RESUMO: Este trabalho pretende demonstrar a forma pela qual os governos têm-se orientado com relação à aplicação dos princípios constitucionais. Será feita uma ampla análise, à luz de modernos pensadores, acerca dos direitos sociais previstos na Constituição Federal visando definir e identificar quais critérios o Estado adota na consecução de um país economicamente e socialmente estável. As questões relacionadas à escassez e a pobreza serão o enfocadas com o objetivo de demonstrar de que forma estas idéias são utilizadas pelos governos e grandes empresários, a fim de se perpetuarem no poder. Realizar-se-á uma análise acerca dos direitos sociais, bem como sobre as relações de ordem econômica no seio social. Os sistemas capitalista e liberal serão explicitados dentro de uma abordagem sintética com o objetivo de esclarecer os efeitos práticos das causas geradoras das desigualdades sociais. Serão apontadas nesta artigo algumas possíveis soluções aos problemas apresentados fundamentadas nos textos constitucionais e no Direito.
PALAVRAS-CHAVE: constituição, direito, economia, empresarial, social, sociedade.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo busca discutir acerca dos aspectos sociais e econômicos embutidos na Constituição Federal do Brasil, numa análise sobre o discurso social contraditório adotado pelos governos pós Constituição de 1988, em que no Brasil há uma priorização muito maior dos aspectos empresariais dentro da sociedade como um todo, em detrimento dos aspectos sociais.
Neste sentido, será feito um resumo sintético com relação a alguns processos históricos atinentes à política do país com vistas a entender os processos pelos quais os governos têm agido com relação às questões sociais e econômicas, principalmente.
Serão evidenciados os princípios fundantes da Constituição Federal relacionados aos direitos sociais e econômicos, bem como suas inter-relações com o princípio da dignidade da pessoa humana e com as ações governamentais relacionadas.
O problema da escassez, a questão da pobreza e da mais valia e suas relações com os direitos sociais serão debatidos com o objetivo de demonstrar as contradições que na prática permeiam os direitos das pessoas.
Serão estudados os desdobramentos destes processos com as formas capitalistas de produção e poder e o liberalismo econômico, originados pela idéia de lucro e concentração de renda. Discutir-se-ão os motivos geradores das misérias e escassez ao redor do mundo dentro de uma visão constitucional direcionada para os fatos da atualidade.
Confrontar-se-ão os aspectos sociais e econômicos previstos na Constituição Federal, a fim de verificar quais os empecilhos e de que forma os cidadãos e o governo podem agir para construir uma constituição efetivamente social.
Desse modo, será possível apontar caminhos viáveis com vistas a superar a crise social que o Brasil tradicionalmente está inserido. Estes caminhos serão trilhados por meio de uma mobilização social, em que os cidadãos possam exigir os seus direitos e também contribuir para a justiça social.
2. OS PRINCÍPIOS SOCIAIS FUNDANTES DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL, A CRISE SOCIAL E O PROBLEMA DA ESCASSEZ
O Brasil desde a época colonial foi explorado pelas nações européias, tais como Portugal e Inglaterra, os quais, inclusive, para atender a ânsia pelo poder e acúmulo de capital fizeram surgir no seio da sociedade a escravidão.
Desde a sua origem, e tradicionalmente, o país mantém uma péssima distribuição de renda. Com o fim da escravidão mudaram-se apenas os termos usados para definições sociais. Os velhos e maléficos costumes da sociedade brasileira continuaram a imperar na vida das pessoas. A velha divisão senhores e escravos foi modificada pela divisão patrões e empregados. Esta situação gerou bolsões de miséria por toda a nação.
A Constituição Federal de 1988 admite este processo histórico de desagregamento da sociedade brasileira e, em seus textos, mais precisamente no Título I Dos Princípios Fundamentais, art. 3º, I, II, III e IV, observa-se esta relação:
Art. 3º Constitui objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (2008, p. 13).
As elites brasileiras representadas pelas instituições tradicionais do Estado, tais como a igreja, latifundiários, os bancos, empresários, etc., que instituíram no país um regime escravocrata e patronal, os quais trazem reflexos ainda nos dias atuais, controlam com mãos de ferro a vida das pessoas. Estas instituições citadas produziram com suas visões equivocadas e baseadas no lucro e na exploração dos mais “fracos” economicamente uma sociedade de extremas desigualdades, à medida que, concentrou riquezas nas mãos de poucas pessoas e impeliu à maioria da população o peso total do trabalho.
Os direitos sociais dos cidadãos são garantidos pela constituição Federal e, como tais, não podem ficar a mercê de ações programáticas do governo para serem efetivados. Devem sim ser garantidos na prática a todos os cidadãos sem distinção, conforme prevê a Carta Magna. A este respeito observe José Afonso da Silva:
Assim, podemos dizer que os direitos sociais, como dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício da liberdade. (2004, p. 286).
O país sofre de forma permanente uma crise social profunda. O Brasil, há tempos, registra um dos menores índices de desenvolvimento no mundo. A Educação Pública, de forma geral, não consegue oferecer ao cidadão brasileiro uma formação de qualidade que lhes possibilite um desenvolvimento pleno dentro da sociedade.
A pobreza ainda persiste embora tenha sido reduzida por conta de programas sociais. O certo é que se precisa de mais investimentos em educação e saúde neste país. E isto deve vir de forma urgente, o país nem as pessoas não podem e nem devem mais esperar.
A Constituição prevê a promoção do bem de todos, garantindo com isso uma equidade entre os cidadãos, porém o que se observa na prática é o inverso disto. Então é possível concluir que algo de muito grave está acontecendo com a sociedade brasileira.
O que se observa é a resistência das elites em continuar com a tradição de descaso para com o povo. Os velhos costumes e tradições ruins insistem em se manter nos dias atuais renovando-se a cada dia, a fim de eternizarem-se no poder. Nas palavras de Ponce Aníbal:
Sabemos o que significam nas mãos da burguesia “liberdade da criança”, “formação do homem”, “direitos do espírito”. A imagem do novo homem que a burguesia nos prometia é a velha imagem já nossa conhecida: a de uma classe opressora que monopoliza a riqueza e a cultura diante de uma classe oprimida, para a qual só é permitida a superstição religiosa e um saber bem dosado (2009, p. 172).
A República Federativa do Brasil, conforme sua Constituição Federal, promulgada no ano de 1988, traz no seu bojo princípios fundamentais que prevêem a valorização da dignidade da pessoa humana.
Neste sentido o art. 6° da Constituição Brasileira nos fornece claramente em que base esta se sustenta para garantir aos cidadãos direitos sociais. Observe:
Art. 6° São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (2008, p. 23).
Torna-se desnecessário dizer que na prática isto pouco tem ocorrido. E qual seria o motivo disto? O nosso sistema político econômico baseado no liberalismo e capitalismo.
Aqui deve se fazer uma indagação: o que mais importa ao país, a manutenção de ordem econômica sob a égide de uma Constituição Empresarial, que não atende aos anseios da população, mas sim dos empresários, em primeiro plano, ou a garantia dos direitos sociais dos cidadãos? Alexandre de Moraes assim diz:
Desta forma, quando houver conflito entre dois ou mais direitos ou garantias fundamentais, o interprete deve utilizar-se do principio da concordância ou harmonização, de forma a coordenar e combinar os bens jurídicos em conflito, evitando o sacrifício total de uns em relação aos outros, realizando uma redução proporcional do âmbito de alcance de cada qual (contradição dos princípios), sempre em busca do verdadeiro significado da norma e da harmonia do texto constitucional com sua finalidade precípua. Grifos do autor. (2009, p. 33).
Parece que as pessoas devem o tempo estar conectadas a um regime de controle e condicionamento que a impedem de enxergar a realidade, à medida que aceitam serem controladas e subjugadas. Mas isto é feito pelos governantes de forma que as pessoas não saibam que estão sendo controladas, que as suas vontades são definidas pela ordem capitalista e consumista.
Isto provoca uma crise séria. Esta crise é de consciência, pois as pessoas ficam presas a um mundo moldado e fabricado, do qual a grande maioria das pessoas não consegue ver nem identificar suas reais intenções, nem os seus propósitos.
A regra básica do capitalismo é lucrar o máximo e investir o mínimo. Assim, quanto maior for a falta de recursos, a fome, as doenças, mais lucrarão com a escassez os empresários proprietários das comidas, da água e dos medicamentos.
A escassez[1], segundo regras do capitalismo e, diferente da pobreza, pode ser entendida como algo que deverá ser sempre combatido, mas jamais erradicado, pois é a falta de recursos quem fornece argumentos de controle e dominação. A abundância deve ser controlada e nunca permitida, ao mesmo tempo em que se combate a escassez.
3. MODELO ECONÔMICO ADOTADO PELOS GOVERNOS PÓS CONSTITUIÇÃO DE 1988
Os governos pós Constituição de 1988 tiveram como orientação uma política voltada à valorização empresarial, em que se prioriza o mercado, as vendas, o consumo, em detrimento do social, das pessoas.
A estabilidade da moeda buscou uma estabilidade econômica. E a estabilidade social como fica? A esta pergunta o governo sempre diz que se trata de uma questão programática a ser cumprida em longo prazo. Porém, as pessoas não podem esperar tanto para ver seus direitos efetivados.
A valorização das políticas sociais pelo governo implica mudança na política econômica. Esta deve atender aos interesses de toda a população sobre todos os outros interesses. Isto significa que as modificações econômicas devem estar alinhadas com os princípios fundantes da Constituição, os quais preconizam a consecução de um país economicamente livre de influências externas nocivas e que seja capaz de oferecer aos seus cidadãos uma maior liberdade nas suas atividades e relações sociais.
A economia de um país deve estar alinhada com os pressupostos constitucionais e, sobretudo, fazer com que haja equilíbrio social com distribuição equânime da renda.
A este respeito observe texto constitucional:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social de propriedade;
IV – livre concorrência;
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos seus produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país. (2008, p. 47/48).
Ao assegurar a todos existência digna o texto constitucional quer dizer que os governos devem garantir a estabilidade econômica com o equilíbrio social, onde todos os cidadãos possam ter acesso à saúde, à educação, ao lazer, de forma que tenha realmente uma vida digna que lhe ofereça condições de igualdade com relação aos demais cidadãos.
4. CONCLUSÃO
De tudo quando exposto, vislumbra-se na prática que para atingir a estabilidade social é preciso que haja uma distribuição de renda em que todos possam usufruir das riquezas do Estado. É preciso que o Estado ofereça às pessoas condições de igualdade para o acesso à saúde, à educação, à segurança pública, enfim para uma vida digna de qualidade. O que não se vê na realidade.
O homem com toda evolução da sociedade ainda continua sendo bruto, competitivo, egoísta, acumulador, agressivo e, considerando que as sociedades nos dias atuais são, em geral, eivadas de crises de toda espécie, conclui-se que o homem atual é o mesmo do passado e construiu uma sociedade nos termos de suas atitudes destrutivas.
A figura de um novo homem faz-se necessária, pois não se pode mais admitir tanta violência e exploração do homem pelo próprio homem. Não se pode mais admitir tantas injustiças sociais. Não se pode mais admitir que o homem seja escravo do próprio homem. Não se pode mais admitir que tantas vidas sejam sacrificadas em nome do lucro das grandes empresas.
O ser humano deve ser respeitado como tal e, para isto, torna-se crucial uma mobilização de todas as pessoas em busca da efetivação daquilo que está previsto na Constituição Federal: direitos e garantias fundamentais para todos sem distinção. Esta mudança de paradigma, bem como a sua efetivação deve ser realizada de forma urgente. Assim sendo, a sociedade brasileira será capaz de obter crescimento e desenvolvimento social de forma sustentável.
REFERÊNCIAS:
ANÍBAL, Ponce. Educação e Luta de Classes. São Paulo: Cortez, 2000.
Constituição da República Federativa do Brasil. 41ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2004.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ªed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.
[1] Conforme explica a Wikipédia, “A escassez é definida como limitação de meios em relação a fins possiveis, é um conceito analítico abstrato enquanto pobreza é um conceito subjetivo e pratico que é classificado como falta do mínimo de recursos para satisfazer as necessidades humanas, a definição do que seriam essas necessidades é puramente subjetiva.”
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINTO, Rinaldo Sergio Guimaraes. A fiscalização dos produtos e serviços como forma de prevenção dos abusos nas relações consumeristas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 set 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40987/a-fiscalizacao-dos-produtos-e-servicos-como-forma-de-prevencao-dos-abusos-nas-relacoes-consumeristas. Acesso em: 23 dez 2024.
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