Para possibilitar o exercício do poder de polícia do Estado, muitas atividades devem ser registradas em cadastro próprio, mesmo sem um processo administrativo de licenciamento. A comercialização de produtos florestais está sujeita ao controle do Poder Público. Somente estão dispensados das autorizações ambientais aqueles produtos já transformados e acabados, utilizáveis sem mais nenhuma intervenção humana na sua transformação.
As empresas que comercializam produtos florestais são obrigadas ao registro no Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Florestais, instituído pelo art. 17, II, da Lei n.º 6.938/81, verbis:
“Art. 17 – Fica instituído, sob a administração do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama:
I- (...)
II- Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, para registro obrigatórios de pessoas físicas e jurídicas que se dediquem à atividades potencialmente poluidoras e/ou à extração, produção, transporte e comercialização de produtos potencialmente perigosos ao meio ambiente, assim como de produtos e subprodutos da fauna e flora;”
Importa observar que a extração, o transporte, o armazenamento, como também a comercialização de produtos florestais, exigem a comprovação da licitude de sua origem, a qual deve ser comprovada através do Documento de Origem Florestal – DOF ou outro documento aprovado pelo sistema nacional de controle mantido pelo IBAMA e pelo Ministério do Meio Ambiente.
Pelo Sistema DOF qualquer vendedor de madeira ou outro produto florestal somente consegue emitir o documento de transporte e armazenamento para empresas registradas no Cadastro Técnico Federal, exigência que também é aplicável para eventuais sistemas estaduais, uma vez que estes últimos devem estar interligados com o sistema nacional.
Com a implantação do Sistema, a comercialização de madeira para as empresas de beneficiamento somente pode ser efetivada pelo sistema eletrônico se o computador estiver registrado no Cadastro Técnico Federal para a emissão do documento de transferência e transporte – o Documento de Origem Florestal.
O Decreto n.º 5.975/2006 estabelece que o documento válido para todo o tempo da viagem ou do armazenamento do produto florestal deve ser uma licença gerada por sistema eletrônico, previamente cadastrado pelo Poder Público gerada por sistema eletrônico, previamente cadastrado pelo Poder Público Federal, compatível com um sistema eletrônico integrado nacionalmente.
Considerando as necessidades de integrar a atuação dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) na execução da Política Florestal do país e de regulamentar os procedimentos e critérios de padronização e integração de sistemas, instrumentos e documentos de controle, transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais pela União, Estados e Distrito Federal, especialmente para eficiência dos procedimentos de fiscalização ambiental, em virtude do disposto na Lei nº. 10.650/2003, que regula o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do SISNAMA, resolveu o CONAMA, através da Resolução nº. 379, de 19 out. 2006, que os órgãos integrantes devem disponibilizar na internet as informações sobre a gestão florestal, em especial, sobre os documentos para o transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais de origem nativa.
Saliente-se que o CONAMA, no art. 5º da citada Resolução, dispôs que ao tempo em que as informações referentes aos documentos para o transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais de origem nativa observariam diretrizes mínimas de garantia do controle da origem, destino e respectivas transformações industriais dos produtos e subprodutos florestais de origem nativa, assegurou também que a geração, emissão e controle dos documentos por meio de sistema eletrônico e informatizado, teriam os respectivos conteúdos sob a responsabilidade dos respectivos usuários.
Assim, ao tempo que estabelece a competência do órgão ambiental que autoriza a exploração do PMFS ou a supressão de vegetação, pela legislação, para se emitir a licença para o transporte e armazenamento, obriga que esta licença seja compatível com o Sistema DOF, possibilitando um controle federal sobre atividade.
Tal interesse destina-se a manter um controle sobre a exploração de produtos florestais no País, em consonância com o art. 1º do Código de Florestal que estabelece que as florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação são bens de interesse comum a todos os habitantes do País.
Por outro lado, importa citar que a posse do Certificado de Registro ou o de Regularidade não desobriga as pessoas físicas ou jurídicas inscritas no Cadastro Técnico Federal de obter as licenças, autorizações, permissões, concessões, alvarás e demais documentos obrigatórios dos órgãos federais, estaduais ou municipais para o exercício de suas atividades (art. 11 da Instrução Normativa Nº 31, de 03 dez. 2009, do IBAMA).
Sendo assim, cumpre desde já definir a distinção entre cancelamento do registro no Cadastro Técnico Federal de cancelamento de Licença Ambiental.
A Resolução CONAMA 237/97 em seu art. 1.º, I, define Licença Ambiental como o “procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva e potencialmente poluidoras ou daqueles que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas aplicáveis ao caso”.
Ao abordar a objeção referida, vem à mente a autonomia dos Estados em relação à União prevista na Carta Magna. Muito embora a União tenha a competência de editar Leis que regulem de forma geral os critérios para a concessão da dita licença, estas normas devem ser aplicadas pelos Estados Membros, que têm autonomia na regulamentação dos órgãos estaduais de controle, regulamentação esta que significa: controle do órgão, administração, atuação do mesmo, e regulamentos suplementares à norma federal quanto aos requisitos da licença.
Saliente-se que o fim colimado pelo IBAMA não é o de invadir a competência dos Estados quanto ao procedimento de concessão e cancelamento das Licenças Ambientais por eles conferidas. Trata-se de ato administrativo praticado por ente federativo independente e autônomo.
Cabe ao IBAMA então, em hipóteses dessa natureza, representar ao Órgão Ambiental competente. Contudo, a desobediência das condicionantes por ele regulados, à luz da legislação aplicável, pode resultar em cancelamento da licença pelo próprio órgão licenciador ou anulação via Poder Judiciário.
A Licença Ambiental opera ao seu possuidor direito temporal à atividade, podendo operar fatores supervenientes que podem resultar desde a modificação até o cancelamento.
O art. 19 da Resolução CONAMA 237/97, trata da possibilidade de modificação, suspensão e cancelamento de Licença Ambiental, onde modificar significa dar nova configuração ao estado anterior; suspender significa sobrestar, sustar até adequação aos requerimentos ambientais necessários; e cancelar, simplesmente, desfazer, anular, tornar o ato ineficaz por algum motivo.
Dispõe o citado art. 19, verbis:
"Art. 19 – O órgão ambiental competente, mediante decisão motivada, poderá modificar os condicionantes e as medidas de controle e adequação, suspender ou cancelar uma licença expedida, quando ocorrer:
I – violação ou inadequação de quaisquer condicionantes ou normas legais;
II – omissão ou falsa descrição de informações relevantes que subsidiaram a expedição de licença;
III – superveniência de graves riscos ambientais e de saúde."
As hipóteses para tais medidas, como se vê, passam pela comprovação de fatores extremados, tentando manter, assim, o máximo da segurança para aquele que consegue a licença, mas que, por outro lado, abrem a possibilidade, no caso dos riscos graves ao ambiente, de revolver esse direito, o que, deverá ser avaliado objetivamente no plano fático.
Consoante nosso texto constitucional, o exercício das atividades econômicas em nosso país é livre, logo a intervenção do Poder Público tem que ser embasada por lei que determine sua atuação, não podendo, pois, simplesmente cercear a atividade privada sem demonstrar norma que dê guarida a sua intenção. Bem alude a melhor doutrina ao lecionar mencionar que a intervenção do Poder Público não se rege pelo sistema da presunção.
Embora não se descure da possibilidade de aplicação de sanção restritiva de direitos prevista no art. 72, § 8º, II, da Lei nº 9.605/98, e no art. 20, II, do Decreto nº 6.514/2008 (cancelamento de registro, licença, ou autorização) diante de situações que revelem graves irregularidades constatadas, mediante a formação de processo administrativo autônomo (contendo patente e objetivamente a constatação das irregularidades) e após a oportunização de defesa ao interessado, tal reprimenda deve ser manejada com certos cuidados por parte da autoridade competente, sob pena de caracterizar condenação arbitrária, afrontando o princípio da ampla defesa e do contraditório.
Essas penalidades são, no fundo, acessórias à sanção principal, eis que não tem sentido aplicá-la isoladamente, sem associação com a multa ou com a suspensão de obra ou atividade. A imposição da sanção, no caso, é de competência do ente federado responsável pela emissão do registro, licença, permissão ou autorização.
Também não se olvida da possibilidade da adoção providências cautelares, que cabem ser discernidas das sanções administrativas, que muitas vezes com elas podem ser confundidas. Importa muito fazer tal diferenciação porque não se submetem à integralidade dos princípios acima citados.
Medidas administrativas acautelatórias são providências que a Administração muitas vezes necessita adotar de imediato para prevenir danos sérios ao interesse público ou à boa ordem administrativa e cuja finalidade não é – como a das sanções – intimidar eventuais infratores para que não incorram em conduta ou omissão indesejada, mas, diversamente, é a de paralisar comportamento de efeitos danosos ou de abortar a possibilidade de que se desencadeiem.
Tais medidas precedem sanções administrativas, mas com elas não se confundem. Por exemplo, a provisória interdição de um estabelecimento perigosamente poluidor, quando tenha que ser tomada sem delonga alguma, é providência cautelar e só se converterá em sanção depois de oportunizado o direito de defesa ao presumido infrator. Em algumas situações seu cabimento é prestante também para garantir a imposição de sanção administrativa, mas só assumirá tal caráter, após a conclusão de um processo regular, quando for o caso.
Na ocorrência de atividades irregulares, sem autorização, quando exigida ou em desacordo com a mesma, justifica-se a aplicação imediata da providência acautelatória, como forma de impedir sua ultimação e o fato consumado, verificando se sua interrupção não representa risco maior para o meio ambiente ou para a coletividade.
A suspensão de atividades deve observar certos critérios, garantindo-se que ninguém seja privado de seus bens arbitrariamente. Ensina Curt Trennepohl, que “é muito importante que se observe, exatamente, qual a atividade a ser atingida pelo embargo. No caso de uma serraria, p. ex., cujo funcionamento será autorizado pelos órgãos ambientais e em cujo pátio se encontra, para serem beneficiadas, somente madeiras sem procedência legal, não cabe a aplicação da pena de embargo da atividade da empresa, pois essa é lícita. Somente os insumos, que são ilícitos, podem ser apreendidos e, consequentemente, proibida sua utilização.” (Infrações contra o meio ambiente: multas e outras sanções administrativas, 1ª Ed., Fórum, 2006)
A paralisação das atividades lícitas de uma empresa, v. g., com autorização de funcionamento expedida pelo órgão ambiental competente, não deve ser utilizada de maneira sumária, mas após processo administrativo próprio, previsto no art. 70, § 4o, da Lei no 9.605/98, assegurando-se o direito a ampla defesa e ao contraditório, sob pena de afronta à norma constitucional.
Deste modo, forçoso reconhecer que efetuar suspensões, sem a constatação das suspeitas erigidas, é medida extremada, vez que tal constrição, sem o devido processo administrativo, não se apoia em qualquer texto legal, constituindo-se violação ao livre exercício de atividade lícita, constitucionalmente assegurada, rechaçada pelos Tribunais pátrios.
A Administração Pública está adstrita ao princípio da legalidade, devendo obediência às normas constitucionais, legais e regulamentares. Segundo este princípio, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite. No direito positivo brasileiro, esse postulado contido no artigo 5º, inciso II, e também no artigo 37 da Constituição Federal, que, repetindo preceito de Constituições anteriores, estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Faz-se necessário distinguir se o administrado é responsável pelos fatos presumidos. A aferição de sua responsabilidade só poderá ocorrer desse modo, não por outros meios, fato que importa de forma oblíqua, em suspensão da atividade econômica do mesmo, sem o devido processo legal, cuja ampla defesa e o contraditório são corolários.
Constatada quaisquer irregularidades no desenvolvimento das atividades do administrado, sua responsabilidade estará configurada, possibilitando a aplicação do disposto que no art. 35 da Instrução Normativa nº. 112, de 21 ago. 2006, do IBAMA, bem como viabilizando a aplicação das demais medidas concernentes ao seu poder de polícia, tais como as sanções administrativas de multa, apreensão do produto florestal, etc.
Impende mencionar que, em qualquer caso, a existência de constatação de irregularidades possibilita que o IBAMA suspenda o fornecimento de DOFs (ou documento para transporte ou armazenamento equivalente), tendo em vista o que dispõe o art. 35, da IN nº. 112/2006, do IBAMA, ipsis litteris:
“Art. 35. O IBAMA suspenderá a emissão do DOF se constatada, de forma direta ou indireta, irregularidade na execução das autorizações concedidas em plano de manejo florestal sustentável, ou autorização de desmatamento, nos estoques de pátio ou no seu controle ou qualquer outra irregularidade constatada.”
Se da análise do caso, inferir o IBAMA a existência de irregularidades por conta das cogitações feitas, o bloqueio de acesso do interessado ao Sistema DOF será legal e legítimo, no contexto descortinado. Assim, tal fato autorizará o bloqueio como medida de cautela visando ao resguardo do meio ambiente até a conclusão do processo administrativo.
Poderíamos objetar que de nada adiantaria permitir o desbloqueio e em consequência a continuidade das atividades da empresa se, ao final deste processo administrativo, se concluir pela efetiva existência das irregularidades suspeitada, não se justificando a proteção a direito individual em detrimento do interesse coletivo ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Ocorre que a presente questão assim não se apresenta. Isto porque, o bloqueio, quando pendente de apreciação - não tem o condão de projetar antijuridicidade sobre toda a atividade do administrado. A sanção prevista no art. 72, VII, da Lei nº. 9.605/98, além de subordinar-se ao controle de prévio processo administrativo, demanda o efetivo exercício de empreendimento de atividade ilícita, conceito no qual não resta passível de enquadramento as atividade reguladas, rechaça atos dessa espécie, vez que possuem efeitos nefastos, pois a paralisação de atividades produtivas, sem o precedente processo legal e sem maiores fundamentos, encontra nefasta ressonância econômica e social.
Penso que a legislação ambiental claramente autoriza a suspensão dos serviços como uma das sanções administrativas. É o que dispõem os artigos 72, XI, da Lei nº. 9.605/98, 20, I, do Decreto nº. 6.514/2008.
Nesse particular, discordo do entendimento de alguns Tribunais, que tem decidido pela impossibilidade de suspensão dos serviços, por configurar meio de cobrança indireta da dívida ativa.
E o faço com a devida vênia àquelas Cortes, porque ainda não há jurisprudência pacífica e específica dos Tribunais Superiores. A jurisprudência sumulada do STF é relativa à cobrança de tributos, cuja cobrança pressupõe o exercício de uma atividade lícita por parte do contribuinte.
Todavia, para sua aplicação mostra-se imprescindível escrutinar o histórico do administrado quanto ao descumprimento da legislação ambiental, com o fulcro de comprovar se o mesmo possui conduta renitente e contrária ao meio ambiente, sendo essa inclusive uma exigência legal prevista para prestação de qualquer serviço oferecido às pessoas físicas ou jurídicas.
Entretanto, aplicar medidas restritivas de direitos do interessado sem empreender um juízo sobre seus antecedentes no cumprimento da legislação ambiental e sem aguardar o desfecho do processo administrativo, paralisando toda sua atividade econômica, sem a devida aferição dos fatores precedentes apontados, preponderantes para sua aplicação, ou ainda, a reincidência no descumprimento da legislação ambiental, é medida que se mostra precipitada.
O devido processo legal é um garantia constitucional alocada no art. 5º, LV da CF/88 e sua observância é obrigatória em qualquer processo administrativo desenvolvido no âmbito da Administração Pública.
“Art. 5º (...)
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (...)”
Deve ser observado esse postulado básico do Estado de Direito, não devendo subsistir a situação restritiva, pelo menos até que haja prova da prática de eventual infração ambiental.
No que se refere à atividade, a restrição equivale, em tudo, à suspensão do empreendimento que, indiretamente, proporciona a paralisação do funcionamento do administrado.
Constitui medida extrema, atentatória ao princípio da razoabilidade, a adoção da sanção restritiva sem que ao menos tenha sido dada oportunidade de defesa ao administrado, considerando, ainda, a gravidade da medida imposta, com possibilidade de repercussão. Integra o direito a ampla defesa, insculpido no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, caráter prévio dessa, ou seja, como regra, antes de efetivamente se punir alguém deve ser dada oportunidade ao acusado de se defender. Não há razão para que tal princípio não seja observado nas infrações administrativas
As sanções devem guardar uma relação de proporcionalidade com a gravidade da infração. Ainda que a aferição desta medida inúmeras vezes possa apresentar dificuldade em ser caracterizada, em inúmeras outras é perfeitamente clara; ou seja: há casos em que se pode ter dúvida se tal ou qual gravame está devidamente correlacionado com a seriedade da infração - ainda que se possa notar que a dúvida nunca se proporá em uma escala muito ampla, mas em um campo de variação relativamente pequeno -, de par com outros casos em que não haverá dúvida alguma de que a sanção é proporcional ou é desproporcional. É impossível no Direito fugir-se a situações dessa compostura, e outro recurso não há para enfrentar dificuldades desta ordem senão recorrendo ao principio da razoabilidade, mesmo sabendo-se que também ele comporta alguma fluidez em sua verificação concreta. De todo modo, é certo que, flagrada a desproporcionalidade, a sanção é inválida.
Aliás, a Lei nº. 9.784/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, em seu art. 2º expressamente estabelece que a Administração se sujeita, dentre outros princípios, aos da razoabilidade e da proporcionalidade.
A suspensão parcial ou total de atividades, a suspensão ou cancelamento de registro, licença ou autorização exigem o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Vale dizer, enquanto o embargo ou a interdição, aplicados de pronto, caracteriza o exercício do poder de polícia do Estado na prevenção do dano ambiental, a suspensão da atividade anteriormente autorizada ou o cancelamento do licenciamento antes concedido representam aplicação de penalidade ou condenação, mesmo que a administrativa. Como tal, somente se admite sua imposição após a ampla defesa, como corolário do devido processo.
A aplicação dessas penalidades deve ser precedida de fundamentação, notificação ao infrator para que exerça sua defesa no prazo legal e julgamento motivado. Até porque, tratando-se de restrição de direitos, deve a lei, por igual, ser interpretativa restritivamente.
Não há dúvida da possibilidade de providências emergenciais para o controle da situação, incluindo mesmo a pronta mitigação do dano. Note-se que tais medidas não possuem caráter sancionatório, mas visam apenas a evitar que o dano causado ganhe dimensões tais que tornem inviável a recuperação do ambiente degradado, tendo-se em conta os princípios do poluidor pagador e da prevenção, que regem as normas de Direito Ambiental e a regulação das atividades potencial ou efetivamente poluidoras.
Vale lembrar que o §3º do art. 54 da Lei nº. 9.605/1998 tipificou como crime a conduta daquele que “deixa de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível”. Não se trata apenas de figura de crime; com efeito, o art. 62, VII, do Decreto nº. 6,514/2008 configura a mesma conduta como infração administrativa.
Entretanto, a sanção restritiva de direito somente deve ser efetivamente aplicada no caso de a Administração se desincumbir do ônus de demonstrar, de forma diligente e objetiva, que o funcionamento das atividades do administrado é temerário e contrário o meio ambiente.
Ora, a Administração Pública somente pode penalizar o potencial infrator quando ele contribui, ainda que indiretamente, para a ocorrência da infração. Quando, no caso concreto, estiver presente a responsabilidade administrativa, é porque houve fato tido como infração resultante de nexo de causa e efeito. Assim, há autoria do ilícito sempre que o agente pratica ou concorre para a prática de uma suposta infração, isto é, quando se verifica uma conduta considerada ilícita por sua própria natureza e esta conduta pode ser imputada a uma dada pessoa, perfeitamente identificável.
A reincidência contumaz ou a renitência em sujeitar-se às normas ambientais merecem ser objeto, com mais freqüência, da aplicação das penalidades que interrompem ou sustam a atividade do infrator. Porém, a caracterização da ilicitude somente poderá incidir diante do enquadramento legal de conduta imputada ao administrado, incluindo, a concreta ocorrência de resultado danoso ao meio ambiente. Em caso contrário, o administrado não poderá ser penalizado com o cancelamento dos atos exigíveis para a o desenvolvimento de sua atividade, notadamente em face da inexistência de histórico negativo que milita contra pretensão punitiva da Administração.
Mostra-se deveras exagerado cancelar o registro no CTF (ou a Licença Ambiental), se o administrado possui pouco tempo de funcionamento e em seu desfavor não há histórico de descumprimento da legislação ambiental.
Importante destacar se as atividades da empresa estão acobertadas pela Licença de Operação expedida pelo Órgão Ambiental competente. A presunção de legalidade que pugna a favor de suas atividades somente pode ser refutada por elementos concretamente comprovados. Existindo objetivamente tais elementos, aí sim, será cabível a interdição de todas as atividades da empresa, bem como o cancelamento de sua licença.
Neste sentido a jurisprudência:
Poder de Polícia – Interdição Administrativa de Atividade sem Processo Legal –Direito – Ofensa. O exercício do poder de policia, que condiciona e restringe atividade e direitos individuais em beneficio da comunidade e do próprio ente público, é discricionário e auto-executável, mas não dispensa as condições de validade dos atos administrativos em geral – competência, finalidade e forma. Assim, se a autoridade interditou atividade que vinha sendo praticada há muitos anos, mediante alvará de funcionamento, sem prévio e devido processo legal, viola direitos líquido e certo remediável por mandado de segurança”.
(TJ-RJ- 7ª Cciv – Duplo Grau de Jurisdição 108/97 – Capital, unân. Rel. Des. ASCLEPIADES RODRIGUES – reg. Em 3/11/197- apud ADCOAS 8158049)
A previsão legal da possibilidade de aplicação da sanção não está desatrelada da proporcionalidade entre a infração e a pena. Evidentemente, estes são conceitos abertos que só poderão ser preenchidos diante de cada caso, à luz do critério da razoabilidade.
Procurador Federal. Graduado pela Faculdade de Direito do Recife/UFPE. Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito do Recife/UFPE .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VILBERTO DA CUNHA PEIXOTO JúNIOR, . Distinção entre cancelamento de registro no Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais e cancelamento de Licença Ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 maio 2014, 07:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39435/distincao-entre-cancelamento-de-registro-no-cadastro-tecnico-federal-de-atividades-potencialmente-poluidoras-ou-utilizadoras-de-recursos-ambientais-e-cancelamento-de-licenca-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Medge Naeli Ribeiro Schonholzer
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