Resumo: Objetivando evitar que as condições ambientais que hoje desfrutamos tornem-se ainda pior, surgiu o principio da não regressão em matéria ambiental, atuando como balizador da supressão ou restrição do direito fundamental da presente e futura geração de viver em um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Palavras-chave: Direito ambiental. Princípio da não regressão.
Abstrat: Aiming to prevent the environmental conditions we enjoy today become worse, came the principle of non-regression in environmental matters, acting as base the suppression or restriction of the fundamental right of present and future generations to live in an ecologically balanced environment.
Keywords: Environmental Law. Principal of non-regression.
Sumário: Introdução 1. Direito Internacional; 2. Direito Brasileiro; 3. Jurisprudência Brasileira; 4. Direito fundamental. conclusão. Referências.
Introdução:
O Direito ambiental, sob uma visão globalizada, vem se solidificando como um novo direito fundamental dentro das Constituições de diversos países. Contudo, paradoxalmente, ao mesmo tempo vem sofrendo duras ameaças, geradas, especialmente, pela atual crise econômica mundial, que impõe uma redução nas obrigações jurídicas e, neste contexto, estão às relacionadas às matérias ambientais, bem como pela dificuldade de acesso e entendimento do complexo conjunto de normas ambientais, provocando um movimento pela facilitação/redução das leis/obrigações ambientais. Tais fatores têm contribuído para um retrocesso das normas incentivadoras do desenvolvimento sustentável.
Essas e tantas outras dificuldades têm impulsionado os pensadores deste ramo jurídico a buscar mecanismos de salvaguarda das normas ambientais já consolidadas, notadamente contra as investidas estatais relacionadas à diminuição dos compromissos de proteção do meio ambiente.
Hodiernamente, a partir da evolução do pensamento jurídico-ambiental, não se pode considerar uma lei que revogue normas antipoluição, limite a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado ou, ainda, que suprima, sem justificativa, áreas ambientalmente protegidas. Dentro deste contexto, surgiu à necessidade de se consolidar um princípio de não regressão, visando à proteção do meio ambiente.
1. DIREITO INTERNACIONAL
Este pensamento tem norteado a comunidade internacional preocupada com o meio ambiente. Michel Prieur, Professor Emérito da Universidade de Limoges (UNILIM - França), em seu texto “O princípio da “não regressão” no coração do direito do homem e do meio ambiente” destaca as nomenclaturas utilizadas em diversos países para descrever este risco de ”não retrocesso”, identificando que esta preocupação é experimentada ao redor do mundo, vejamos:
“a terminologia utilizada pela doutrina ainda é hesitante. Em certos países, menciona-se o princípio do standstill. É o caso da Bélgica. Na França se utiliza o conceito do Efeito Cliquet (catraca) ou regra “Cliquet” antirretorno. Alguns autores falam em “intangibilidade” de certos direitos fundamentais ou de cláusula de “statu quo”. Em inglês, encontra-se a expressão “eternity clause” ou “entrenched clause”, em espanhol “prohibicion de regresividad o de retroceso”, em português “proibição de retrocesso”.”
Ao fim, afirma que o princípio da não regressão “não é uma simples cláusula ou mera regra, mas sim um verdadeiro princípio”. Ressalta que este postulado “é também a expressão de um dever de não regressão imposto ao Poder Público.” E ainda, destaca a finalidade protetiva da instituição de tal princípio, vejamos:
“Utilizando-se da “não regressão” no que tange ao meio ambiente, procura-se sobrelevar os degraus na proteção do meio ambiente e que os progressos legislativos consistem numa segurança “progressiva” da proteção mais elevada possível do meio ambiente no interesse coletivo da humanidade, da mesma maneira que existe a progressão dos direitos humanos.”
Segundo o artigo 30 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, uma vez um direito humano seja reconhecido ele não pode ser limitado, destruído ou suprimido, sendo proibida a “destruição” ou a “limitação” de um direito fundamental, ou seja, seu retrocesso. Tal determinação também pode ser visualizada no artigo 17 e 53 da Convenção Européia dos direitos do homem.
A discussão acerca da importância do princípio da não regressão das normas jurídico-ambientais foi tema central na Conferência da Organização das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, também conhecida como Rio+20, tornando-se um marco internacional na consolidação do tema.
2. DIREITO BRASILEIRO
Identificando a necessidade de solidificar o principio da não regressão em nosso ordenamento jurídico a Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) do Senado Federal promoveu um Colóquio Internacional sobre o Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental, em 29 de março de 2012, coordenado pelo Ministro e Professor Antonio Herman Benjamin, precursor do tema no Brasil e um dos expoentes do Direito Ambiental no mundo.
Como conclusão deste amplo debate jurídico consolidou-se doutrinariamente no Brasil o principio da não regressão, por intermédio de fortes fundamentos éticos, políticos, constitucionais, legais e jurisprudenciais.
Em que pese à ausência do princípio de forma expressa em nossa Carta Magna ou na legislação infraconstitucional ele pode ser depreendido de forma sistêmica, a partir do complexo de normas que formam o direito ambiental, especialmente do artigo 225 da Constituição de 1988, topos central no ordenamento jurídico ambiental que dispõe: “Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, impondo- se ao Poder Publico e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Dessa forma, há forte movimento doutrinário e jurisprudencial afirmando que o princípio do não retrocesso está implícito em nossa Carta Magna.
No sentido da existência do princípio da não-regressão em matéria ambiental em nosso ordenamento jurídico já se manifestou o Professor Antonio Herman Benjamin, vejamos:
“E seguro afirmar que a proibição de retrocesso, apesar de não se encontrar, com nome e sobrenome, consagrada na nossa Constituição, nem em normas infraconstitucionais, e não obstante sua relativa imprecisão − compreensível em institutos de formulação recente e ainda em pleno processo de consolidação−, transformou-se em principio geral do Direito Ambiental, a ser invocado na avaliação da legitimidade de iniciativas legislativas destinadas a reduzir o patamar de tutela legal do meio ambiente, mormente naquilo que afete em particular a) processos ecológicos essenciais, b) ecossistemas frágeis ou a beira de colapso, e c) espécies ameaçadas de extinção.”
Michel Prieur trata especificamente do caso brasileiro, vejamos:
“A Constituição Brasileira de 1988 comporta um grande número de disposições sobre o meio ambiente, dando assim a esta política um lugar eminente na hierarquia jurídica interna. Mesmo que ele não figure no título consagrado aos direitos e às garantias fundamentais, a doutrina considera que os direitos ligados ao meio ambiente constituem no plano material, e também formal, direitos fundamentais. Esta constituição comporta uma disposição original que consiste em enunciar que os “direitos e as garantias individuais” estão excluídos de uma revisão constitucional, consoante aplicação do artigo 60, § 4º, IV (cláusula pétrea ou cláusula de intangibilidade constitucional). Estes direitos são considerados, assim, como direitos adquiridos. Admite-se, portanto, que a proteção constitucional do meio ambiente faz parte dos direitos adquiridos qualificados como imutáveis e que ela não admite, assim, nenhuma revisão.”
De fato, o principio da não regressão já foi inclusive admitido judicialmente e como exemplos temos decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, data de 18 de dezembro de 2008, n° 7002162254 e do Tribunal de Justiça de São Paulo, datada de 25 agosto de 2009, n°5878524400.
3. JURISPRUDENCIA BRASILEIRA
O Superior Tribunal de Justiça também já reconheceu, expressamente, a proibição de retrocesso como princípio geral do Direito Ambiental, por intermédio do REsp 418.526/SP, de Relatoria do Min. Teori Albino Zavascki, publicado no DJe de 13.10.2010.
Em outro precedente, o Min. Herman Benjamin do STJ voltou a manifestar-se acerca do principio da proibição de retrocesso, garantindo que “os avanços urbanistico-ambientais conquistados no passado não serão diluídos, destruídos ou negados pela geração atual ou pelas seguintes”. Vejamos:
Ementa: Processual Civil, Administrativo, Ambiental e Urbanístico. Loteamento City Lapa. Ação Civil Pública. Ação de nunciação de obra nova. Restrições urbanístico-ambientais convencionais estabelecidas pelo loteador. Estipulação contratual em favor de terceiro, de natureza propter rem. Descumprimento. Prédio de nove andares, em área onde só se admitem residências uni familiares. Pedido de demolição. Vício de legalidade e de legitimidade do alvará. Ius variandi atribuído ao município. Incidência do princípio da não-regressão (ou da proibição de retrocesso) urbanístico-ambiental. Violação ao art. 26, VII, da Lei 6.766/79 (Lei Lehmann), ao art. 572 do Código Civil de 1916 (art. 1.299 do Código Civil de 2002) e à Legislação Municipal. Art. 334, I, do Código de Processo Civil. Voto-Mérito. [...] 11. O exercício do ius variandi, para flexibilizar restrições urbanístico-ambientais contratuais, haverá de respeitar o ato jurídico perfeito e o licenciamento do empreendimento, pressuposto geral que, no Direito Urbanístico, como no Direito Ambiental, é decorrência da crescente escassez de espaços verdes e dilapidação da qualidade de vida nas cidades. Por isso mesmo, submete-se ao princípio da não-regressão (ou, por outra terminologia, princípio da proibição de retrocesso), garantia de que os avanços urbanístico-ambientais conquistados no passado não serão diluídos, destruídos ou negados pela geração atual ou pelas seguintes. [...] 19. Recurso Especial não provido. (Superior Tribunal de Justiça – Segunda Turma/ REsp 302.906/SP/ Relator: Ministro Herman Benjamin/ Julgado em 26.08.2010/ Publicado no DJe em 01.12.2010).
4. DIREITO FUNDAMENTAL
No que tange a proteção dada por nossa Constituição Federal de 1988 ao direito ao meio ambiente, destaca-se que em que pese as normas de direito ambiental não estejam insertas no capítulo voltado aos direitos fundamentais, dele faz parte, merecendo guarida da intangibilidade de tais direitos.
A CF88 atribuiu ao direito ao ambiente o status de direito fundamental do indivíduo e da coletividade, bem como consagrou a proteção ambiental como um dos objetivos ou tarefas fundamentais do Estado de Direito brasileiro.
Sendo o direito ambiental categoria de direito humano, em especial do direito à vida, suas normas não podem ser alteradas ao sabor das circunstâncias, sem um amplo debate prévio, já que seu objetivo primordial é proteger, promover e evitar a degradação do ambiente, sendo este o principal argumento em prol do princípio da não regressão das conquistas jurídicos- ambientais.
A proibição do retrocesso deve atuar como uma garantia constitucional do cidadão contra a ação do Poder Legislativo e do Poder Executivo, no intuito de conferir proteção aos direitos fundamentais consagrados pelo ordenamento jurídico.
Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer, em artigo dedicado ao tema, afirmam que “é possível afirmar que a garantia da proibição de retrocesso tem por escopo preservar o bloco normativo – constitucional e infraconstitucional – já construído e consolidado no ordenamento jurídico, especialmente naquilo em que objetiva assegurar a fruição dos direitos fundamentais, impedindo ou assegurando o controle de atos que venham a provocar a supressão ou restrição dos níveis de efetividade vigentes dos direitos fundamentais.”
Assim, a proibição de retrocesso se expressa a partir da idéia de proteção dos direitos fundamentais.
Conclusões
Frente às ameaças que pesam sobre o planeta em conseqüência das múltiplas degradações dos ecossistemas, e em busca do desenvolvimento sustentável para as presentes e futuras gerações somos instados a pensar em instrumentos que contenham a poluição, a perda da biodiversidade e melhorem o meio ambiente, ou seja, somos convidados a seguir em frente e jamais retroceder nas conquistas jurídicas ambientais, sendo o princípio do não retrocesso do direito ambiental uma garantia de efetividade do direito do homem ao meio ambiente.
Referências Bibliográficas
BENJAMIN, Antonio Herman. Constitucionalização do ambiente e ecologização da Constituição brasileira. In: CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes; MORATO LEITE, Jose Rubens (Orgs.). Direito constitucional ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 57-130.
PRIEUR, Michel. O princípio da “não regressão” no coração do direito do homem e do meio ambiente. Revista NEJ - Eletrônica, Vol. 17 - n. 1 - p. 06-17 / jan-abr 2012.
SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. O papel do Poder Judiciário brasileiro na tutela e efetivação dos direitos e deveres socioambientais. In: Revista de Direito Ambiental, n. 52. São Paulo: Revista dos Tribunais, Out-Dez/2008, p. 73-100;
Procuradora Federal desde 03/03/2008, atualmente lotada na Procuradoria Federal Especializada do INCRA; Ex. Procuradora do Estado do Pará; Ex. Defensora Pública do Estado do Pará e Ex. Advogada do Banco do Estado do Pará.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AVILA, Kellen Cristina de Andrade. O princípio da "não regressão" no Direito Ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 set 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41076/o-principio-da-quot-nao-regressao-quot-no-direito-ambiental. Acesso em: 23 dez 2024.
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