Resumo: Este trabalho aborda, sinteticamente, a distinção entre metas de universalização e revisão tarifária. Assim é que o presente estudo discorre sobre a definição de cada um desses institutos, a distinção entre eles e sobre eventual possibilidade de efetivação de redução de tarifas, por meio da revisão tarifária, como consequência da desoneração das metas do Plano Geral de Metas de Universalização.
Sumário: 1. Introdução. 2. Da distinção entre metas de universalização e revisão tarifária. 3. Conclusão.
Palavras-Chave: Metas de universalização. STFC. Revisão tarifária. Distinção. PGMU. Modicidade Tarifária. Equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
1 Introdução
As metas de universalização são obrigações impostas às concessionárias do serviço de telefonia fixa prestado em regime público, com o objetivo de possibilitar o acesso de qualquer pessoa ou instituição de serviço público a serviço de telecomunicações, independentemente de sua localização e condição socioeconômica, bem como de permitir a utilização das telecomunicações em serviços essenciais de interesse público (art. 79, §1º, da LGT).
As obrigações de universalização são consolidadas no Plano Geral de Metas para a Universalização (PGMU). Atualmente está em vigor o Plano aprovado pelo Decreto 7.512/2011, com metas para o período de 2011 a 2015. Após, tal Plano será revisado para o período de 2016 a 2020.
Nos termos do art. 64 da LGT, comportarão prestação no regime público as diversas modalidades do serviço telefônico fixo comutado. Demais disso, ainda nos termos da LGT, cabe ao Poder Executivo, por meio de decreto, instituir ou eliminar a prestação de modalidade de serviço no regime público, concomitantemente ou não com sua prestação no regime privado (art. 18, inciso I). Dessa feita, atualmente o regime público refere-se apenas ao serviço telefônico fixo comutado, sendo que eventual alteração (instituição ou eliminação de serviço no regime público) depende de decreto do Poder Executivo.
Nesse ponto, de se indagar, considerando a notoriedade do fato de que a população apresenta cada vez menor interesse na telefonia fixa (a bem da verdade, atualmente a população está cada vez mais interessada no serviço de telefonia móvel e de internet), se, na revisão do PGMU para o período de 2016 a 2020, poder-se-ia, ao invés de estabelecer novas metas, utilizar o montante de eventuais saldos de recursos decorrentes da desoneração de metas em revisão tarifária, por meio da redução das tarifas do serviço.
A intenção deste trabalho, portanto, é discorrer sobre essa questão.
2 Da distinção entre metas de universalização e revisão tarifária
De início, de se dizer que não há de se confundir metas de universalização com revisão tarifária.
Como já salientado, as metas de universalização são obrigações impostas às concessionárias do serviço de telefonia fixa prestado em regime público, com o objetivo de possibilitar o acesso e a utilização do serviço.
Assim é que o PGMU, em princípio, pressupõe novas metas de universalização, a serem estabelecidas de acordo com as condições vigentes à época. Ou seja, a revisão do PGMU pressupõe o estabelecimento de novas metas que, de acordo com as condições vigentes à época, possibilitem o acesso e a utilização do serviço. Nesse sentido, vale citar a Cláusula 3.2 dos Contratos de Concessão:
Cláusula 3.2. O presente Contrato poderá ser alterado em 31 de dezembro de 2010, 31 de dezembro de 2015 e 31 de dezembro de 2020 para estabelecer novos condicionamentos, novas metas para universalização e para qualidade, tendo em vista as condições vigentes à época, definindo-se, ainda, no caso de metas de universalização, os recursos complementares, nos termos do art. 81 da Lei nº 9.472, de 1997.
§ 1º A Anatel, 24 (vinte e quatro) meses antes das alterações previstas nesta cláusula, fará publicar consulta pública com sua proposta de novos condicionamentos e de novas metas para qualidade e universalização do serviço, submetidas estas últimas à aprovação, por meio de Decreto, do Presidente da República, nos termos do art. 18, inciso III, da Lei nº 9.472, de 1997.
I - A Consulta Pública com as propostas de alterações previstas para 31 de dezembro de 2015 será publicada até 30 de junho de 2014.
§ 2º As alterações mencionadas na presente Cláusula não excluem a possibilidade de revisão, a qualquer tempo, do presente Contrato em virtude da superveniência de fato relevante, a critério da Anatel.
§ 3º Cumpre à Anatel assegurar a proteção da situação econômica da Concessionária, nos termos do Capítulo XIII deste Contrato.
[grifos acrescidos]
De outro lado, a revisão tarifária, que, repita-se, não se confunde com metas de universalização, está intimamente relacionada com os institutos da modicidade tarifária e do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Sobre o conceito e contornos da revisão tarifária, vale transcrever trechos do Parecer nº 76/2014/PFS/PFE-Anatel/PGF/AGU, exarado pela Procuradoria Federal Especializada junto à Anatel, nos autos do processo nº 53500.004493/2009. Vejamos:
II.(b). Revisão tarifária.
24. A revisão tarifária, por sua vez, segundo as disposições do contrato de concessão, especificamente seu capítulo XIII, está relacionada com acontecimentos extraordinários e pontuais, ou seja, dissociados da conjuntura ordinária do mercado e do comportamento empresarial.
25. De plano, o contrato de concessão, em sua cláusula 13.1, já dispõe que constitui seu pressuposto básico a preservação, em regime de ampla competição, da justa equivalência entre a prestação e a remuneração, vedado às partes o enriquecimento imotivado às custas de outra parte ou dos usuários do serviço.
26. Por um lado, a concessionária só está obrigada a suportar prejuízos em decorrência do contrato de concessão se eles decorrerem de um dos seguintes fatores, conforme delineados no §1º da referida cláusula 13.1: (i) da sua negligência, inépcia ou omissão na exploração do serviço; (ii) dos riscos normais à atividade empresarial; (iii) da gestão ineficiente dos seus negócios, inclusive aquela caracterizada pelo pagamento de custos operacionais e administrativos incompatíveis com os parâmetros verificados no mercado; ou (iv) da sua incapacidade de aproveitar as oportunidades existentes no mercado, inclusive no atinente à expansão, ampliação e incremento da prestação do serviço objeto da concessão.
27. Como se vê, as hipóteses em que se admite que a concessionária sofra prejuízos em função do contrato celebrado são bastante amplas, seja por culpa sua ou por conjunturas ordinárias do mercado. É praticamente a regra geral. Fará jus à recomposição da sua situação inicial de encargos e retribuições quando circunstâncias de força maior ou calamidades afetarem de forma significativa a exploração do serviço, observado sempre, como parâmetro, o reflexo dessas situações nos prestadores de serviços telecomunicações no regime privado.
28. Além dessas hipóteses mais fáticas, o §4º do art. 108 da LGT dispõe que a oneração causada por novas regras sobre os serviços, pela álea econômica extraordinária, bem como pelo aumento dos encargos legais ou tributos, salvo o imposto sobre a renda, implicará a revisão do contrato.
29. Nesse caso, proceder-se-á à revisão tarifária em prol da concessionária, embora também se admita a utilização de outro mecanismo que, a critério da Anatel, seja considerado apto a neutralizar a situação verificada.
30. Além da revisão tarifária visando a evitar prejuízo à concessionária, nos casos de força maior ou calamidades, vale lembrar que também é possível proceder-se à revisão tarifária em prol dos consumidores, a fim de evitar que a concessionária se enriqueça indevidamente. O §2º da cláusula 13.1 do contrato de concessão veda o que denomina de enriquecimento imotivado da concessionária:
§ 2º É vedado o enriquecimento imotivado da Concessionária decorrente:
I - da apropriação de ganhos econômicos não advindos diretamente da sua eficiência empresarial, em especial quando decorrentes da edição de novas regras sobre o serviço; e
II - do repasse de receitas a terceiros, em detrimento da aplicação do princípio da modicidade tarifária, conforme estabelecido no § 7º da Cláusula 6.1.
31. Nesse sentido é que a LGT dispõe, no §3º do art. 108, que serão transferidos integralmente aos usuários os ganhos econômicos que não decorram diretamente da eficiência empresarial, em casos como os de diminuição de tributos ou encargos legais e de novas regras sobre os serviços.
32. A revisão tarifária como mecanismo pontual e não ordinário de ajuste nos valores das tarifas fica clara quando o §2º da cláusula 13.2. do contrato de concessão aduz que a providência adotada para neutralizar uma distorção será única, completa e final relativamente ao evento que lhe deu origem. Ou seja, a revisão é vinculada a evento específico, e não à conjuntura do mercado e da conduta empresarial, que, como se viu, são associados ao reajuste tarifário.
33. Como se vê, a revisão tarifária pode ocorrer em favor da concessionária ou dos usuários, a depender do teor do evento que lhe dá origem. Nesse sentido, vale colacionar a cláusula 13.3. do contrato de concessão, que apresenta hipóteses de revisão tarifária decorrentes de atos praticados pelo Estado, como modificações contratuais, alterações legislativas, fato do príncipe, etc:
Cláusula 13.3. Independentemente do disposto na Cláusula 13.1, caberá revisão das tarifas integrantes do Plano Básico do Serviço Local em favor da Concessionária ou dos usuários, nos termos do art. 108 da Lei nº 9.472, de 1997, quando verificada uma das seguintes situações específicas:
I - modificação unilateral deste Contrato imposta pela Anatel, que importe variação expressiva de custos ou de receitas, para mais ou para menos, de modo que a elevação ou redução de tarifas seja imposta pela necessidade de evitar o enriquecimento imotivado de qualquer das partes;
II - alteração na ordem tributária posterior à assinatura deste Contrato que implique aumento ou redução da lucratividade potencial da Concessionária;
III - ocorrências supervenientes, decorrentes de fato do príncipe ou fato da Administração que resultem, comprovadamente, em alteração dos custos da Concessionária;
IV - alteração legislativa de caráter específico, que tenha impacto direto sobre as receitas da Concessionária de modo a afetar a continuidade ou a qualidade do serviço prestado; ou
V - alteração legislativa que acarrete benefício à Concessionária, inclusive a que concede ou suprime isenção, redução, desconto ou qualquer outro privilégio tributário ou tarifário, consoante do previsto no § 3º do art. 108 da Lei nº 9.472, de 1997.
§ 1º Não importará na revisão de tarifas o prejuízo ou a redução de ganhos da Concessionária decorrente da livre exploração do serviço em condições de competição ou da gestão ineficiente dos seus negócios.
§ 2º Não será aplicável a hipótese de revisão prevista no inciso II do caput desta Cláusula quando a alteração na ordem tributária implicar criação, supressão, elevação ou redução em impostos incidentes sobre a renda ou o lucro da Concessionária, como o Imposto sobre a Renda, que não impliquem oneração administrativa ou operacional.
§ 3º Não caberá revisão de tarifas nas hipóteses previstas nesta Cláusula quando os eventos ensejadores da revisão já estiverem cobertos pelo Plano de Seguros previsto na Cláusula 24.1.
§ 4º As contribuições da Concessionária ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações e ao Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações não ensejarão revisão das tarifas.
34. Por fim, deve-se consignar que não se procederá à revisão tarifária em favor da concessionária quando os impactos do evento apontado como motivador do pedido de revisão puderem ser neutralizados pela eficiente exploração do serviço, pela expansão do mercado ou pela geração de receitas alternativas ou complementares associadas ao objeto do contrato de concessão.
Como se vê, a revisão tarifária pode sim ser realizada nos moldes da LGT e do Contrato de Concessão, mas não como forma de universalização. A revisão tarifária não se traduz em universalização.
A universalização pressupõe o estabelecimento de metas periódicas e deve referir-se, dentre outros, aos aspectos elencados pelo artigo 80 da LGT:
Art. 80. As obrigações de universalização serão objeto de metas periódicas, conforme plano específico elaborado pela Agência e aprovado pelo Poder Executivo, que deverá referir-se, entre outros aspectos, à disponibilidade de instalações de uso coletivo ou individual, ao atendimento de deficientes físicos, de instituições de caráter público ou social, bem como de áreas rurais ou de urbanização precária e de regiões remotas.
§ 1º O plano detalhará as fontes de financiamento das obrigações de universalização, que serão neutras em relação à competição, no mercado nacional, entre prestadoras.
§ 2º Os recursos do fundo de universalização de que trata o inciso II do art. 81 não poderão ser destinados à cobertura de custos com universalização dos serviços que, nos termos do contrato de concessão, a própria prestadora deva suportar.
Cumpre destacar, ainda, que a universalização engloba não só o serviço em si, mas também as redes de suporte ao serviço: (i) redes de suporte (backhaul); e (ii) redes de acesso. A título exemplificativo, vale citar o artigo 5º, inciso III, do Decreto nº 2.592, de 15 de maio de 1998, que aprovou o Plano Geral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado no Regime Público daquela época:
Art. 5º Em localidades com Serviço Telefônico Fixo Comutado, com acessos individuais, a Concessionária deverá:
[...]
III - tornar disponíveis acessos individuais para Estabelecimentos de Ensino Regular e Instituições de Saúde, objetivando permitir-lhes comunicação com redes de computadores, mediante utilização do próprio Serviço Telefônico Fixo Comutado ou da rede que lhe dá suporte. [grifos acrescidos]
Vale consignar, ainda, a título ilustrativo, que ampliação da capacidade do backhaul também se traduz em universalização do STFC. Nesse sentido, vale citar o artigo 3º do Decreto nº 6.424, de 4 de abril de 2008, que altera e acresce dispositivos ao Anexo do Decreto no 4.769, de 27 de junho de 2003, que aprovou o Plano Geral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado prestado no Regime Público – PGMU (PGMU II), verbis:
Art. 3º Os arts. 3º, 13, 16 e 17 do Anexo ao Decreto no 4.769, de 2003, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 3º...................
XII - Unidade de Atendimento de Cooperativa - UAC é aquela que atende efetivamente os associados de uma cooperativa, desenvolvendo atividades específicas, tais como unidades de armazenagem, embalagem, frigorificação, crédito e infra-estrutura, entre outras;
.............................................................................
XIV - Backhaul é a infra-estrutura de rede de suporte do STFC para conexão em banda larga, interligando as redes de acesso ao backbone da operadora.
..................................................................... ” (NR)
“Art. 13. A concessionária deverá instalar backhaul nas sedes dos municípios e localidades ainda não atendidos, em suas respectivas áreas geográficas de concessão, observadas as seguintes disposições:
I - quarenta por cento das sedes dos municípios, até 31 de dezembro de 2008;
II - oitenta por cento das sedes dos municípios, até 31 de dezembro 2009; e
III - cem por cento das sedes dos municípios, até 31 de dezembro 2010.
§ 1º As despesas e as receitas resultantes da implementação do disposto no caput, assim como o eventual saldo dos recursos, serão apurados até 31 de julho de 2010, em forma a ser estabelecida por regulamento da ANATEL.
§ 2º Verificado, nos termos do disposto no § 1º, eventual saldo positivo, este será utilizado na ampliação do backhaul, o que se dará pelo atendimento a localidades a que se refere o caput ou, em já estando todas as localidades atendidas, pelo aumento das capacidades mínimas de transmissão, na forma de regulamento a ser estabelecido pela ANATEL.
§ 3º Os critérios de atendimento às novas localidades, conforme o disposto no § 2o, serão definidos em regulamento da ANATEL.
§ 4º À concessionária que já houver atendido ao disposto no caput e seus incisos na data da publicação deste Decreto será aplicado o disposto no § 2o.
§ 5º A concessionária tem por obrigação disponibilizar o acesso à infraestrutura de que trata o caput, nos termos da regulamentação aplicável, atendendo, preferencialmente, a implementação de políticas públicas para as telecomunicações.
§ 6º Fica excluída da obrigação constante deste artigo a concessionária na modalidade longa distância nacional e internacional.” (NR)
[...]
Como se vê, o PGMU II estabeleceu não só a instalação de backhaul, mas também a utilização de eventual saldo positivo na ampliação do backhaul, pelo atendimento a localidades referidas ou, em já estando todas as localidades atendidas, pelo aumento das capacidades mínimas de transmissão, na forma de regulamento a ser estabelecido pela Anatel.
3 Conclusão
Em vista do exposto no presente trabalho, conclui-se que somente se for constatado e atestado que efetivamente todas as metas de universalização já foram atingidas e que não existem mais metas a serem estipuladas é que se vislumbra a possibilidade de utilização de eventual recuso de universalização na redução de tarifas, em sede de revisão.
Nesse caso, pode-se dizer que, muito embora não se trate de universalização, a redução tarifária, por meio da revisão de tarifas, será efetivada como consequência da desoneração das metas até então estipuladas.
Em suma, o conceito de universalização não se confunde com o de modicidade tarifária. Com efeito, a redução de tarifas deve ser efetivada por meio de uma revisão tarifária.
Desse modo, somente é possível a utilização de eventual recurso de universalização na redução de tarifas, em sede de revisão tarifária, se todas as metas de universalização já tiverem sido atingidas e novas metas não puderem ser estipuladas, em razão da completa universalização do serviço (nível máximo). Nesse caso, essas situações devem ser devidamente atestadas.
Referências Bibliográficas
ESCOBAR, João Carlos Mariense. Serviços de telecomunicações: aspectos jurídicos e regulatórios. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.
Telecomunicações no desenvolvimento do Brasil. Coordenação Geral Lia Ribeiro Dias, Patrícia Cornils. São Paulo: Momento Editorial, 2008.
Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FELIX, Luciana Chaves Freire. Da distinção entre metas de universalização e revisão tarifária Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 abr 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39006/da-distincao-entre-metas-de-universalizacao-e-revisao-tarifaria. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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