RESUMO: O presente artigo busca demonstrar a importância do regime jurídico-administrativo nas empresas estatais para assegurar a observância aos princípios e às regras próprias do regime jurídico-administrativo (de direito público) representa um meio destinado a estabelecer limitações indispensáveis ao zelo da moral, do patrimônio e dos recursos públicos, em respeito ao princípio da indisponibilidade, para tanto serão analisados o conceito de empresa pública e sociedade de economia mista, suas diferenças, derrogações e prerrogativas, bem como o regime jurídico aplicado às diferentes espécies. Por último, analisaremos a constitucionalidade dos monopólios estatais e o fenômeno da privatização. Como referencial teórico seguiu-se o pensamento do doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello.
Palavras-chave: Empresas estatais. Análise. Regime jurídico.
I. INTRODUÇÃO:
O Estado, seja prestando serviço público, seja atuando na atividade econômica (fiscalização, regulação e execução), pode desenvolver atividades por si mesmo (fenômeno denominado de concentração) ou por meio de outros sujeitos (descentralização).
Esta atuação descentralizada ocorre quando o Estado transfere o exercício de determinadas atividades para particulares (pelo regime concessão, permissão e autorização), fenômeno conhecido por descentralização por delegação, ou quando o próprio Estado cria entidades a ele vinculadas, com personalidade jurídica distinta, e a estas passa a própria titularidade e execução de tais atividades administrativas (fenômeno da descentralização por outorga, que pressupõe a edição de uma lei que crie ou autorize a criação de nova entidade).
O Decreto-Lei nº 200/67, considerados por muito autores como a segunda grande Reforma Administrativa, instituiu a descentralização na organização administrativa, quando delegou autonomia às entidades da Administração indireta, partindo do pressuposto de que havia uma rigidez na Administração direta e da premissa de uma maior eficiência da Administração indireta.[1]
Dessa forma, foi a partir da promulgação deste referido Decreto-Lei que a Administração Pública brasileira passou a dividir-se em direita e indireta, conforme determina o art. 4º, I e II, respectivamente, do Decreto-Lei 200/67.
É nesse ínterim que ganharam regime jurídico específico as empresas públicas e sociedades de economia mista, pertencentes à Administração indireta, com autonomia financeira e administrativa.
Conforme ensinamentos de Odete Medauar[2], no Brasil, recebem o nome genérico de estatais as empresas administradas e controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público. Assim, no presente artigo, chamaremos de forma geral de empresas estatais as empresas públicas e as sociedades de economia mista.
Inicialmente, as empresas estatais foram sendo criadas de modo mais acentuado nas décadas de 60 e 70 como formas de participação direta do Estado na atividade econômica. A Constituição Federal de 1988, no seu art. 173, assegura como lícita essa intervenção do Estado, desde que seja de forma excepcional, quando necessária essa intervenção por motivos de segurança nacional ou relevante interesse público.
Ocorre que, posteriormente, essas estatais também foram sendo criadas para prestação de serviço público. O fundamento está no art. 175, da Carta Magna, posto que incumbe ao Poder Público a prestação de serviço público diretamente ou sob o regime de delegação. Com isso tanto o Estado pode prestar serviço público através de seus órgãos (Administração direta), como através empresas públicas e sociedades de economia mista (Administração indireta).
O presente trabalho pretende desdobrar o estudo de tais empresas, notadamente no que diz respeito ao regime juspublicista a elas aplicável. Para isso, mostra-se necessário o estudo acerca do respeito às normas de direito público, seja quando imponham sujeições ou mesmo quando possibilitam prerrogativas não extensíveis aos particulares.
Em verdade, tais empresas predominantemente atuam na área privada e, por isso, é enorme a incidência de regime jusprivatista. Todavia, demonstrar-se-á que a observância aos princípios e às regras próprias do regime jurídico-administrativo (de direito público) representa um meio destinado a estabelecer limitações indispensáveis ao zelo da moral, do patrimônio e dos recursos públicos, em respeito ao princípio da indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos.
Nas lições do professor Celso Antônio Bandeira de Mello, tais empresas seriam verdadeiro instrumento de ação do Estado: “o traço essencial e caracterizador dessas pessoas é o de constituírem em auxiliares do Poder Público; logo, são entidades voltadas, por definição, à busca de interesses transcendentes aos meramente privados”[3].
Em síntese, o presente trabalho buscará estudar o conceito de empresa pública e sociedade de economia mista, suas diferenças, derrogações e prerrogativas, bem como o regime jurídico aplicado às diferentes espécies. Por último, analisaremos a constitucionalidade dos monopólios estatais e o fenômeno da privatização.
II. DESENVOLVIMENTO:
1. Empresas Estatais: conceito clássico.
O conceito das entidades em exame está intimamente atrelado à verificação da atividade que elas exercem, bem como à análise das derrogações das normas de direito público, questões essas que serão objeto de estudo em momento posterior.
Com finalidade didática, abaixo se vê o conceito da doutrina clássica sobre o tema, notadamente os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello[4], verbis:
Deve-se entender que a empresa pública federal é a pessoa jurídica criada por força de autorização legal como instrumento de ação do Estado, dotada de personalidade de Direito Privado, mas submetida a certas regras especiais decorrentes de ser coadjuvante da ação governamental, constituída sob quaisquer das formas admitidas em Direito e cujo capital seja formado unicamente por recursos de pessoas de Direito Público interno ou de pessoas de suas Administrações indiretas, com predominância acionária residente na esfera federal.
(...)
Sociedade de economia mista federal há de ser entendida com a pessoa jurídica cuja criação é autorizada por lei, como um instrumento de ação do Estado, dotada de personalidade de Direito Privado, mas submetida a certas regras especiais decorrentes desta sua natureza auxiliar da atuação governamental, constituída sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertencem em sua maioria à União ou entidade de sua Administração indireta, sob remanescente acionário de propriedade privada.
Como exemplos de empresas públicas temos: EBCT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), INFRAERO (Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária), Caixa Econômica Federal e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social); já como sociedades de economia mista temos: Banco do Brasil S/A, PETROBRÁS (Petróleo Brasileiro S/A) e Banco do Amazônia S/A.
2. Há diferenças entre empresa pública e sociedade de economia mista?
A bem da verdade, não há uma distinção material entre as empresas estatais. Ambas dependem de autorização legal, detêm personalidade jurídica de direito privado e podem tanto atuar como empresárias como prestadoras de serviço público. Não há um critério jurídico bem definido que obrigue o Poder Público a escolher uma ou que impeça de escolher outra para atuar em tal ou qual atividade.
Três são os aspectos diferenciadores, tendo em vista o aspecto formal: composição do capital, forma jurídica e foro competente para as lides processuais (este último aspecto aplica-se somente as empresas estatais federais).
2.1) Composição do capital:
De acordo com Marcos Nóbrega, a principal diferença estaria na composição do capital social, já que, em se tratando de empresa pública, o capital seria 100% público. Já em se tratando de sociedade de economia mista, há capital público mas também há capital privado, mas este último (capital privado) não pode retirar da Administração o controle acionário da empresa: “somente será sociedade de economia mista se houver o controle acionário pela entidade vinculada à administração pública”. [5]
As empresas públicas têm capital exclusivamente público. Não há espaço para capital aberto, ou seja, não há possibilidade de participação direta de recursos de particulares na formação do capital. Em regra, todo o capital está sob comando da entidade política que autorizou a criação desta empresa, mas nada impede que haja participação de outras pessoas políticas, ou de entidades das diversas Administrações indiretas. Ou seja, uma sociedade de economia mista pode ser acionista de uma empresa pública. E isso não retira o caráter público do capital da empresa pública.
Já as sociedades de economia mista detêm capital aberto, formado obrigatoriamente pela conjugação do capital público e privado. A única exigência é que a maioria das ações com direito a voto pertença à pessoa política instituidora, ou de entidade de sua Administração indireta.
2.2) Forma jurídica:
As empresas públicas podem adotar qualquer forma jurídica admitida em direito (podem ser S/A, Ltda, comandita por ações, etc.). Pode ainda haver a criação de uma forma jurídica inédita, desde que a empresa seja do plano federal (já que apenas a União pode inovar em matéria de direito comercial ou civil, à luz do art. 22 da Constituição Federal de 1988).
Já as sociedades de economia mista só podem ser sociedades anônimas, regidas pela Lei 6.404/76.
2.3) Justiça Competente
A questão do foro federal ou local para julgamento das causas contra empresas estatais não é, em tese, uma diferenciação entre tais empresas. Na verdade, a diferença não é intrínseca, mas extrínseca, já que não se está tratando de algo que uma empresa tem e que outra não tem. Está-se apenas analisando como o direito processual é aplicado aos dois tipos de empresas estatais (sociedade de economia mista e empresa pública). Por isso, a rigor, não é uma diferença entre elas, mas sim uma diferença de tratamento efetuado pelas normas de processo.
As empresas públicas federais são julgadas na Justiça Federal, conforme determina o art. 109, inciso I, da Constituição Federal, exceto as causas de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.
Já as sociedades de economia mista federais são julgadas na Justiça Local, posto que a Carta Magna apenas mencionou as empresas públicas federais.
3. Do regime jurídico das empresas estatais:
Apesar das empresas estatais serem pessoas jurídicas de direito privado (pois são criadas quando seus respectivos estatutos são devidamente registrados - ou na junta comercial ou no cartório do registro civil de pessoas jurídicas) seu regime jurídico é híbrido, misto, posto que o fato de pertencerem ou mesmo serem controladas pelo Poder Público acarreta a incidência de normas de Direito Público, tendo em vista que qualquer conduta da Administração deve ter como fim último o interesse público, em respeito aos princípios da finalidade e da supremacia do interesse público sobre o interesse privado.
Nesse sentido, afirma José dos Santos Carvalho Filho:
(...) as sociedades de economia mista e as empresas públicas (...) exibem dois aspectos inerentes à sua condição jurídica: de um lado, são pessoas jurídicas de direito privado e, de outro, são pessoas sob o controle do Estado. Esses dois aspectos demonstram, nitidamente, que nem estão sujeitas inteiramente ao regime de direito privado nem inteiramente ao de direito público. Na verdade, pode dizer-se, como fazem alguns estudiosos, que seu regime tem certa natureza híbrida (...).
Na mesma linha, Celso Antônio aduz que a personalidade de direito privado “não passa de um expediente técnico cujo préstimo adscreve-se, inevitavelmente, a certos limites, já que não poderia ter o condão de embargar a positividade de certos princípios e normas de Direito Público cujo arrendamento comprometeria objetivos celulares do Estado de Direito.”[6]
Ora, as derrogações próprias do regime jurídico-administrativo aplicáveis às empresas estatais não são meros instrumentos burocráticos, mas, sim, meios destinados a estabelecer limitações indispensáveis ao zelo da moral, do patrimônio e dos recursos públicos, em respeito ao princípio da indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos. Por isso, mais uma vez, Celso Antônio aduz que “O regime de direito público resulta da caracterização normativa de determinados interesses como pertinentes à sociedade e não aos particulares considerados em sua individuada singularidade”.[7]
O eminente professor acima referido destaca, em apertada síntese, que por muito tempo, parte da doutrina e jurisprudência pátria afirmava que em regra estas estatais seriam regidas pelas normas de direito privado e que apenas quando houvesse disposições expressas que impusessem restrições próprias do regime jurídico de direito público é que estas entidades da Administração indireta deveriam obedecer tais disposições.
Acresce ainda o aludido autor que esta errônea visão ensejou, na prática, uma completa desestruturação e desmoralização dessas entidades. Vultuosos desperdícios de recursos públicos para custear regalias para diretoria; admissão de pessoal sem a observância das normas de concurso público; inobservância de processo licitatório para aquisição e alienação de bens; não sujeição à fiscalização do Tribunal de Contas; entre outras mazelas.
Nada mais óbvio que estas entidades (seja quando estiverem intervindo na economia, seja prestando serviço público) devem se submeter aos controles internos e externos da Administração Pública, bem como às normas de direito público que lhes imponham uma atuação mais transparente, impessoal e isonômica com os administrados/cidadãos, posto que estas estatais utilizam recursos captados total ou majoritariamente de fontes públicas, bem como são entidades criadas pelo Poder Público para auxiliarem este na busca da realização do bem comum.
Tento em vista a proteção maior que é dada pelas normas de direito público ao cidadão/administrado (verdadeiro detentor dos bens e interesses públicos) e analisando a essencialidade dessas empresas estatais (posto que são entidades criadas pelo Poder Público para lhe auxiliar na consecução do bem comum), mostra-se claro que as estatais, independente da atividade que estejam a desempenhar, devem, sim, estar submetidas, ao menos em parte, às normas publicitas. Afial, o Estado é como um Midas: não transforma tudo em ouro, mas publiciza tudo o que toca.
Por óbvio que as normas de direito público aplicam-se de forma diferenciada, tendo em vista a atividade a ser desenvolvida pelas estatais, como será exaustivamente demonstrado no item posterior.
4. Espécies de empresas estatais:
Conforme fora mencionado acima, as empresas estatais podem ser empresárias (quando estão intervindo diretamente na economia, nos casos excepcionais necessários aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, com fundamento no art. 173, da Constituição Federal) ou podem ser prestadoras de serviços público, com base no art. 175 da Carta Política.
Corroborando este entendimento, importante transcrever mais uma vez o posicionamento de Celso Antônio Bandeira de Mello[8]:
Há, portanto, dois tipos fundamentais de empresas públicas e sociedades de economia mista: exploradoras de atividade econômica e prestadoras de serviços públicos ou coordenadoras de obras públicas e demais atividades públicas. Seus regimes jurídicos não são, nem podem ser, idênticos(...)
No primeiro caso, é compreensível que o regime jurídico de tais pessoas seja o mais próximo possível daquela aplicável à generalidade das pessoas de Direito Privado. Seja pela natureza do objeto de sua ação, seja para prevenir que desfrutem de situação vantajosa em relação às empresas privadas - às quais cabe a senhoria no campo econômico -, compreende-se que estejam, em suas atuações, submetidos a uma disciplina bastante avizinhada da que regula as entidades particulares de fins empresariais. Daí haver o Texto Constitucional estabelecido que em tais hipóteses regular-se-ão pelo regime próprio das empresas privadas (art. 173, §1º, II). Advirta-se, apenas, que há um grande exagero nesta dicção da Lei Magna, pois ela mesma se encarrega de desmentir-se em inúmeros outros artigos(...)
No segundo caso, quando concebidas para prestar serviços públicos ou desenvolver quaisquer atividades de índole pública propriamente (como promover a realização de obras públicas), é natural que sofram o influxo mais acentuado de princípios e regras de Direito Público, ajustados, portanto, ao resguardo de interesses desta índole. (grifou-se)
4.1) Empresárias:
O Constituinte originário de 1988 deixou claro que a República Federativa do Brasil segue o sistema capitalista de mercado, posto que, no caput do art. 170 da Carta Política, está assegurado que a ordem econômica está fundada na livre iniciativa e que a atuação do Estado na atividade econômica se daria na forma de monopólio estatal (art. 177, da CF) ou, excepcionalmente, na exploração direta da atividade econômica, quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo (art. 173, da CF).
Andou bem o constituinte em assegurar esta intervenção estatal no domínio econômico, posto que seguiu o modelo capitalista, mas não adotou a ideologia neoliberal do Estado-mínimo. Ao revés. De acordo com Celso Antônio, “é claro que a todas as luzes que a Constituição brasileira apresenta-se como uma estampada antítese do neoliberalismo, pois não entrega a satisfatória organização da vida econômica e social a uma suposta (e nunca demonstrada) eficiência de mercado. Pelo contrário, declara que o Estado brasileiro nela se enunciam, obrigando a que a ordem econômica e social sejam articuladas de maneira a realizar os objetivos apontados (diga-se no Texto Constitucional)”. [9]
Com isso, é constitucionalmente assegurado ao Estado criar entidades para atuar no setor econômico, desde que respeitado as disposições constitucionais.
Todavia, esta atuação estatal direta na exploração de atividade econômica não pode ensejar concorrência desleal com relação às empresas do setor privado, dessa forma, a Carta Maior determina, em seu art. 173, §1º, II, que as empresas estatais exploradoras de atividades econômicas se sujeitam ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários.
Entretanto, a presença do Poder Público e a finalidade maior que determina a criação destas estatais acarreta a incidência de normas de direito público, em especial daquelas que impõem sujeições. Nesse sentido verificam-se os pronunciamentos do STF no MS 21.322-1/DF (DJU 23.04.1993 e BDA, maio 1995) e no RE 172.816-7/RJ (BDA, fev. 1995).
Exemplos dessas sujeições imposta pelas normas de direito público são:
a) submissão aos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput, da CF);
b) proibição de acumulação de cargos, empregos e funções públicas, exceto os casos permitidos no texto constitucional (art. 37, XVII, da CF);
c) submissão das operações de créditos externo e interno a limites fixados pelo Senado Federal (art. 52, VII, da CF);
d) exigência de concurso público para admissão de pessoal (art. 37, II, CF);
e) vedação a que deputados e senadores , em certos casos desde a diplomação e outros desde a posse, aceitem ou exerçam cargos, funções ou empregos e firme ou mantenham contratos com empresa pública e sociedade de economia mista (art. 54, I, da CF);
f) remuneração de pessoa sujeito ao teto constitucional quando estas empresas estatais receberem recursos públicos para pagamento de pessoal ou de custeio em geral (art. 37, XI, e § 9);
g) observância à Lei 8.666/93 (lei de licitações e contratos) no que concerne aos contratos relacionados a todas as atividades-meio, até que seja criado regime próprio de licitação a ser estabelecido, em lei ordinária, pela União;
h) controle finalístico pela Administração direta;
i) controle pleno pelo Poder Legislativo (art. 49, X, CF);
j) controle exercido pelos Tribunais de Contas, inclusive a tomada de contas especial (art. 71, II, CF);
k) controle do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF).
Registre-se, dentre outras, como exemplos dessas empresas estatais empresárias a PETROBRÁS (Petróleo Brasileiro S/A) e o Banco do Brasil S/A.
4.2) Prestadoras de Serviço Público:
As empresas estatais prestadoras de serviço público têm sua criação fundamentada na faculdade, conferida ao Poder Público, de decidir sobre o modo de realização de tais atividades. Como já dito anteriormente o art. 175, da Carta Política, afirma que a prestação de serviço público cabe ao Estado diretamente ou sob a forma de delegação.
Dessa forma, caberá ao Estado, tendo em vista a análise da conveniência e oportunidade (diga-se juízo de discricionariedade), escolher entre prestar o serviço público por meio de seus órgãos ou através de uma entidade da Administração indireta (empresa pública ou sociedade de economia mista).
Por óbvio que, tendo em vista a atividade desenvolvida, quando estas empresas estatais prestarem serviço público deverão nortear-se, em grande parte, por normas de direito público.
Há doutrinadores que discutem acerca da fundamentação desta prestação estatal, se estas empresas estatais atuariam diretamente ou sob a forma de delegação.
Seguindo os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello[10], caberá falar em concessão de serviço público quando se ponham em pauta os direitos, deveres e poderes que entram em jogo no referido instituto. Isto ocorre nos casos em que há verdadeiramente concurso de (a) capitais particulares na formatação do capital da sociedade (quando as estatais forem sociedades de economia mista, pois não há possibilidade dos particulares possuírem ações nas empresas públicas); (b) capitais provenientes de órbita governamental diversa da órbita da pessoa a quem assiste a competência constitucional para prestá-lo (aqui podem ser delegatárias de serviço público tanto as empresas públicas quanto sociedades de economia mista).
Em síntese, as sociedades de economia mista federais sempre serão prestadoras de serviço público sob o regime de delegação, posto que estas sempre possuem capital aberto. Com relação às empresas públicas federais estas podem prestar serviço público diretamente (quando o capital for exclusivamente da União ou por capital dela em conjugação com o de pessoas de sua Administração indireta) ou sob a forma de delegação (quando for formada pela conjugação de recursos oriundos de entidades da esfera federal associados a recursos provenientes de entidades da esfera estadual, distrital ou mesmo municipal).
Independentemente da empresa estatal atuar com fundamento na prestação direta ou sob o regime de delegação, estas entidades prestadoras de serviço público não podem ser regidas somente pelo direito privado, ao contrário, ante a atividade desenvolvida, norteiam-se com predomínio das normas de direito público.
Assim essas estatais seguem predominantemente o regime jurídico-administrativo, sendo derrogadas por normas de direito privado. Dessa forma, estas entidades também gozam de prerrogativas próprias das entidades regidas pelo direito público, como por exemplo:
a) seus bens afetados ao serviço público diretamente são considerados bens públicos (sendo, pois, inalienáveis, impenhoráveis, imprescritíveis e não - oneráveis);
b) seus atos, que diretamente se liguem ao próprio desempenho do serviço, são considerados atos administrativos, sendo, pois, contestáveis judicialmente por meio de mandado de segurança;
c) seus contratos firmados para atendimento das finalidades são contratos administrativos;
d) gozam de imunidade tributária recíproca (art. 150, VI, a, da CF), exceto quando as estatais receberem contraprestação ou pagamento de preços e tarifas pelo usuário (do art. 150, §3, da CF).
Com relação às derrogações oriundas do direito privado pode-se destacar: o regime de pessoal que não é estatutário, mas, sim, celetista, ou seja, regido pelas normas da CLT; sua criação apenas se efetua quando são devidamente inscritas no registro público competente (registro civil de pessoas jurídicas ou registro público de empresas mercantis).
A bem da verdade, o que pretende o presente trabalho, que tem como foco a visão publicista das estatais, é demonstrar quais as sujeições impostas pelo regime jurídico-administrativo a estas entidades prestadoras de serviço público. Por isso, vale mencionar que todas as sujeições anteriormente apontadas para as empresas estatais empresárias também são verificadas para as estatais prestadoras de serviço público. Ocorre que, pelo fato destas últimas entidades realizarem atribuições ditas essências para a sociedade, ainda incorrem sobre elas outras derrogações específicas, quais sejam:
a) sujeitas integralmente ao procedimento licitatório (lei 8.666/93), posto que nem mesmo com o surgimento do estatuto jurídico haverá modificação, tendo em vista que o caput do art. 173 versa sobre a possibilidade da atuação estatal, de forma excepcional, no domínio econômico;
b) respondem objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (art. 37, §6º, da CF).
Registre-se, dentre outras, como exemplos dessas empresas estatais prestadoras de serviço público a Compesa e a Chesf.
5. Dos monopólios estatais:
O monopólio exercido por empresa privada é vedado pela Carta Magna, posto que esta garante a livre concorrência como um dos princípios basilares da atividade econômica, sendo contrária a quaisquer formas de dominação de mercado, por entidades da iniciativa privada.
Com relação aos monopólios estatais estes são, acertadamente, garantidos pela Constituição Cidadã, posto que seu art.177 é incisivo em afirmar que certas atividades constantes nos incisos deste artigo constituem monopólio da União.
Para fundamentar a existência desses monopólios estatais, bem como para diferenciá-los dos monopólios privados, importante transcrever as lições de José dos Santos Carvalho Filho[11]:
(...) A diferença, porém, é flagrante. Enquanto o monopólio privado tem por escopo o aumento de lucros e interesse privado, o monopólio estatal visa sempre à proteção do interesse público. A exclusividade de atuação do Estado em determinado setor econômico tem caráter protetivo (...)
Ressalte-se que estas atividades monopolizadas são atividades econômicas, devendo, pois, serem regidas predominantemente pelas normas de direito privado, o que não exclui, como dito alhures, a aplicabilidade das normas de direito público a tais empresas. Assim, por exemplo, a Petrobrás não precisará fazer licitação para vender ou comprar barris de petróleo, mas necessitará realizar o procedimento licitatório para aquisições que sejam ligadas às suas atividades instrumentais, e não finais. Ou seja, necessitará realizar licitação quando não haja prejuízo para o regular desenvolvimento de suas atividades econômicas (por exemplo, quando for adquirir cadeiras ou computadores).
III. CONCLUSÃO:
Até os dias atuais, apesar do nosso conteúdo normativo expressar certa mudança de comportamento, ainda se verificam resquícios de uma tentativa de desmonte e de desmoralização destas empresas estatais, principalmente das que atuam como empresarias, posto que para os grandes setores econômicos privados estas estatais são verdadeiras “barreiras” para o seu desenvolvimento econômico.
Insurgisse este artigo para a busca da revalorização destas empresas estatais, tendo por mote principal o respeito às normas de direito público, posto que estas entidades foram idealizadas para auxiliarem o Estado na consecução de suas atribuições.
Nesse sentido, a visão publicista que aponta na doutrina, de bandeira em punho, é fortemente carreada pelo doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello. As suas opiniões, as quais aderimos, são, em verdade, uma luta contra o desmantelamento e privatização da Administração Pública. Realça-se, então, a visão publicista de tais empresas estatais, muito presente em seu discurso jurídico-literário.
Por tais motivos, fazendo escola, a visão publicista deste presente artigo tem como fundamento a observância estrita das normas de direito público às empresas estatais, posto tais normas buscam interesses transcendentes aos interesses particulares, a partir da verificação e do respeito da cidadania.
A bem da verdade, este entendimento, mais condizente com o respeito ao cidadão e com a moral administrativa, vem ganhando espaço, principalmente pela via normativa. A própria Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988, traz em seu bojo varias limitações próprias para estas entidades da Administração indireta, que foram exaustivamente analisados quando da análise das espécies das empresas estatais. E, também, graças a vozes que se levantam para bradar e marcar posição juspublicista do direito administrativo brasileiro (gerando contraponto ao “direito administrativo agencificado” estadunidense.
É fato ainda que esta revalorização perpassa não só por questões jurídicas, mas, sobretudo, por decisões políticas. De certo modo, percebe-se uma certa mudança de orientação política, posto que o processo de privatização (um dos principais vetores de desmonte das estatais) mostra-se paralisado.
O que se deve buscar é uma mudança mais profunda, ou seja, uma mudança conceitual e paradigmática visando a proteção do verdadeiro detentor do patrimônio e dos recursos públicos, quem seja: o cidadão. Não por acaso os pilares do regime jurídico-administrativo são: os princípios da indisponibilidade, pela Administração, do interesse público e da Supremacia do interesse público sobre o interesse privado.
IV. REFERÊNCIAS
DIAS, Maria Tereza Fonseca. Direito administrativo pós-moderno: novos paradigmas do direito administrativo a partir do estudo da relação entre o Estado e a sociedade. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19ª edição. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 13ª edição. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 26ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009.
NÓBREGA, Marcos. Curso de direito administrativo. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004.
[1] Dias, Maria Tereza Fonseca. Direito administrativo pós-moderno: novos paradigmas do direito administrativo a partir do estudo da relação entre o Estado e a sociedade. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p 189.
[2] Medauar, Odete. Direito Administrativo Moderno. 13ª edição. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 89.
[3] Mello, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 26ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 193.
[4] Ibid, pp. 186, 190 e 191.
[5] Nóbrega, Marcos. Curso de direito administrativo. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004, p. 32
[6] Op. Cit, p. 194.
[7] Op. Cit., p. 55
[8] Op. Cit., p. 198, 199.
[9] Op. Cit, p. 787
[10] Op. Cit, p. 200.
[11] Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19ª edição. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 829.
Procurador do Município de João Pessoa/PB, Procurador Chefe da Procuradoria Patrimonial de João Pessoa, Graduado pela Universidade Católica de Pernambuco (2010), Pós-graduado em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Damásio de Jesus SP (2013), Ex-Procurador do Município de Petrolina/PE (2012/2013) Membro do Conselho Fiscal da Associação Nacional dos Procuradores Municipais (ANPM), Vice-Presidente da Associação dos Procuradores do Município de João Pessoa (APJP), Aluno Especial da Disciplina Arranjos Institucionais e Projetos do Mestrado em Desenvolvimento Urbano (MDU/UFPE) (2014).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Leon Delácio de Oliveira e. Análise juspublicista das empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jul 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40264/analise-juspublicista-das-empresas-estatais-empresas-publicas-e-sociedades-de-economia-mista. Acesso em: 23 dez 2024.
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