Resumo
Este trabalho aborda, sinteticamente, o princípio do informalismo procedimental nos processos administrativos.
Assim é que o presente estudo discorre sobre o principio e sobre sua aplicação, com apontamento de exemplo prático sobre a questão.
Por fim, é ressaltada a relação desse princípio com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade em relação às formas e de sua importância para o alcance dos fins a que o processo administrativo se destina.
Sumário
1. Introdução. 2. Do princípio do informalismo procedimental nos processos administrativos. 3. Conclusão.
Palavras-Chave
Princípio dos informalismo procedimental. Processos Administrativos. Simplicidade das formas. Requisitos mínimos. Formalismo. Lei. Interesse Público. Direito dos particulares. Princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
1 Introdução
Como sabido, o processo administrativo é distinto do processo judicial. Um dos exemplos de tal distinção é o princípio do informalismo procedimental que vigora no processo administrativo, mas não vigora no processo judicial.
A intenção desse trabalho é discorrer sobre esse princípio e sobre sua aplicação.
Demais disso, o presente trabalho busca apontar que o informalismo procedimental nos processos administrativos enseja, a bem da verdade, a aplicação da proporcionalidade e da razoabilidade em relação às formas, cujo objetivo é justamente atingir a finalidade a que o processo se destina.
2 Do princípio do informalismo procedimental nos processos administrativos.
O processo administrativo é regido pelo princípio do informalismo procedimental. Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho[1], “o princípio do informalismo procedimental significa que, no silêncio da lei ou de ato regulamentares, não há para o administrador a obrigação de adotar excessivo rigor na tramitação dos processos administrativos, tal como ocorre, por exemplo, nos processos judiciais. Ao administrador caberá seguir um procedimento que seja adequado ao objeto específico a que se destinar o processo”.
Sobre tal princípio, vale citar a lição de Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari[2]:
O princípio da informalidade significa que, dentro da lei, sem quebra da legalidade, pode haver dispensa de algum requisito formal sempre que sua ausência não prejudicar terceiros nem comprometer o interesse público. Um direito não pode ser negado em razão da inobservância de alguma formalidade instituída para garanti-lo, desde que o interesse público almejado tenha sido atendido. Dispensam-se, destarte, ritos sacramentais e despidos de relevância, tudo em favor de uma decisão mais expedita e, pois, efetiva.
A procedimentalização das ações administrativas, o estabelecimento de certos procedimentos instrumentais para a tomada de decisões, visam a amparar tanto o cidadão quanto a coletividade, mas não podem levar ao ponto em que já se chegou no processo judicial, onde muitas vezes o direito material a ser defendido ou exercitado fica em segundo plano, quando não é até mesmo sepultado por uma avalancha de questiúnculas procedimentais menos relevantes.
O processo deve ser um meio seguro de realização do direito, não de sua negação. O princípio da informalidade significa que devem ser observadas as formalidades estritamente necessárias à obtenção da certeza e da segurança jurídicas ao atendimento dos fins almejados pelo sistema normativo. Deve-se dar maior prestígio ao espírito da lei que à sua literalidade no tocante ao iter estabelecido pela norma jurídica disciplinadora do processo.
É indiferente que a omissão de alguma providência instrumental possa ser atribuída ao particular interessado ou à Administração: o importante é que não haja lesão a interesses públicos ou de terceiros e que o interesse legítimo postulado pelo particular possa ser atendido.
As formas têm que ser vistas como meio para alcançar determinado fim, de modo que sejam resguardados os direitos da parte interessada. Assim, é necessário conciliar a segurança do indivíduo com a simplicidade das formas.
Não obstante o caráter de informalismo que apresenta o Processo Administrativo, a legislação impõe alguns requisitos mínimos que deverão ser atendidos. Podemos citar um exemplo prático: caso de irregularidade de representação processual quando da interposição de recurso. Nesse caso, há entendimento majoritário no sentido da aplicação subsidiária do artigo 13 do Código de Processo Civil ao processo administrativo. São tais os termos do dispositivo:
Art. 13. Verificando a incapacidade processual ou a irregularidade da representação das partes, o juiz, suspendendo o processo, marcará prazo razoável para ser sanado o defeito. Não sendo cumprido o despacho dentro do prazo, se a providência couber:
I - ao autor, o juiz decretará a nulidade do processo;
II - ao réu, reputar-se-á revel;
III - ao terceiro, será excluído do processo.
No que pertine ao tema, é relevante citar a seguinte Jurisprudência Administrativa, proferida em sede de Procedimento Administrativo Fiscal:
REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL – FALTA/PARTE ILEGÍTIMA – Falta de instrumento de procuração – Duplo grau de jurisdição administrativa. O próprio sujeito passivo, em processo administrativo, ao contrário do judicial, pode subscrever impugnações e recursos. O fazendo através de Advogado, deverá ser anexado instrumento de procuração. Não estando o processo devidamente instruído com a mesma, deverá a autoridade julgadora a quo saneando o processo nos termos do art. 13 do CPC, intimar o contribuinte para anexá-la. Decisão que não conheça do recurso por falta de instrumento de procuração, sem antes intimá-lo nos termos supra, será nula por afetar o direito de defesa do contribuinte. Não sendo válida a decisão a quo, será nula a decisão de órgão julgador recursal enquanto pendente aquela, pois seria suprimida uma instância julgadora, o que feriria o princípio do devido processo legal. Processo anulado a partir da decisão de primeira instância, inclusive para que outra seja prolatada atacando o mérito. (Acórdão n.º 201-70.652, DOU de 22/09/1997)
Pois bem. Nesse caso, a Administração deve oferecer à parte a oportunidade de suprir a falha, possibilitando o saneamento da irregularidade na representação processual. Caso a parte não apresente a procuração no prazo estipulado, o recurso administrativo não deve ser conhecido.
Mesmo na esfera judicial, verifica-se que o STJ é assente em admitir a juntada de instrumento procuratório perante as instâncias ordinárias, desde que observada a regra do art. 37 do CPC, após a intimação da parte para suprir a falta (RESP 199901156602, ALDIR PASSARINHO JUNIOR, STJ - QUARTA TURMA, 14/08/2000).
No que pertine ao assunto, é relevante citar decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª – TRF1:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DEFEITO NA REPRESENTAÇÃO. ADVOGADO NÃO TEM DA PROCURAÇÃO. ART. 37, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. 1. "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente em admitir a juntada do instrumento procuratório perante as instâncias ordinárias, desde que observada a regra do art. 37 do CPC, após a intimação da parte para suprir a falta "(RESP 199901156602, ALDIR PASSARINHO JUNIOR, STJ - QUARTA TURMA, 14/08/2000) 2. No caso, no entanto, está evidenciada a hipótese do parágrafo único do art. 37 do CPC, que considera inexistente o recurso não ratificado no prazo, visto que a decisão, juntada por cópia de fls. 400/401, proferida em agosto/2007, afastou o subscritor do recurso por não possuir poderes para atuar na execução e nos embargos. 3. Intimada daquela decisão, a advogada do apelante não providenciou a regularização da representação com a ratificação dos atos praticados pelo subscritor do recurso. E mais, manifestou-se nos presentes autos, fls. 339/362, sem ratificar o ato ou mesmo providenciar o substabelecimento, concordando com os termos da sentença e apresentando novos cálculos. 4. Dessa forma, mostra-se configurada a preclusão lógica, de forma a ensejar a imediata incidência da regra acima aludida. "[...] tem-se, então, como incidente, aí, a preclusão, sob pena de se prestigiar o lado desidioso na defesa de seus interesses, procrastinando-se, desnecessariamente, o andamento do feito [...]" (RESP 199800577971, ALDIR PASSARINHO JUNIOR, STJ - QUARTA TURMA, 18/02/2002). 5. "Descumprido o quando prescreve o caput do art. 37 do CPC - "sem instrumento de mandato, o advogado não será admitido a procurar em juízo". Ademais, de acordo com a regra do parágrafo único do mesmo artigo, "os atos, não ratificados no prazo, serão havidos por inexistentes, respondendo o advogado por despesas e perdas e danos" (AC 0009448-79.2007.4.01.3300/BA, Rel. Desembargador Federal João Batista Moreira, Conv. Juiz Federal Evaldo De Oliveira Fernandes, Filho (conv.), Quinta Turma, e-DJF1 p.252 de 1 2 / 11 / 2 0 1 0). 6. Apelação não-conhecida. (TRF 1 – AC – Apelação Cível – 20053000000611. Órgão Julgador: 2ª Turma Suplementar. Relatora: JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO. e-DJF1 DATA:11/05/2011 PAGINA:616).
Por outro lado, Freddie Didier Jr., entende que a capacidade postulatória seria um pressuposto processual de validade do processo. Segundo o autor, como se trata de um requisito de validade, a capacidade postulatória deve ser pensada à luz do sistema de invalidação dos atos processuais, que impede a decretação da invalidade se do defeito do ato não decorrer prejuízo. Assim, busca-se, sempre, o aproveitamento do ato processual[3]. De acordo com esse entendimento, mesmo no âmbito do processo judicial, deve ser concedido prazo para que a parte supra o vício, quando não houver prejuízo.
Portanto, nesse caso, a Administração deve notificar a recorrente para que ela supra o vício verificado, sob pena de nulidade. Caso a irregularidade não seja suprida no prazo concedido, o recurso não deve ser conhecido. Em sendo corrigida a irregularidade, o recurso deve ser apreciado. Trata-se de exemplo prático do princípio da informalismo procedimental.
Isso não significa que, em todos os processos administrativos, vigora o informalismo procedimental. A bem da verdade, o artigo 22 da Lei de Processo Administrativo, Lei nº 9.784/1999, estabelece que “os atos do processo administrativo não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir”.
Dessa feita, havendo forma determinada expressamente em lei, ela deve ser observada. Como destaca Maria Sylvia Zanella Di Pietro[4], o formalismo deve existir, em alguns casos, de modo a atender ao interesse público e a proteger os direitos dos particulares:
Às vezes, a lei impõe determinadas formalidades ou estabelece um procedimento mais rígido, prescrevendo a nulidade para o caso de sua inobservância. Isso ocorre como garantia para o particular de que as pretensões confiadas aos órgãos administrativos serão solucionadas nos termos da lei; além disso, constituem o instrumento adequado para permitir o controle administrativo pelos Poderes legislativo e Judicial.
A necessidade de maior formalismo existe nos processos que envolvem interesses dos particulares, como é o caso dos processos de licitação, disciplinar e tributário. Nesses casos, confrontam-se, de um lado, o interesse público, a exigir formas mais simples e rápidas para a solução dos processos, e, de outro, o interesse particular, que requer formas mais rígidas, para evitar o arbítrio e a ofensa a seus direitos individuais.
É por isso que, enquanto inexistem normas legais estabelecendo o procedimento a ser adotado nos processos administrativos em geral, à semelhança do que ocorre nos processos judiciais, determinados processos especiais que dizem respeito a particulares estão sujeitos a procedimento descrito em lei.
[...]
Na realidade, o formalismo somente deve existir quando seja necessário para atender ao interesse público e proteger os direitos dos particulares. É o que está expresso no artigo 2º, incisos VIII e IX, da Lei n. 9.784/1999, que exige, nos processos administrativos, a “observância das formalidades essenciais à garantia dos administrados” e a “adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados”, Trata-se de aplicar o principio da razoabilidade ou da proporcionalidade em relação às formas.
[grifos acrescidos]
Como bem destacado, o informalismo procedimental em processos administrativos nada mais é do que a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade em relação às formas.
Por fim, vale observar que, como bem destaca Maria Sylvia Zanella Di Pietro[5], “informalismo não significa, nesse caso, ausência de forma; o processo administrativo é formal no sentido de que deve ser reduzido a escrito e conter documentado tudo o que ocorre no seu desenvolvimento; e informal no sentido de que não está sujeito a formas rígidas”.
3 Conclusão
Em vista do exposto neste presente trabalho, é forçoso concluir que o principio do informalismo procedimental visa conferir maior efetividade aos processos administrativos, sem afastar a necessidade de que sejam observadas as formalidades estritamente necessárias à obtenção da certeza e da segurança jurídicas ao atendimento dos fins almejados pelo sistema normativo.
O princípio do informalismo procedimental nos processos administrativos busca conferir razoabilidade e proporcionalidade em relação às formas, evitando que formalismos rigorosos e excessivos afastem a própria finalidade do processo, o interesse público almejado e os direitos dos administrados.
Isso não significa, como salientado no presente trabalho, que, em alguns casos, não vigore o formalismo. Nos casos em que a lei o exigir, as formas devem ser observadas tal como dispostas. Nesses casos, a forma prescrita em lei traduz-se em garantia para o particular de que as pretensões confiadas aos órgãos administrativos serão solucionadas nos termos da lei, bem como em instrumento adequado para permitir o controle administrativo pelos Poderes Legislativo e Judicial.
Trata-se, portanto, de princípio de suma importância no âmbito dos processos administrativos, na medida em que busca resguardar a própria finalidade a eles atinentes.
4. Referências bibliográficas
FERRAZ, Sérgio e DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros.
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. 1. 7ª ed. Edições Jus Podivm.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2001.
[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas, p. 980.
[2] FERRAZ, Sérgio e DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, p. 125/126.
[3] DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. 1. 7ª ed. Edições Jus Podivm. p. 204.
[4] PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 500/501.
[5] PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 500.
Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FELIX, Luciana Chaves Freire. Do princípio do informalismo procedimental nos processos administrativos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 mar 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38792/do-principio-do-informalismo-procedimental-nos-processos-administrativos. Acesso em: 23 dez 2024.
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