Resumo: O presente artigo tece considerações a respeito da contagem dos prazos para a perda da qualidade de segurado do Regime Geral de Previdência Social – RGPS.
Palavras chave – perda da qualidade de segurado; contagem dos prazos; período de graça.
Sumário – I - Introdução; II - Aquisição da qualidade de segurado; III - Perda da qualidade de segurado; IV - Conclusões; V - Referências bibliográficas.
I - Introdução
A concessão de um benefício no âmbito do Regime Geral de Previdência Social pressupõe um vínculo jurídico entre os que contribuem na qualidade de segurado obrigatório ou facultativo e daqueles que se enquadram na condição de dependentes e o Instituto Nacional do Seguro Social.
Esse vínculo jurídico não está fundado na noção civilista de risco, na medida em que nem todos os eventos que alcançam cobertura pelo RGPS tem como pressuposto um dano. Seu objeto reside na relação de condicionalidade ou contingência, isto é, na circunstância ou evento que gera a necessidade de tutela[1].
Trata-se de um direito fundamental decorrente de preceitos constitucionais e legais cuja responsabilidade do ente previdenciário se funda na teoria do risco social, não se indagando acerca da atuação dolosa ou culposa, tampouco da intenção do segurado em causar o infortúnio. Preenchidos os requisitos, não há discricionariedade na concessão do benefício[2].
Entretanto, uma das mais relevantes causas de extinção da relação jurídica previdenciária reside na perda da qualidade de segurado, disciplinada no art. 15 da Lei nº 8.213/91 e que será tratada no presente artigo.
II - Aquisição da qualidade de segurado
Podem ser enquadrados como segurados do RGPS toda pessoa física que exerce atividade remunerada, efetiva ou eventual, de natureza urbana ou rural, com ou sem vínculo de emprego, a título precário ou não, bem como aquele que se filia facultativamente.[3]
Para aquisição da qualidade de segurado, é necessária a filiação, compreendida esta como o vínculo que se estabelece entre as pessoas que contribuem para o sistema e do qual decorrem direitos e obrigações[4]. É a partir da filiação que a relação jurídica de natureza previdenciária se estabelece.
A filiação à Previdência Social é automática e decorre do exercício de atividade remunerada para os segurados obrigatórios e da formalização da inscrição com o primeiro pagamento para o segurado facultativo[5].
A filiação não se confunde com a inscrição. Essa corresponde ao ato pelo qual o segurado é cadastrado no Regime Geral de Previdência Social, mediante comprovação dos dados pessoais e de outros elementos necessários e úteis a sua caracterização[6]. Segundo Ionas Deda Gonçalves, a inscrição:
É um ato administrativo, necessário para que a relação jurídica ultrapasse a fronteira do abstrato e passe a produzir efeitos concretos. Sem a inscrição o segurado não pode exercer seus direitos previdenciários nem sequer cumprir sua obrigação de cotização.[7]
A inscrição se realiza para o empregado mediante o preenchimento dos documentos que o habilite ao exercício da atividade, formalizado pelo contrato de trabalho; para o avulso pelo cadastramento e registro no sindicato ou órgão gestor de mão de obra; para o empregado doméstico com a apresentação de documento que comprove a existência de contrato de trabalho; para o contribuinte individual pela apresentação de documento que caracterize a sua condição ou o exercício de atividade profissional, liberal ou não; para o segurado especial mediante a apresentação de documento que comprove o exercício de atividade rural; para o facultativo pela apresentação de documento de identidade e declaração expressa de que não exerce atividade que o enquadre na categoria de segurado obrigatório[8].
Entretanto, a cessação do desempenho de atividade remunerada para o segurado obrigatório e a interrupção das contribuições para o segurado facultativo são situações de grande relevância a ponto de implicar na perda da qualidade de segurado e por conseguinte, na caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade de conformidade com o art. 102 da Lei nº 8.213/91, conforme será exposto.
III - Perda da qualidade de segurado
De forma excepcional e à luz da natureza protetiva do sistema previdenciária, é possível a manutenção da qualidade de segurado por certo lapso temporal sem o exercício de atividade remunerada ou recolhimentos. Conforme saliente Frederico Augusto Di Trindade Amado:
... em observância ao Princípio da Solidariedade, pedra fundamental do nosso regime previdenciário, não seria justo que após a cessação das contribuições a pessoa perdesse imediatamente a condição de segurada, deixando de estar coberta pelo seguro social, justamente no momento em que enfrente grandes dificuldades, em especial por não mais desenvolver atividade laborativa remunerada.[9]
É o chamado “período de graça”, lapso temporal durante o qual são conservados todos os direitos inerentes à relação jurídica de natureza previdenciária sem o recolhimento das contribuições. As hipóteses estão dispostas no art. 15 da Lei nº 8.213/91:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
A primeira hipótese é clara e dispensa maiores comentários. O segurado em gozo de benefício previdenciário conserva durante esse período todos os direitos inerentes à relação jurídica previdenciária. Cessado o benefício, a manutenção da qualidade de segurado será mantida por doze meses, findo os quais, será necessária a volta do pagamento das contribuições, sob pena de caducidade dos direitos.
Esse prazo será estendido por mais doze meses num total de vinte e quatro meses para o segurado desempregado que comprove esta situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e Emprego. Para a hipótese de o segurado haver contribuído com mais de cento e vinte contribuições mensais sem a interrupção da qualidade de segurado, a prorrogação ocorrerá por um período de vinte e quatro meses.
Se o segurado tiver somado mais de cento e vinte contribuições sem a interrupção da qualidade de segurado e encontrar-se em situação de desemprego comprovado pelo registro no órgão competente do Ministério do Trabalho, a prorrogação chegará ao lapso temporal máximo de trinta e seis meses.
Entretanto, para o segurado facultativo, o período de graça será de até seis meses improrrogáveis contados da cessação das contribuições.
Nos casos de segurado acometido por doença de segregação compulsória ou recluso, haverá o prazo de doze meses após a segregação ou o livramento, durante o qual serão conservados a qualidade de segurado e os direitos inerentes.
Na hipótese do segurado, incorporado às Forças Armadas para prestar serviços militares, o lapso temporal em que se conserva a qualidade de segurado está restrito a três meses.
Questão significativa diz respeito à contagem dos prazos para perda da qualidade de segurado.
Nos termos do § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao final dos prazos citados.
Segundo esclarece Fábio Zambitte Ibrahim:
Basicamente, o que se deve entender é que a perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia 16 do segundo mês seguinte ao término dos prazos fixados no item anterior. Esse lapso temporal existe em razão do recolhimento previdenciário ser feito somente no mês seguinte ao da competência. A desfiliação, que ocorre no mês seguinte ao término do período de graça, somente toma lugar, efetivamente, após o prazo de vencimento desta competência, que ocorrerá no dia 15 do mês seguinte.
(...)
Como a lei prevê o termo a quo do prazo para perda da qualidade após a ‘cessação das contribuições’, e o recolhimento é sempre feito no mês seguinte, isto tem o efeito de postergar o início do período de graça, pois a contagem do prazo deve ser de acordo com o regime de competência, adotado para fins de recolhimento, além de diferir o término para o dia 15 do mês seguinte ao término do prazo legal. [10]
A título de exemplo, se um segurado empregado ou contribuinte individual exerce atividade remunerada até 30 de março de 2013, haverá manutenção da qualidade de segurado até 15 de maio de 2014.[11]
A tabela constante no anexo XXIV da IN 45/2010 ilustra e sintetiza de forma clara o período de graça:
Situação |
Período de Graça |
A partir de 6/03/1997 -Decreto nº 2.172, de 6/03/1997
|
Até 120 contribuições |
12 meses após encerramento da atividade. |
Dia 16 do 14º mês. |
Mais de 120 contribuições |
24 meses após encerramento da atividade |
Dia 16 do 26º mês. |
Em gozo de benefício |
12 ou 24 meses após a cessação do benefício |
Dia 16 do 14º ou 26º mês. |
Recluso |
12 meses após o livramento |
Dia 16 do 14º mês. |
Facultativo (a partir da Lei nº 8.213/91) |
6 meses após a interrupção das contribuições |
Dia 16 do 8º mês |
Segurado Especial |
12 meses após o encerramento da atividade |
Dia 16 do 14º mês |
Serviço Militar |
3 meses após o licenciamento |
Dia 16 do 5º mês |
Com a perda da qualidade de segurado, haverá por conseguinte, perda dos direitos inerentes a essa condição.
IV – Conclusões
Considerando a natureza protetiva do RGPS, é razoável conservar a qualidade de segurado e consequentemente todos os direitos inerentes a essa condição durante certo lapso temporal sem o exercício de atividade remunerada ou recolhimentos. É o chamado período de graça.
Esses prazos variam entre o mínimo de três meses até o máximo de trinta e seis meses, a depender das situações que se encontra o segurado.
A perda da qualidade de segurado implica na caducidade dos direitos inerentes a essa condição e nos termos do § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados no citado artigo e seus parágrafos.
Referida regra tem como efeito prático o diferimento do início do período de graça bem como do término.
V - Referências bibliográficas
AMADO, Frederico Augusto Di Trindade. Direito Previdenciário Sistematizado. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2011.
CASTRO, Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 14ª ed. Florianópolis: Conceito, 2012.
GONÇALVES, Ionas Deda, Direito Previdenciário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 17ª ed. Niterói: Impetus. 2012.
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[1] SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 37.
[2] CASTRO, Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 14ª ed. Florianópolis: Conceito, 2012, p. 161-162.
[3] Ob. cit., p. 167.
[4] Artigo 29 da Instrução Normativa INSS/PRES 45/2010.
[5] Artigo 29, § 1º da Instrução Normativa INSS/PRES 45/2010.
[6] Artigo 38 da Instrução Normativa INSS/PRES 45/2010.
[7] GONÇALVES, Ionas Deda, Direito Previdenciário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 41.
[8] Artigo 39, § 1º da Instrução Normativa INSS/PRES 45/2010.
[9] AMADO, Frederico Augusto Di Trindade. Direito Previdenciário Sistematizado. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2011, p. 295.
[10] IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 17ª ed. Niterói: Impetus. 2012, p. 548-549.
[11] Nos termos do art. 30, I, “b” da Lei nº 8.212/91 na redação dada pela Lei nº 11.933/2009, o prazo final para recolhimento das contribuições previdenciárias dos segurados empregados e trabalhadores avulsos de empresa é o dia 20 do mês subsequente, de forma que o prazo de carência será de 13 meses e 20 dias.
Procurador Federal, Mestre em Direito das Relações Econômico-empresariais, Especialista em Direito Empresarial e Processual Civil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CERVO, Fernando Antonio Sacchetim. Contagem dos prazos para a perda da qualidade de segurado do Regime Geral de Previdência Social Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 out 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41101/contagem-dos-prazos-para-a-perda-da-qualidade-de-segurado-do-regime-geral-de-previdencia-social. Acesso em: 23 dez 2024.
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