A responsabilização pelos danos ambientais não era disciplinada pelo direito positivo até o ano de 1970, quando se iniciou um processo de conscientização ecológica, dando origem às primeiras legislações específicas sobre a matéria, imputando ao agente causador do dano a devida responsabilização.
Seguindo a tendência internacional, o legislador pátrio passou a criar instrumentos eficazes à proteção ao meio ambiente, como exemplo a Lei nº 6.938/81, conhecida como Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, que trouxe as bases para a proteção ao meio ambiente, e a Lei 7.347/85 que disciplina Ação Civil Pública por danos causados ao meio ambiente.
A Lei 6.938/87, em seu art. 14, parágrafo 1º, dispõe sobre a responsabilidade ambiental nos seguintes termos:
Art. 14, §1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor pagador obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.
A matéria concernente à responsabilidade ambiental ganhou contorno constitucional com a inserção de capítulo próprio sobre o meio ambiente na Constituição Federal de 1988 e, sem dúvida, foi o marco definidor da tutela ambiental no ordenamento jurídico brasileiro.
O art. 225, em seu parágrafo 3º, determina que:
Art. 225, §3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar o dano.
Diante do dispositivo constitucional transcrito, conclui-se, com facilidade, que a responsabilidade por danos ambientais é bastante ampla, não sendo imputada apenas às pessoas físicas, mas também às pessoas jurídicas, as maiores causadoras de grandes danos ambientais.
Ainda em relação ao dispositivo constitucional mencionado, deve-se ressaltar que o agente causador do dano ambiental deverá ser responsabilizado nas esferas administrativa, civil e criminal.
A responsabilidade administrativa resulta de infração a normas de direito administrativo, sujeitando o infrator a sanções, tais como advertência, multa simples e interdição de atividades.
Essa responsabilidade decorre do poder de polícia, que é inerente a todas as esferas da federação. Através desse poder, a administração impõe condutas aos administrados que exerçam atividades ou detenham bens que afetem ou possam afetar a coletividade.
A responsabilização criminal, por sua vez, resulta do cometimento de crime ou contravenção, ficando o infrator sujeito a sanções penais, tais como a perda da liberdade ou a pena pecuniária.
Os crimes contra o meio ambiente, ou crimes ecológicos, só existem na forma definida em lei. A constituição Federal em seu art. 225, parágrafo 3º, acima transcrito, estabelece que as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão infratores a sanções penais. A Lei 9.605/98, o mais importante diploma legal nessa matéria, dispôs sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
A responsabilidade civil por dano ao meio ambiente impõe ao infrator a obrigação de ressarcir o prejuízo causado por sua conduta ou atividade.
Para José Rubens Morato Leite[1] ”esta tríplice responsabilização deve ser articulada conjunta, coerente e sistematicamente, em verdadeiro sistema múltiplo de imputação ao degradador ambiental”.
No prisma da responsabilidade civil por dano ambiental, redação do dispositivo constitucional não traz explícita a responsabilidade objetiva, como o faz o art. 14, parágrafo 1º da Lei 6.938/81, mas inquestionavelmente a manteve, em virtude do fato de ter recepcionado a mencionada Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, já que não há nenhuma incompatibilidade entre ela e a Lei Fundamental.
O direito ambiental, em razão de suas particularidades, não se enquadra nas regras clássicas da responsabilidade aquiliana, em que se faz necessário à comprovação da culpa para que haja a imputação do dano ao agente causador para a consequente reparação.
A responsabilidade por danos ao meio ambiente, no ordenamento jurídico pátrio, é objetiva e, para sua caracterização, é necessária apenas a comprovação da atividade do autor e do nexo causal entre a conduta, independente de sua licitude, e o dano.
Desse modo, pode-se concluir que existindo qualquer ato causador de um dano ambiental, o mesmo deverá ser reparado por seu agente.
A doutrina, aqui expendida, considera bastante para configuração da responsabilidade, a comprovação da existência do dano vinculado a uma conduta do agente. Não se admite nenhuma das excludentes de responsabilidade, como o caso fortuito, força maior, ação de terceiro ou culpa concorrente da vítima.
A teoria da responsabilidade objetiva para os danos ambientais foi adotada originariamente no Brasil pela Lei nº 6.453/77, que trata da responsabilidade por danos nucleares. Depois, o Brasil celebrou a Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil em Danos causados por Poluição a Óleo, em 1969, promulgada pelo Decreto 79.347/77. O próximo passo foi a Lei 6938/81, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente.
Portanto, o fundamento da teoria objetiva reside na ideia de que o dano ambiental resolve-se em um problema de causalidade, não se indagando a imputabilidade de agente nem a antijuridicidade do fato danoso, apenas se verifica se ocorreu o evento danoso para que o autor seja obrigado a repará-lo.
A reparabilidade integral do dano ambiental é uma decorrência da responsabilidade objetiva e deve ser inteiramente aplicada quando se pretende a reconstituição do meio ambiente lesado.
Para José de Sousa Cunhal Sendim[2], “o que se exige é restitutio in integrum do bem jurídico ambiental que foi lesado, através da reabilitação ou da restauração dos componentes ambientais, não a reposição material de todas as condições físico-químico-biológicas do ambiente anteriores à lesão”.
Não obstante a imensa dificuldade de apurar o ressarcimento do dano ambiental, pelo fato de sua difícil reposição e pelas barreiras na avaliação econômica, a reparação do meio ambiente deve ser a mais completa possível de acordo com a melhor técnica desenvolvida pela ciência.
A reparabilidade integral do dano ambiental vem expressa na Constituição Federal de 1988, art. 225, parágrafo 3,º que prevê que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
O art 14, parágrafo1º, da Lei 6.938, de 1981 também não restringe a extensão da restauração, quando prescreve que sem obstar a aplicação das penalidades previstas, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.
Já o art. 13 da Lei nº 7.347/85, rege que os recursos obtidos pela indenização pecuniária oriunda do dano ambiental serão destinados à reconstituição dos bens lesados, nos seguintes termos:
“Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados”.
Desses dois dispositivos se extrai que a responsabilidade civil pelos danos ambientais deve ser de reparabilidade integral, levando em consideração o risco decorrente da conduta do agente. E, ainda, que deve ser imputado ao degradador uma indenização suficiente para efetiva reconstituição do bem lesado.
Não se pode olvidar que os indivíduos que exercem atividades econômicas de risco devem responder integralmente frente à sociedade pelos danos provocados ao meio ambiente, estabelecendo, de acordo com o art. 170, VI, da Constituição pátria, tratamento diferenciado, conforme o impacto ambiental produzido pelos produtos e serviços e seus processos de elaboração e prestação, visando sempre a defesa do meio ambiente.
A defesa do meio ambiente também enseja, conforme se desprende da legislação, sanções no âmbito penal e administrativo.
Quanto à esfera administrativa, a Lei 9.605/98, conhecida como Lei dos Crimes Ambientais, dedicou um capítulo específico à matéria das infrações administrativas, consubstanciando nas disposições dos arts. 70 a 76. São previstas várias sanções, tais como advertência, multa simples, multa diária, apreensão de animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, destruição ou inutilização dos produtos, demolição da obra, suspensão da venda, fabricação do produto, dentre outras.
As multas no âmbito das infrações administrativas ambientais, segundo o art. 75 da Lei 9.605/98, são limitadas segundo um valor máximo e um mínimo, da seguinte forma:
Art.75. O valor da multa de que trata esse capítulo será fixado no regulamento desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecido na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 (cinqüenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais).
Já na esfera penal, as penas podem ser restritivas de direitos, restritiva de liberdade e multa. As penas privativas de liberdade podem ser de reclusão, detenção e prisão simples. Assinala-se que há uma preferência na Lei de Crimes Ambientais pelas penas restritivas de direitos e penas pecuniárias, estas últimas serão calculadas segundo os critérios do Código Penal.
Cabe ressaltar que se o julgador verificar que o valor obtido se revela ineficaz, ainda que aplicado no valor máximo, poderá, de acordo com o art. 18 do Código Penal, aumentar até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.
Segundo Maria de Fátima de Araújo Ferreira[3] “os argumentos relativos à impossibilidade de incidirem sobre o mesmo fato ambiental três consequências pecuniárias, instituindo desta forma ter in idem não devem ser levados em consideração, pois além de serem argumentos contra o meio ambiente e pró poluidores, contrariam expressamente a determinação constitucional.”
Resta evidenciado que a punição dos agentes lesionadores do meio ambiente deve ser a mais ampla possível, abrangendo as esferas penal, administrativa e civil, devendo a indenização ser correspondente ao valor da lesão sofrida. Podendo, portanto, o agente causador do dano sofrer três consequências pecuniárias em razão de sua conduta.
Deve se ressaltar por fim, que em relação à responsabilidade civil pelos danos causados ao meio ambiente, verifica-se o dever de se priorizar sempre a restauração ou reconstrução do bem lesado e apenas, subsidiariamente, é que se deve convertê-lo em uma prestação pecuniária que deve ser suficiente para a efetiva recuperação do bem ambiental lesado.
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[1] MORATO LEITE, José Rubens, “Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial” 2ª Ed, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2003, p. 63
[2] SEDIM, José Moura Cunhal, “Responsabilidade civil por danos ecológicos: da reparação do dano através da restauração natural”, Coimbra Editora, Coimbra, 1998, pg 187.
[3] FERREIRA, Maria de Fátima de Araújo. Dano Ambiental: dificuldades na determinação da responsabilidade e valoração. Recife, 200. Dissertação de Mestrado em Direito – Faculdade de Direito do Recife. Universidade Federal de Pernambuco, p. 120.
Procuradora Federal desde 2008, atualmente em exercício na Procuradoria Regional Federal da 5 ? Região (Recife). Atuou na Procuradoria Federal Especializada do INSS em Santarém-PA (2008 - 2012). Graduada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Pós graduanda em direito previdenciário na Faculdade Anhanguera<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALBUQUERQUE, Fernanda Cavalcanti de. A responsabilidade ambiental - reparabilidade integral do dano ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 ago 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40602/a-responsabilidade-ambiental-reparabilidade-integral-do-dano-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
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