Resumo: O estudo analisa os conceitos, os agentes, os tipos do ilícito, a forma de agir, o dolo e a culpa de todos aqueles que são passíveis de cometer atos de improbidade administrativa. Ademais, lista quem são as pessoas jurídicas passíveis de sofrer atos de improbidade. Ainda, analisa a jurisprudência dos Tribunais Superiores, sobre a matéria e, por fim, quem são as pessoas que podem requerer a punição do ato de improbidade.
Abstract: The study examines the concepts, agents, types of illicit, how to act, deceit and guilt of those who are likely to commit acts of administrative misconduct, as well as list who are the subject of legal persons suffer acts of misconduct, analyzes the jurisprudence of the Superior Courts, on the matter and, finally, who are the people that may require the punishment of the act of misconduct.
Palavras-chave: Direito público. Atos de improbidade administrativa. Lei n. 8.429/92. Agentes públicos.
Introdução
A Administração Pública não exerce suas atividades e direitos com a mesma autonomia e liberdade com que os particulares os exercem.
Enquanto a atuação dos particulares funda-se no princípio da autonomia da vontade, a atuação do Poder Público é orientada por princípios como o da legalidade, da supremacia do interesse público sobre o privado e da indisponibilidade dos bens e direitos, entre outros.
Numa primeira aproximação, improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano), revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas, à custa do erário.
Assim, também, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo tráfico de influência nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos.
No entanto, vale observar, em primeiro lugar, que vários autores administrativistas ou constitucionalistas, para definirem o conceito de improbidade, iniciam estabelecendo o que seria probidade e sua relação com a moralidade, traçando suas diferenças e, não raro, qual seria o gênero, como é o caso de José Afonso da Silva, que acredita que a probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa.
Desse modo, convém relembrar a origem da palavra probidade. A mencionada palavra possui seu nascimento no latim probus, que exprime a ideia daquilo que brota bem, que possui boa qualidade.
Emerson Garcia afirma que se teve uma permanente utilização de tal vocábulo de forma figurada, embora em harmonia com suas raízes etimológicas e, assim, probidade significa retidão de conduta, honradez, lealdade, integridade, virtude e honestidade.
Dos conceitos da Lei n. 8.429/92:
Improbidade administrativa - é o ato ilegal ou contrário aos princípios básicos da Administração Pública, cometido por agentes públicos durante o exercício de função pública ou decorrente desta. Segundo Calil Simão, o ato de improbidade qualificado como administrativo (ato de improbidade administrativa), é aquele impregnado de desonestidade e deslealdade.
Sujeito ativo – o agente público, ou seja, aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades que a lei menciona.
As entidades são a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território.
Incluem-se, também, no conceito de entidades a empresa incorporada ao patrimônio público, bem como aquelas para cuja criação ou custeio o erário participe com mais de 50% do patrimônio ou da receita anual.
Caso a participação do erário seja inferior a 50%, a sanção patrimonial limitar-se-á à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.
Agentes do ato ilícito:
Os atos ilícitos podem ser praticados por qualquer agente público, servidor ou não. Assim, busca a lei punir não apenas o corrupto, como o corruptor.
Do texto da lei, é possível compreender pela responsabilização de qualquer pessoa, ainda que não seja considerada agente público, de forma direta ou indireta (pessoas físicas e jurídicas).
Ao ressaltar que agente público é todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função, a lei que regula a probidade na administração tipifica que não apenas servidores públicos cometem improbidade administrativa, mas qualquer pessoa que exerça função pública, mesmo que de forma temporária, e mesmo que a prestação desse serviço não envolva remuneração.
Tomemos como exemplo, o mesário que trabalha nas eleições e o jurado, os mesmos, apesar de não serem agentes públicos, em sentido estrito, estão sujeitos à Lei de Improbidade.
É importante ressaltar que o Supremo Tribunal Federal já decidiu que a Lei de Improbidade Administrativa, em regra, não se aplica aos agentes políticos.
Uma decisão exemplificativa desse pensamento, foi a decisão que surgiu de uma reclamação ajuizada pela União contra decisão da Justiça Federal que condenou o então Ministro de da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Mota Sardemberg, às penas previstas na Lei de Improbidade Administrativa. Sardemberg foi condenado a ressarcir ao erário os prejuízos causados e à suspensão dos direitos políticos por oito anos, em razão do uso indevido de jato da Força Aérea Brasileira.
Na ocasião, o STF afirmou que nesse caso a Lei n° 8.429/1992 não seria aplicável, pois a Lei n° 1.079/1950 (Lei dos Crimes de Responsabilidade) trata das infrações cometidas pelos agentes políticos, e, portanto, é mais específica. Aquela Corte Suprema entendia que estão sujeitos à Lei n° 1.079/1950 os seguintes agentes políticos: Presidente da República, Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Procurador-Geral da República, Governadores de Estado e Secretários Estaduais. Desse modo, a tais autoridades não seria aplicável a Lei de Improbidade.
Entretanto, sua jurisprudência mais atual, aceita perfeitamente a aplicação da Lei n. 8.429/92 aos agentes políticos.
Assim, também, o egrégio STJ tem jurisprudência pacífica no sentido de aplicação da Lei de Improbidade aos agentes políticos. Vejamos julgado, abaixo, bem representativo desse entendimento:
Processo |
AgRg no AREsp 135384 / RS |
Relator(a) |
Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO (1133) |
Órgão Julgador |
T1 - PRIMEIRA TURMA |
Data do Julgamento |
03/04/2014 |
Data da Publicação/Fonte |
DJe 15/04/2014 |
Ementa |
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (I) OS AGENTES POLÍTICOS PODEM SER PROCESSADOS POR SEUS ATOS PELA LEI 8.429/92. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA CORTE ESPECIAL/STJ (RCL 2.790/SC, REL. MIN. TEORIO ALBINO ZAVASCKI, DJE 4.3.2010). (II) LICITUDE DA PROVA OBTIDA MEDIANTE GRAVAÇÃO CLANDESTINA (CAPTAÇÃO DA CONVERSA POR UM DOS INTERLOCUTORES, SEM O CONHECIMENTO DO OUTRO), DESDE QUE QUE SEU CONTEÚDO NÃO SEJA SECRETO OU INEXISTA OBRIGAÇÃO LEGAL DE GUARDAR SIGILO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A Corte Especial, no julgamento da RCL 2.790/SC, de relatoria do eminente Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, já orientou caber a submissão dos Agentes Políticos à Lei de Improbidade Administrativa, e a jurisprudência desta Corte e do STF vem se mantendo majoritária nesse sentido. [...]Precedente: RHC 19.136/MG, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ 14.05.2007, p. 332. 3. Agravo Regimental desprovido. |
Dos atos de improbidade e suas características:
Os atos de improbidade administrativa encontram-se descritos em três seções que compõem o capitulo II da Lei n° 8.429/1992, sendo que estão aglutinados em três grupos distintos, conforme o ato importe em enriquecimento ilícito (art. 9º), cause prejuízo ao erário (art.10) ou tão somente atente contra princípios da administração pública (art. 11).
A doutrinadora Maria Sylvia Zanella di Pietro nos ensina que, em matéria administrativa, sempre que se verificar que o comportamento da Administração ou do administrado, que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofenda a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, além da ideia comum de honestidade, haverá ofensa ao princípio da moralidade administrativa.
Temos ainda que, conforme disposto no art. 4°, da lei em comento, que os agentes públicos, de qualquer nível ou hierarquia, são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.
Percebe-se que o princípio da eficiência não foi contemplado pelo dispositivo, apesar de constar no art. 37 da Constituição. Pois bem, isso acontece porque esse princípio foi incluído na Constituição por meio da Emenda Constitucional n° 19/1998. A Lei n. 8.429/1992 copiou o texto constitucional da época.
Esses, obviamente, não são os únicos princípios que os agentes públicos precisam observar obrigatoriamente. Maria Sylvia Zanella di Pietro ensina que “qualquer violação aos princípios da legalidade, da razoabilidade, da moralidade, do interesse público, da eficiência, da motivação, da publicidade, da impessoalidade e de qualquer outro imposto à Administração Pública pode constituir ato de improbidade administrativa.”
O art. 5° ressalta que, ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.
É imprescindível para configurar-se o dever do agente público e de terceiro de indenizar o dano patrimonial ocasionado ao erário, em decorrência de ato de improbidade administrativa, que tenham agido com dolo ou culpa (imprudência, negligência ou imperícia).
Não é devido o ressarcimento de dano causado ao erário quando este tenha resultado de ato administrativo lícito, ou ainda de ato ilícito praticado por agente público sem dolo ou culpa.
Apesar de algumas das condutas consideradas como atos de improbidade administrativa ter correspondência com tipos penais, como crimes praticados por funcionários públicos contra a administração pública (arts. 312 a 326 do CP), de responsabilidade dos prefeitos (art. 1º do Decreto-lei 201/67) etc., os atos de improbidade administrativa não são considerados ilícitos criminais, tendo inquestionável natureza civil.
Da apuração dos atos de improbidade:
Ademais, é importante saber que os atos de improbidade administrativa podem ser apurados na esfera administrativa ou na esfera judicial.
A ação de improbidade administrativa pode ser proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada.
Qualquer pessoa poderá representar, denunciando à autoridade competente acerca de ato de improbidade praticado por agente público. Essa previsão legal decorre do direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder, assegurado a todos pela Constituição de 1988, independentemente do pagamento de taxas.
Essa representação deverá conter a qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de que se tenha conhecimento. Se essas formalidades não forem observadas, a autoridade administrativa rejeitará a representação.
Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma prevista nos arts. 148 a 182 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.
Quanto aos servidores militares, estes se submetem a uma série de normas disciplinares específicas, respondendo inclusive pelos crimes previstos no Código Penal Militar. Além disso, eles não se submetem à Lei nº 8.112/1990, mas sim à Lei nº 6.880/1980.
Por outro lado, o ato de improbidade não depende necessariamente da efetiva existência de dano ao patrimônio público. É verdade que a ideia da ocorrência de dano está intrinsecamente ligada à nossa percepção acerca do ato de improbidade, mas perceba que nem todas as condutas descritas na lei importam em dano pecuniário.
Os órgãos de controle interno e os tribunais de contas têm competência para apreciar as contas dos gestores públicos. A aprovação dessas contas não impede que seja proposta a ação civil e nem o procedimento administrativo para apuração da ocorrência de ato de improbidade.
CONCLUSÃO
A Constituição Federal de 1988 determina que a Administração Pública deve obedecer, dentre outros, ao princípio da moralidade. De acordo com ele, a conduta dos agentes públicos deve obedecer não só à lei, mas também às regras de conduta que disciplinam seu comportamento de acordo com a ética e a justiça. O ato legal, mas imoral, é ilegítimo e pode ser anulado pelo Poder Judiciário ou pela Administração Pública. O cidadão pode requerer a anulação do ato imoral ao Judiciário por meio da ação popular.
A Lei n° 8.429/1992 é aplicável tanto ao agente público quanto particular que, mesmo sem ser agente público, induz ou concorre para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficia.
Apesar de algumas das condutas consideradas atos de improbidade administrativa são ilícitos de natureza civil.
Bibliografia:
LEI N° 8.429/92 (LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA) – site do Planalto / www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm/ : http://jus.com.br/artigos/4008/improbidade-administrativa#ixzz3AwKiUm00
(GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 6. ed. Lumen Júris, 2011. p. 125, 279.)
SIMÃO, Calil. Improbidade Administrativa - Teoria e Prática. Leme: J.H. Mizuno, p. 82 e ss.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, Editora Atlas, 17ª edição, 2004.
ALVARENGA, Aristides Junqueira. Ato do improbidade administrativa: crime de responsabilidade. publicado no Caderno Direito & Justiça do Jornal Correio Braziliense do dia 30 de setembro de 2002.
JESUS , Damásio E. de, Revista Justitia nº 50, São Paulo, janeiro-março de 1988.
Procuradora Federal/AGU. Especialista em Direito Público - Universidade de Brasília - UNB.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Cleide Siqueira. Comentários à Lei n. 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 ago 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40715/comentarios-a-lei-n-8-429-92-lei-de-improbidade-administrativa. Acesso em: 23 dez 2024.
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