Resumo: Este Artigo foi elaborado com a proposta de abordar a analise das causas e consequências em que se refere aos direitos do público LGBT em situação de cárcere, abordando com este, um foque na importância das Alas reservadas a esse público, nos estados em que elas já funcionam: Paraíba (PB), Minas Gerais (MG), Mato Grosso (MT) e de estados em implementação: São Paulo (SP). Abordaremos essa importância, e a relevância que estas possuem para essas pessoas e como essas leis estaduais devem ser federalizadas e expandidas para todo o país, seguindo a jurisprudência que estes estão criando em relação ao assunto, para que esses indivíduos não fiquem a mercê da violência de outros detentos, pelo fato de ser o que eles realmente são.
Palavras-Chave: Cárcere. Ala LGBT. Direitos LGBT.
INTRODUÇÃO
O Brasil é um país marcando com um sistema heteronormativo, existindo uma dualidade do que cada individuo deve ser, agir e se comportar ao nascer e em todas as fases de seu desenvolvimento. A um lado, o que deve ser um homem/masculino e do outro o que deve ser uma mulher/feminino, e cada individuo tem que se encaixar nessa forma, sendo preponderante nessa colocação entre um e o outro, as características dos exteriores e interiores dos órgãos.
Por que as pessoas ainda possuem tanto medo do diferente? Por que tem que ser padrão, homem e mulher? E o que deve ser feito com quem não se adequa a essa dicotomia?
As pessoas que não se adequa a esse sistema são postas a margem da sociedade e ficam sujeitas a diversas agressões a seus direitos, A sociedade renega um individuo que nasce como homem e aspas quer ser aspas mulher ou se comportar como ela ou uma mulher que quer ser um homem ou se comportar como ele.
A diversas formas de agressões a esse publico que não esta em conformidade com o padrão pré-estabelecido, desde se negar o direito a adequação do seu sexo e nome civil nos seus documentos, até a um grande numero de assassinatos, pelo fato de querer ser o que a sociedade diz que ela não é.
A inadequação de seus direitos também é um fato ao qual se é renegado a esse público, como: uma transexual ir para um presidio masculino ou um transexual em um presidio feminino, ou uma transexual ser proibida de usar um banheiro feminino, por causar constrangimento as outras mulheres, como foi o caso da Miss Paraíba Trans Angie Melo, que ao usar um banheiro feminino em um shopping no centro da cidade de João Pessoa no dia 12 de junho de 2014, foi surpreendia com o chefe da segurança do shopping, a mandando sair de forma grosseira, mais o por que isso aconteceu? Segundo Guthyers (2014):
uma mulher se sentiu no direito de reclamar para a segurança que o banheiro tinha travestis e que elas são homens e não deveriam estar lá. Chamou o namorado que fez o maior barulho na porta do banheiro, o chefe da segurança do shopping que é uma empresa privada chamada "Rex" mandou de forma grosseira que a transexual e a sua amiga também transexual saíssem do banheiro.
Por que uma Trans ou Travesti não pode usar um banheiro feminino? Se ela é/se considera ser uma mulher? Qual o constrangimento que uma mulher sofre ao encontrar uma trans ou uma travesti em um banheiro retocando a maquiagem ou ajeitando o cabelo? Ou ver elas entrando em uma cabine do banheiro e depois saindo? Ela não será assediada ou mesmo verá nenhuma genitália, então me pergunto novamente, Qual o constrangimento afinal? Seria preciso criar um banheiro para esse público ou isso seria uma espécie de exclusão?
A uma diferença entre se separa para proteção e bem estar fisco e psicológico das pessoas e a promoção de uma separação no intuito de isolar ou reafirma um preconceito diferente e o coloca-lo longe da sociedade e das ditas pessoas normas, Barbosa e Cruz (2014), nos trás uma ideia muito interessante, ao nos mostrar a construção do Monstro:
O Monstro, o ser distinto do que se define como real e correto, nós leva a imaginar seres completamente diferentes do ser “humano perfeito” que conhecemos, as características disformes, proporções inadequadas as normais, ora uma parte do corpo é mais ressaltada do que outra, outrora é outra, essa distinção de busca de semelhança ao ser da classe/estrato da qual fazemos parte para nos sentirmos refletidos de alguma maneira no outro ou não, e essa não semelhança (social, genética, moral, teológica, normativa etc.), não sendo atingida por este individuou há uma quebra de expectativa e sendo assim, o outro do qual não tem as mesmas características que a minha, ele acaba não se assemelhando a mim, e sendo assim o vinculo de semelhança quebrado, surge o que santo Agostinho define como “ O Monstro”, significa o que vai contra á ordem da natureza, O Montrum, portentum, prodigium, que vem da derivação de Monera que seria Advertir
E é essa ideia de Monstro que nos afastamos das pessoas diferentes do dito normal e correto, e sendo assim não nos encontramos refletidos nelas, podendo gerar diversos problemas de desigualdade de direitos
Pegando como ponto de Partida essa concepção de o ser diferente acabar gerando um desconforto social a pessoa a partir do momento em que essa “diferença” ultrapassa a ideia do ser “humano” e chega a ser fator preponderante de dissemelhança entre os constituintes sociais, gerando assim categorias e “classes”, essas classes são grupos de indivíduos dos quais todos possuem algo em comum uns com os outros, das quais podem ser de caráter econômico, religioso, dentre outros. O que acaba gerando vários aspectos de desigualdades, pois afinal existem grupos majoritariamente “superiores” a outros por algum motivo, dos quais pode ser por maioria, por poder socioeconômico, dentre outros. (BARBOSA E CRUZ, 2014)
Eles ainda nos mostra com sua Epígrafe no inicio de seu trabalho que essa concepção do mostro, gera-se um medo do ser distinto e estranho que se ver. Quando esse medo é quebrado ai é que vem a curiosidade de saber. Afinal do que estamos falando?
HISTORIA
Não é um homem, não é uma mulher... Eu acho que são duas pessoas juntas. A hora que a gente quer ser feminina, a gente é! A hora que a gente quer ser masculino, a gente também é! Pelo menos na minha cabeça é Assim (Suzane Kellen) (DENIZART apud BERUTTI, 2010)
Ventura (2010) Baseada nos estudos de Castel (2001), que acabou por produzir uma espécie de cronologia da “Historia do transexual” ou “fenômeno transexual“ como ela define em seus estudos, sendo este uma versão contemporânea, mostrando-nos as batalhas e confrontos e disputas no campo cientifico e os consensos internos estabelecidos entre especialidades médicas: entre medicina, ciências sócias, direito e outros conhecimentos, e que propõe em seu estudo uma periodicidade da historia cientifica e cultural do conceito do “transexual” em quatro fazes:
· A primeira é marcada por teorias da sexologia, que, além de uma “ambição taxonômica positivista“, tem, dentre outros, o propósito de rejeitar a ideia da homossexualidade como perversão e revogar as sanções penais impostas a essa conduta sexual em diversos países. É atribuído ao sexólogo Magnus Hirschfield o uso, no ano de 1949, em um estudo de caso em que são esboçadas as principais características do fenômeno, que viriam a ser consideradas específicas das transexuais
· A segunda é alimentada pelo desenvolvimento da endocrinologia, denominada por Castel “behaviorismo endocrinológico“. Essa fase, de certa forma, apoia as teses sociológicas sobre a identidade sexual após 1945 e, indiretamente, contesta as teses psicanalíticas, acolhendo e justificando cientificamente a demanda das pessoas transexuais por transformações corporais;
· A terceira (de 1945 a 1975) é considerada a mais rica em acontecimentos, em virtude da mediatização do caso Jorgensen, feminizado em 1952, e do desenvolvimento da “tradição americana de sociologia empírica e sua teoria da influência determinante do meio“. As novas teorias sociológicas conduziram muitos pesquisadores “a explorar conjuntamente a questão da socialização dos hermafroditas, dos meninos com órgãos genitais acidentalmente mutilados e dos transexuais“, contribuindo para a defesa do tratamento dos transexuais por meio de intervenções corporais. Seus personagens centrais são: Harry Benjamin, endocrinologista alemão radicado nos Estados Unidos; John Money, psicólogo, professor do Hospital Universitário Johns Hopkins; e Robert Stoller, psicanalista e psiquiatra americano. Estes são considerados os principais formuladores de uma proposta de diagnóstico e tratamento para o “Transexualismo“ e das primeiras iniciativas de institucionalização da prática médica, em sua versão contemporânea, para “mudança de sexo“ ou “readequação sexual“ – como também é conhecida. Benjamin foi o primeiro a introduzir o termo “transexual“ para designar uma pessoa que deseja viver um gênero (gender role) anatomicamente oposto ao seu; além disso, formulou e descreveu uma definição própria e distinta para o transexualismo e estabeleceu os critérios recomendados para diagnóstico e o acesso das pessoas transexuais ás transformações corporais. É Benjamin que passa a distinguir transexuais, travestis e homossexuais – denominações utilizadas, até então, de forma indistinta –, recomendando as transformações corporais apenas para o “verdadeiro transexual“ (BENJAMIN,ATHAYDE, CARDOSO apud VENTURA, 2010). John Money esboçou as primeiras teses sobre o conceito de “gênero“ aplicado á clínica psicológica e de identidade de gênero, apoiado em teorias sociológicas dos papéis sociais; além disso, formulou “teses sobre a estrutura naturalmente dimórfica do corpo e a heterossexualidade como a prática normal desse corpo. (ZAMBRANO, BENTO apud VENTURA, 2010). A separação entre sexo/gênero, elaborada por Money, possibilitou a compreensão e definição do transexualismo – passando a ser entendido como uma síndrome na qual a pessoa sente-se, psiquicamente, como se fosse de um sexo oposto ao seu – e estabeleceu as diferenças – em um modelo explicativo médico – entre identidade sexual, práticas e orientações sexuais dos sujeitos. O desdobramento prático dessa elaboração foi a separação da abordagem clínica e psicológica do transexualismo e do homossexualismo. Por fim, temos a contribuição de Robert Stoller – por meio da aproximação dos estudos de Benjamin e de Money e de estudos sobre o psiquismo das crianças afetadas por anomalias sexuais congênitas (FRIGNET apud VENTURA, 2010) –, que foi pioneiro ao iniciar o desenvolvimento da clínica psicanalítica para o tratamento do transexualismo (CASTEL apud VENTURA, 2010);
· A quarta se inicia em meados dos anos 1970, com “a reinvindicação libertária de uma despatologização radical do transexualismo e a ideia de que a [imposição de uma] identidade sexual é em si um preconceito e limita a liberdade individual“. A rejeição da psicanálise ás propostas psicoterapêuticas alcança seu grau máximo nessa fase, mas, paralelamente, o transexualismo vai se firmando como um “fenômeno neuroendocrinológico, por oposição a toda forma de psicogênese e, sobretudo, psicanalítica“, acomodando-se, assim, ás versões mais biologizantes do “distúrbio da identidade de gênero“, com aspirações de grupos ativistas de direitos das pessoas transexuais. (CASTEL apud VENTURA, 2010)
Para Ventura (2010), O gênero possui diversos significados, como na antropologia e na Biologia, como define Ferreira (2004): sendo o significado de gênero para a antropologia como "a forma culturalmente elaborada que a diferença sexual toma em cada sociedade, e que se manifesta nos papéis e status atribuídos a cada sexo e constitutivos da identidade sexual dos indivíduos” e na Biologia, como uma "Categoria taxonômica compreendida entre a família e a espécie". (FERREIRA apud VENTURA, 2010). Podemos afirmar que essa categoria foi introduzida entre (1960-1970) pelos cientistas sociais, tendo então como finalidade evidenciar e determinar o que é masculino e feminino. (VENTURA, 2010). Apesar disso, existem definições distintas, que estão relacionadas ao gênero nas teorias sociais, existindo pelo menos duas dessas: Sendo para uma o gênero, é entendida como um atributo de individuo, entretanto a outra considera o gênero como um atributo de regulação social. (SCOTT; BUGLIONE apud VENTURA, 2010)
Ao olharmos esse mesmo conceito no campo da transexualidade, percebemos que ele possui um campo semântico mais abrangente, em que podemos incluir alguns elementos, tanto individuais, como também sociais, aos quais, estão diretamente associados a construção da identidade sexual de cada um. (VENTURA, 2010).
A construção do termo do que posteriormente viria a ser, o que constantemente usamos e escutamos que é o termo "Transexualidade”, se deu a partir da incorporação desse termo a medicina, essa incorporação, se deu para dar explicação "a percepção subjetiva de pertencimento do transexual a um sexo oposto ao seu sexo biológico" (definir sexo biológico),levando então ao fim desse processo, chegamos a ideia de identificação como "identidade de gênero", sendo feita essa incorporação do termo "gênero" pelo psicólogo John Money. (PERES, FIGNET, ZAMBRANO, SAADEH apud VENTURA, 2010)
O termo sexualidade é utilizado de forma recente. (VILLELA E ARILHA apud VENTURA, 2010), esse termo, aparece nos dicionários de uso comum como sendo um sinônimo de sexo e também como um conjunto dos fenômenos que ocorrem na vida sexual, sendo relacionadas aos atos sexuais. A definição desse termo é elaborada em três perspectivas:
A Essencialista, que dá ênfase ao imperativo biológico e/ou natural da sexualidade, entendendo que esta é determinada por fatores biológicos e fisiológicos invariantes. (ZAMBRANO apud VENTURA, 2010)
A Interacionista, que entende que a sexualidade se desenvolve por meio de uma interação de diversos fatores individuais – biológicos e psicológicos – e sociais. (VILLELA E ARILHA apud VENTURA, 2010)
A Construtivista, que explica a sexualidade como um constructo social e admite que a identidade sexual seja adquirida por escolha. (ZAMBRANO apud VENTURA, 2010)
A Organização Mundial da Saúde (OMS) segue a concepção Interacionista e considera a sexualidade, como sendo "um conjunto de ideias sobre sexo, identidade de gênero e papel, orientação sexual, prazer e reprodução" (VENTURA, 2010) que são determinados por interações entre ”Fatores biológicos, Psicológicos, Sociais, econômicos, políticos, culturais, éticos, legais, históricos, religiosos e espirituais, [que se] expressa em pensamentos, práticas, papéis e relacionamentos”. (CORRÊIA, ALVES E JANNUZZI apud VENTURA, 2010)
Tomando essas duas concepções (essencialista e interacionista), ambas consideram a autonomia humana individual como não existente ou se existir é bem reduzida, sendo uma dessas considerada em grande parte dos estudos sobre o tema e que considera o sentir ser do sexo oposto ao seu biológico, como um desvio ou anomalia, e que resulta em um intenso sofrimento psíquico. (VENTURA, 2010)
VENTURA (2010) Chega à conclusão de que tanto as normas médicas, quanto as jurídicas consolidam uma espécie de naturalização de um sistema de sexo/gênero binário, ou seja, um sistema que possui a penas dois polos, sendo esse o sistema homem/masculino e Mulher/feminino e que não reconhece a ideia de um outro polo (ser) distinto destes. Apesar de existir pessoas distintas, como as intersexuais, esse sistema busca sempre essa dualidade.
A recomendação geral clínica é que, sendo identificado qualquer distúrbio morfológico da diferenciação sexual, como nos casos dos hermafroditas, este deve ser corrigido, buscando-se determinar, por meio de intervenção cirúrgica reparadora, o sexo mais viável funcionalmente antes dos dois anos de idade, permitindo o "desenvolvimento normal da identidade sexual". (REY apud VENTURA, 2010)
Podemos notar que com essa recomendação, se define como sendo normal e adequada, quando se esta em conformidade a genitália externa a um determinado sexo, sendo esse um dos aspectos dessa concepção. (VENTURA, 2010)
A Resolução n. 1.652/2002, do CFM e a com concepção antiga tida pelas decisões judiciais, em que se definia que um dos elementos principais di "verdadeiro transexual", seria o desejo de adequar o seu órgão genital ao sexo que acredita ser e que seria uma etapa final do tratamento, a realização da cirurgia de redesignação sexual. (VENTURA, 2010) Sendo posta em cheque essa ideia nos tempos atuais, de se diferenciar um/a transexual de uma travesti, Pois a alguns anos, pessoas trans buscam a sua mudança do gênero e não a condicionam á cirurgia de mudança de sexo, o que tornou mais complexo e embaraçoso as fronteiras identitárias. (BENTO, 2008)
A transexualidade e o travestilidade são construções identitarias que estão localizadas no campo do gênero e que servem como resposta para o sistema binário de homem e mulher, para muitos a transexualidade não passa de uma ficção. (BENTO, 2008)
A jurisprudência Brasileira já consolidou a ideia contraria a essa definição de ser um/a “transexual verdadeira“ apenas o individuo que pretende ou que passou pela cirurgia de mudança de sexo, como podemos ver nos exemplos citados por Barbosa e CRUZ (2014), em seu estudo sobre as dificuldades da retificação do nome civil por transexuais e travestis e os problemas da coexistência do nome civil e do social.
Em Goiania/GO no dia 11/01/2014, a Juiza Sirlei Martins DA Costa, autorizou uma transexual a mudar o seu nome Civil, sem ter feito a cirurgia de redesignação sexual, pois de acordo com ela, a mudança de nome civil, segue o principio constitucional da dignidade da pessoa humana, no constrangimento de identificação diferente do que se considera ser.
I. O Juiz da 15ª Vara da Família em Fortaleza autorizou no dia 01/02/2013 à mudança de sexo e nome no registro civil de uma transexual alegou que apesar de ter nascido com o sexo masculino, desde criança apresenta características físicas e psicológicas femininas, Por conta disso, sofreu fortes constrangimentos durante a infância e a adolescência, fez a cirurgia na Tailândia, e em dezembro de 2012 entrou com a ação judicial para alterar a documentação. O Juiz ainda afirmou que “em nenhuma hipótese deverá existir qualquer menção à referida alteração nos documentos do requerente, tais como carteira de identidade e cadastro de pessoa física”.
II. No dia 12/02/2014 o TJSP Autorizou a alteração de prenome de um transexual, independentemente da realização de cirurgia de mudança de sexo, permitida pela 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo que se Baseou em um parecer psicológico favorável a mudança, mesmo assim ela perdeu em primeira instancia, recorreu e conseguiu a mudança. O Relator James Siano, considerou a mudança procedente, “Não será o procedimento cirúrgico, em si, que definirá a sexualidade da pessoa, mas, sim, o sexo psicológico estabelecido de maneira irreversível.”.
Com esses exemplos podemos afirmar que a ideia de o que é ser um/a transexual e o que é ser um travesti, vai muito mais além de uma pessoa querer ou não passar por uma cirurgia de mudança de sexo.
Bento(2006) afirma que:
Quando se diz “transexual”, não se está descrevendo uma situação, mas produzindo um efeito sobre os conflitos do sujeito que não encontra no mundo nenhuma categoria classificatória e, a partir daí, buscará comportar-se como “transexual”. O saber médico, ao dizer “transexual” está citando uma concepção muito específica do que seja uma/a transexual. Esse saber médico apaga a legitimidade da pluralidade, uma vez que põe em funcionamento um conjunto de regras consubstanciando nos protocolos, que visa encontrar o/a “verdadeiro transexual”. O ato de nomear o sujeito transexual implica pressuposições e suposições sobre os atos apropriados e não apropriados que os/as transexuais devem atualizar em suas práticas. (BENTO apud VENTURA, 2010)
Portanto ainda segundo Bento (s. d.), a transexualidade é “ uma experiência de conflito com as normas de gênero“. Bento (2006) e Villela e Arilha (2003), ainda nos tras concepções da sociedade de o que é ser homem e ser mulher, definindo um homem como o que tem um pênis e uma mulher o que tem uma vagina, e que devem ser heterossexuais, havendo assim qualquer coisa que vá contra essa definição, como um homem com uma vagina e uma mulher com o pênis ou uma transexual que se relaciona sexualmente com outra mulher, não a torna apta a realizar transformações corporais e alterar a identidade desejada. (BENTO apud VENTURA, 2010)
Há vários conceitos do que é ser transexual, para esse estudo, vamos nos apropriar do discurso de Ventura, no qual ela descreve:
A transexualidade é entendida como uma expressão legitima de sexualidade – que pode trazer um tipo de condição de sofrimento (ou não) – e não necessariamente uma doença psiquiátrica, em razão das condições sociais e pessoais em que é vivenciada. Isso implica considerar que a transexualidade não traz em si limitações á autonomia (moral ou legal) da pessoa transexual, mais sim um tipo de vulnerabilidade (condições sociais e indivíduos que podem pôr em risco ou afetar a saúde e o direito das pessoas e/ou de população, ou seja, como condições atuais e não potenciais de risco de dano) em razão da contradição entre a transexualidade e as normas sociais e morais sexuais vigentes, o que pode resultar em restrições pessoais e sociais danosas á autonomia individual (ou seja, em vulneração), como a proibição legal de alteração do prenome e do sexo nos documentos de identificação pessoal, ou restrições para o acesso ás transformações corporais desejadas, no sistema oficial de saúde, dificultando as intervenções médicas adequadas e seguras. (VENTURA apud BARBOSA, 2014)
VIOLENCIA
A uma definição de o que deve ser e o que se deve fazer um individuo de um sexo biológico determinado pela sociedade heteronormativa, existindo uma espécie de encaixe, que seria supostamente perfeito e sem falha, existindo assim duas opções claras, que é o feminino/mulher e o que é masculino/homem, e um indivíduo ao nascer já vem nesse sistema binário pré-definido e ele tem que se adequar a um dessas opções (BARBOSA, 2014), como menciona Bento (2008) ao falar da existência de uma ordem de gênero fundamentada na diferença sexual.
Barbosa (2014) nos mostra que:
A uma internalização dos indivíduos quanto ao conceito de o que é feminino e masculino, com uma normatização social pré-estabelecida ao próprio nascimento do ser, como por exemplo, uma mulher está gravida e o questionamento maior e mais frequente e muitas vezes um dos primeiros questionamentos feitos a mulher é o sexo do feto e a partir dessa definição dada pela mulher ao questionamentos feito, há de imediato uma pré-construção de individuo, sendo a resposta um menino o tratamento perante a barriga da mulher será um e caso a resposta seja contraria, será outro, ao ser um menino a fala e a construção vai se formando, vai ser um jogador de futebol, um garanhão, vai pegar todas as menininhas e se for menina é a minha princesa.
Bento (2011), ainda nos reforça essa ideia:
Quando se diz “é um menino!”, não se está descrevendo um menino, mas criando um conjunto de expectativas para aquele corpo que será construído como “menino”. O ato da linguagem, nessa perspectiva, não é uma representação da realidade, mas uma interpretação construtora de significados. John Austin chamou essa característica da linguagem de “capacidade performática. Quando se diz “menino/menina”, não se está descrevendo uma situação, mas produzindo masculinidades e feminilidades condicionadas ao órgão genital. (BENTO apud BARBOSA, 2014)
E se esse pessoa não se adequar? E se ele não for como se deve ser? Ele é obrigado a se adequar mesmo sem ter optado por esse sistema?
Bento (2008), nos mostra que:
Quando se age e se procura reproduzir a/o mulher/homem "de verdade", desejando que cada ato seja reconhecido como aquele que nos posiciona legitimamente na ordem de gênero, nem sempre o resultado corresponde àquilo definido e aceito socialmente como atos próprios a um/a homem/mulher.
Essa sociedade busca esses atos para se definir como um/a homem/mulher agem, então se algum desses se comportarem e agirem de uma forma não pertencente a essa expectativa definida pelo seu "ser social", esses sofrem uma repreensão social, que segundo Bento (2008), " Geralmente utilizam da violência física e/ou simbólica para manter essas práticas ás margens do considerado humanamente normal".
Os que não seguem esse padrão que é pré-estabelecido antes mesmo do seu nascimento, são repreendidos e tidos como diferentes do padrão, esse padrão de homem e mulher, faz com que a nossa sociedade crie uma verdadeira hierarquia e um sistema excludente destes e que acaba por condenar esse/essa transexual ou travestis a uma morte em vida " exilando em si mesmos os sujeitos que não se ajustam ás idealizações. " (BENTO,2008)
Essa violência citada a cima por Bento, nos é revelada também em dados de mortes das pessoas LGBTTTI, em que se pode ser visto em dados publicados pelo Grupo Gay da Bahia (GGB):
Em 2013 foram contabilizados 312 assassinatos, mortes e suicídios de gays, travestis, lésbicas e transexuais brasileiros vítimas de homofobia e transfobia, de acordo com levantamento do Grupo Gay da Bahia (GGB). O documento inclui a morte de uma transexual brasileira no Reino Unido e um gay morto na Espanha. A média é de uma morte a cada 28 horas.
Esse número é 7,7% menor em relação ao ano de 2012 (388 mortes), mas, segundo o GGB, as mortes aumentaram 14,7% nos últimos 4 anos.
Segundo o documento, a maioria das mortes de gays acontece na casa da vítima, enquanto a maioria dos travestis morre na rua. Em um ano foram 186 gays, 108 transexuais, 14 lésbicas, 2 bissexuais e 2 héteros mortos, confundidos com homossexuais. (ARAÚJO apud BARBOSA, 2014)
ESTADOS QUE POSSUEM ALA PARA LGBTTTI
“Para assegurar a justiça das relações sociais, o Direito deve buscar forma de garantir a imparcialidade e o equilíbrio nas relações, fixando normas, regras, regulamentos e buscando o atingimento da máxima transparência e equidade social.” (FREITAS apud BARBOSA E CRUZ, 2014).
No estado de São Paulo (SP), Foi assinada uma resolução pelo secretário Lourival Gomes, da secretaria de Administração Penitenciária (SAP), no dia 31 de janeiro de 2014, institui uma possibilidade de se criar alas para os/as detentas/detentos transexuais e travestis nas penitenciarias do estado, Para isso, será feita uma consulta previa á população assistida, assim como o foi no estado da Paraíba.
"Essa é uma atitude muito importante para impedir que travestis e transsexuais que adentram o sistema prisional sejam punidas duas vezes: a primeira, com a restrição à liberdade. A segunda, pelo abuso físico e psicológico a que estão sujeitas em um sistema violento", resume Keila Simpsom, vice-presidenta da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transsexuais (ABLGT).
"Não há respeito à identidade de gênero quando as meninas chegam à prisão e é como se dissessem: 'você é homem e vai ter de agir como homem'", diz Keila. (SIMPSOM apud SARTORATO, 2014)
Em Minas Gerais (MG), a ala para a população LGBTTTI funciona desde o ano de 2009 no presídio São Joaquim de Bicas e desde 2012 no Presídio de Vespasiano.
A ideia é tirar essas pessoas do convívio dos presos, porque havia denúncias de maus tratos, além da necessidade de oferecer a elas um tratamento apropriado, explicou o subsecretário de Administração Prisional, Murilo Andrade.(ANDRADE apud BRANDÃO, 2013)
Para a chefe da Cods, Walkíria La Roche, o problema é ainda maior e trata-se de uma questão de saúde. Segundo ela, os homossexuais e travestis abusados sexualmente nas prisões acabam contraindo doenças sexualmente transmissíveis e, consequentemente, transmitindo a outros homens no ambiente carcerário. "É muito comum no nosso país que essas pessoas sejam usadas como moeda de troca nos presídios. Não há preocupação com a transmissão de DST. E como os homens, depois, recebem visita íntima, pode causar uma epidemia", explica Walkíria.
(ROCHE apud BRANDÃO, 2013)
No estado do Rio Grande do Sul (RS), ESSA POLITICA funciona desde abril de 2012 no presidio central da cidade de Porto Alegre.
O mesmo tipo de violência que acontece contra essas pessoas nas ruas também é verificado aqui dentro. E essa foi a forma que encontramos para não contribuirmos mais com a violação de direitos humanos contra gays e travestis, explica a assessora de Direitos Humanos da Susepe (Superintendência dos Serviços Penitenciários), Maria José Diniz. Segundo ela, houve uma queda significativa dos casos de violência após a adoção da ala LGBT.(DINIZ apud BRANDÃO, 2013)
Na Paraíba (PB), A POLITICA DE alas para o público LGBTTTI, está em funcionamento desde setembro de 2013 no Presídio do Roger, na Penintenciária Dr. Romeu Golçalves de Abrantes (PB-1) e Penitenciária Regional Raimundo Asfora (Complexo do Serrotão), em Campina Grande. (PARAÍBA, 2014)
No estado do Mato Grosso (MT), a ala para o público LGBT existe desde julho de 2011, surgiu a partir do Projeto Arco-íris, esse Projeto foi apresentado pelo Psicólogo Mauro Borges:
Para o juiz da Vara de Execuções Penais, Geraldo Fidelis, além dos presos, a sociedade tem muito a ganhar com iniciativas como essa. “O sistema penitenciário deve resguardar a integridade física e moral dos reeducandos. As pessoas inseridas no projeto Arco-Íris estão sendo cuidadas com zelo e isso, com certeza, fortalece o trabalho de ressocialização”, explicou o magistrado.(CAVALCANTI, 2013)
A diversos estados que iniciaram a implementação da política nacional de combate à homofobia e promoção dos direitos LGBT por meio da elaboração de planos estaduais e da criação de coordenadorias e conselhos. São eles: Alagoas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e São Paulo.
CONCLUSÃO
Chegamos a conclusão, que é possível se afirma a importância que essas alas para LGBT's representam para esse público, pois as violências, tanto físicas como também verbais e psicológicas que ocorrem na nossa sociedade que esta fora dos muro do presidio, em que se predomina a heteronormatividade, ao qual se define padrões para o que é ser homem e o que é ser mulher, esse sistema também ocorre de modo evidente nos presídios Brasileiros, o sofrimento que essas pessoas sofrem é imenso, seria uma punibilidade enorme para essas pessoas, não basta serem colocadas em cárcere e retiradas as suas liberdades, ainda punem mais ao não respeitarei o sei sentir ser, ao colocar uma transexual em um presidio masculino e um transexual em um presidio feminino, seria como uma forma de punir mais de uma vez essas pessoas, e esses possuem muitas vezes passar por outros sofrimentos, como os casos de estupro de LGBT's nos presídios.
Portanto, é inegável a importância desse sistema, e que, portanto deve ser não apenas uma lei estadual, uma lei que vigore apenas nesses estados, mais que se torne sim uma lei nacional em que se determine a criação de alas para o público LGBT em todos os Presídios do Brasil que possuam esse público, e que proporcione cursos de formação, assistência a saúde, dentre outros meios para a promoção desses indivíduos
Bibliografia
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BARBOSA, Bruno Rafael Silva Nogueira; CRUZ, Eduardo Ailson da. João ou Maria? Maria ou João?: As dificuldades da adequação do gênero ao Nome civil. Revista Gênero & Direito, João Pessoa, v. 1, n. 1, p.124-145, maio 2014. Semestral. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/article/view/18293>. Acesso em: 14 jun. 2014.
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BRANDÃO, Marcelo. Presídios adotam alas gays para reduzir casos de violência contra homossexuais. 2013. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/09/29/presidios-adotam-alas-gays-para-reduzir-casos-de-violencia-contra-homossexuais.htm>. Acesso em: 14 jun. 2014.
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Graduando em Direito pela Universidade Federal da Paraíba.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBOSA, Bruno Rafael Silva Nogueira. Uma Selva nas Muralhas do Presídio: E a importância das Alas LGBT nos Presídios Brasileiros Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jul 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40080/uma-selva-nas-muralhas-do-presidio-e-a-importancia-das-alas-lgbt-nos-presidios-brasileiros. Acesso em: 23 dez 2024.
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