RESUMO: Este artigo aborda aspectos do direito civil acerca dos limites das garantias nos contratos envolvendo o direito de personalidade. Será dada ênfase à questão da inaplicabilidade e inadmissibilidade quanto ao fato da celebração de contratos que tenham como garantias o corpo humano e, por conseqüência, a dignidade da pessoa humana. As discussões serão feitas a partir de um resumo sintético relativo à evolução dos contratos, objetivando delimitar o tema a ser tratado. No presente artigo será realizada uma análise das normas e princípios que fundamentam a teoria geral dos contratos de modo a servir de base às argumentações apresentadas, quanto à inviabilidade do direito de personalidade ser utilizado como garantia na celebração de contratos. Demonstrar-se-á, no presente trabalho, como o direito a personalidade vinculado ao princípio da dignidade da pessoa humana se ramifica nas relações contratuais gerando efeitos na consecução dos mesmos.
PALAVRAS-CHAVE: contrato; direito de personalidade; direito civil; garantia.
1. INTRODUÇÃO
Este artigo aborda aspectos do Direito Civil Brasileiro numa síntese da evolução das relações contratuais gerais e sua vinculação ao direito de personalidade. Serão estudados os desdobramentos dos contratos celebrados entre pessoas e a aferição jurídica acerca da validade ou não dos acordos realizados, suas condições e, principalmente, seus limites.
A evolução das relações contratuais dentro das sociedades será discutida, a fim de se chegar a uma conclusão sobre a norma jurídica atinente e o sentimento das pessoas, a moral e a ética relativos ao tema abordado.
Discutir-se-ão os motivos pelos quais o direito de personalidade, evidenciado pelo princípio da dignidade da pessoa humana, não podem ser objeto de contratos.
Serão discutidos os principais os aspectos relacionados ao tema apresentado sob o prisma do Código Civil Brasileiro, bem como à luz de modernas teorias e doutrinas do direito civil, a fim de se contemplar uma maior abrangência dos assuntos tratados.
Assim, será possível oferecer um juízo de valor acerca da visão de nulidade quanto a celebração de contratos que envolvam o direito de personalidade.
2. BREVE SÍNTESE DA EVOLUÇÃO DOS CONTRATOS
O Direito originou-se das relações que se fizeram necessárias dentro da evolução do homem e consequentemente das sociedades. Houve e ainda há, nas relações sociais, a necessidade de regras e normas que ofereçam garantias às pessoas para que estas relações possam ser moralmente e juridicamente justas.
O Contrato, mais especificamente, surgiu para assegurar garantia no cumprimento de uma obrigação. Na antiga Roma existiam algumas referencias aos contratos, entretanto diferiam em muito do que se pratica na atualidade, à medida que, no império romano os contratos se traduziam em fontes de obrigações.
Estudiosos na idade média, influenciados pela escolástica defendiam a idéia de que a justiça existia sempre como finalidade dos contratos. Este pensamento coloca em evidencia a boa – fé contratual, por exemplo. Estas idéias foram sendo questionadas com o passar do tempo e com a evolução no entendimento acerca dos contratos. A justiça dos contratos, neste contexto, ficaria adstrita e subordinada a uma subjetividade com relação à transparência dos contratos por falta de um controle dos preços justos das coisas, bem como por conta do monopólio que era feito por alguns grupos economicamente privilegiados, por exemplo.
Os Jusnaturalistas foram extremamente importantes na história dos contratos, uma vez que pregavam a vontade das partes como fonte de obrigação e não contrato. Assim, esboçando uma teoria das vontades, esta corrente de pensamento defendia que aqueles pactos que não tem sinalagma não podem trazer no seu bojo nenhuma obrigação.
No século XIX a teoria contratual individualista irá ter um aprimoramento alinhado com o liberalismo do Código Civil Francês e a escola das Pandectas Alemãs, em que sobressai vitoriosa a teoria dos contratos romano-germânica.
Neste sentido, o início do século XX, configura-se naquilo que se evidencia nos contratos e nas vontades individuais dos contratantes, diferindo das relações estabelecidas pela vontade das tradições dos contratos. Neste momento, havia na realização dos contratos, por exemplo, os princípios da lex inter parts e pacta sunt servanda.
Influenciados por idéias de cânones, tais como Santo Agostinho, as revisões dos contratos tiveram ênfase e foram aplicadas na pratica, diante da imutabilidade tradicional dos contratos.
Na atualidade, tem-se a teoria da imprevisão que impele uma relativização acerca dos contratos celebrados, uma vez que as predisposições dos contratantes não dependem única e exclusivamente deles, por exemplo, mas de um conjunto de possibilidades, por exemplo, as quais circundam os contratos e podem servir como base e apoio na consecução dos mesmos.
3. ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS NORTEADORES DO CONTRATO
A teoria dos contratos no direito brasileiro estabelece como princípios fundamentais a autonomia da vontade, a função social do contrato (art. 421 do CCB), do consensualismo, da obrigatoriedade da convenção, da relatividade dos efeitos do contrato e boa fé objetiva (art. 422 do CCB). Os princípios exercem uma importância muito grande dentro do direito, à medida que, oferecem caminhos viáveis de solução dos conflitos, por exemplo, por meio da análise direta do caso concreto e sua adequação com forma pacificadora. A este respeito Álvaro Villaça Azevedo preceitua que:
Os princípios gerais de direito apresentam-se com força normativa nos sistemas jurídicos contemporâneos, principalmente porque encontram sua força no próprio direito natural. Já Marco Tullio Cícero dizia que a razão ensina e explica o que deve ser feito e o que deve ser evitado (ratio docet explanat quid faciend fungiendumve sit.). Por isso, esses princípios não podem ser olvidados, nas contratações, quer no âmbito nacional, quer no internacional, sob pena de desequilibrarem-se as relações jurídicas, com o enriquecimento de um e o empobrecimento do outro contratante. (2009, p. 11).
Os contratos exercem, desse modo, uma importância crucial nas relações sociais, pois garante que estas mesmas relações possam ser concretizadas na pratica e, em caso contrário, ela ainda oferece meios jurídicos, se for o caso, para que se cumpra a obrigação pactuada. O contrato visto como acordo de vontades deve se ater a convergência das pessoas quanto ao objeto e todos os requisitos atinentes ao contrato, pelo qual as pessoas devem se vincular, por meio de suas anuências naquilo que se pactua. Para Maria Helena Diniz:
É indispensável o encontro de vontades que tendem ao mesmo fim. É necessário que as vontades de duas ou mais pessoas, isoladas, sejam convergentes e se encontrem para, com uma conciliação de interesses, poder atingir o objetivo a que se propõem. É preciso ressaltar que não é a vontade como expressão do querer interno, porém a já manifestada que interessa à ordem jurídica, como elemento essencial à constituição do contrato válido, idôneo a produzir efeitos jurídicos. Enquanto não se exteriorizar a vontade, não terá relevância no mundo do direito. (2007, p. 37).
O acordo de vontades surge assim como item prioritário na consecução dos contratos. É necessário ponderar que todo este processo deve obedecer rigorosamente os princípios acima mencionados, sob pena de nulidade ou anulação do contrato.
4. INVIABILIDADE DO DIREITO DE PERSONALIDADE COMO GARANTIA CONTRATUAL
O direito de personalidade é indisponível, e isto significa que as pessoas não podem abrir mão deles por quaisquer motivos. A Constituição Federal do Brasil no artigo 1º, III, trata acerca da questão da dignidade da pessoa humana, como preceito fundamental, essência do ordenamento jurídico nacional:
Art. 1º: A república Federativa do Brasil formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal. Constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoas humana. (VAde Mecum 2010, p. 23).
Tem-se assim, o principio da dignidade das pessoas humana como norteador das relações contratuais, à medida que, a exigência deste princípio, no alcance de sua amplitude, restringe e limita os contratos, por meio de sua imposição normativa e, inclusive, de seu cunho moral e ético. A dignidade da pessoa humana relaciona-se com a questão da possibilidade de um contrato envolvendo o direito de personalidade, sendo esta relação visa impedir que o ser humano possa servir como garantia em qualquer tipo de contrato.
O Código Civil Brasileiro no seu art. 13 declara: “Art. 13: Salvo por exigência médica, é defeso o ato de dispor do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes (Vade Mecum 2010, p. 141)”.
Assim sendo, a fim de se obter transparência, atenção à moral, à ética e aos bons costumes, a garantia nos contratos deve obedecer aos limites exigidos pela norma e pelos princípios fundamentais do homem.
5. CONCLUSÃO
Do quanto exposto acima e analisando a obra “O Mercador de Veneza” de William Shakespeare pode-se concluir que um contrato que envolva como garantia o direito de personalidade, como foi o caso do contrato celebrado entre Shylock e Antonio, tornar-se-á nulo de pleno direito, haja vista que, no caso da obra, o contrato não se norteia e não se estrutura por meio do principio da função social do contrato, nem pela boa-fé objetiva e, assim como na obra e na discussão aqui trazida, pelo fato do contrato ir de encontro ao direito de personalidade que também é um direito indisponível.
Desse modo, a liberdade das pessoas na celebração de contratos deve obedecer aos limites impostos pelos princípios e normas aplicadas pelo direito. Isto significa que a autonomia da vontade será regulada e limitada pelo ordenamento jurídico.
REFERÊNCIAS:
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria Geral dos Contratos Típicos e Atípicos: curso de direito civil. 3 ed - São Paulo: Atlas, 2009.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 3º volume: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 23 ed - São Paulo: Atlas, 2009.
SHAKESPEARE, William. O Mercador de Veneza. Edição Ridendo Castigat Mores / Fonte Digital, versão para e-books. São Paulo, 2002.
VADE MECUM / Acadêmico de Direito / organização Anne Joyce Angher. 9 ed. – São Paulo: Ridel, 2010.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINTO, Rinaldo Sergio Guimaraes. Limites das garantias nos contratos envolvendo o direito de personalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 set 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40978/limites-das-garantias-nos-contratos-envolvendo-o-direito-de-personalidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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