RESUMO: O presente estudo possui o objetivo de compreender o procedimento investigatório criminal presidido pelo Ministério Público, além de estudar a validade desde ato perante o ordenamento jurídico sob a óptica do princípio da legalidade administrativa
INTRODUÇÃO
A nova ordem constitucional instaurada com a promulgação da carta cidadã de 1988 conferiu ao Ministério Público, no capítulo destinado às funções essenciais à justiça, um extenso leque de atribuições para a salvaguarda da ordem jurídica e para a consecução dos valores do Estado Democrático de Direito.
As atribuições constitucionais do Ministério Público não são taxativas, pois a cláusula de abertura do art. 129 dispôs que a lei poderá determinar outras competências ao Parquet desde que estas estejam de acordo com a sua finalidade.
Não obstante a ausência de expressa disposição constitucional, o Ministério Público, através de processo hermenêutico que confere interpretação tópico sistemática à Constituição Federal, está legitimado para a promoção de atos de investigação criminal, amoldando suas atribuições institucionais aos ditames da máxima eficácia dos direitos fundamentais esculpidos no bojo da Constituição Federal.
Atualmente, o Supremo Tribunal Federal entende, acertadamente, ser aplicável ao caso a teoria dos poderes implícitos que objetiva conferir maior efetividade aos desideratos e atribuições expressamente consignadas na carta magna, conferindo às instituições os instrumentos necessários para alcançar os fins constitucionalmente colimados, desde que este esteja em harmonia com a atividade da Instituição. Sendo assim, o Ministério Público, na condição de detentor, exclusivamente, da ação penal pública, possui os meios necessários para a promoção eficaz da persecutio criminis in judicio.
Sendo assim, faz-se necessário analisar o procedimento e os limites para a atuação ministerial no âmbito da investigação criminal.
1. A RESOLUÇÃO 13/2006 E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
O princípio da legalidade estrita ou administrativa subordina a atuação do Estado aos ditames legais, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, é tradução de um propósito jurídico, o de submeter o exercente do poder a um quadro normativo que obste a atuação pautada em favoritismo, perseguições ou desmandos.
Em habitual intelecção, Bandeira de Mello define o princípio da legalidade como:
O princípio da legalidade é específico do Estado de Direito, é justamente aquele que o qualifica e que lhe dá a identidade própria. Por isso mesmo é o princípio basilar do regime jurídico-administrativo, já que o Direito Administrativo nasce com o Estado de Direito: é uma consequência dele. É o fruto da submissão do Estado à lei. É, em suma: a consagração da ideia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.[1]
Assim sendo, podemos afirmar que o procedimento investigatório promovido pelo Ministério Público é compatível com o sistema jurídico vigente, uma vez que apossui compatibilidade com as atribuições do Parquet e não há ingerência arbitrária nas atribuições de qualquer outro órgão ou entidade. Conforme pedagógica lição de Calabrich:
Essa previsão legal, por seu turno, para que seja constitucional, há que se compatibilizar com a estrutura do Estado em que se insere o órgão ou autoridade a quem compete a atividade de investigação. Para que a lei que prevê a atribuição investigatória de determinado ente seja constitucional, deve existir uma relação de pertinência lógica entre os fins de sua atividade própria, dentro da organização dos poderes do Estado, e os fins da investigação.[2]
Os textos normativos da Lei Complementar 75/93 e da Lei 8.625/93 confere ao Ministério Público amplo rol de atribuições e funções, entre elas, funções relacionadas à investigação criminal, por exemplo, a possibilidade de notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva (art. 8º, I); requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades da Administração Pública direta e indireta (inciso II); requisitar informações e documentos a entidades privadas (inciso IV); realizar inspeções e diligências investigatórias (inciso V). Ademais, o mesmo texto normativo aduz que nenhuma autoridade poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou documento que lhe seja fornecido (Art. 8º, §2º).
Na mesma esteira a lei que se refere ao Ministério Público Estadual dispõe que cabe ao Ministério Público requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades, promover inspeções e diligências investigatórias (Art. 26, i, b, c, da Lei 8.625/93), em evidente procedimento investigatório ao alcance do Parquet para a elucidação dos fatos.
Desse modo, o Conselho Nacional do Ministério Público, com o objetivo de delimitar as balizas e o procedimento a ser seguido durante a investigação criminal, expediu a resolução 13 de 2.10.2006, que regulamenta o art. 8º da LC nº 75/1993 e o art. 26 da Lei nº 8.625/1993, com base no art. 130-A da Constituição Federal.[3]
Preliminarmente, a resolução traça o conceito de investigação criminal em seu art. 1º como procedimento de natureza administrativa e inquisitorial, instaurado e presidido pelo Ministério Público no uso de suas atribuições, tendo a função de embasar a opinio delicti do órgão ministerial, ressalvando a possibilidade de persecução penal ser iniciada sem a necessidade do procedimento investigatório, uma vez que o procedimento investigatório não é peça obrigatória para a propositura da ação penal. Caso o Ministério possua elementos de prova que seja suficiente para a indicação da materialidade e autoria delitiva, o órgão do parquet poderá oferecer a denúncia com base em outras peças informativas.
A resolução dispôs, entre outras medidas, que a instauração do procedimento investigatório poderá ser realizada de ofício por membro do Ministério Público ou por meio de provocação, com prazo de 30 dias para dar andamento às peças de informação. Após a instauração do procedimento investigatório, a Procuradoria-Geral deverá ser comunicada, por meio escrito, sobre sua instauração.
O art. 6º da referida resolução confere ao Ministério Público amplos poderes para proceder com os atos de investigação, possibilitando, inclusive a requisição de força policial e requisitar a oitiva para colheita de informações.
É cediço que qualquer procedimento investigatório, notadamente na seara penal, não poderá postergar-se indefinitivamente no tempo, sob pena de proceder em lesão aos direitos individuais do investigado. Sendo assim, o procedimento investigatório ministerial regido pela resolução 13/2006 terá prazo para conclusão de 90 dias, com possibilidade de prorrogações sucessivas, desde que a prorrogação seja realizada através de decisão fundamentada pelo membro do Ministério Público.
O procedimento será por via de regra público, salvo os casos em que haja disposição legal diversa ou quando o interesse público ou a conveniência da investigação requisitar sigilo do procedimento investigatório. Entretanto, em todo caso, é garantido ao investigado a obtenção de cópia autenticada de depoimento que tenha prestado e daqueles atos que tenha participado pessoalmente.
Nesse ponto é imperioso salientar que a doutrina não é uníssona na possibilidade das resoluções do CNMP prever procedimentos para a investigação criminal, pois esta não se confunde com preceito normativo primário, o que a impossibilita de criar direito e obrigações. Conforme valiosa lição de Lênio Streck:
Portanto, as resoluções que podem ser expedidas pelos aludidos Conselhos não podem criar direitos e obrigações e tampouco imiscuir-se (especialmente no que tange à restrições) na esfera dos direitos e garantias individuais ou coletivas. O poder “regulamentador” dos Conselhos esbarra, assim, na impossibilidade de inovar. As garantias, os deveres e as vedações dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público estão devidamente explicitados no texto constitucional e nas respectivas leis orgânicas. Qualquer resolução que signifique inovação será, pois, inconstitucional.[4]
No entanto, nota-se que a referida resolução regulamenta os artigos da LC 75/1993, concretizando efetivamente os ditames legais e constitucionais já delineados pelo legislador pátrio, garantido efetividade às normas jurídicas já postas, cumprindo, assim, a regra da complementariedade da resolução.
2. CONLUSÃO
O Conselho Nacional do Ministério Público, através do poder regulamentar, dispôs, através da expedição da Resolução nº 13/2006, a atuação do Ministério Público no procedimento de investigação preliminar, delimitando a sua forma de atuação, o prazo para a conclusão da investigação, além de outras providências, em perfeita sincronia com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, que exige, para a validade do ato investigatório ministerial, principalmente, a definição do rito procedimento a ser seguido.
Por fim, salienta-se que a investigação criminal promovida pelo Ministério Público reflete o amadurecimento da instituição, além coadunar-se com a obrigatoriedade do Estado em elucidar os crimes de ação penal pública incondicionada e na colheita de elementos de prova necessários para a punição de crimes e para efetivar os desideratos de justiça em cooperação com os demais órgãos investigativos.
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 22 de maio de 2014.
CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: uma renitente e brasileira polêmica. In: MOREIRA, Rômulo Andrade; CAVALCANTI, Stela Valéria. Temas Atuais do Ministério Público. 3. ed. Bahia: JusPodivm, 2012.
CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Resolução nº 13, de 2 de outubro de 2006. Regulamenta o art. 8º da Lei Complementar 75/93 e o art. 26 da Lei n.º 8.625/93, disciplinando, no âmbito do Ministério Público, a instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.cnmp.mp.br/portal/component/content/article/115-normas/211-resolucoes>. Acesso em: 20 maio 2014.
FELDENS, Luciano; SCHMIDT, Andrei Zenkner. Investigação criminal e ação penal. 2. ed., rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editores, 2007. p. 11.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
STRECK, Lenio Luiz. Crime e constituição: a legitimidade da função investigatória do Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
STRECK, Lênio Luiz; SARLET; Ingo Wolfgang; CLÈVE; Clemerson Merlin. Os limites constitucionais das resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) Revista ESMEC, v. 12, n. 18, 2005.
TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e investigação criminal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.
[1] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 99 e 100, grifo nosso.
[2] CALABRICH, Bruno. Investigação criminal pelo Ministério Público: uma renitente e brasileira polêmica. In: MOREIRA, Rômulo Andrade; CAVALCANTI, Stela Valéria. Temas Atuais do Ministério Público. 3. ed. Bahia: JusPodivm, 2012. p. 713.
[3] 130-A. Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo-lhe:
I zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências. Cf. BRASIL, 1988, não paginado.
[4]STRECK, Lênio Luiz; SARLET; Ingo Wolfgang; CLÈVE; Clemerson Merlin. Os limites constitucionais das resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) Revista ESMEC, v. 12, n. 18, 2005, p. 7.
Técnico do Seguro Social no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS); Bacharelando em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA); Cidade de domicílio: São Luís - MA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RODRIGO DANUZIO FERREIRA DINIZ., . O rito procedimental dos atos investigativos promovidos pelo Ministério Público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 maio 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39498/o-rito-procedimental-dos-atos-investigativos-promovidos-pelo-ministerio-publico. Acesso em: 23 dez 2024.
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