INTRODUÇÃO
Primeiramente, antes de adentrar na análise do cabimento ou não de honorários advocatícios no cumprimento de sentença, é preciso fazer uma digressão acerca do instituto. De acordo com a doutrina[1], existem duas fases dentro do cumprimento: a)- a fase inicial, onde há o adimplemento voluntário e a multa legal coercitiva; b)- a segunda fase, a execução forçada.
DESENVOLVIMENTO
Fredie Didier Jr. entende que só cabe falar em honorários advocatícios nesta segunda etapa, vez que só aqui há o requerimento do credor e a instauração de uma demanda onde há pedido e causa de pedir, sem necessidade de nova qualificação das partes, nem requerimento de nova citação. O E. Superior Tribunal de Justiça entendeu que[2]:
Embora os honorários advocatícios possam ser fixados para a fase de cumprimento de sentença, a sua exigibilidade só é possível se o devedor não efetuar o pagamento ou o depósito no montante da condenação da condenação no prazo de 15 dias previsto no artigo 475-J do CPC, antes da prática dos executórios.
Ainda, esta segunda etapa poderia ser dividida em outras três subfases: 1) – a inicial, em que se busca a penhora e a avaliação de bens que possam satisfazer a dívida; 2) – impugnação do executado (fase de cognição limitada dentro da execução) e 3)- prática de atos de pagamento ou expropriação.
Como se percebe, nesta etapa do procedimento é que se instaura o contencioso executivo e há a fixação de honorários advocatícios, os quais serão estabelecidos nos termos do artigo 20, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil.
Este dispositivo é o fundamento para a incidência da verba no cumprimento de sentença, vez que afirma que “...nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz...”, de acordo com o voto proferido pela Ministra Nancy Andrighi no julgamento do REsp n. 978.545.
No entendimento da julgadora[3], “diz a Lei, e isso é sintomático, que os honorários serão fixados nas execuções. Não há no texto da norma referência aos “processos de execução”, mas às execuções. Induvidoso, portanto, que existindo execução, deverá haver a fixação de honorários. Acrescente-se, ainda, que o art. 475-I, do CPC, é expresso em afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, se faz por execução. Ora, se haverá arbitramento de honorários na execução (art. 20, § 4º, do CPC) e se o cumprimento da sentença se faz por execução (art. 475, I, do CPC), outra conclusão não é possível, senão a de que haverá a fixação de verba honorária na fase de cumprimento da sentença. No mais, o fato da execução agora ser um mero “incidente” do processo não impede a condenação em honorários, como, aliás, ocorre em sede de exceção de pré-executividade, na qual esta Corte admite a incidência da verba”.
De outro lado, no sentido do não cabimento dos honorários na fase de cumprimento voluntário, foi o entendimento do Ministro Aldir Passarinho Júnior em recente julgado do E. STJ[4]:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS. MULTA. ARTIGO 475-J, DO CPC. IMPULSO DA PARTE. NECESSIDADE. DESPROVIMENTO. I. "Na hipótese em que o trânsito em julgado da sentença condenatória com força de executiva (sentença executiva) ocorrer em sede de instância recursal (STF, STJ, TJ E TRF), após a baixa dos autos à Comarca de origem e a aposição do "cumpra-se" pelo juiz de primeiro grau, o devedor haverá de ser intimado na pessoa do seu advogado, por publicação na imprensa oficial, para efetuar o pagamento no prazo de quinze dias, a partir de quando, caso não o efetue, passará a incidir sobre o montante da condenação, a multa de 10% (dez por cento) prevista no art. 475-J, caput, do Código de Processo Civil." (REsp n. 940.274/MS, Rel. para o acórdão Min. João Otávio de Noronha, Corte Especial, maioria, DJe de 31.05.2010, RSTJ vol.. 219 p. 35). II. "Quanto à possibilidade de se fixar honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença, é cabível a verba sucumbencial em face do não-cumprimento voluntário por parte do devedor da obrigação imposta. In casu, não são devidos honorários advocatícios, pois houve o depósito do valor da condenação pela ré, sem que fosse apresentada impugnação." (AgR-REsp n. 1.060.935/RS, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, Unânime, DJe de 03.12.2008). III. Agravo regimental desprovido. – original sem grifos.
É interessante ressaltar que no Novo CPC, ainda em fase de aprovação pelo Congresso Nacional, há regra expressa no sentido do cabimento de honorários advocatícios no cumprimento de sentença, conforme redação dada aos parágrafos 1º e 9º de seu artigo 87:
Art. 87. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§1º A verba honorária de que trata o caput será devida também no pedido contraposto, no cumprimento de sentença, na execução resistida ou não e nos recursos interpostos, cumulativamente.
(...)
§9º As verbas de sucumbência arbitradas em embargos à execução rejeitados ou julgados improcedentes, bem como em fase de cumprimento de sentença, serão acrescidas no valor do débito principal, para todos os efeitos legais.
José Miguel Garcia Medina[5] afirma que como consequência da autonomia da ação de execução de sentença, considerando que não houve cumprimento voluntário, pelo réu, ensejando o exercício de nova demanda, pelo exequente, deverá o juiz definir os honorários advocatícios devidos ao advogado deste.
Existem Tribunais que entendem que neste caso se aplica a regra prevista no artigo 652-A do CPC, devendo o Juiz fixar de plano os honorários ao despachar a inicial.
O entendimento quanto ao cumprimento de sentença também foi discutido pelo E. Supremo Tribunal Federal[6], o que ensejou a edição da súmula n. 39 da Advocacia Geral da União:
"São devidos honorários advocatícios nas execuções, não embargadas, contra a Fazenda Pública, de obrigações definidas em lei como de pequeno valor (art. 100, § 3º, da Constituição Federal)."
Independentemente das diferenças existentes entre o procedimento executivo nas ações contra a Fazenda Pública e o previsto no artigo 475-J do CPC, o raciocínio é o mesmo, vez que espelha novamente o disposto no artigo 20, parágrafo 4º, do CPC.
Como bem expôs a Ministra Andrighi no acórdão mencionado acima, a lei não faz a distinção da espécie, se limitando apenas a afirmar que na execução são devidos honorários, razão pela qual tanto em sede de cumprimento de sentença forçado (segunda fase), nas execuções contra a Fazenda Pública e na exceção de preexecutividade, é cabível a fixação de honorários advocatícios.
Quanto a esta última, leia-se[7]:
PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 20 DO CPC. ACOLHIMENTO DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE PARA EXTINGUIR PARCIALMENTE A EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Discute-se nos autos a possibilidade de condenação em honorários advocatícios em face de acolhimento de exceção de pré-executividade que extinguir parcialmente a execução fiscal. O Tribunal de origem entendeu que "a alegação de que não houve fixação de honorários advocatícios no acórdão não procede vez que estes serão arbitrados na ação principal" (fl. 106). 2. Esta Corte já se manifestou no sentido de que o acolhimento do incidente de exceção de pré-executividade, mesmo que resulte apenas na extinção parcial da execução fiscal, dá ensejo à condenação na verba honorária proporcional à parte excluída do feito executivo. Nesse sentido: AgRg no Ag 1.236.272/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 03/02/2011, REsp 1.212.247/RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 14/02/2011, AgRg no REsp 1.143.559/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 14/12/2010, REsp 948.412/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 03/11/2010. 3. Retornem os autos à origem para que seja fixada a verba honorária na forma dos parágrafos 3º e 4º do art. 20 do CPC. 4. Recurso especial provido.
Ainda no contexto do cabimento de honorários advocatícios no cumprimento de sentença, interessante é o ensinamento de Luiz Guilherme Marinoni[8]. Segundo o autor, nada mais óbvio do que a incidência da verba, vez que o advogado não é obrigado a trabalhar sem que haja retribuição pelo seu trabalho. Assim, iniciada a execução forçada, quem deve arcar com os honorários do advogado do credor é o réu. No momento de decidir acerca do cumprimento, deve o Juiz fixar a verba independentemente da multa prevista pelo atraso, já que esta tem caráter sancionatório e não reverte em favor do patrono do credor, mas sim deste:
Na fase de execução, além de devidos honorários de advogado, não é possível premiar o réu em virtude de pagamento imediato ou integral. Na execução da sentença condenatória, trabalha-se com outro tipo de sanção, isto é, com uma sanção punitiva, voltada a estimular o devedor a pagar para não sofrer a multa de dez por cento, e não com uma sanção dirigida a estimulá-lo a cumprir para se beneficiar com a redução do valor a ser pago. A distinção entre as sanções decorre da diferença entre a sentença condenatória e o título extrajudicial, sendo claro que o condenado não merece a mesma espécie de estímulo que o devedor de título extrajudicial.
Como dito em outras oportunidades, as reformas recentes do CPC visam á celeridade e à efetividade, dando ênfase, quando possível, ao chamado sincretismo. Assim, elimina-se a “ação autônoma de execução” – ressalvados os casos em que o cumprimento é incompatível com a natureza do crédito, como nas execuções contra a Fazenda Pública – para dar lugar a um processo uno, com incidentes que permitem a rápida solução do litígio.
Não se pode esquecer, no que tange aos fins a que se presta o cumprimento de sentença, que o artigo 475-J busca a máxima efetividade da execução, visando garantir ao credor a satisfação total (quando possível) de seu crédito, da maneira menos onerosa ao devedor.
CONCLUSÃO
O voto proferido no REsp n. 978.545, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça apenas consolidou uma regra que havia sido colocada em dúvida quando da alteração do CPC pela lei n. 11.232/05, vez que não há previsão expressa no que tange aos honorários, omissão esta a ser superada com a entrada em vigor do Novo Código.
Desta forma, considerando todos os posicionamentos acima expostos bem como os julgados transcritos, não há como se defender a ilegalidade da fixação de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença, vez que não se pode condicionar o pagamento da verba à existência de uma ação autônoma de execução.
[1] DIDIER Jr., Fredie. DA CUNHA, Leonardo José Carneiro. BRAGA, Paula Sarno. OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 5. P. 525/526. Editora Juspodivm. 2009.
[2] AgRg no REsp 1153180/SP. Rel. Min. Humberto Martins. J. 04.11.2010.
[3] Extraído do inteiro teor do acórdão proferido no REsp 978.545 in http://www.stj.jus.br.
[4] AgRg no REsp 1119688 / SP. DJe 25/02/2011.
[5] Código de Processo Civil Comentado. 3ª tiragem. P. 460. Editora RT. 2011.
[6] RE 420816 (DJ de 10/12/2006).
[7] STJ. REsp 1243090 / RS. Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES. DJe 28/04/2011.
[8] Curso de Processo Civil. Vol. 3. P. 440/441. Ed. RT. 2011.
Procurador Federal, membro da Advocacia-Geral da União. Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARANDA, Alexandre Lundgren Rodrigues. Do cabimento de honorários advocatícios no cumprimento de sentença Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 abr 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38952/do-cabimento-de-honorarios-advocaticios-no-cumprimento-de-sentenca. Acesso em: 23 dez 2024.
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