que o ato concessivo só poderia ser desfeito se estivesse eivado de algum vício. Deve-se considerar, ainda, que se a Administração não possui liberalidade para apreciar o ato no momento de sua edição, tampouco poderá fazê-lo posteriormente, salvo se houvesse autorização legal expressa. [26]
Há doutrinadores, entretanto, que defendem que o princípio da legalidade estrita não pode ser invocado pela administração para restringir direitos dos administrados, uma vez que a existência do Estado não constitui um fim em si mesmo, e sim um meio para a satisfação das necessidades dos cidadãos cujo bem-estar constitui o verdadeiro fundamento de sua existência. [27]
Em se admitindo a existência útil do Estado, há de se perseguir o bem comum, sob o risco do desmoronamento de suas bases instituidoras, pois além de proporcionar igualdade de condições para todos, também deve garantir meios de sobrevivência que assegurem a dignidade humana. Nesse sentido, negar o reconhecimento de um direito público individual é relegar a um segundo plano os interesses do administrado, elevando o princípio da legalidade a um patamar tal, que implicaria em sobrepor os direitos e garantias fundamentais outorgados ao cidadão pelo Poder Constituinte. Da mesma forma que à Administração é vedado fazer tudo que não for permitido em lei, ao Administrado somente poderão ser impostas as restrições legalmente previstas.[28]
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DO MÍNIMO EXISTENCIAL
O princípio da dignidade da pessoa possui duas dimensões que lhe são constitutivas: uma negativa e outra positiva. A primeira assegura que a pessoa não pode ser objeto de ofensas ou humilhações, em razão de que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante, nos termos do art. 5º, III, da Constituição Federal. CF. A dimensão positiva presume o pleno desenvolvimento de cada pessoa, com o reconhecimento da total autodisponibilidade, sem interferências ou impedimentos externos, das possibilidades de atuação próprias de cada homem.[29]
Assim, a integridade física e espiritual do homem é a dimensão irrenunciável da sua individualidade autonomamente responsável, tendo sua identidade pelo livre desenvolvimento da personalidade; a libertação da "angústia da existência" da pessoa mediante mecanismos de socialidade, dentre os quais se incluem a possibilidade de trabalho e a garantia de condições existenciais mínimas[30], como a aposentadoria e porque não dizê-la da forma mais vantajosa possível, cogitando-se da possibilidade de desaposentação. Sobre o princípio do mínimo existencial existem duas vertentes: a garantística que impede agressão do direito, com a cedência de outros direitos ou de deveres (pagar imposto, p. ex.) perante a garantia de meios que satisfaçam as mínimas condições de vivência digna da pessoa ou da sua família, havendo vinculação do Estado e o particular. A vertente prestacional tem caráter de direito social, exigindo obrigações genéricas do Estado que devem ser devidamente atendidas. Segundo Victor Abramovich e Christian Courtis[31] seriam elas:
“a) Obrigação de adotar medidas imediatas – O Estado deverá implementar, em um prazo razoavelmente breve, atos concretos, deliberados e orientados o mais claramente possível a satisfação da obrigação e a ele cabe justificar por que não avançou na consecução do objetivo. Dentre as obrigações imediatas do Estado destacam-se: i) Obrigação de adequação do marco legal; ii) Obrigação de vigilância efetiva, informação e formulação de plano; iii) Obrigação de provisão de recursos efetivos; b) Obrigação de garantir níveis essenciais dos direitos – O Estado deve demonstrar todo o esforço realizado para utilizar com prioridade a totalidade dos recursos que estão a sua disposição; c) Obrigação de progressividade e proibição de retrocesso – A noção de progressividade demanda o consecução do objetivo. Dentre as obrigações imediatas do Estado destacam-se: i) Obrigação de adequação do marco legal; ii) Obrigação de vigilância efetiva, informação e formulação de plano; iii) Obrigação de provisão de recursos efetivos; b) Obrigação de garantir níveis essenciais dos direitos – O Estado deve demonstrar todo o esforço realizado para utilizar com prioridade a totalidade dos recursos que estão a sua disposição; c) Obrigação de progressividade e proibição de retrocesso.”
Ingo Wolfgang Sarlet, estabelece que existem certos direitos subjetivos a prestações ligados aos recursos materiais mínimos para a existência de qualquer indivíduo. A existência digna estaria intimamente ligada à prestação de recursos materiais essenciais, devendo ser analisada a problemática do salário mínimo, da assistência social, da educação, do direito à previdência social e do direito à saúde.[32]
Desta feita, a aposentadoria, prestação por excelência da Previdência Social, é um direito subjetivo que garante recursos materiais mínimos e deve ser garantido ao segurado da melhor forma possível, proporcionalmente a todas as contribuições vertidas, obedecendo-se ao princípio da contraprestação, em nada desrespeitando o princípio da solidariedade, pois diante da desaposentação estar-se-á incluindo no cálculo da nova aposentadoria nada mais do que aquilo que o segurado contribuiu.
Assim, permitir ao segurado que busque a melhoria de sua aposentadoria é garantir em sua plenitude o princípio da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial. Ao revés, quando a Administração Pública nega esta possibilidade, o indeferimento é um ato administrativo eivado de inconstitucionalidade e, portanto, nulo, restando ao segurado se socorrer junto ao Poder Judiciário.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça no REsp 1334488/SC, julgado como recurso repetitivo, reconheceu que os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis, passíveis, portanto, de renúncia, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria já fruída, para concessão de nova prestação. A propósito, veja-se:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DESAPOSENTAÇÃO E REAPOSENTAÇÃO. RENÚNCIA A APOSENTADORIA. CONCESSÃO DE NOVO E POSTERIOR JUBILAMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE.
1. Trata-se de Recursos Especiais com intuito, por parte do INSS, de declarar impossibilidade de renúncia a aposentadoria e, por parte do segurado, de dispensa de devolução de valores recebidos de aposentadoria a que pretende abdicar.
2. A pretensão do segurado consiste em renunciar à aposentadoria concedida para computar período contributivo utilizado, conjuntamente com os salários de contribuição da atividade em que permaneceu trabalhando, para a concessão de posterior e nova aposentação.
3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento. Precedentes do STJ.
4. Ressalva do entendimento pessoal do Relator quanto à necessidade de devolução dos valores para a reaposentação, conforme votos vencidos proferidos no REsp 1.298.391/RS; nos Agravos Regimentais nos REsps 1.321.667/PR, 1.305.351/RS, 1.321.667/PR, 1.323.464/RS, 1.324.193/PR, 1.324.603/RS, 1.325.300/SC, 1.305.738/RS; e no AgRg no AREsp 103.509/PE.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem reconheceu o direito à desaposentação, mas condicionou posterior aposentadoria ao ressarcimento dos valores recebidos do benefício anterior, razão por que deve ser afastada a imposição de devolução.
6. Recurso Especial do INSS não provido, e Recurso Especial do segurado provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(REsp 1334488/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2013, DJe 14/05/2013)
Saliente-se, ainda, que há outra decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, referente ao Recurso Especial n.º 1.348.301-SC, em que se reconheceu a inaplicabilidade da decadência prevista no art. 103 da Lei de Benefício ao direito do trabalhador em renunciar à aposentadoria, salvaguardando os direitos sociais dos segurados. Veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PROCESSO CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RENÚNCIA À
APOSENTADORIA. DECADÊNCIA PREVISTA NO ART. 103 DA LEI 8.213/91. INAPLICABILIDADE. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. RECURSO IMPROVIDO.
1. Inexiste negativa de prestação jurisdicional quando o Tribunal de origem examina a questão supostamente omitida "de forma criteriosa e percuciente, não havendo falar em provimento jurisdicional faltoso, senão em provimento jurisdicional que desampara a pretensão da embargante" (REsp 1.124.595/RS, Rel. Min. ELIANA CALMON, Segunda Turma, DJe de 20/11/09).
2. A desaposentação indica o exercício do direito de renúncia ao benefício em manutenção a fim de desconstituir o ato original e, por conseguinte, obter uma nova aposentadoria, incrementada com as contribuições vertidas pelo segurado após o primeiro jubilamento.
3. A norma extraída do caput do art. 103 da Lei 8.213/91 não se aplica às causas que buscam o reconhecimento do direito de renúncia à aposentadoria, mas estabelece prazo decadencial para o segurado ou seu beneficiário postular a revisão do ato de concessão de benefício, o qual, se modificado, importará em pagamento retroativo, diferente do que se dá na desaposentação.
4. A interpretação a ser dada ao instituto da decadência previsto no art.
103, caput, da Lei 8.213/91 deve ser restritiva, haja vista que as hipóteses de decadência decorrem de lei ou de ato convencional, inexistentes na espécie.
5. A jurisprudência desta Corte acolheu a possibilidade de renúncia com base no entendimento de que os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, Por isso, suscetíveis de desistência por seus
titulares (REsp 1.334.488/SC, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Primeira Seção, julgado proferido sob o rito do art. 543-C do CPC, Dje 14/5/13).
6. Sendo certo que o segurado pode dispor de seu benefício, e, ao fazê-lo encerra a aposentadoria que percebia, não há falar em afronta aos arts. 18, § 2º, e 103, caput, da Lei 8.213/91. E, devido à desconstituição da
aposentadoria renunciada, tampouco se vislumbra ualquer violação ao comando da alínea "b" do inciso II do art. 130 do Decreto 3.048/99, que impede a expedição de certidão de tempo de contribuição quando este já tiver sido Utilizado para efeito de concessão de benefício, em qualquer regime de previdência social.
7. Recurso especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e Resolução STJ nº 8/2008.
(Resp 1348301/SC. Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima. STJ: 1ª Turma. Julgado em 27/11/2013.)
Feita a presente exposição, cabe concluir que todos os princípios acima comentados devem ser interpretados sempre a favor do segurado, o que também já foi sedimentado pela jurisprudência pátria, conforme a seguir:
PREVIDENCIÁRIO. ACIDENTE DE TRABALHO. INCAPACIDADE PARCIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. NECESSIDADE DE PROVA DA IMPOSSIBILIDADE DE PROVER O SUSTENTO POR OUTROS MEIOS. ÔNUS DO SEGURADO. DEMONSTRAÇÃO INOCORRENTE. ALTERAÇÃO PARA AUXÍLIO-ACIDENTE, INDEPENDENTEMENTE DE REQUISIÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. PRINCÍPIOS PREVIDENCIÁRIOS A FAVOR DO SEGURADO. AUXÍLIO-DOENÇA. CANCELAMENTO ADMINISTRATIVO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. DESPROVIMENTO DA REMESSA.[33]
Também é interessante abordar sobre o papel do Poder Judiciário na garantia do mínimo existencial.
Em havendo mora do Poder Público, como é o caso da postura negativa do INSS diante dos pedidos de desaposentação, cabe ao Judiciário controlar as escolhas efetuadas pelo Legislativo e Executivo. Incumbe ao magistrado, pois, perquirir a pretensão individual levada a Juízo, cotejando-a com as opções realizadas pelo Poder Público. Gustavo Amaral sustenta que devem ser averiguados o grau de essencialidade da medida e o seu nível de excepcionalidade. Para ele, não basta que o direito postulado seja de cunho essencial, mas que se trate de medida excepcional:[34]
a decisão judicial para o indivíduo deve ser sempre circunstancial, respeitando, assim, a pluralidade de opções alocativas existentes, a heterogeneidade da sociedade e seu reflexo necessário sobre as concepções que tem sobre suas necessidades e a deficiência na coleta de informações que é inerente ao procedimento judicial. Com decisões para o caso concreto e não para a generalidade dos casos, como se tem visto nas decisões relacionadas à saúde, mantém-se a flexibilidade para o futuro, o que é uma virtude notável no que diz respeito à saúde, onde a evolução dos tratamentos torna o quadro sempre mutante.
Esta teoria remete às idéias de proporcionalidade e razoabilidade, que devem ser postas em prática perante posturas ou escolhas do Administrador. O Judiciário, ao analisar atos executivos, não pode, por certo, substituir a vontade do administrador pela sua própria: cabe-lhe apenas conformar a atuação administrativa aos preceitos da ordem jurídica, somente invalidando atos eventualmente violadores de normas cuja observância é obrigatória. Assim se manifesta Sérgio de Andréa Ferreira: [35]
É certo que o juiz não vai substituir ao legislador, ao administrador, no núcleo do poder discricionário. Mas não o estará fazendo se verificar que, diante de uma aparente legalidade extrínseca, na verdade esteja diante de uma grande injustiça, de um procedimento administrativo desarrazoado, ilógico, contrário à técnica, à economicidade, à logicidade, que são os parâmetros do controle jurisdicional, neste campo específico da chamada legitimidade.
Assim, o juiz, ente inanimado, de que falava Montesquieu, é, em verdade, “a alma do progresso jurídico, o artífice laborioso do Direito novo contra as fórmulas caducas do Direito tradicional.” A participação do juiz na renovação é um fenômeno constante, pois o Direito é nascido da jurisprudência, vive por ela e por seu meio é que evoluirá sobre uma legislação imóvel. [36]
Desta maneira, é que a falta de normatização sobre a desaposentação será suplantada pela evolução da jurisprudência, que, de tão forte e atenta às necessidades sociais, acabará por animar o espírito do legislador a trazer mudanças em benefício do trabalhador, tão sedento de ver seus direitos mínimos garantidos e efetivados.
CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto, é possível concluir que o instituto da desaposentação é reconhecido amplamente pela doutrina e pela jurisprudência, uma vez que diante do baixo valor do dos benefícios, os aposentados tendem a retornar ao mercado de trabalho para complementar sua renda.
Ela significa a renúncia à aposentadoria gozada pelo segurado, a fim de obter outra em que seja contado o tempo de contribuição pós-jubiliação, a fim de aumentar o valor do benefício. Desenvolveu-se esta teoria principalmente em virtude de disposições da Lei n.º 8.213/91 que tratam da impossibilidade de acumulação de duas aposentadorias bem como por ser garantidos aos aposentados apenas o salário-família e a reabilitação profissional. Além de que o segurado aposentado caso retorne ao mercado de trabalho, torna-se novamente segurado obrigatório do RGPS, devendo continuar a verter contribuições previdenciárias. Também é um remédio contra a extinção do direito ao pecúlio ocorrida em 1995, que possibilitava ao segurado já aposentado. reaver as contribuições pagas após sua aposentadoria, quando da rescisão do contrato de trabalho.
A aposentadoria é um direito social do trabalhador e expressão máxima do direito social à Previdência Social e como tal deve ser garantida ao segurado de maneira mais vantajosa a ele.
É possível aplicar-se o instituto da desaposentação no RGPS dentre as aposentadoria por idade, por tempo de contribuição e especial. Quanto à aposentadoria por invalidez, é difícil sua aplicação uma vez que existe norma prevendo sua cessação em caso de retorno do segurado ao mercado de trabalho.
O INSS nega administrativamente todos os pedidos de desaposentação que recebe, sob o argumento de que o Decreto 3.048/99 veda a renúncia e a reversão das aposentadorias por tempo de contribuição, idade e especial. No entanto, verificou-se que esta atitude macula o princípio da legalidade, pois somente lei pode trazer permissões ou vedações aos cidadãos e não outras normas infralegais.
Além de que, há de se observar que a aposentadoria é um direito social por excelência, devendo se observar em seu tratamento por parte da Administração Pública e do Poder Judiciário os princípios da proteção social do trabalhador, da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial. Também há de se aplicar a norma de interpretação de que todos princípios devem ser aplicados em favor do segurado.
Em suma, todos os princípios em comento asseguram, com brilhantismo, sobre a possibilidade da desaposentação no sistema jurídico brasileiro, vez que não é vedada constitucionalmente e legalmente.
Finalmente, recentemente foi consagrado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o direito à desaposentação aos segurados, sem a necessidade de devolução dos valores pagos em decorrência da concessão do primeiro benefício, não se sujeitando a renúncia ao prazo decadencial previsto na Lei de Benefícios.
REFERÊNCIAS:
1. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 51
2. Celso Lafer, “Direitos humanos e democracia: no plano interno e internacional”, em “Desafios: ética e política”, Ed. Siciliano, 1995, pp. 201 e segs.
3. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8ª ed. São Paulo. LTr, 2009. P. 196.
4. DEMO, Roberto Luís Luchi. Aposentadoria – Direito Disponível – Desaposentação - Indenização ao Sistema Previdenciário. Revista Síntese Trabalhista, n° 163, Jan.2003, p.23.
5. FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade social: prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. Ed. Livraria do Advogado. Porto Alegre, 2005, p. 163
6. IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação: O caminho para uma melhor aposentadoria.RJ: Impetus, 2005, p. 35.
7. José Afonso da Silva, “Direito Const. Positivo”, Malheiros Ed., 15ª ed., 1998, p. 289.
8. José Afonso da Silva, “Direito Const. Positivo”, Malheiros Ed., 15ª ed., 1998, p. 290.
9. LAZZARI, João Bastita e CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. São Paulo: RT, 2006, p.545.
10. LAZZARI, João Bastita e CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 547
11. MARTINEZ, Wladimir Novaes. A Seguridade Social na Constituição Federal. 2ª ed., São Paulo: LTr, 1992, p. 179
12. MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 1999, p. 324.
13. MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 25. ed., São Paulo :Atlas, 2008, p. 321.
14. NOVAES, Wladimir. Como andam os processos de desaposentação. Revista de Previdência Social n. 231, p. 137.
15. Relator Juiz Ivori Luis da Silva Scheffer, 5/08/2004, Processo n. 2004.92.95.003417-4. Disponível em www.jfsc.gov.br. Acesso em 29/08/2010
16. STJ, AgRg no REsp 1055431/SC. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2008/0102846-1. Rel. Og. Fernades. 6ª Turma. Julgado em 15/10/2009.
17. TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. 4. ed. Rio de Janeiro: L. Júris, 2002. p. 87.
18. TRF da 5ª Região, 1ª T., REO n.º 77.896, Proc. n.º2000.82.000100351-PB, Rel. Des. Fed. CASTRO MEIRA, j. em 18.04.2002, unânime, DJU de 03.06.2002, p. 379
19. MARTINEZ, Wladimir Novaes Curso de Direito Previdenciário. TOMO II – Previdência Social. 1998. P. 769.
20. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo:Malheiros, 24ª ed., 2007, p. 96
21. SANTOS, Fernando Ferreira dos. Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana . Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, dez. 1998. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=160>. Acesso em: 02 set. 2010.
22. ABRAMOVICH, Victor; COURTIS, Christian. Los derechos sociales como derechos exigibles. 2ª ed. Madrid: Editorial Trotta, 2004, p. 79-116.
23. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 322-323.
24. REsp 1113682 / SC. Rel. Min. Napoleão Nunes Filho. Julgado em 23/02/2010. DJe 26/04/2010.
25. AgRg no REsp 328101 / SC. Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA. Julgado em 02/10/2008. DJe 20/10/2008
26. TJ/Sc. Apelação Civel n.º 2002.012515-1. Rel: Jorge Schaefer Martins. Julgado em 19/09/2002. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5074599/apelacao-civel-ac-125151-sc-2002012515-1-tjsc/inteiro-teor.
[1] Celso Lafer, “Direitos humanos e democracia: no plano interno e internacional”, em “Desafios: ética e política”, Ed. Siciliano, 1995, pp. 201 e segs.
[2] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª Edição, São Paulo : Editora Malheiros, 2006, p. 563.
[3] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª Edição. Coimbra : Edições Almedina, 2003, p. 386-387
[4] GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. 4ª Edição, São Paulo : RCS Editora, 2005, p. 46.
[5] DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 36.
[6] José Afonso da Silva, “Direito Const. Positivo”, Malheiros Ed., 15ª ed., 1998, p. 289.
[7] José Afonso da Silva, “Direito Const. Positivo”, Malheiros Ed., 15ª ed., 1998, p. 290.
[8] TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. 4. ed. Rio de Janeiro: L. Júris, 2002. p. 87.
[9] MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 25. ed., São Paulo :Atlas, 2008, p. 321.
[10] MARTINEZ, Wladimir Novaes. A Seguridade Social na Constituição Federal. 2ª ed., São Paulo: LTr, 1992, p. 179
[11] MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 1999, p. 324.
[12] FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade social: prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. Ed. Livraria do Advogado. Porto Alegre, 2005, p. 163
[13] LAZZARI, João Bastita e CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. São Paulo: RT, 2006, p.545.
[14] NOVAES, Wladimir. Como andam os processos de desaposentação. Revista de Previdência Social n. 231, p. 137.
[15] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação: O caminho para uma melhor aposentadoria.RJ: Impetus, 2005, p. 35.
[16] DEMO, Roberto Luís Luchi. Aposentadoria – Direito Disponível – Desaposentação - Indenização ao Sistema Previdenciário. Revista Síntese Trabalhista, n° 163, Jan.2003, p.23.
[17] LAZZARI, João Bastita e CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 547
[18] TRF da 5ª Região, 1ª T., REO n.º 77.896, Proc. n.º2000.82.000100351-PB, Rel. Des. Fed. CASTRO MEIRA, j. em 18.04.2002, unânime, DJU de 03.06.2002, p. 379
[19] STJ, AgRg no REsp 1055431/SC. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2008/0102846-1. Rel. Og. Fernades. 6ª Turma. Julgado em 15/10/2009.
[20] Relator Juiz Ivori Luis da Silva Scheffer, 5/08/2004, Processo n. 2004.92.95.003417-4. Disponível em www.jfsc.gov.br. Acesso em 29/08/2010
[21] ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 51.
[22] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8ª ed. São Paulo. LTr, 2009. P. 196.
[23] MARTINEZ, Wladimir Novaes Curso de Direito Previdenciário. TOMO II – Previdência Social. 1998. P. 769.
[24] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo:Malheiros, 24ª ed., 2007, p. 96
[25] MARTINS, Clarissa Duarte.A Desaposentação e a Vedação de Acumulação de Proventos e Remuneração após a Emenda Constitucional n.º 20/98. Disponível em <http://www.abdir.com.br/doutrina/ver.asp?art_id=&categoria= > Acesso em :3 de novembro de 2010
[26] Idem.
[27] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação. O Caminho para uma melhor aposentadoria. Rio de Janeiro: Impetus, 2005, p. 65.
[28] A Desaposentação e a Vedação de Acumulação de Proventos e Remuneração após a Emenda Constitucional n.º 20/98. Disponível em <http://www.abdir.com.br/doutrina/ver.asp?art_id=&categoria= > Acesso em :3 de novembro de 2010.
[29] SANTOS, Fernando Ferreira dos. Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana . Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, dez. 1998. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=160>. Acesso em: 02 set. 2010.
[30] Idem.
[31] ABRAMOVICH, Victor; COURTIS, Christian. Los derechos sociales como derechos exigibles. 2ª ed. Madrid: Editorial Trotta, 2004, p. 79-116.
[32] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 322-323.
[33] TJ/Sc. Apelação Civel n.º 2002.012515-1. Rel: Jorge Schaefer Martins. Julgado em 19/09/2002. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5074599/apelacao-civel-ac-125151-sc-2002012515-1-tjsc/inteiro-teor.
[34] AMARAL, Gustavo (2001). Direito, Escassez & escolha: em busca de critérios Jurídicos para lidar com a escassez de recursos e as decisões trágicas. Rio de Janeiro: Renovar, pp. 208-9.
[35] LEAL, Rogério Gesta. O Estado-Juiz na Democracia Contemporânea, p. 42
[36] MAXIMINIANO, Carlos (2001). Hermenêutica e Aplicação do Direito. Rio de Janeiro: Renovar, p. 39.
Analista Judiciária da Justiça Federal e ex-servidora do Instituto Nacional do Seguro Social. Pós-graduada em Direito Previdenciário e em Direito do Estado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: KOEHLER, Michele. A desaposentação no RGPS como direito social Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 mar 2014, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38594/a-desaposentacao-no-rgps-como-direito-social. Acesso em: 23 dez 2024.
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