Resumo: Este trabalho aborda, sinteticamente, a revisão em processos administrativos. Assim é que o presente estudo discorre sobre a definição desse instituto, sua natureza jurídica e pressupostos.
Palavras-Chave: Revisão. Processos administrativos. Fatos novos. Circunstâncias relevantes. Inadequação da sanção aplicada.
Sumário: 1. Introdução. 2. Da revisão em processos administrativos. 3. Conclusão.
1 Introdução
Nos termos da Lei de Processo Administrativo, Lei n.º 9.784/1999, os processos administrativos de que resultem sanções são passiveis de pedido de revisão, desde que preenchidos os pressupostos necessários para tanto.
A intenção deste trabalho é discorrer sobre a revisão em processos administrativos, ou seja, sobre seu conceito, natureza jurídica e pressupostos.
2 Da revisão em processos administrativos
A possibilidade de revisão de decisões no âmbito do processo administrativo foi regulada pelo art. 65 da Lei n.º 9.784/1999, nos seguintes termos:
Art. 65. Os processos administrativos de que resultem sanções poderão ser revistos, a qualquer tempo, a pedido ou de ofício, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada.
Parágrafo único. Da revisão do processo não poderá resultar agravamento da sanção.
No mesmo sentido, por exemplo, no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel, estabelece o caput do artigo 90 do seu Regimento Interno, aprovado pela Resolução n.º 612, de 29 de abril de 2013:
Art. 90. O Pado de que resulte sanção poderá ser revisto, a qualquer tempo, de ofício ou mediante pedido dirigido á autoridade que aplicou a sanção, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada.
Os parágrafos do dispositivo, por sua vez, estabelecem o procedimento e os efeitos do pedido de revisão. Vejamos:
§ 1º O pedido de revisão será recebido como novo procedimento e autuado em autos próprios, cabendo ao interessado instruir o feito com cópia integral ou dos principais documentos do processo cuja revisão se pleiteia.
§ 2º A apresentação de pedido de revisão não suspenderá os efeitos da sanção aplicada por decisão administrativa transitada em julgado, especialmente a adoção das medidas necessárias à constituição, cobrança e execução do crédito não tributário decorrente da aplicação de sanção de multa.
§ 3º Da revisão do Pado não poderá resultar agravamento da sanção.
Como se vê, a revisão enseja a instauração de novo processo e não suspende os efeitos da decisão transitada em julgado.
Demais disso, da leitura dos dispositivos em comento, percebe-se que a admissibilidade do pedido de revisão está condicionada à indicação de fatos novos ou circunstâncias relevantes que demonstrem a inadequação da sanção aplicada.
Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho[1], “o recurso de revisão exige a presença de três pressupostos específicos: 1º) que os fatos sejam novos; 2º) que as circunstâncias sejam relevantes; e 3º) que deles emane a conclusão de que foi inadequada a sanção”.
Sobre cada um desses pressupostos, ensina José dos Santos Carvalho Filho[2]:
a) Fatos novos – Fatos novos são aqueles não levados em consideração no processo original de que resultou sanção por terem ocorrido a posteriori. O sentido de “novo” no texto guarda relação com o tempo de sua ocorrência e, por conseguinte, com sua ausência para análise ao tempo em que se apurava a infração. O fato novo pode alterar profundamente a conclusão antes firmada, protagonizando convicção absolutória no lugar do convencimento sancionatório adotado na ocasião. Surgindo fato dessa natureza, não seria mesmo justo que perdurasse a sanção, decorrendo daí que esta deve ser anulada ou modificada conforme a hipótese, mas não mantida da forma como foi imposta.
[...]
b) Circunstâncias relevantes – Circunstâncias relevantes também são fatos justificadores da alteração do ato punitivo, mas enquanto a ideia de fatos novos se baseia no fator tempo, considerando o momento de tramitação do processo, a de circunstâncias relevantes leva em conta não o tempo, mas a importância do fato para chegar-se à revisão da sanção.
[...]
c) Adequabilidade probatória – Não basta que o fato seja novou ou que a circunstância seja relevante para que seja procedente o pedido de revisão.
O texto do art. 65 denuncia que fatos e circunstâncias sejam suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada. É a incidência do princípio da adequabilidade probatória, segundo o qual é preciso que tais elementos sejam efetivamente justificadores da conclusão de que a aplicação da sanção se afigurou inadequada. Se não o forem, não haverá como atender ao que foi requerido pelo sancionado.
Sobre o pedido de revisão, vale, ainda, citar a lição de Sérgio Ferraz e Adilson Dallari[3]:
O pedido de revisão não é exatamente uma manifestação de inconformidade com os fundamentos e a motivação da decisão que se deseja modificar. Por meio do pedido de revisão o que se pretende é alterar a situação jurídica decorrente de decisão definitiva no âmbito administrativo, mas em função do surgimento ou da descoberta de fatos novos, de novas provas, que justifiquem a modificação pretendida.
[...]
A revisão não é um pedido de anulação da decisão proferida anteriormente; não se alega vício jurídico naquela decisão anterior. O que se alega é a inadequação ou a inconveniência da manutenção da penalidade imposta, em função de dados fáticos novos, que ensejam uma distinta configuração da base empírica da decisão revisanda, privando-a de um de seus lastros fundamentais. Em suma, busca-se assim, mais uma vez, a preponderância da verdade material sobre a realidade formal.
Importa salientar que, muito embora o pedido de revisão guarde certos contornos recurso, não se trata de um recuso administrativo propriamente dito. Trata-se, a bem da verdade, de instrumento em favor dos administrados que permite que seja suscitada a reapreciação do processo, desde que preenchidos os pressupostos necessários para tanto. Nesse sentido, vale citar a lição de Bruno de Souza Vichi[4]:
Da forma como se apresenta a revisão na Lei n.º 9.784/99, percebe-se claramente que não se insere como modalidade de recurso administrativo. Com efeito, se o recurso apresenta-se como instrumento de rediscussão de decisão de um dado processo administrativo, representando, portanto, um instrumento interno do processo à mão do administrado, a revisão é forma de reapreciação de processo em si, sobre o qual incidem fatos novos que possam interferir na decisão administrativa terminativa ou, ainda, sujeita a circunstâncias relevantes que possam interferir na sanção aplicada.
Anote-se que há doutrinadores que definem o pedido de revisão como recurso administrativo. José dos Santos Carvalho Filho, por exemplo, citando Maria Sylvia Di Pietro, leciona o seguinte[5]:
Revisão e o recuso administrativo pelo qual o interessado postula a reapreciação de determinada decisão, já proferida em processo administrativo.
De qualquer sorte, no presente trabalho, como salientado, defende-se que o pedido de revisão não tem natureza jurídica de um recurso, já que possui contornos e pressupostos próprios.
Saliente-se, ainda, que os pressupostos do pedido de revisão devem ser interpretados restritivamente. Isso significa o pedido de revisão não pode ser manejado apenas e tão somente de modo a ensejar novas e reiteradas manifestações da Administração Pública sobre questões já analisadas.
O pedido de revisão, repita-se, deve ser manejado apenas nos casos em que efetivamente estejam presentes os pressupostos necessários para tanto. Em outras palavras, deve ser admitido apenas nos casos em que surjam fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada.
Não há de se admitir, portanto, que, no bojo de pedido de revisão, haja mera reiteração de argumentos apresentados pelo administrado, e refutados pela Administração, no decorrer da instrução processual.
Em casos tais, a Administração Pública não deve sequer conhecer do pedido de revisão, por falta de pressuposto legal de admissibilidade. Isso porque admitir pedidos de revisão cujo objeto seja a mera reiteração de argumentos anteriormente refutados implicaria, a bem da verdade, em toda uma nova movimentação da Administração Pública sobre questões amplamente já analisadas e decididas.
Enfim, no caso de ausência de fatos novos ou circunstâncias relevantes, o pedido de revisão não deve ser sequer admitido por falta de pressuposto legal de admissibilidade. Nesse sentido, vale transcrever a ementa do acordão proferido pelo Conselho Diretor da Anatel, nos autos do processo n.º 53500.025661/2011 (julgado em 5 de setembro de 2013):
PEDIDO DE REVISÃO. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE PREVISTOS NO ART. 65 DA LEI DE PROCESSO ADMINISTRATIVO E DO ART. 90 DO REGIMENTO INTERNO.
1. O Pedido de revisão não será conhecido quando não preenchidos os requisitos previstos no art. 65 da Lei no 9.784/99 – Lei de Processo Administrativo e no art. 90 do Regimento Interno da Anatel, uma vez que não foram apresentados fatos novos e circunstâncias relevantes que justificassem a inadequação da sanção aplicada no âmbito do PADO a que se submete a revisão.
2. Nao conhecer do Pedido.
Por fim, importa salientar que não se admite reformatio in pejus em sede de pedido de revisão. É o que estabelece o parágrafo único do artigo 65 da Lei n.º 9.784/1999 (já transcrito).
Nesse ponto, Sérgio Ferraz e Adilson Dallari bem explicam a vedação legal[6]:
Tratando-se, portanto, claramente, de um benefício, é perfeitamente pertinente o disposto no parágrafo único desse artigo no sentido de que a revisão não pode acarretar agravamento da sanção. Com efeito, a decisão sancionatória anterior é definitiva e, por suposto, satisfativa da pretensão punitiva da Administração Pública.
Sobre a impossibilidade de reformatio in pejus em sede de pedido de revisão, vale, ainda, citar a lição de José dos Santos Carvalho Filho[7]:
AGRAVAMENTO DA SANÇÃO – Enquanto nos processos administrativos em geral seja cabível que o julgamento do recurso provoque gravame maior ao recorrente, como autoriza o art. 64, parágrafo único, nas condições ali estabelecidas, no processo de revisão o agravamento tem expressa vedação legal (art. 65, paragrafo único).
Dispondo a lei que “da revisão não poderá resultar agravamento da sanção”, está adotando o mesmo postulado do estatuto processual penal, como visto, o princípio da vedação à reformatio in pejus. Segue-se que se o recorrente objetiva cancelar a sanção, por inexistência de ilícito, não pode o órgão julgador mantê-la e aplicar alguma outra em acumulação. Por outro lado, se o recorrente pretende ver a atenuação da sanção inadequadamente aplicada, por ter sido desproporcionalmente pesada, não poderá o julgador agravá-la mais ainda com a aplicação de sanção mais gravosa na escala contemplada na lei.
Desse modo, em nenhuma situação a revisão pode dar ensejo a que se piore a situação do recorrente. Em consequência, a pior situação que o recorrente pode sofrer é a que decorre do indeferimento do pedido revisional e manutenção da sanção originalmente imposta.
3 Conclusão
Em vista do exposto no presente trabalho, conclui-se que o pedido de revisão possui pressupostos expressos e restritivos, que devem ser observados, sob pena de não conhecimento.
O pedido de revisão não deve ser confundido com o recurso administrativo propriamente dito. Trata-se, a bem da verdade, de instrumento em favor do administrado que permite que seja suscitada a reapreciação do processo, quando surgirem fatos novos ou circunstâncias relevantes que demonstrem a inadequação da sanção aplicada.
Por se tratar de garantia, da revisão do processo não poderá resultar agravamento da sanção.
Referências Bibliográficas
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 13ª. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2005.
CARVALHO FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas, 2013.
CARVALHO FILHO. José dos Santos Carvalho. Processo Administrativo Federal. Comentários à Lei nº 9.784/1999. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013.
FERRAZ, Sérgio e DALLARI, Adilson Abreu. Processo administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012.
Do recurso administrativo e da revisão (arts. 56 a 65). In: FIGUEIREDO, Lucia Valle (coord.). Comentários à lei federal do processo administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2004.
[1] CARVALHO FILHO. José dos Santos Carvalho. Processo Administrativo Federal. Comentários à Lei nº 9.784/1999. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 334.
[2] CARVALHO FILHO. José dos Santos Carvalho. Processo Administrativo Federal. Comentários à Lei nº 9.784/1999. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 334/335.
[3] FERRAZ, Sérgio e DALLARI, Adilson Abreu. Processo administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 306/307.
[4] Do recurso administrativo e da revisão (arts. 56 a 65). In: FIGUEIREDO, Lucia Valle (coord.). Comentários à lei federal do processo administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 257/258.
[5] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 13ª. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2005. P. 745.
[6] FERRAZ, Sérgio e DALLARI, Adilson Abreu. Processo administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 306.
[7] CARVALHO FILHO. José dos Santos Carvalho. Processo Administrativo Federal. Comentários à Lei nº 9.784/1999. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013. P. 336/337.
Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FELIX, Luciana Chaves Freire. Da revisão em processos administrativos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 abr 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38950/da-revisao-em-processos-administrativos. Acesso em: 23 dez 2024.
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