Resumo: com o falecimento do devedor no decorrer do processo executivo fiscal, o espólio passa a responder pela dívida nos limites do valor das forças da herança. Esse redirecionamento é atingido por simples petição incidental nos autos da ação de execução fiscal, não reclamando a instauração de processo de habilitação.
Sumário: 1. Introdução; 2. A Responsabilidade do espólio pelas dívidas do falecido devedor; 3. Redirecionamento nos autos da execução fiscal por simples petição incidental; 4. Conclusão.
1 – Introdução
A ação de execução fiscal tem por objetivo a cobrança forçada de créditos, de natureza tributária ou não, inscritos em dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias, incluindo as fundações públicas, por força do disposto no artigo 41, do Código Civil.
A legitimidade para figurar no polo passivo da execução fiscal, em regra, é do devedor de tributos ou de crédito não fiscal, como, por exemplo, multa administrativa aplicada pela inobservância da legislação de regência de determinada autarquia.
O artigo 4º, da Lei nº 6.830/80 de Execução fiscal estabeleceu quem deve compor a legitimidade passiva ad causam: devedor, fiador, espólio, massa, responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado, e os sucessores a qualquer título.
Observa-se na hipótese de falecimento do devedor no curso da execução fiscal, após a regular inscrição em dívida ativa e ajuizamento da ação, a Lei de Execução Fiscal redireciona a cobrança do débito ao espólio e aos sucessores a qualquer título.
Nesse passo, cabe distinguir a responsabilidade do espólio e dos sucessores.
Com o falecimento do devedor ocorre a abertura da sucessão, e seu patrimônio é transferido imediatamente, nos termos do artigo 1.784, do Código Civil.
Remarque-se que a formalização da transferência da responsabilidade para os sucessores, contudo, depende da conclusão do processo de inventário, com a consequente partilha de bens. Durante o período de tempo iniciado com a abertura da sucessão (morte) e concluído com o término do processo de inventário (partilha dos bens), a responsabilidade pelos tributos devidos pelo de cujus, até a data de sua morte, é do espólio[[1]].
Para se redirecionar a execução fiscal é necessária a propositura do processo de habilitação previsto nos artigos 1.055 a 1.062, do Código de Processo Civil ou a juntada de petição nos autos do processo executivo fiscal.
O presente artigo abordará e demonstrará a desnecessidade de instauração da habilitação, porquanto o redirecionamento para o espólio é medida que se impõe, para tanto, basta simples requerimento consubstanciado em petição incidental.
2 - Responsabilidade do espólio pelas dívidas do falecido devedor
Conforme a legislação substantiva civil, o direito de sucessão causa mortis é espécie de sucessão universal, na qual os bens do de cujus se tornam um todo unitário e transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários:
Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.
Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.
Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.
Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demonstrando o valor dos bens herdados.
Esse conjunto de bens tem sua administração determinada pela lei, que estabelece duas fases: a) a primeira, compreendida entre a abertura da sucessão (com o falecimento) e a assinatura do compromisso do inventariante e b) a segunda, após a assinatura do compromisso do inventariante e a partilha.
A herança, em sentido genérico, é o conjunto de bens, direitos e obrigações deixados por uma pessoa a seus sucessores. Por sua vez, espólio é a denominação que se confere a herança no sentido jurídico-formal, “um complexo quantitativo, universalidade objetiva de um patrimônio deixado pelo autor da herança, que não possui personalidade jurídica, tendo, porém, capacidade processual, limitada às relações de ordem patrimonial e como parte formal, atua por via de representação. Essa universalidade objetiva de bens não fica sem sujeito, estando-lhe assegurada gestores que a administrarão e a representarão em juízo ou fora dele”[[2]].
Não existindo ou inconcluso inventário, por imperativo lógico, não há homologação da partilha, assim, falecendo o executado, ocorre sua substituição pela figura processual do espólio, o qual deve responder pelas dívidas do falecido, a teor das disposições dos artigos 43 e 597, do Código de Processo Civil e1997, do Código Civil:
Código de Processo Civil
Art. 43. Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no art. 265.
Art. 597. O espólio responde pelas dívidas do falecido; mas, feita a partilha, cada herdeiro responde por elas na proporção da parte que na herança lhe coube.
Código Civil
Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA PESSOA JURÍDICA. PEDIDO DE REDIRECIONAMENTO FORMULADO CONTRA OS HERDEIROS DO SÓCIO-GERENTE.
1. O Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo (AgRg no Ag nº 1265124), assentou a possibilidade o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente no caso de dissolução irregular da empresa.
2. É viável o prosseguimento da execução fiscal em relação ao corresponsável quando o óbito deste é posterior ao ajuizamento da execução fiscal, como é o caso dos autos.
3. Nos termos do art. 4º, III, da Lei 6.830/80, "a execução fiscal poderá ser promovida contra o espólio". "O termo espólio pode ser usado como sinônimo de herança. Na prática, porém, utiliza-se no sentido de herança inventariada, ou seja, herança em processo de inventário" (FIUZA, Cesar. "Direito civil: curso completo", 10ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2007, pág. 1.003). Na hipótese, a própria recorrente admite que inexiste inventário. Ressalte-se que, nos termos do art. 985 do CPC, "até que o inventariante preste o compromisso (art. 990, parágrafo único), continuará o espólio na posse do administrador provisório", de modo que este "representa ativa e passivamente o espólio" (art. 986).
4. Por tais razões, é imperioso concluir que: 1) antes de se efetuar a partilha, é viável o pedido de redirecionamento do processo executivo fiscal para o espólio, que será representado pelo administrador provisório, caso não iniciado o inventário, ou pelo inventariante, caso contrário; 2) efetuada a partilha, por força do disposto no art. 4º, VI, da Lei 6.830/80 ("a execução fiscal poderá ser promovida contra sucessores a qualquer título"), é possível redirecionar a execução para o herdeiro, que responde nos limites da herança (art. 1.792 do CC/2002), "cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube" (art. 1.997 do CC/2002).
5. Assim, como bem ressaltou o Tribunal a quo, inexistindo inventário, mostra-se inviável, desde logo, incluir os herdeiros no pólo passivo do processo executivo fiscal. Ressalva-se, entretanto, a possibilidade de novo pedido de redirecionamento, dentro das circunstâncias supramencionadas.
6. Recurso especial desprovido.
(REsp 877.359/PR, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 18/03/2008, DJe 12/05/2008)
O redirecionamento da execução fiscal para o espólio também se apresenta juridicamente possível em razão da responsabilidade do espólio pelos débitos tributários ou de natureza não fiscal devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão, à luz dos expressos termos do artigo 4º, III, §2º, da Lei nº 6.830/80, e 131, III, do Código Tributário Nacional:
Lei nº 6.830/80
Art. 4º - A execução fiscal poderá ser promovida contra:
(....)
III - o espólio;
(....)
§2º - À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial.
Código Tributário Nacional
Art. 131. São pessoalmente responsáveis:
(....);
III - o espólio, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão.
Sobre o tema, julgados do Tribunal Regional Federal da 5ª Região:
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. "TAXA DE OCUPAÇÃO". DÍVIDA ATIVA NÃO-TRIBUTÁRIA. FALECIMENTO DO EXECUTADO ANTERIOR À PROPOSITURA DO EXECUTIVO FISCAL. EQUÍVOCO NÃO REGULARIZADO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO PARÁGRAFO 2º, DO ART. 4º, DA LEI Nº 6.830/80, C/C O ART. 131, II E III, DO CTN. APELAÇÃO DA UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) PROVIDA.
1 - Tendo a morte da parte executada ocorrido antes da propositura da execução fiscal e sendo aquela somente informada após o decurso de longo prazo, "o caso não é de suspensão do processo, mas de espera, pelo prazo legal, das providências do autor relativas à citação dos representantes do espólio" (RSTJ 20/333 e STJ-RT 670/176);
2 - Como se pode depreender dos autos, a presente execução fiscal envolve dívida não-tributária, referente à cobrança de "taxa" de ocupação;
3 - Ora, o parágrafo 2º, do art. 4º, da Lei nº 6.830/80, dispõe, in verbis: À Divida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial;
4 - Nessa linha, ainda que a hipótese em tela envolva crédito de natureza não-tributária, por força do contido no parágrafo 2º, anteriormente transcrito, mostra-se aplicável ao caso a inteligência do disposto no art. 131, II e III, do CTN, o que leva ao afastamento da precipitada a extinção do processo, sem resolução do mérito, uma vez que não foram exauridos, efetivamente, todos os meios colocados à disposição da parte exequente para o recebimento dos créditos que lhe são devidos pelo espólio ou sucessores do devedor falecido;
5 - Precedentes desta Segunda Turma;
6 - Apelação da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) provida.
(AC 200685000004139, Desembargador Federal Paulo Gadelha, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data: 28/07/2011 - Página: 176.)
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. FALECIMENTO DO EXECUTADO ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. CITAÇÃO DO ESPÓLIO.
1. Apelou-se de sentença que extinguiu a Execução, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC, por entender que a relação processual não fora validamente constituída.
2. A legislação vigente dispõe sobre as hipóteses de suspensão do feito para fins de restabelecimento do pólo passivo, em casos de falecimento do devedor, redirecionando-se a execução para os sucessores do executado, nos termos do art. 131, II e III, do CTN.
3. Impossibilidade de extinção do processo. Citação dos representantes do espólio do falecido. Apelação provida, para anular a sentença.
(AC 200682010015139, Desembargador Federal Geraldo Apoliano, TRF5 - Terceira Turma, DJE - Data: 01/07/2010 - Página: 540)
Por tais razões, o espólio é responsável pelas dívidas do falecido desde o evento morte (abertura da sucessão) até o término do processo de inventário (partilha dos bens).
3. Redirecionamento nos autos da execução fiscal por simples petição incidental
O processo de habilitação está previsto nos artigos 1.055 a 1.062, do Código de Processo Civil. Tem como objetivo regularizar a sucessão processual quando ocorre a morte de qualquer das partes. Nem toda morte da parte, entretanto, admite a sucessão processual, hipótese na qual o processo de habilitação será inadmissível[[3]].
Por força da interpretação literal dos incisos dos artigos 1.055 e 1.056, do Código de Processo Civil, conclui-se que o processo de habilitação tem cabimento exclusivamente aos "sucessores do falecido" (herdeiros e legatários), não se aplicando, portanto, ao espólio:
Art. 1.055. A habilitação tem lugar quando, por falecimento de qualquer das partes, os interessados houverem de suceder-lhe no processo.
Art. 1.056. A habilitação pode ser requerida:
I - pela parte, em relação aos sucessores do falecido;
II - pelos sucessores do falecido, em relação à parte.
Da leitura destes artigos se infere que a habilitação neles referida não se aplica ao espólio, sendo restrita aos “sucessores do falecido”, nos termos da lei civil. O espólio não é “sucessor do falecido”, não se equiparando a herdeiros e legatários. É o “conjunto de bens, direitos e obrigações de uma pessoa, após sua morte, e enquanto não distribuídos aos seus herdeiros e sucessores” (Celso Agrícola Barbi). Trata-se, pois, de uma universalidade de bens, sem personalidade jurídica, à qual se atribui mera “personalidade judiciária”, ou seja, capacidade de ser parte (CPC, art. 12, V, do CPC). Por isso, costuma-se afirmar que espólio é a herança do ponto de vista processual ou formal. Enquanto existir inventário, até a partilha, os bens da herança formam um espólio, que é a massa, ou a universalidade dos bens declarados em juízo[[4]].
Portanto, é de todo inviável a assimilação do conceito de espólio ao de “sucessores do falecido”, pois não se pode confundir herança com herdeiros. Logo, pela própria dicção legal, dessume-se que a habilitação prevista nos arts. 1055 et seqq. do CPC simplesmente não se aplica ao espólio, mas apenas aos herdeiros e legatários do falecido. Ademais, o processo de habilitação pressupõe um conflito, ainda que meramente potencial, sobre o direito do interessado (herdeiro ou legatário) à sucessão processual. Tal conflito, de regra, não se verifica no caso do espólio, a revelar a desnecessidade de instauração de eventual processo de habilitação[[5]].
Com efeito, pode surgir controvérsia em relação aos sucessores quanto à condição de herdeiro ou legatário do de cujus, inclusive, com possibilidade de produção de prova, o que não acontece em relação ao espólio.
Descabe ventilar, nesse contexto, a legitimidade do espólio para suceder processualmente o falecido, tendo em conta o disposto nos artigos 43 e 597, do Código de Processo Civil, artigo 4º, III, da Lei de Execução Fiscal e artigo 131, III, do Código Tributário Nacional. “Eventual controvérsia pode girar em torno de quem o representará no caso concreto (inventariante ou administrador provisório), mas não sobre a legitimidade do espólio em si mesmo para suceder processualmente a parte que faleceu no curso da ação”[[6]].
Assim, para a citação do espólio do falecido não há necessidade de instauração de processo autônomo de habilitação, o simples requerimento de citação do espólio é medida mais consentânea com os princípios da celeridade processual e da instrumentalidade das formas, visto que a responsabilidade do espólio não inspira maiores discussões, sendo de todo contraproducente a instauração de processo autônomo de habilitação, conforme decidiu o Tribunal Regional Federal da 5ª Região:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE DEVEDORA. POSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO CONTRA O SÓCIO-GERENTE. ÓBITO DA COEXECUTADA NO CURSO DA DEMANDA JUDICIAL. POSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO CONTRA O ESPÓLIO DA CORRESPONSÁVEL MEDIANTE SIMPLES REQUERIMENTO DE CITAÇÃO NOS AUTOS DA EXECUÇÃO FISCAL. DESNECESSIDADE DE HABILITAÇÃO DO ESPÓLIO NOS TERMOS DOS ARTS. 1.055 E SEGUINTES DO CPC. HABILITAÇÃO DOS HERDEIROS: IMPOSSIBILIDADE SI ET IN QUANTUM. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo (AgRg no Ag nº 1265124), assentou a possibilidade o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente no caso de dissolução irregular da empresa.
2. É viável o prosseguimento da execução fiscal em relação ao corresponsável
quando o óbito deste é posterior ao ajuizamento da execução fiscal, como é o caso dos autos.
3. Não tendo havido partilha, os herdeiros não podem ser citados em nome próprio, uma vez que não respondem com patrimônio próprio pelas obrigações do de cujus, senão pelos bens adquiridos em sucessão mortis causa e nos limites das forças da herança (intra vires hereditatis), nos termos do art. 1997 do CC/2002, falecendo-lhes, si et in quantum, legitimidade passiva ad causam. 4. Antes da partilha, a legitimidade passiva ad causam pertence ao espólio, cuja citação deve dar-se na pessoa do inventariante ou, não o havendo, na do administrador provisório. Portanto, inexistindo inventariante, o espólio deve ser citado na pessoa do administrador provisório, que, em regra, é o cônjuge/companheiro sobrevivente, conforme dispõe o art. 1797 do CC/2002. Precedentes do STJ.
5. Pela própria literalidade da dicção legal, dessume-se que a habilitação prevista nos arts. 1055 et seqq. do CPC não se aplica ao espólio, mas apenas aos "sucessores do falecido" (herdeiros e legatários), consoante prevê o art. 1056 do CPC.
6. A citação do espólio prescinde de prévia instauração de processo de habilitação nos termos dos arts. 1055 e seguintes do CPC.
7. Sobre inexistir previsão legal em relação ao espólio, é patente a desnecessidade de instauração de processo de habilitação nos termos dos arts. 1055 e seguintes do CPC.
8. De feito, quanto aos sucessores, pode haver discussão quanto à qualidade de herdeiro ou legatário do interessado, até mesmo com possibilidade de produção de prova, o que inocorre em relação ao espólio: não há discutir sua legitimidade para suceder processualmente o de cujus, diante da clareza do art. 43 do CPC. Eventual controvérsia pode girar em torno de quem o representará no caso concreto (inventariante ou administrador provisório), mas não sobre a legitimidade do espólio em si mesmo para suceder processualmente a parte que faleceu no curso da ação.
9. Destarte, o simples requerimento de citação do espólio é medida mais consentânea com os princípios da celeridade processual e da instrumentalidade das formas, visto que a responsabilidade do espólio não inspira maiores discussões, sendo de todo em todo contraproducente a instauração de processo autônomo de habilitação.
10. Portanto, o mero requerimento de citação deduzido nos autos da própria execução fiscal, com indicação do endereço do inventariante ou do administrador provisório, é suficiente para redirecionar legitimamente a execução contra o espólio.
11. Agravo de instrumento provido.
(AG 00123762220124050000, Desembargador Federal André Dias Fernandes, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data: 17/01/2013 - Página: 201)
Por fim, a questão do representante do espólio, esse encargo deve recair, em regra, no cônjuge sobrevivente, uma vez que tem a posse direta e a administração dos bens hereditários, “por ser o administrador provisório natural, por estar na posse dos bens a serem inventariados”[[7]]. Inteligência dos artigos 985, 986 e 990, I, do Código de Processo Civil e 1797, do Código Civil:
Código de Processo Civil
Art. 985. Até que o inventariante preste o compromisso (art. 990, parágrafo único), continuará o espólio na posse do administrador provisório.
Art. 986. O administrador provisório representa ativa e passivamente o espólio, é obrigado a trazer ao acervo os frutos que desde a abertura da sucessão percebeu, tem direito ao reembolso das despesas necessárias e úteis que fez e responde pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causa.
Art. 990. O juiz nomeará inventariante:
I - o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste;
Código Civil
Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente:
I - ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão;
A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais é no sentido de que o cônjuge supérstite seja o administrador provisório:
PROCESSO CIVIL. MORTE DE UMA DAS PARTES. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. ESPÓLIO. REPRESENTAÇÃO PELO ADMINISTRADOR PROVISÓRIO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE INVENTARIANTE. SUSPENSÃO DO FEITO. DESNECESSIDADE. NULIDADE PROCESSUAL. INOCORRÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não há a configuração de negativa de prestação jurisdicional nos embargos de declaração, se o Tribunal de origem enfrenta a matéria posta em debate na medida necessária para o deslinde da controvérsia, ainda que sucintamente. A motivação contrária ao interesse da parte não se traduz em maltrato ao art. 535 do CPC.
2. De acordo com os arts. 985 e 986 do CPC, enquanto não nomeado inventariante e prestado compromisso, a representação ativa e passiva do espólio caberá ao administrador provisório, o qual, comumente, é o cônjuge sobrevivente, visto que detém a posse direta e a administração dos bens hereditários (art. 1.579 do CC/1916, derrogado pelo art. 990, I a IV, do CPC; art. 1.797 do CC/2002).
3. Apesar de a herança ser transmitida ao tempo da morte do de cujus (princípio da saisine), os herdeiros ficarão apenas com a posse indireta dos bens, pois a administração da massa hereditária restará, inicialmente, a cargo do administrador provisório, que representará o espólio judicial e extrajudicialmente, até ser aberto o inventário, com a nomeação do inventariante, a quem incumbirá representar definitivamente o espólio (art. 12, V, do CPC).
4. Não há falar em nulidade processual ou em suspensão do feito por morte de uma das partes se a substituição processual do falecido se fez devidamente pelo respectivo espólio (art. 43 do CPC), o qual foi representado pela viúva meeira na condição de administradora provisória, sendo ela intimada pessoalmente das praças do imóvel.
5. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 777.566/RS, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), Terceira Turma, julgado em 27/04/2010, DJe 13/05/2010)
Tributário e Processual Civil. Agravo de instrumento. Execução Fiscal. Morte do Co-executado. Processo de inventário pendente de abertura. Citação do cônjuge supérstite para representar o espólio na condição de administrador provisório. Possibilidade. Até o compromisso do inventariante, a administração provisória da herança caberá, além de outros representantes enumerados no Código Civil, ao cônjuge supérstite. Inteligência dos arts. 985 986 e 1.797 do Código Civil.
Agravo de instrumento provido.
(AG 00111935020114050000, Desembargador Federal André Dias Fernandes, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data: 07/02/2013 - Página: 677)
EXECUÇÃO. CITAÇÃO. ESPÓLIO. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO INVENTÁRIO. REPRESENTAÇÃO PASSIVA PELO CÔNJUGE SUPÉRSTITE. ADMINISTRADOR PROVISÓRIO.
1. Enquanto não formalizado o inventário, há a figura do administrador provisório da herança, que, a teor do inc. I do art. 1.797 do CC, é o cônjuge sobrevivente ou companheiro (a).
2. Segundo o art. 986 do CPC, o administrador provisório representa ativa e passivamente o espólio, pelo que é possível a citação na pessoa do cônjuge supérstite.
(AG 200604000262148, Luiz Carlos de Castro Lugon, TRF4 - Terceira Turma, DJ 18/10/2006 Página: 467)
4 - Conclusão
Por todo exposto, conclui-se que o redirecionamento para o espólio do executado nos próprios autos do processo de execução fiscal por simples requerimento é medida mais coerente e adequada com os princípios da celeridade processual e da instrumentalidade das formas, sendo desnecessária a propositura do processo de habilitação, porquanto a responsabilidade do espólio está prevista nos artigos 43 e 597, do Código de Processo Civil, artigo 4º, III, da Lei de Execução Fiscal e artigo 131, III, do Código Tributário Nacional. Além disso, a habilitação se aplica somente aos herdeiros e legatários do falecido, interpretação literal dos artigos 1.055 e 1.056, do Código de Processo Civil, pressupondo um conflito, ainda que potencial, sobre essa qualidade à sucessão processual, o que não verifica no caso do espólio.
Referências:
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 7 ed. São Paulo: Método, 2013.
ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 11 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.
CASSETARI, Christiano e MENIN, Márcia Maria (coords.). Direito das Sucessões. Vol. 8. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
MADUREIRA, Claudio Penedo, ANDRADE, José Árido Valadão. Execução Fiscal. 4 ed. Salvador: Juspodvm, 2012.
MALTINTI, Eliana Raposo. Direito Civil: direito de família e sucessões. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Código Civil Comentado. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2007.
NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 5 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 4 ed. São Paulo: Método, 2012.
NICOLAU, Gustavo Rene. Direito Civil: sucessões. São Paulo: Atlas, 2005.
PAULSEN, Leandro, ÁVILA, René Bergmann e SLIWKA, Ingrid Schroder. Direito Processual Tributário: processo administrativo fiscal e execução fiscal à luz da doutrina e jurisprudência. 3 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
SCALQUETTE, Ana Cláudia. Família & Sucessões. São Paulo: Barros, Fisher & Associados, 2005.
SILVA, Américo Luís Martins da. A execução da dívida ativa da Fazenda Pública. 2 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
Notas:
[[1]] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 7 ed. São Paulo: Método, p. 312.
[[2]] 2153759 PR Agravo de Instrumento - 0215375-9, Relator: Edvino Bochnia, Data de Julgamento: 22/11/2002, Decima Câmara Cível (extinto TA), Data de Publicação: 06/12/2002 DJ: 6265.
[[3]] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 4 ed. São Paulo: Método, 2012. p. 1431/1432.
[[4]] Trecho extraído do voto do Desembargador Federal André Dias Fernandes, Relator do AG 00123762220124050000, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data: 17/01/2013 - Página: 201.
Procurador Federal, membro da Advocacia-Geral da União. Pós-graduado em Direito Público e Direito do Trabalho. Ex-advogado da Caixa Econômica Federal. Ex-advogado da Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão. Ex-analista processual do Ministério Público da União. Ex-conciliador federal. Ex-advogado privado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ERICEIRA, Cássio Marcelo Arruda. A desnecessidade do processo de habilitação na execução fiscal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jul 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40133/a-desnecessidade-do-processo-de-habilitacao-na-execucao-fiscal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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